Orações de sapiência - Universidade de Coimbra
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1 2 0 PEDRO FERNANDES<br />
Faz, em seguida, uma referência a Deus, criador do Homem, citando, a propósito,<br />
um excerto dos Phaenomena <strong>de</strong> Arato.<br />
E é pelo Homem que vai iniciar a sua exposição. É <strong>de</strong>veras graciosa a maneira<br />
como fala do corpo. Aos olhos chama “fulgida illa si<strong>de</strong>ra”, expressão sugestivamente<br />
metafórica. Com eles, o Homem po<strong>de</strong> observar o céu e, consequentemente, observar<br />
o movimento dos astros. E assim Pedro Fernan<strong>de</strong>s começa a discorrer sobre a<br />
Astronomia, ou seja, inicia o tema com uma certa graça subtil. Não é a única vez<br />
que tal acontece. Quase sempre a transição <strong>de</strong> uma ciência para a outra faz-se com<br />
esta subtileza. É, aliás, uma das qualida<strong>de</strong>s que encontramos na sua prosa e com<br />
que raramente <strong>de</strong>paramos nas orações dos outros humanistas.<br />
“Cuius est tanta excellentia...” – diz o nosso autor acerca da Astronomia. E o<br />
mesmo dirá das outras artes e ciências...<br />
Faz citações, alonga-se em referências. Mas, como cristão, rejeita a predição do<br />
futuro pelos astros, não a <strong>de</strong>senvolvendo, portanto.<br />
E continuando: se os olhos foram o ponto <strong>de</strong> partida para a Astronomia, os<br />
ouvidos sê-lo-ão para a Música. Não entra na análise da arte dos sons. Refere o<br />
prestígio que ela teve na Antiguida<strong>de</strong>, especialmente grega, recordando casos curiosos,<br />
<strong>de</strong>monstrativos do alto valor pedagógico em que a música era tida entre os antigos.<br />
Este capítulo é especialmente belo pelas referências múltiplas feitas às diversas<br />
influências da Música na alma humana.<br />
Mas – continua o nosso orador – se a harmonia musical baila em torno do<br />
ouvido, “nec minus circa aures nostras numerus ipse versatur”. E, <strong>de</strong>ste modo, entra<br />
a consi<strong>de</strong>rar a Aritmética, tratando logicamente a seguir, a Geometria. Tal como<br />
as outras, “geometriae tamen tanta est excellentia...”. É o que procura <strong>de</strong>monstrar,<br />
citando Platão, Pitágoras, Flávio Josefo e outros.<br />
Consi<strong>de</strong>ra a forma geométrica e faz <strong>de</strong>la a essência da arte. “Sine geometria non<br />
modo haec sed nec rerum omnium speciem et pulchritudinem, quae in partium omnium<br />
proportione, uenustaque symmetria posita est posse consistere”. Era a concepção<br />
clássica da arte do seu tempo: harmonia e beleza.<br />
Mas voltemos ao Homem, diz Pedro Fernan<strong>de</strong>s. E, com aquela não <strong>de</strong>smentida<br />
subtileza, consi<strong>de</strong>ra o rosto, <strong>de</strong>pois a boca e, claro, surge então a palavra – tradutora<br />
<strong>de</strong> uma i<strong>de</strong>ia – e, por isso, a Gramática! “Vi<strong>de</strong>bimus oris effigiem et speciem, Deus<br />
bone, quam elegantem, quam utilem, quam necessariam cum ad alia multa, tum<br />
maxime ad id, quod animo conceperis explicandum”.<br />
A palavra é o meio <strong>de</strong> expressão da poesia. O humanista entra então em curiosas<br />
consi<strong>de</strong>rações acerca <strong>de</strong>sta arte.<br />
Pedro Fernan<strong>de</strong>s estima os Poetas. Nota-se neste capítulo um entusiasmo especial,<br />
reflectindo, certamente, o sentimento <strong>de</strong> Cícero no Pro Archia. Assim, afirma: “Poëtas<br />
cum dico, absit omnis uerbo inuidia, hominum genus maxime diuinum dico”. Exalta<br />
a poesia, citando Platão, Crisipo e outros, mas reserva um lugar especial para Moisés,<br />
Isaías, Job e Salomão.<br />
Obra protegida por direitos <strong>de</strong> autor