Mais, ainda - Centro de Comunicação e Expressão - UFSC
Mais, ainda - Centro de Comunicação e Expressão - UFSC
Mais, ainda - Centro de Comunicação e Expressão - UFSC
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
1. A peça <strong>de</strong> Brecht: "O Círculo <strong>de</strong> Giz Caucasiano" coloca em cena<br />
(literalmente), a partir da presença do juiz Azdak, levado e mantido no cargo por muitos<br />
lances <strong>de</strong> sorte, a predominância do justo e não do legal, nas suas <strong>de</strong>cisões. E com um<br />
final feliz, para essa nova forma <strong>de</strong> fazer justiça.<br />
Vejamos o final da peça:<br />
RECITANTE:<br />
Vós, porém, que ouvistes a história do Círculo <strong>de</strong> Giz,<br />
Segui o conselho dos velhos:<br />
As coisas <strong>de</strong>vem caber aos que sabem fazer melhor.<br />
As crianças, às mulheres <strong>de</strong> coração maternal, para que sejam bem criadas.<br />
Os carros, aos bons condutores, para que a viagem seja boa,<br />
E o vale, aos que o abastecem <strong>de</strong> água, para que as colheitas sejam boas. 62<br />
A peça começa e termina com a questão da terra, afirmando que a proprieda<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>ve ser justa, isto é, <strong>de</strong> quem nela trabalha. E entre essas duas pontas, chegamos, na<br />
meta<strong>de</strong> da peça em diante, ao juiz Azdak, que faz proliferar sentenças em que o justo<br />
prevalece sobre o legal.<br />
Isso era o negativo para o <strong>Mais</strong>!, seja em 1993 no dossiê sobre o PT, seja no<br />
artigo <strong>de</strong> Contardo Calligaris, criticando Lula: "Lula <strong>de</strong>clarando 'entre a lei e a coisa<br />
justa e legítima, eu sempre disse que o justo e legítimo é muito mais importante', <strong>de</strong>u<br />
uma <strong>de</strong> Antígona mo<strong>de</strong>rna". 63<br />
Antecipando Brecht, e especialmente trecho <strong>de</strong>ssa peça, em que camponeses<br />
ajudam a justa Grucha a atravessar a ponte com o filho do rei, contra a polícia, o <strong>Mais</strong>!<br />
parece caminhar no rumo <strong>de</strong> uma mudança ao negar-se, ou, pelo menos, negar o<br />
passado (e o futuro que apontava) para acomodar-se ao presente, intensificando-o, bem<br />
como <strong>de</strong>bilitando "o passado e o futuro" 64 .<br />
2. Os segundos: ao contrário do que tínhamos visto, até aqui, há agora um elogio<br />
dos segundos, a começar pelo lançamento do livro pela Cosac & Naify, que o <strong>Mais</strong>!<br />
repercute, em comemoração aos 40 anos da tradução e encenação da peça no Brasil.<br />
Ban<strong>de</strong>ira, o segundo (aquele que opera por), merece a atenção <strong>de</strong> um primeiro e, nos<br />
termos do <strong>Mais</strong>!, ele não só "traduz" como "dialoga" com Brecht.<br />
62 BRECHT, Bertold. O Círculo <strong>de</strong> Giz Caucasiano. São Paulo: Cosac & Naify, 2002, p. 190.<br />
63 CALLIGARIS, Contardo. Lula como Antígona. Folha <strong>de</strong> S. Paulo, 5 jul. 1994. <strong>Mais</strong>!, p. 13.<br />
64 SARLO, Beatriz. Paisagens imaginárias. São Paulo: Edusp, 1997, p. 135.<br />
192