Cristina Toshie Lucena Nishio - Biblioteca Digital de Teses e ...
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Distinção entre memória e hábito<br />
Segundo Bergson, o passado sobrevive sob duas maneiras distintas: em<br />
mecanismos motores e em lembranças in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes. Nesse sentido, há dos tipos <strong>de</strong><br />
memória: uma memória que se converte em ações aprendidas e repetidas pelo corpo,<br />
hábitos do corpo adaptado para movimentos automáticos, e uma memória virtual do<br />
presente, não conhecida pela consciência e que só eventualmente se converte em<br />
lembrança.<br />
Bergson nos diz que a memória com a qual os psicólogos geralmente trabalham diz<br />
respeito a essa memória articulada pelo hábito, voltada, portanto, para a ação. Nas palavras<br />
do filósofo, “ela é agida, mais que representada”, ou seja, agida mais que pensada. É uma<br />
memória utilitária. Ela exige a aprendizagem do corpo, pela repetição <strong>de</strong> um mesmo<br />
movimento tantas vezes quantas forem necessárias para que ele se realize<br />
automaticamente. Uma memória que se converte em mecanismos motores. Bergson a<br />
<strong>de</strong>screve:<br />
“Como hábito, ela é adquirida pela repetição <strong>de</strong> um mesmo esforço. Como<br />
hábito, ela exigiu inicialmente a <strong>de</strong>composição, e <strong>de</strong>pois a recomposição da<br />
ação total. Como todo exercício habitual do corpo, enfim, ela armazenou-se<br />
num mecanismo que estimula por inteiro um impulso inicial, num sistema<br />
fechado <strong>de</strong> movimentos que se suce<strong>de</strong>m na mesma or<strong>de</strong>m e ocupam o<br />
mesmo tempo.” (Bergson, 1990, p. 61)<br />
Na verda<strong>de</strong>, a reação <strong>de</strong> um ser vivo a um estimulo qualquer po<strong>de</strong> ser imprevisível.<br />
Algo inusitado po<strong>de</strong> acontecer. E esse grau <strong>de</strong> in<strong>de</strong>terminação só é possível graças à<br />
interferência da memória no processo <strong>de</strong> percepção consciente e <strong>de</strong> produção <strong>de</strong><br />
representações. Para evitar essa imprevisibilida<strong>de</strong> entre estímulo e resposta, o ser se<br />
esforça por diminuir a interferência da memória através <strong>de</strong> mecanismos que se traduzem<br />
em um processo <strong>de</strong> aprendizagem baseado na repetição. O sucesso <strong>de</strong>sse processo <strong>de</strong><br />
aprendizagem <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> evitar a emergência <strong>de</strong> novos estados<br />
afetivos; tanto aqueles que são gerados no instante mesmo em que o movimento atinge o<br />
corpo, no instante presente do estímulo, quanto aqueles mais antigos, que po<strong>de</strong>riam vir à<br />
tona e se apresentarem à consciência por imbricações inusitadas com as representações.<br />
Como conseqüência, a <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> afetiva e o grau <strong>de</strong> in<strong>de</strong>terminação que a memória<br />
promove aos movimentos que nos atingem passam a ser minimizados em prol <strong>de</strong> uma<br />
reação que ten<strong>de</strong> a ser cada vez mais automática e impessoal, dando origem, assim, aos<br />
hábitos. A reação ten<strong>de</strong> a se tornar, nesse caso, cada vez mais previsível, na medida em que<br />
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