Cristina Toshie Lucena Nishio - Biblioteca Digital de Teses e ...
Cristina Toshie Lucena Nishio - Biblioteca Digital de Teses e ... Cristina Toshie Lucena Nishio - Biblioteca Digital de Teses e ...
fotografia permitiu à pintura ocidental desembaraçar-se definitivamente da obsessão realista de reencontrar a sua autonomia estética.” (Bazin, op. cit., p. 127) Passa a caber, enfim, à imagem fotográfica (bem como às outras imagens pertencentes ao “paradigma fotográfico”, o cinema, o vídeo) satisfazer aos anseios de nossa época por produzir imagens realistas o suficiente para exercer a função de “duplo” do real. A objetividade dessa (s) imagem (s) lhe (s) garantiria a credibilidade necessária para responder bem a essa necessidade moderna, pois ela se fundamentaria no próprio modo de constituição da imagem, em sua gênese automática. 54
O real na imagem para além da realidade visível As reflexões que Bazin (1983) desenvolve sobre a imagem fotográfica – bem como a cinematográfica – mantêm-se ainda extremamente atuais e influentes no contexto contemporâneo das teorias das imagens. Contudo, no nosso entendimento, há um outro teórico mais recente que também se destaca na singularidade de suas idéias: Roland Barthes. Em seu último trabalho, La chambre claire ele elabora um movimento muito pessoal nas reflexões que vai tecendo sobre a fotografia. 14 Inicialmente, ele dá prosseguimento à ênfase bazaniana no processo químico que viabiliza a inscrição da imagem, também reconhecendo nela o poder de se apresentar como “uma emanação do referente”: “Não é essa senão a única prova de sua arte? Anular-se como médium, não ser mais um signo, mas a própria coisa mesma?” (ibidem, p. 121, 73). Mas Barthes aponta para algo mais. Para ele, a noção de real transcende a realidade visível. Nesse sentido, a função de “duplo” do real (Bazin, 1983, passim) não é satisfeita apenas pelo realismo alcançado na imagem, mas é ampliada pela sua capacidade de remeter a algo mais sobre ele, o real; algo que, em última instância, é “indizível”, e que só se apresenta na imagem como uma “ferida” (Barthes, 1984, passim). A realidade visível representada na imagem corresponderia, assim, ao que Barthes chama de studium, remeteria a um Saber sobre ela que já se encontra disponibilizado pela cultura; proporia, portanto, um reconhecimento da realidade na imagem, uma “leitura da imagem pela cultura”. O “indizível”, por outro lado, é um algo a mais sobre o real que a imagem fotográfica tem a capacidade de expressar, algo além daquilo que os olhos vêem, aquilo que abre a imagem, que rompe sua aparente unidade, que perturba, que “fere”, que “quebra o studium da imagem”. Uma “ferida” que ele nomeia como punctum. “O punctum tem, mais ou menos virtualmente, uma força de expansão.” (ibidem, p. 73) Quando o punctum está ausente na imagem, a fotografia restabelece sua unidade, garante a tranqüilidade de leitura, em um “prazer mediano”. Ela se torna aquilo que Barthes chama de “fotografia unária”: “a fotografia é unária quando transforma enfaticamente a realidade, sem duplicá-la, sem fazê-la vacilar (a ênfase é uma força de coesão), nenhum duelo, nenhum indireto, nenhum distúrbio.” (ibidem, p. 66) Não é, contudo, a “fotografia unária” que lhe interessa. Interessa-lhe a imagem que “punge”, que “fere”. 14 “(...) transformar em razão minha declaração de singularidade e tentar fazer da „antiga soberania do eu‟ (Nietzsche) um princípio heurístico.” (Barthes, 1984, p. 19) 55
- Page 3 and 4: À minha mãe e ao meu pai, por ter
- Page 5 and 6: “O Saber encontra expressão na f
- Page 7 and 8: Fig. 1 Fig. 2 Lista de Ilustraçõe
- Page 9 and 10: Résumé Ce travail analyse le proc
- Page 11 and 12: Antônio Moreno, ofereceu aos aluno
- Page 13 and 14: nova imagem. Mas o que é o movimen
- Page 15 and 16: 1. Nos fotogramas, fotografias Nos
- Page 17 and 18: O funcionamento da câmera e do pro
- Page 19 and 20: 1. 1. No processo ótico, a configu
- Page 21 and 22: A perspectiva artificialis e o olho
- Page 23 and 24: “Dizia-se, naquela época, que po
- Page 25 and 26: passariam a permitir sua inscriçã
- Page 27 and 28: Fig. 1 “Câmara obscura transport
- Page 29 and 30: ao “paradigma fotográfico”, ta
- Page 31 and 32: Ao enfatizar o processo ótico que
- Page 33 and 34: Do ponto de fuga ao ponto de vista:
- Page 35 and 36: acoplamento de olhares, essa identi
- Page 37 and 38: verdade, a sucessão cinematográfi
- Page 39 and 40: Essas imagens que surgiriam logo em
- Page 41 and 42: filmes de estrutura narrativa clás
- Page 43 and 44: que vagueia, que se perde. O sujeit
- Page 45 and 46: Na imagem, a expressão de sua temp
- Page 47 and 48: se confundiria de maneira indistint
- Page 49 and 50: evento, muitos ainda viriam a conti
- Page 51 and 52: O realismo nas imagens pertencentes
- Page 53: Pode-se observar, portanto, que oco
- Page 57 and 58: Barthes alcança aquilo que tanto p
- Page 59 and 60: „revelar uma foto‟, mas o que a
- Page 61 and 62: traduziria, então, em uma represen
- Page 63 and 64: 2. Entre os fotogramas, o movimento
- Page 65 and 66: partes mais leves de algum corpo ma
- Page 67 and 68: epresentação; no entanto, ela rem
- Page 69 and 70: o real se articula com a imagem; es
- Page 71 and 72: 2. 1. Das pesquisas sobre a persist
- Page 73 and 74: a ser percebidos como um único eve
- Page 75 and 76: Fig. 3 “Séries de taumatrópios
- Page 77 and 78: O cientista austríaco Simon Stampf
- Page 79 and 80: A projeção luminosa Há ainda uma
- Page 81 and 82: 81 Figuras 7 e 8 “Dissolving View
- Page 83 and 84: ele viria a se tornar um elemento i
- Page 85 and 86: animação da imagem fotográfica,
- Page 87 and 88: Fig. 11 “Balle Rebondissante - É
- Page 89 and 90: mutável. 43 Em 1891, Thomas Edison
- Page 91 and 92: Fig. 12 “Projetor e câmera crono
- Page 93 and 94: alternância que não é percebida
- Page 95 and 96: Real e virtual: dois planos distint
- Page 97 and 98: cinematográfico fundamenta-se no e
- Page 99 and 100: natureza, onde o passado e o futuro
- Page 101 and 102: Bergson chama de “afecção”. C
- Page 103 and 104: presente, de estímulos visuais. Es
O real na imagem para além da realida<strong>de</strong> visível<br />
As reflexões que Bazin (1983) <strong>de</strong>senvolve sobre a imagem fotográfica – bem como<br />
a cinematográfica – mantêm-se ainda extremamente atuais e influentes no contexto<br />
contemporâneo das teorias das imagens. Contudo, no nosso entendimento, há um outro<br />
teórico mais recente que também se <strong>de</strong>staca na singularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> suas idéias: Roland<br />
Barthes. Em seu último trabalho, La chambre claire ele elabora um movimento muito<br />
pessoal nas reflexões que vai tecendo sobre a fotografia. 14 Inicialmente, ele dá<br />
prosseguimento à ênfase bazaniana no processo químico que viabiliza a inscrição da<br />
imagem, também reconhecendo nela o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> se apresentar como “uma emanação do<br />
referente”: “Não é essa senão a única prova <strong>de</strong> sua arte? Anular-se como médium, não ser<br />
mais um signo, mas a própria coisa mesma?” (ibi<strong>de</strong>m, p. 121, 73). Mas Barthes aponta<br />
para algo mais. Para ele, a noção <strong>de</strong> real transcen<strong>de</strong> a realida<strong>de</strong> visível. Nesse sentido, a<br />
função <strong>de</strong> “duplo” do real (Bazin, 1983, passim) não é satisfeita apenas pelo realismo<br />
alcançado na imagem, mas é ampliada pela sua capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> remeter a algo mais sobre<br />
ele, o real; algo que, em última instância, é “indizível”, e que só se apresenta na imagem<br />
como uma “ferida” (Barthes, 1984, passim). A realida<strong>de</strong> visível representada na imagem<br />
correspon<strong>de</strong>ria, assim, ao que Barthes chama <strong>de</strong> studium, remeteria a um Saber sobre ela<br />
que já se encontra disponibilizado pela cultura; proporia, portanto, um reconhecimento da<br />
realida<strong>de</strong> na imagem, uma “leitura da imagem pela cultura”. O “indizível”, por outro lado,<br />
é um algo a mais sobre o real que a imagem fotográfica tem a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> expressar,<br />
algo além daquilo que os olhos vêem, aquilo que abre a imagem, que rompe sua aparente<br />
unida<strong>de</strong>, que perturba, que “fere”, que “quebra o studium da imagem”. Uma “ferida” que<br />
ele nomeia como punctum. “O punctum tem, mais ou menos virtualmente, uma força <strong>de</strong><br />
expansão.” (ibi<strong>de</strong>m, p. 73) Quando o punctum está ausente na imagem, a fotografia<br />
restabelece sua unida<strong>de</strong>, garante a tranqüilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> leitura, em um “prazer mediano”. Ela se<br />
torna aquilo que Barthes chama <strong>de</strong> “fotografia unária”: “a fotografia é unária quando<br />
transforma enfaticamente a realida<strong>de</strong>, sem duplicá-la, sem fazê-la vacilar (a ênfase é uma<br />
força <strong>de</strong> coesão), nenhum duelo, nenhum indireto, nenhum distúrbio.” (ibi<strong>de</strong>m, p. 66) Não<br />
é, contudo, a “fotografia unária” que lhe interessa. Interessa-lhe a imagem que “punge”,<br />
que “fere”.<br />
14 “(...) transformar em razão minha <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> singularida<strong>de</strong> e tentar fazer da „antiga soberania do eu‟<br />
(Nietzsche) um princípio heurístico.” (Barthes, 1984, p. 19)<br />
55