Cristina Toshie Lucena Nishio - Biblioteca Digital de Teses e ...

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1. 2. No processo químico, o vínculo com o real pelo instante fotográfico Durante os séculos XVI, XVII e XVIII a câmara obscura se difundiu como um dispositivo óptico que facilitava a produção de imagens em perspectiva. No século XIX, entretanto, ela viria a adquirir um novo status, quando alguns indivíduos começam a se dar conta do quão interessante seria encontrar um modo mais prático de fixar essas imagens que se produziam no interior do aparato, um modo que dispensasse o trabalho do pintor, um modo mais automático. Para que isto se tornasse possível, eles deveriam pesquisar sobre materiais que fossem sensíveis à luz. Vários pesquisadores se embrenharam nesses estudos. E, mesmo residindo em diferentes lugares e, muitas vezes, sem se comunicarem entre si, eles encontraram soluções que culminariam no surgimento das primeiras imagens fotográficas. Na Inglaterra, havia o cientista amador Thomas Wedgwood (já em fins do século XVIII), o erudito e cientista Willian Henry Fox Talbot (desde 1833), e o cientista J.B. Reade (desde 1837); na França, o funcionário do Estado Hippolyte Bayard (desde 1837); na Alemanha, os cientistas Franz von Kobell, professor de mineralogia, e Carl August von Steinheil, professor de matemáticas (desde 1839); no Brasil, o pintor Hercules Florence, dentre outros. Mas o primeiro a tornar pública a invenção da fotografia seria o francês Louis Jacques Mandé Daguerre, quando, em julho de 1839, ele vende o seu invento, o daguerreótipo 8 , para o governo francês. Em 19 de agosto de 1839, o daguerreótipo foi apresentado à Academia de Ciências e Belas Artes. Este passou a ser considerado o Dia Oficial do Nascimento da Fotografia 9 . Contudo, mesmo após tal 8 No manual de Daguerre, Historique et Description des Procédés du Daguerréotype et du Diorama, publicado imediatamente após a reunião no Instituto de Franquia, havia uma descrição sobre o processo do daguerreótipo, cujo resumo é comentado por Helmut Gernsheim (1966, p. 16): “Uma lâmina de cobre foi sensibilizada com vapor de iodo, que formou iodeto de prata sobre a lâmina. Depois de exposta dentro da câmara, a imagem latente foi revelada com vapor de mercúrio aquecido em um fogareiro de álcool. O mercúrio se aderiu às partes de iodeto de prata que haviam sido afetadas pela luz. A imagem foi fixada com hipofulfito sódico e lavanda com água destilada. O resultado foi um positivo finamente detalhado com uma superfície delicada que tinha que ser protegida com um cristal contra a abrasão e fechada hermeticamente para prevenir que se desvanecesse com o contato com o ar.” 9 Na verdade, o daguerreótipo surge como um aperfeiçoamento da Heliografia, que havia sido inventada por Nicéphore Niépce alguns anos antes. Há especulações de que já em 1793, quase meio século antes do Dia Oficial do Nascimento da Fotografia, Nicephore Niépce e seu irmão Claude Niépce já tentavam fixar quimicamente a imagem que se projetava no interior da câmara obscura. Segundo pesquisas de Gernsheim (1966), há uma carta de Nicéphore a Claude que faz referência a essas tentativas. Mas essas experiências só produziriam resultados favoráveis muitos anos mais tarde, quando Nicéphore Niépce, incentivado pela técnica da litografia, voltaria a pesquisar sobre os métodos possíveis de fixação da imagem. Após experimentar diferentes materiais – para o suporte da imagem, primeiro pedras litográficas, depois papel, depois placas de cristal, e finalmente pranchas de metal; para sensibilização desses diferentes materiais que serviriam como suporte da imagem, nas pedras, um verniz sensível à luz não especificado, no papel, cloreto 48

evento, muitos ainda viriam a continuar a se empenhar no aperfeiçoamento do processo fotográfico. Após três séculos servindo de instrumento para os pintores produzirem suas imagens, a partir da descoberta química, a câmara obscura passa a servir também a uma nova classe de produtores de imagens: aqueles que viriam a ser conhecidos como fotógrafos. A partir do momento em que são desenvolvidas novas técnicas de fixação dessas imagens, seu uso se modifica. Ela passa a participar também do processo de produção desse novo tipo de imagem: a imagem fotográfica. A produção dessa nova imagem passa a necessitar, então, do processamento de pelo menos dois fenômenos distintos: o fenômeno ótico, elaborado pela câmara obscura, e o fenômeno químico, a ocorrer com a atuação da luz no material sensível a ela. No contexto atual, esse material que foi exposto à luz passará ainda por novos e diferentes tratamentos químicos, por meio dos quais a imagem latente, que foi produzida no material foto- sensível, mas ainda não se manifestou plenamente, será revelada e depois fixada em uma imagem negativa, invertida. Esta imagem em negativo servirá como matriz para a produção de quantas imagens em positivo forem desejadas, respeitando-se, evidentemente, o tempo de vida do material de base. Como a imagem continua a se configurar em perspectiva, ela mantém o efeito de realismo na cena. O olhar ideal de um suposto sujeito ideal continua a fundamentar a composição da imagem fotográfica. Entretanto, os processos químicos que viabilizam o surgimento dessa nova imagem tornam-lhe possível apresentar uma nova qualidade: a de prata, no cristal e no metal, betume da judéia, dentre outros; e para a fixação da imagem produzida, no caso do papel sensibilizado pelo cloreto de prata, a fixação parcial da imagem se fazia com ácido nítrico; neste último caso, ele obteve uma imagem em negativo – , Niépce produziria, em 1826, o que hoje a maioria dos pesquisadores considera como a primeira imagem fotográfica. Nela, ficaria registrado em tons de cinza uma imagem que correspondia àquela que Niépce percebia quando fitava “o mundo lá fora” da janela de seu quarto de trabalho. Esta imagem é um positivo produzido com o uso de uma placa de metal que foi sensibilizada por betume da judéia e exposta durante cerca de oito horas, dentro daquela que é considerada por muitos pesquisadores como a primeira câmara profissional. Após a exposição, a placa foi banhada com azeite de espieglo e terebentina. Nas partes do metal afetadas pela luz, o betume continuou sendo solúvel ao azeite de espieglo e terebentina, e foi eliminado, enquanto que as partes que não foram expostas à luz se endureceram quando entraram em contato com este solvente. O resultado é uma imagem em preto e branco de alto contraste. Depois do êxito desta imagem, ele continuou suas experiências com novos materiais. Em 1829, Niépce firma um convênio de sociedade com Daguerre. Após sua morte, Daguerre dá prosseguimento às pesquisas iniciadas por Niépce. Ele desenvolve um novo procedimento no qual se produzia primeiro uma imagem latente e só depois esta se revelaria em imagem, com o uso de vapor de mercúrio, procedimento tal que permitia reduzir o tempo de exposição de oito horas para vinte ou trinta minutos. Mais tarde, ele fixaria essa imagem utilizando uma solução de sal comum. Finalmente, acreditando ter criado uma técnica diferente daquela desenvolvida por Niépce, Daguerre decide chamar esta invenção de daguerreótipo. 49

evento, muitos ainda viriam a continuar a se empenhar no aperfeiçoamento do processo<br />

fotográfico.<br />

Após três séculos servindo <strong>de</strong> instrumento para os pintores produzirem suas<br />

imagens, a partir da <strong>de</strong>scoberta química, a câmara obscura passa a servir também a uma<br />

nova classe <strong>de</strong> produtores <strong>de</strong> imagens: aqueles que viriam a ser conhecidos como<br />

fotógrafos. A partir do momento em que são <strong>de</strong>senvolvidas novas técnicas <strong>de</strong> fixação<br />

<strong>de</strong>ssas imagens, seu uso se modifica. Ela passa a participar também do processo <strong>de</strong><br />

produção <strong>de</strong>sse novo tipo <strong>de</strong> imagem: a imagem fotográfica.<br />

A produção <strong>de</strong>ssa nova imagem passa a necessitar, então, do processamento <strong>de</strong> pelo<br />

menos dois fenômenos distintos: o fenômeno ótico, elaborado pela câmara obscura, e o<br />

fenômeno químico, a ocorrer com a atuação da luz no material sensível a ela. No contexto<br />

atual, esse material que foi exposto à luz passará ainda por novos e diferentes tratamentos<br />

químicos, por meio dos quais a imagem latente, que foi produzida no material foto-<br />

sensível, mas ainda não se manifestou plenamente, será revelada e <strong>de</strong>pois fixada em uma<br />

imagem negativa, invertida. Esta imagem em negativo servirá como matriz para a<br />

produção <strong>de</strong> quantas imagens em positivo forem <strong>de</strong>sejadas, respeitando-se, evi<strong>de</strong>ntemente,<br />

o tempo <strong>de</strong> vida do material <strong>de</strong> base.<br />

Como a imagem continua a se configurar em perspectiva, ela mantém o efeito <strong>de</strong><br />

realismo na cena. O olhar i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> um suposto sujeito i<strong>de</strong>al continua a fundamentar a<br />

composição da imagem fotográfica. Entretanto, os processos químicos que viabilizam o<br />

surgimento <strong>de</strong>ssa nova imagem tornam-lhe possível apresentar uma nova qualida<strong>de</strong>: a<br />

<strong>de</strong> prata, no cristal e no metal, betume da judéia, <strong>de</strong>ntre outros; e para a fixação da imagem produzida, no<br />

caso do papel sensibilizado pelo cloreto <strong>de</strong> prata, a fixação parcial da imagem se fazia com ácido nítrico;<br />

neste último caso, ele obteve uma imagem em negativo – , Niépce produziria, em 1826, o que hoje a maioria<br />

dos pesquisadores consi<strong>de</strong>ra como a primeira imagem fotográfica. Nela, ficaria registrado em tons <strong>de</strong> cinza<br />

uma imagem que correspondia àquela que Niépce percebia quando fitava “o mundo lá fora” da janela <strong>de</strong> seu<br />

quarto <strong>de</strong> trabalho. Esta imagem é um positivo produzido com o uso <strong>de</strong> uma placa <strong>de</strong> metal que foi<br />

sensibilizada por betume da judéia e exposta durante cerca <strong>de</strong> oito horas, <strong>de</strong>ntro daquela que é consi<strong>de</strong>rada<br />

por muitos pesquisadores como a primeira câmara profissional. Após a exposição, a placa foi banhada com<br />

azeite <strong>de</strong> espieglo e terebentina. Nas partes do metal afetadas pela luz, o betume continuou sendo solúvel ao<br />

azeite <strong>de</strong> espieglo e terebentina, e foi eliminado, enquanto que as partes que não foram expostas à luz se<br />

endureceram quando entraram em contato com este solvente. O resultado é uma imagem em preto e branco<br />

<strong>de</strong> alto contraste. Depois do êxito <strong>de</strong>sta imagem, ele continuou suas experiências com novos materiais. Em<br />

1829, Niépce firma um convênio <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong> com Daguerre. Após sua morte, Daguerre dá prosseguimento<br />

às pesquisas iniciadas por Niépce. Ele <strong>de</strong>senvolve um novo procedimento no qual se produzia primeiro uma<br />

imagem latente e só <strong>de</strong>pois esta se revelaria em imagem, com o uso <strong>de</strong> vapor <strong>de</strong> mercúrio, procedimento tal<br />

que permitia reduzir o tempo <strong>de</strong> exposição <strong>de</strong> oito horas para vinte ou trinta minutos. Mais tar<strong>de</strong>, ele fixaria<br />

essa imagem utilizando uma solução <strong>de</strong> sal comum. Finalmente, acreditando ter criado uma técnica diferente<br />

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