08.06.2013 Views

Orações de sapiência - Universidade de Coimbra

Orações de sapiência - Universidade de Coimbra

Orações de sapiência - Universidade de Coimbra

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

ORAÇÃO DE TODAS AS PARTES DA FILOSOFIA<br />

E gravando tudo isto no íntimo do coração humano, levanta os ouvintes à<br />

esperança da glória imortal e, dando-lhes a conhecer a divinda<strong>de</strong>, instrui-os e<br />

inflama-os na religião e na virtu<strong>de</strong> e, além disso, robustece-lhes as forças, <strong>de</strong> forma<br />

a po<strong>de</strong>rem constantemente pôr em prática o que é ensinado. E embora fale da morte<br />

do corpo, [22] isso não quer dizer que se <strong>de</strong>va <strong>de</strong>sejar a sua separação da alma antes<br />

que chegue o tempo marcado por Deus, mas que cada um <strong>de</strong>ve levantar o espírito<br />

acima <strong>de</strong>sta massa corpórea e dos vícios que daqui dimanam e, afastado quanto<br />

po<strong>de</strong> ser todo o contágio carnal, ocupar-se só na contemplação das coisas mais altas.<br />

A este pensamento a<strong>de</strong>re Macróbio no Sonho <strong>de</strong> Cipião; fala da divisão bipartida<br />

da morte: uma que vem da natureza, outra que parte da virtu<strong>de</strong>. 95 A este propósito<br />

vem ainda aquela frase <strong>de</strong> S. Paulo: <strong>de</strong>sejo ar<strong>de</strong>ntemente soltar-me do corpo e estar<br />

com Cristo. 96 A isto se ligam também as palavras <strong>de</strong> Aurélio Agostinho no livro<br />

Da Verda<strong>de</strong>ira Religião: refere que Platão tinha por costume exortar os seus jovens<br />

a absterem-se dos prazeres venéreos e que estivessem plenamente persuadidos <strong>de</strong><br />

que a verda<strong>de</strong> não é acessível aos olhos do corpo ou a outro sentido qualquer, mas<br />

só ao espírito puro. Para a apreen<strong>de</strong>r não havia maior impedimento do que uma<br />

vida dada à luxúria e as falsas imagens das coisas sensíveis que, mediante corpo,<br />

se gravam em nós. 97<br />

Ve<strong>de</strong>s, cultíssimos ouvintes, que eu, arrebatado pelo amor da divina teologia,<br />

ultrapassei a medida oratória e que todavia não realizei o que pretendia. 98 Mas já<br />

que a minha oração se escapou <strong>de</strong> lugares cheios <strong>de</strong> escolhos e, por entre rochas<br />

brancas da espuma das ondas, a frágil canoa avançou para o alto mar <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />

ter <strong>de</strong>ixado ao largo os escolhos doutrinais, 99 voltemos já as velas noutra direcção.<br />

Suplico todavia aos que tanto amam a verda<strong>de</strong> evangélica, que a honrem com uma<br />

fé sincera e com as honestas homenagens da virtu<strong>de</strong>.<br />

Ouvimos, juventu<strong>de</strong> estudiosa, o que <strong>de</strong>vemos conhecer e <strong>de</strong>sejar, 100 trabalho<br />

que eu elaborei somente para apresentar as divisões da filosofia. Aqueles que a ela<br />

se habituam e a apren<strong>de</strong>m, gozam dum medicamento muito eficaz com que não<br />

apenas curam as doenças da alma, mas também transmitem à imortalida<strong>de</strong> um nome<br />

que a velhice teria <strong>de</strong>struído juntamente com o corpo. Quem se inicia nos seus<br />

dons é constituído imediatamente filho <strong>de</strong> Zeus, nascido sob o signo duma estrela<br />

favorável e traz, <strong>de</strong> novo, pelo seu incalculável valor, a ida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ouro. Atraídos pela<br />

sua doçura é que aqueles antigos sábios dirigiam imprecações contra a brevida<strong>de</strong><br />

da vida humana.<br />

[23] Eis porque Sócrates, com cuja morte os homens pecaram contra a filosofia, 101<br />

ao avizinhar-se aquela, confessava: uma coisa somente sei, é que não sei. 102 E diz-<br />

-se que o sábio Temístocles, ao pressentir que ia morrer, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> ter completado<br />

cento e sete anos, afirmava que sentia pena <strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar a vida na ocasião em que<br />

começava a ter gosto <strong>de</strong> saber. 103 Platão, príncipe do talento e do saber, morreu<br />

aos oitenta e um anos, a escrever. Isócrates completou noventa e nove anos no<br />

trabalho <strong>de</strong> ditar e escrever. 104 E Catão o Censor, homem sapientíssimo, não sentiu<br />

<strong>de</strong>sdouro <strong>de</strong> apren<strong>de</strong>r, já velho, o grego. 105<br />

Obra protegida por direitos <strong>de</strong> autor<br />

2 2 9

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!