Cristina Toshie Lucena Nishio - Biblioteca Digital de Teses e ...
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uma outra espécie <strong>de</strong> real. Daí o talento <strong>de</strong>ssa imagem para criar realida<strong>de</strong>s paralelas –<br />
ficções – que se acrescenta ao talento fotográfico <strong>de</strong> documentar o real que lhe <strong>de</strong>u origem.<br />
Parece-nos que Bazin (1991) intui sobre essa diferença entre a imagem<br />
cinematográfica e a imagem fotográfica, quando, no artigo intitulado “Montagem<br />
proibida” 23 , ele incentiva a exploração da ambigüida<strong>de</strong> essencial da imagem<br />
cinematográfica, valorizando, por exemplo, filmes como Crin blanc (O balão Branco), <strong>de</strong><br />
Albert Lamorisse, que, segundo o crítico francês, conseguem conciliar a realida<strong>de</strong><br />
cinematográfica com a realida<strong>de</strong> documentária:<br />
cinema:<br />
“Consi<strong>de</strong>rar os filmes <strong>de</strong> Lamorisse como filmes <strong>de</strong> pura ficção seria traí-los,<br />
com também, por exemplo, Le ri<strong>de</strong>au cramoisi. A credibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>las está<br />
certamente ligada a seu valor documental. Os acontecimentos que eles<br />
representam são parcialmente verda<strong>de</strong>iros. Para Crin Blanc, a paisagem <strong>de</strong><br />
Camargue, a vida dos criadores e pescadores, os costumes das manadas,<br />
constituem a base da fábula, o ponto <strong>de</strong> apoio sólido e irrefutável do mito.<br />
Porém, essa realida<strong>de</strong> fundamenta-se justamente em uma dialética do<br />
imaginário, cujo interessante símbolo é a duplicação <strong>de</strong> Crin Blanc. Assim,<br />
Crin Blanc é a um só tempo o verda<strong>de</strong>iro cavalo que pasta nos campos<br />
salgados <strong>de</strong> Camargue, e o animal <strong>de</strong> sonho que nada eternamente em<br />
companhia do menino Folco. Sua realida<strong>de</strong> cinematográfica não po<strong>de</strong>ria<br />
dispensar a realida<strong>de</strong> documentária, mas era preciso, para que ela se tornasse<br />
verda<strong>de</strong> <strong>de</strong> nossa imaginação, que se <strong>de</strong>struísse e renascesse na própria<br />
realida<strong>de</strong>.” (Bazin, 1991, p. 59)<br />
Há ainda um outro trecho do artigo on<strong>de</strong> Bazin aponta para esse traço próprio ao<br />
“O importante é que possamos dizer, ao mesmo tempo, que a matéria-prima<br />
do filme é autêntica e que, no entanto, é „cinema‟. Assim, a tela reproduz o<br />
fluxo e refluxo <strong>de</strong> nossa imaginação, que se nutre da realida<strong>de</strong> a qual ela<br />
projeta sem substituir. A fábula nasce da experiência que ela transcen<strong>de</strong>.”<br />
(ibi<strong>de</strong>m, p 60)<br />
Se há algo do fotográfico que possa ser encontrado no cinema é essencialmente<br />
esse vínculo existencial que a imagem mutável apresenta com o real que lhe <strong>de</strong>u origem;<br />
seu valor <strong>de</strong> documento. Como diz Barthes (1984), a imagem se apresenta como uma<br />
“emanação do referente” ; este compreen<strong>de</strong>ndo, na verda<strong>de</strong>, o real que se encontrava lá,<br />
embrenhando o equipamento <strong>de</strong> produção da imagem latente. Mas o que po<strong>de</strong>mos<br />
consi<strong>de</strong>rar aqui como sendo especificamente cinematográfico é esse modo particular como<br />
coração: esquece-se on<strong>de</strong> se está. Idéias estranhas inva<strong>de</strong>m os espíritos; fica-se cada vez menos consciente.”<br />
(Gorki, 1995, p. 28 et seq. )<br />
23 Cahiers du cinema, 1953 e 1957.<br />
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