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Focus 17.1 - Royal Canin

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VETERINARY<br />

A revista internacional para o Médic o Veterinário de animais de c ompanhia<br />

V<br />

Doença do trato<br />

urinário inferior<br />

#<strong>17.1</strong><br />

Epidemiologia da urolitíase felina • Como abordar... Gatos com sintomas do trato urinário inferior • Nutrição e distúrbios urinários em gatos esterilizados •<br />

Análise quantitativa dos cálculos urinários em cães e gatos • Como tratar... O gato com DTUI – perspectiva do cirurgião • Endo-urologia e radiologia de<br />

intervenção do trato urinário • Métodos para medir o potencial de cristalização da urina - RSS vs. APR • Sal, hipertensão e doença renal crônica


O grande objetivo<br />

dos pesquisadores que<br />

trabalham para a <strong>Royal</strong><br />

<strong>Canin</strong> é compartilhar nosso<br />

conhecimento com os<br />

nossos colegas da<br />

comunidade veterinária,<br />

através de variados<br />

artigos e livros.


EDITORIAL<br />

Caro Colega,<br />

Veterinary <strong>Focus</strong>, Vol. 17, nº1 – 2007<br />

Consultores Editoriais<br />

• Drª Denise A. Elliott, BVSc(Hons), PhD, Dipl.<br />

ACVIM, Dipl. ACVN Comunicações Científicas,<br />

<strong>Royal</strong> <strong>Canin</strong>, EUA<br />

• Drª Pascale Pibot, DVM, Directora de<br />

Publicações Científicas, <strong>Royal</strong> <strong>Canin</strong>, França<br />

• Drª Pauline Devlin, BSc, PhD, Directora-<br />

Assistente Veterinária, <strong>Royal</strong> <strong>Canin</strong>, RU<br />

• Drª Karyl Hurley, BSc, DVM, Dipl. ACVIM, Dipl.<br />

ECVIM-CA Assuntos Académicos Globais,<br />

WALTHAM<br />

Obrigado pela sua fidelidade e apoio à WALTHAM <strong>Focus</strong> ao longo dos últimos anos. No<br />

momento em que a presente edição marca o início do 17º ano de publicação, a equipe<br />

editorial e o editor desejam expressar a sua gratidão. O nosso objetivo consiste em<br />

proporcionar ao leitor uma revista de veterinária de alta qualidade, com pareceres estado de<br />

arte no campo da medicina veterinária canina e felina. Para tornar a leitura mais agradável,<br />

temos o prazer de apresentar o novo aspecto gráfico, com uma nova concepção e melhor<br />

utilização das ilustrações.<br />

Para esta edição, selecionamos o tema sobre os distúrbios urinários. Ao longo dos últimos<br />

anos, tem-se verificado um aumento do número de novos casos de urolitíases por estruvita<br />

em felinos, apesar da redução significativa da prevalência desta afecção registada nos anos<br />

90. É muito importante que os clínicos disponham de boa informação sobre este distúrbio, de<br />

forma a realizar um tratamento eficaz e, simultaneamente, diminuir a sua prevalência.<br />

Por último, a denominação WALTHAM <strong>Focus</strong> foi alterada para Veterinary <strong>Focus</strong>. Tendo em<br />

conta o volume de circulação de 100.000 cópias, em cerca de 50 países, consideramos da<br />

máxima importância a inclusão da palavra “Veterinária” no título!<br />

Com os nossos votos de um excelente trabalho!<br />

Editor<br />

• Dr. Richard Harvey, PhD, BVSc, DVD, FIBiol, MRCVS<br />

Secretário Editorial<br />

• Laurent Cathalan<br />

lcathalan@buena-media.fr<br />

Ilustração<br />

• Arnaud Pouzet<br />

Tradução<br />

• Paula Cortes<br />

A equipe editorial<br />

Denise Elliott, Pascale Pibot, Pauline Devlin, Karyl Hurley e Richard Harvey<br />

AGRADECIMENTOS: A ROYAL CANIN DO BRASIL AGRADECE A PROFA. DRA. MITIKA HAGIWARA PELA PRECIOSA<br />

CONTRIBUIÇÃO NA REVISÃO DESTA EDIÇÃO DA REVISTA VETERINARY FOCUS.<br />

Revisão editorial para outras línguas :<br />

• Drª Imke Engelke, DVM (Alemão)<br />

• Drª María Elena Fernández, DVM (Espanhol)<br />

• Drª Eva Ramalho, DVM (Português)<br />

• Drª Paola Oppia, DVM (Italiano)<br />

• Drª Margriet Bos, DVM (Holandês)<br />

• Prof. Dr. R. Moraillon, DVM (Francês)<br />

• Drª Luciana D. de Oliveira, DVM (Português)<br />

• Drª Ana Gabriela Valério (Português)<br />

• Drª Wandrea S. Mendes (Português)<br />

Publicado por: Buena Media Plus<br />

PCA: Bernardo Gallitelli<br />

Morada: 85, avenue Pierre Grenier<br />

92100 Boulogne – França<br />

Telefone: +33 (0) 1 72 44 62 00<br />

Impresso na União Europeia<br />

ISSN 0965-4577<br />

Circulação: 100,000 cópias<br />

Depósito legal: Fevereiro 2007<br />

Publicado por Aniwa S. A. S.<br />

Impresso no Brasil por:<br />

Intergraf Indústria Gráfica Ltda.<br />

As autorizações de comercialização dos agentes terapêuticos para uso em animais de companhia variam muito a nível mundial. Na ausência de uma licença específica, deve ser considerada<br />

a publicação de um aviso de prevenção adequado, antes da administração de tais fármacos.


SUMÁRIO<br />

Editorial p. 01<br />

Conhecimento e respeito... As principais raças felinas atuais p. 03<br />

Catherine Bastide-Coste<br />

Epidemiologia da urolitíase felina p. 04<br />

Doreen M. Houston<br />

Como abordar... Gatos com sintomas do trato urinário inferior p. 10<br />

Jodi L. Westropp<br />

Nutrição e distúrbios urinários em gatos esterilizados p. 18<br />

Jean-Jacques Bénet e Morgane Lamarche<br />

Análise quantitativa dos cálculos urinários em cães e gatos p. 22<br />

Andrew Moore<br />

Como tratar... O gato com DTUI – perspectiva do cirurgião p. 28<br />

Giselle Hosgood<br />

Endo-urologia e radiologia de intervenção do trato urinário p. 31<br />

Allyson C. Berent<br />

Métodos para medir o potencial de cristalização da urina p. 37<br />

- RSS vs. APR<br />

William G. Robertson e Abigail E. Stevenson<br />

Ponto de vista ROYAL CANIN... Diluição urinária: fator-chave p. 41<br />

na prevenção de urólitos de estruvita e de oxalato de cálcio<br />

Vincent Biourge<br />

Sal, hipertensão e doença renal crônica p. 45<br />

Scott A. Brown<br />

Guia destacável... Atlas de sedimento urinário p. 47<br />

ALEMANHA ARGENTINA AUSTRÁLIA ÁUSTRIA BAHREIN BÉLGICA BRASIL CANADÁ CHINA CHIPRE COREIA CROÁCIA DINAMARCA EMIRADOS ÁRABES UNIDOS ESLOVÉNIA ESPANHA ESTADOS UNIDOS DA<br />

AMÉRICA ESTÓNIA FILIPINAS FINLÂNDIA FRANÇA GRÉCIA HOLANDA HONG-KONG HUNGRIA IRLANDA ISLÂNDIA ISRAEL ITÁLIA JAPÃO LETÓNIA LITUÂNIA MALTA MÉXICO NORUEGA NOVA ZELÂNDIA<br />

POLÓNIA PORTO RICO PORTUGAL REINO UNIDO REPÚBLICA CHECA REPÚBLICA DA ÁFRICA DO SUL REPÚBLICA ESLOVACA ROMÉNIA RÚSSIA SINGAPURA SUÉCIA SUIÇA TAILÂNDIA TAIWAN TURQUIA<br />

2 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / Vol 17 No 1<br />

VETERINARY<br />

A Veterinary <strong>Focus</strong> é publicada em inglês, francês, alemão, chinês, holandês,<br />

italiano, polonês, português, espanhol, japonês, grego e russo<br />

Ilustração da capa: cálculo de oxalato de cálcio detectado na bexiga de uma cadela Schnauzer Miniatura esterilizada, com 8,5 anos e 9kg<br />

de peso. O cálculo media 18mm de diâmetro.<br />

CONHECIMENTO E RESPEITO<br />

#<strong>17.1</strong><br />

2 0 0 7 - 1 0 $ / 1 0 €<br />

A revista internacional para o Médic o Veterinário de animais de c ompanhia<br />

Visite a biblioteca científica para uma selecção de artigos<br />

da Veterinary <strong>Focus</strong><br />

© Lanceau<br />

© Lanceau<br />

© Lanceau<br />

Maine Coon<br />

British Shorthair<br />

Bengal


As raças clássicas, uma<br />

situação mista<br />

Na maioria das regiões do mundo<br />

(particularmente, na Europa), as<br />

raças British Shorthair e Siamês<br />

encontram-se quase sempre na lista<br />

das dez mais populares (Tabela 1),<br />

seguida de perto pela raça Persa. Em<br />

contrapartida, nos EUA a situação é<br />

muito diferente, com a ausência total<br />

do British Shorthair. Compilar dados<br />

“globais” significativos da Europa<br />

Continental torna-se uma tarefa<br />

difícil, uma vez que cada país possui<br />

o seu próprio registro de felinos<br />

domésticos. No entanto, foi possível<br />

reunir e comparar alguns elementos,<br />

que se apresentam na Tabela 1. Os<br />

dados relativos a França já são<br />

reconhecidos pelo Ministério da<br />

Agricultura (o primeiro caso na<br />

Europa). No Japão, a raça Persa é<br />

a mais popular, imediatamente<br />

seguida pelo American Shorthair. Na<br />

Austrália, Nova Zelândia e África do<br />

Sul, os dados são muito semelhantes<br />

aos obtidos no Reino Unido.<br />

Os Persa estão em declínio<br />

A longa supremacia dos Persa tem<br />

sido ultimamente desafiada em<br />

diversos países. Sobretudo os gatos<br />

de raça grande, como o Maine Coon<br />

e o Gato das Florestas Norueguesas,<br />

estão tornando-se cada vez mais<br />

populares. O Ragdoll e o Siberiano<br />

registram também um aumento de<br />

popularidade. Uma característica que<br />

os torna particularmente atraentes é<br />

o fato de requererem menos cuidados<br />

Tabela 1.<br />

Detalhes comparativos dos registros de raças felinas (dados de 2005, majoritariamente)<br />

CONHECIMENTO E RESPEITO<br />

As principais raças<br />

felinas atuais<br />

Existem cerca de sessenta raças reconhecidas mundialmente.<br />

A sua popularidade diverge consideravelmente de acordo com<br />

cada país.<br />

Por Catherine Bastide-Coste, Comunicações, LOOF (Registo oficial francês de raças de gatos)<br />

de higiene e de beleza que os Persa.<br />

Raças Exóticas<br />

Os criadores estão constantemente<br />

em busca de novas raças que suscitem<br />

admiração. Nos EUA, a TICA (The<br />

International Cat Association) é<br />

muito ativa neste campo e,<br />

como se pode constatar através da<br />

Tabela 1, ultimamente o número de<br />

registros da raça Bengal (resultante<br />

do cruzamento entre gatos selvagens<br />

e gatos malhados) é muito superior<br />

ao de qualquer outra raça. Em<br />

contrapartida, na Rússia, as raças<br />

Sphinx, Scottish Fold e American Curl<br />

são as mais populares. Na Austrália, a<br />

raça Australian Mist apresenta um<br />

índice crescente de popularidade.<br />

Estados Unidos Reino Unido Europa Continental França<br />

CFA TICA GCCF (30.000 registos) FiFe LOOF (17.000 registos)<br />

Persa<br />

Bengal<br />

British Shorthair Gato das Florestas Norueguesas<br />

Persa<br />

Maine Coon Ragdoll<br />

Siamês<br />

Persa<br />

Burmês<br />

Exotic Shorthair Maine Coon<br />

Persa<br />

Maine Coon<br />

Chartreux<br />

Siamês<br />

Sphinx<br />

Burmês<br />

Sagrado da Birmânia<br />

Maine Coon<br />

Abissínio<br />

Persa<br />

Sagrado da Birmânia<br />

British Shorthair Gato das Florestas Norueguesas<br />

Fontes:<br />

TICA- The International Cat Association (www.tica.org), CFA- the Cat Fanciers Organization (www.cfa.org), FIFe- Fédération Internationale Féline<br />

(www.fifeweb.org), GCCF- Governing Council of the Cat Fancy (www.gccfcats.org).<br />

Vol 17 No 1 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / 3


Epidemiologia<br />

da urolitíase felina<br />

Doreen M. Houston DVM, DVSc,<br />

Dipl. ACVIM<br />

Medi-Cal - <strong>Royal</strong> <strong>Canin</strong> Veterinary Diets<br />

Guelph, Ontário, Canadá<br />

A Drª Houston é formada pela Faculdade de Medicina<br />

Veterinária de Ontário (FVO), em 1980. Durante 4 anos<br />

trabalhou numa clínica veterinária em Thunder Bay, Ontário,<br />

regressando à FVO para prosseguir a sua formação (Internato,<br />

Residência e DVSc em Medicina Interna). Obteve o Diploma do<br />

Colégio Americano de Medicina Interna Veterinária (ACVIM) em<br />

1991. A Drª Doreen M. Houston ingressou no corpo docente da<br />

Faculdade Ocidental de Medicina Veterinária da Universidade<br />

de Saskatchewan em 1990, alcançando o título de professora<br />

catedrática em 1995. Durante o exercício da sua docência a<br />

Drª. Houston recebeu inúmeros prêmios de ensino. Em Julho<br />

de 1996, abandonou o meio acadêmico para integrar a equipe<br />

de Veterinary Medi-Cal Diets <strong>Royal</strong> <strong>Canin</strong> em Guelph, Ontário.<br />

Atualmente desempenha as funções de Diretora de Pesquisa<br />

e Ensaios Clínicos da Medi-Cal <strong>Royal</strong> <strong>Canin</strong> Veterinary Diets,<br />

Canadá. A Drª Houston é autora de diversos artigos<br />

publicados, de capítulos de livros e de um manual.<br />

Introdução<br />

Incidência, prevalência e taxa de morbidade proporcional<br />

(PMR) são termos usados para descrever a<br />

frequência de uma doença (1). Define-se por taxa de<br />

incidência da urolítiase o número de novos casos desta<br />

4 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / Vol 17 No 1<br />

doença observados numa população, durante um<br />

período de tempo definido (habitualmente anual). A<br />

incidência de uma doença constitui-se em um dado útil<br />

para os epidemiologistas, pois serve para medir o risco<br />

da patologia. Define-se por prevalência da urolitíase o<br />

número total de animais de companhia de uma<br />

população que apresentem urólitos, num momento<br />

específico. A prevalência difere da incidência, na<br />

medida em que não transmite informação acerca do<br />

risco. A proporção de urolitíases na totalidade dos casos<br />

observados em uma clínica ou hospital, em um<br />

determinado período de tempo, constitui a taxa de<br />

morbidade proporcional (PMR).<br />

Infelizmente, estes termos são muitas vezes utilizados<br />

de forma inadequada ou com alternância do sentido, o<br />

que pode dar origem a confusões quando se pretende<br />

comparar dados de estudos diferentes. Além disso, nem<br />

todos os países editam trabalhos sobre a urolitíase, e os<br />

dados publicados relativos a felinos são menos<br />

consistentes entre países do que para a espécie canina,<br />

com representação de um número inferior de países.<br />

Por consequência, é bastante difícil conhecer a<br />

verdadeira incidência, prevalência e PMR da urolitíase<br />

nos gatos, no mundo.<br />

A doença do trato urinário inferior felino (DTUIF ou<br />

FLUTD - feline lower urinary tract disease) consiste em<br />

um grupo heterogêneo de distúrbios caracterizados<br />

por sinais clínicos semelhantes, que incluem<br />

hematúria (macroscópica e microscópica), disúria,<br />

estrangúria, polaquiúria, micções inapropriadas<br />

(periúria, ou sinais de micção irritativa fora da caixa de<br />

areia), assim como, obstrução parcial ou total da uretra<br />

(2). Historicamente, a taxa de incidência da FLUTD tem<br />

registado valores


Tabela 2.<br />

Predisposição decorrente da idade, sexo e raça e outros fatores de risco em potencial de causar urólitos em gatos<br />

Tipo de urólito Raça Idade Gênero Outros<br />

Estruvita<br />

EUA<br />

Estéril: 3 meses – 22 anos; Fêmeas ligeiramente > • Excesso de peso /<br />

Foreign Shorthair; Ragdoll; Chartreux; Oriental média 7,2 +/- 3,5 anos (1) machos (10, 19)<br />

inativo<br />

Shorthair; DPC*; Himalaia (6); Himalaia e Persa (8); Induzido por infecção; Machos <br />

fêmeas (10, 19)<br />

Machos ligeiramente ><br />

fêmeas (10)<br />

Nenhuma<br />

Machos (10)<br />

Fêmeas > machos (1)<br />

Machos > fêmeas (10)<br />

Nenhuma (10)<br />

Machos > fêmeas<br />

(8, 10)<br />

• Excesso de peso / inativo<br />

• Consumo reduzido<br />

de água<br />

• Ingestão de dietas<br />

acidificantes<br />

de urina (17)<br />

• Vida em ambientes<br />

internos (17)<br />

• Hipercalcemia sérica (18)<br />

• Consumo reduzido<br />

de água<br />

• Shunts porto-vasculares<br />

• Infecções do trato urinário<br />

• Consumo reduzido de água<br />

• Vida em ambientes internos<br />

• Defeito metabólico<br />

congênito (23)<br />

• Defeito congênito do metabolismo<br />

da purina (24)<br />

• Consumo reduzido de<br />

água<br />

• Consumo reduzido de<br />

água<br />

• Hiperparatiroidismo<br />

primário (19)<br />

Em gatos Rex, Burmês, Abissínio, Azul da Rússia,<br />

Sagrado da Birmânia e Siamês, o risco de formação de<br />

cálculos de estruvita parece ser mais baixo (6,8,13).<br />

Ao contrário do que sucede na espécie canina, no gato a<br />

maioria dos urólitos de estruvita é estéril (1,6,13). A<br />

infecção por organismos responsáveis pela quebra da<br />

urease é rara em felinos e observável, sobretudo, em<br />

gatos com menos de um ano de vida, em gatos<br />

idosos ou com fatores de comprometimento do<br />

hospedeiro (ureterostomias perineais, etc.). Os urólitos<br />

de estruvita formam-se devido à supersaturação da<br />

urina em magnésio, amônio e fósforo, e com um pH<br />

urinário >6,5, situação que pode resultar da depleção<br />

do volume intravascular e da retenção de água. Um


estudo de casos clínicos destacou o aumento do risco<br />

pela administração de dietas com teores elevados de<br />

magnésio, fósforo, cálcio, cloreto e fibra, níveis<br />

moderados de proteína e baixo teor de gordura (14). As<br />

dietas contendo 0,15 a 1,0% de magnésio, na matéria<br />

seca, estão associadas à formação de urólitos de<br />

estruvita. Contudo, a ação do magnésio depende da<br />

forma deste mineral e do pH da urina (15). Buffington,<br />

et al. relataram que os gatos com administração de 0,5%<br />

de cloreto de magnésio não evidenciaram formação de<br />

urólitos de estruvita, enquanto que os felinos com 0,5%<br />

de óxido de magnésio apresentaram este tipo de<br />

cálculo. A diferença em termos de formação de estruvita<br />

foi devido ao fato do óxido de magnésio promover a<br />

produção de urina alcalina, enquanto o cloreto de<br />

magnésio favorece a formação de urina ácida que tem<br />

carácter protetor (15).<br />

Oxalato de cálcio<br />

As raças Himalaia e Persa parecem mais predispostas ao<br />

risco de urolitíase por oxalato de cálcio (6,8,10,11,13)<br />

(Figuras 3 e 4). Até o momento não existe explicação<br />

para o aparente aumento do risco de formação de urólitos<br />

de oxalato de cálcio, embora seja associado ao uso<br />

frequente de dietas acidificantes com restrição do teor de<br />

magnésio, de modo a controlar a formação de urólitos de<br />

estruvita (6,13,14,16,17,18). A acidúria persistente pode<br />

estar associada a uma acidose metabólica de baixa<br />

intensidade, que promove a mobilização óssea de<br />

carbonato e de fósforo para os íons tampão de<br />

hidrogênio. A mobilização simultânea de cálcio,<br />

associada à inibição da reabsorção deste mineral nos<br />

túbulos renais provoca o aumento da excreção urinária<br />

de cálcio (hipercalciúria). Lekcharoensuk, et al.<br />

relataram probabilidade três vezes superior de formação<br />

de urólitos de oxalato de cálcio em gatos alimentados<br />

com dietas formuladas para induzir pH urinário situado<br />

entre 5,99 e 6,15 (13,14). Em 5 gatos com hipercalcemia e<br />

urólitos de oxalato de cálcio, a descontinuação de dietas<br />

acidificantes ou a administração de acidificantes<br />

urinários foi associada à normalização das concentrações<br />

de cálcio sérico (18). No entanto, muitos gatos são<br />

alimentados com dietas acidificantes e apenas alguns<br />

desenvolvem hipercalcemia, acidose metabólica e<br />

urolitíase de oxalato de cálcio. Consequentemente, é<br />

importante levar em consideração fatores como a<br />

hiperabsorção gastrintestinal ou o aumento da excreção<br />

renal de cálcio em pacientes com maior susceptibilidade.<br />

O aumento da absorção intestinal de cálcio pode resultar<br />

do excesso de cálcio dietético, excesso de vitamina D ou<br />

hipofosfatemia. Por outro lado, o aumento da excreção<br />

renal de cálcio pode ocorrer devido ao decréscimo da<br />

EPIDEMIOLOGIA DA UROLITÍASE FELINA<br />

Figura 2.<br />

Variabilidade do<br />

aspecto dos urólitos<br />

de estruvita em<br />

felinos.<br />

Imagem: cortesia de<br />

Andrew Moore, CVUC,<br />

Guelph, Ontário,<br />

Canadá.<br />

Figura 3a.<br />

Radiografia laterolateral<br />

que evidencia<br />

inúmeros cálculos, de<br />

pequenas dimensões,<br />

radiopacos, na uretra<br />

de um gato macho<br />

com FLUTD.<br />

Radiografia: cortesia<br />

do Dr. Brian Crabbe,<br />

Port E lgin, Ontário,<br />

Canadá.<br />

Figura 3b.<br />

A análise revelou<br />

urólitos compostos<br />

por 100% de oxalato<br />

de cálcio.<br />

Imagem: cortesia de<br />

Andrew Moore, CVUC,<br />

Guelph, Ontário,<br />

Canadá.<br />

Figura 4.<br />

Urólitos de oxalato felinos com aspecto variável. Frequentemente, o<br />

diidrato de oxalato de cálcio revela uma aparência laminada, tal como<br />

é observável no canto inferior direito da figura. De forma geral, o<br />

monoidrato de oxalato de cálcio é arredondado, como o exemplo que<br />

se apresenta no canto inferior esquerdo da imagem.<br />

Imagem: cortesia de Andrew Moore, CVUC, Guelph, Ontário, Canadá.<br />

reabsorção tubular renal (furosemida e corticosteróides),<br />

ou ao aumento da mobilização de cálcio das reservas do<br />

organismo (acidose, hiperparatiroidismo, hipertiroidismo,<br />

excesso de vitamina D) (1,19).<br />

Um estudo de casos clínicos demonstrou que os gatos<br />

alimentados com dietas com teores reduzidos de<br />

umidade e de proteína apresentam maior risco de<br />

urolitíase por oxalato de cálcio (14). Foi igualmente<br />

Vol 17 No 1 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / 7


elatado aumento do consumo de água, do volume<br />

urinário e da excreção de fósforo na urina em felinos<br />

com administração de dietas ricas em proteínas, embora<br />

a excreção de cálcio não tenha aumentado. A depleção<br />

do volume intravascular e a concentração do volume<br />

urinário potencializam o risco de supersaturação da<br />

urina em cálcio e em oxalato. Os gatos alimentados com<br />

dietas úmidas apresentam cerca de 1/3 de<br />

probabilidade de desenvolver urólitos de oxalato de<br />

cálcio, comparados a gatos que recebem<br />

alimentos com pouca umidade(14). Os alimentos<br />

ricos em umidade estão associados com o aumento de<br />

produção de urina menos concentrada, quando<br />

comparadas a dietas com pouca umidade.<br />

A piridoxina (vitamina B 6 ) aumenta a transaminação<br />

de glioxilato, importante precursor do ácido oxálico,<br />

para glicina. Deste modo, a carência em piridoxina<br />

aumenta a produção endógena e subsequente excreção<br />

de oxalato. Não foi relatada, até o momento, qualquer<br />

forma de ocorrência natural desta síndrome. Além<br />

disso, a suplementação com vitamina B 6 não reduz a<br />

excreção urinária de ácido oxálico, comparativamente à<br />

administração de dietas contendo níveis adequados<br />

desta vitamina (20).<br />

Tanto a restrição quanto a suplementação de magnésio<br />

dietético estão associadas ao maior risco de urolitíase<br />

por oxalato de cálcio em gatos. Consequentemente, no<br />

intuito de minimizar os riscos deste distúrbio, as dietas<br />

não deverão conter nem um teor muito restritivo, nem<br />

suplementação de magnésio (14).<br />

Nos humanos é sugerido desde há muito tempo que a<br />

suplementação com cloreto de sódio permite aumentar<br />

a excreção urinária de cálcio. Contudo, um estudo<br />

epidemiológico recente conduzido por Lekcharoensuk,<br />

et al. não sustenta esta hipótese, ao descobrir que o<br />

aumento de sódio dietético reduz o risco de formação<br />

de urólitos de oxalato de cálcio no gato (14).<br />

O risco de formação de urólitos de oxalato de cálcio<br />

aumenta com a idade. Smith, et al. relataram uma<br />

produção urinária em gatos idosos (idade média: 10,63<br />

+/- 1,32 anos) com valores RSS para a estruvita,<br />

significativamente inferiores (0,721 +/- 0,585 vs. 4,984<br />

+/- 4,028) e níveis RRS para o oxalato de cálcio bem mais<br />

elevados (3,449 +/- 1,619 vs. 0,911 +/- 0,866), em<br />

comparação a um grupo de gatos mais jovens (4,06 +/-<br />

1,02 anos). Os gatos idosos apresentaram um pH urinário<br />

acentuadamente mais baixo que os felinos mais jovens<br />

(6,08 ± 0,22 vs. 6,38 +/- 0,22, respectivamente). Este<br />

decréscimo observado nos animais mais velhos explica, em<br />

8 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / Vol 17 No 1<br />

parte, a maximização do risco de formação de urólitos de<br />

oxalato de cálcio decorrente do envelhecimento (21).<br />

O modo de vida em ambientes fechados é também<br />

considerado um fator de risco para urolitíase por oxalato<br />

de cálcio (7,12,17).<br />

Urato de amônio<br />

O urato de amônio é o terceiro urólito habitualmente<br />

identificado em gatos. É composto por ácido úrico e pelo<br />

sal de amônio monobásico deste ácido (urato ácido de<br />

amônio) (1,8). Em comparação com a estruvita e o oxalato,<br />

caracteriza-se por uma baixa prevalência e não sofreu<br />

alterações significativas durante as últimas 2 décadas<br />

(Tabela 1). No Canadá, dos 321 cálculos analisados como<br />

urato de amônio, 10 eram provenientes de gatos Siamês<br />

(3,1%) e 9 de Maus Egípcios (2,8%) (10). Os urólitos de<br />

urato podem formar-se em gatos com shunts portosistêmicos<br />

ou qualquer forma grave de disfunção hepática,<br />

situações por vezes associadas a um decréscimo da<br />

conversão hepática da amônia para uréia que resulta em<br />

hiperamonemia. Nesta espécie os urólitos de urato são<br />

também observáveis em animais com infecções do trato<br />

urinário, condizentes ao aumento de amônia urinária, em<br />

gatos com acidose metabólica e urina com elevada acidez,<br />

assim como em felinos alimentados com dietas de teor<br />

elevado em purinas, como fígado e outras vísceras (22). No<br />

entanto, na maioria dos pacientes felinos a patogênese<br />

permanece desconhecida (8).<br />

Fosfato de cálcio<br />

Os urólitos de fosfato de cálcio são pouco comuns no gato.<br />

A hidroxiapatita e a apatita carbonatada são as formas<br />

habitualmente observadas; a bruxita (diidrato de cálcio,<br />

hidrogênio e fosfato) é menos frequente. Os urólitos puros<br />

de cálcio e fosfato podem estar associados a hiperparatiroidismo<br />

primário, a distúrbios predisponentes à<br />

hipercalciúria (hipercalcemia, excesso de vitamina D,<br />

acidose sistêmica, excesso de cálcio dietético), ou à hiperfosfatúria<br />

(excesso de fósforo dietético), à diminuição do<br />

volume urinário, urina muito alcalina e, pelo menos no<br />

caso de nefrólitos, à presença de coágulos sanguíneos (1).<br />

Estes ocorrem com frequência como um componente<br />

menor, juntamente com os cálculos de estruvita e de<br />

oxalato de cálcio.<br />

Cistina<br />

Os urólitos de cistina formam-se em gatos com cistinúria,<br />

malformação metabólica congênita caracterizada por<br />

uma deficiente reabsorção tubular proximal de cistina e<br />

de outros aminoácidos (ornitina, lisina, arginina) (23).<br />

Não foi relatada qualquer predisposição óbvia de sexo ou<br />

raça, embora o risco seja maior em gatos Siamês (6,19).<br />

Acomete sobretudo felinos de meia-idade e idosos (23).


Sílica<br />

Os urólitos de sílica são pouco frequentes. Ainda que<br />

com base em dados limitados, não parece existir<br />

predisposição de raça, sexo ou idade. No entanto, no<br />

Canadá o número de cálculos analisados provenientes<br />

de machos foi ligeiramente superior ao de fêmeas (10).<br />

Desconhece-se a causa deste tipo de urólitos em gatos.<br />

Xantina<br />

Os urólitos de xantina são raros e podem resultar de um<br />

defeito congênito no metabolismo das purinas ou da<br />

administração de alopurinol. Na maioria dos casos não<br />

existem fatores de risco identificáveis. Não foi relatada<br />

qualquer predisposição aparente de raça, sexo ou idade<br />

(24). Risco de reincidência elevado (no intervalo de 3 a<br />

12 meses) (24).<br />

Pirofosfato de magnésio e potássio<br />

Foram identificados urólitos de pirofosfato de magnésio e<br />

de potássio em 4 gatos Persa (25). No Canadá, no total<br />

foram analisados 15 deste tipo de urólitos no CVUC<br />

(Centro Veterinário de Urólitos do Canadá). A maioria<br />

ocorreu em gatos domésticos (66,7%) e 2/3 dos urólitos<br />

foram identificados em machos. Cinco ocorreram em gatos<br />

de raça (2 Himalaia, 2 Persa e 1 Maine Coon). Outros 9<br />

urólitos apresentaram núcleo de oxalato de cálcio (8)<br />

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EPIDEMIOLOGIA DA UROLITÍASE FELINA<br />

ou de estruvita (1) recoberto por cálculos de pirofosfato<br />

(10). Apesar da sua etiologia não estar totalmente<br />

elucidada, postula-se que esteja relacionada com uma<br />

disfunção enzimática temporária ou permanente que<br />

provoque a supersaturação urinária de pirofosfato<br />

conducente, por sua vez, à cristalização do urólito (25).<br />

Cálculos sanguíneos sólidos desidratados<br />

(DSBC)<br />

Foram relatados casos de DSBC em felinos da América<br />

do Norte (8) com etiologia desconhecida. Em geral,<br />

estes cálculos não contêm qualquer material cristalino e<br />

muitos são radiolucentes.<br />

Urólitos mistos<br />

Os urólitos mistos ou compostos consistem em um núcleo de<br />

um determinado tipo de mineral e pedra ou concha de outro<br />

tipo de mineral. Formam-se em virtude da sobreposição de<br />

fatores que promovem a precipitação de um tipo de urólito<br />

sobre fatores anteriores que favoreciam a precipitação de<br />

outro tipo de mineral. Alguns minerais funcionam<br />

também como núcleo de depósito de outro tipo de mineral;<br />

por exemplo, todos os tipos de urólito predispõem a<br />

infecções do trato urinário, passíveis de originar a<br />

precipitação secundária de estruvita.<br />

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Vol 17 No 1 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / 9


COMO ABORDAR...<br />

Gatos com<br />

sintomas do trato<br />

urinário inferior<br />

Jodi L. Westropp, DVM, PhD, Dipl. ACVIM<br />

Departamento de Medicina e Epidemiologia Veterinária,<br />

Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade da<br />

Califórnia, Davis, CA 95616 EUA<br />

A Drª Westropp realizou o seu curso universitário na<br />

Universidade Estadual de Ohio, onde permaneceu até<br />

concluir o curso de medicina veterinária, em 1997.<br />

Em seguida, completou um ano de internato em medicina e<br />

cirurgia de pequenos animais em Nova Iorque.<br />

Regressou ao Ohio para efetuar a residência em medicina<br />

interna e o PhD. Obteve o Diploma em 2001 e concluiu o<br />

Doutorado em 2004. Atualmente, é professora assistente do<br />

departamento de medicina e epidemiologia<br />

da Faculdade de Medicina Veterinária, na Universidade da<br />

Califórnia, em Davis. O seu principal interesse na área da<br />

pesquisa centra-se nos distúrbios do trato urinário inferior,<br />

em cães e gatos. A Drª Westropp detém também o cargo de<br />

diretora do Laboratório de Análise de Cálculos Urinários<br />

Gerald V. Ling, na UCD.<br />

Introdução<br />

A doença do trato urinário inferior (DTUI) nos gatos inclui<br />

diversas associações de manifestações: tentativas frequentes e<br />

esforço de micção, micções inapropriadas (periúria), micções<br />

dolorosas e presença de sangue na urina (hematúria). Estes<br />

sinais não caracterizam uma doença específica: podem ser<br />

10 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / Vol 17 No 1<br />

observados em gatos com cálculos vesicais (cálculos císticos),<br />

infecções bacterianas do trato urinário, neoplasia, ou outras<br />

lesões por massas vesicais. Em cerca de dois terços dos casos,<br />

os clínicos não conseguem descobrir uma causa específica<br />

para os sinais clínicos, pelo que se referem a esta síndrome<br />

como cistite idiopática felina (CIF) (1).<br />

Anamnese e exame físico<br />

A elaboração de uma anamnese completa pode revelar-se<br />

muito importante para determinar a presença de poliúria,<br />

polidipsia, polaquiúria (micção frequente de pequenos<br />

volumes de urina), estrangúria, hematúria, ou se o gato<br />

apresenta uma combinação destes sinais clínicos. Por outro<br />

lado, a história do paciente auxilia igualmente a decidir quais<br />

os diagnósticos mais importantes. É importante obter<br />

informações sobre o ambiente, sobretudo em felinos com<br />

maior probabilidade de CIF. Deve realizar-se sempre um<br />

exame físico minucioso do trato urinário inferior e da região<br />

perineal circundante.<br />

Diagnóstico<br />

Exame de urina e cultura: a urinálise conduzida em gatos<br />

com DTUI apresenta resultados variáveis (alterações como<br />

hematúria, proteinúria, piúria, cristalúria e densidade), que<br />

são pouco característicos de afecções específicas da bexiga.<br />

Por exemplo, tanto hematúria como proteinúria, sinais de<br />

vasodilatação suburetral e derrame vascular, independentemente<br />

da sua etiologia, podem ser temporários – presente<br />

em uma micção, mas não na seguinte. Em caso de infecção<br />

do trato urinário, pode ser observada piúria. Contudo, este<br />

sinal clínico (habitualmente, em quantidades mínimas) pode<br />

também manifestar-se numa cistite estéril. Além disso,<br />

menos de 2% dos gatos com idade inferior a 10 anos<br />

apresentam cistite bacteriana verdadeira , porém, a cultura<br />

urinária é geralmente um teste pouco elucidativo. A


probabilidade de infecção do trato urinário aumenta com a<br />

idade, com a presença de cálculos císticos, de<br />

ureterostomias perineais (2) e de urina diluída (3).<br />

Pode também ser observada cristalúria em diversos gatos<br />

sem manifestação de sinais clínicos associados ao trato<br />

urinário inferior. No entanto, pode constituir um dado<br />

relevante em pacientes com predisposição para a recorrência<br />

de cálculos urinários. Uma vez que a CIF é um diagnóstico de<br />

exclusão, preconiza-se a realização de análise e cultura<br />

urinárias, em gatos com DTUI recorrente e não sujeitos a<br />

avaliação anterior. A densidade da urina deve ser<br />

cuidadosamente analisada, sobretudo em felinos mais<br />

velhos, de modo a verificar a existência de concentração<br />

adequada, levando-se em conta que o tipo de dieta (seca<br />

>1,040 vs. em lata >1,030) pode inf luenciar o<br />

resultado. Consequentemente, o clínico deverá recomendar<br />

veementemente a realização de exame de urina em gatos<br />

idosos, ou se o felino evidenciar outros distúrbios com<br />

presença de isostenúria (ex. hipertiroidismo, insuficiência<br />

renal) ou tenha sido submetido a cirurgias anteriores.<br />

Radiografia: a radiografia abdominal simples, que abranja<br />

todo o trato urinário (incluindo a uretra), pode constituir -se<br />

em instrumento diagnóstico de grande utilidade em gatos<br />

com DTUI. É aconselhável aplicar enema de água morna antes<br />

do exame radiológico para conseguir avaliar completamente a<br />

uretra. Aproximadamente 15 a 20% dos pacientes felinos com<br />

DTUI apresentam evidências radiográficas de cálculos císticos<br />

(4). Em algumas situações, a cistografia contrastada pode<br />

ajudar a revelar lesões, como cálculos não radiopacos, massas<br />

ou coágulos sanguíneos. Os estudos de contraste são<br />

particularmente indicados para gatos mais velhos, com menor<br />

probabilidade de CIF.<br />

Cistoscopia: Se o gato apresentar episódios recorrentes de<br />

DTUI e já tiverem sido efetuados os diagnósticos<br />

supramencionados, poderá ser considerada a realização de<br />

uma citoscopia. Este procedimento permite visualizar a<br />

uretra e a bexiga em baixas e altas pressões, o que facilita a<br />

detecção de pequenos cálculos císticos, divertículos,<br />

ureteres ectópicos e pequenos pólipos. Caso não seja<br />

observável nenhum destes elementos, é possível avaliar o<br />

grau de gravidade do edema, de glomerulações (pequenas<br />

hemorragias localizadas), da friabilidade e de fibroses. Se o<br />

cenário cistoscópico indicar, ocasionalmente, deverá se<br />

considerar a realização de biópsia da bexiga para análise<br />

histopatológica e eventual cultura.<br />

Os exemplos apresentados a seguir são casos apresentados<br />

aos nossos clínicos ou combinações de diversos casos, para<br />

ilustrar diferentes diagnósticos e estratégias terapêuticas<br />

para gatos com DTUI.<br />

Caso Nº 1<br />

Onion é uma fêmea esterilizada de raça doméstica de pêlo<br />

curto, com 3 anos de idade. Foi levada à consulta devido a<br />

um primeiro episódio de periúria, estrangúria e hematúria,<br />

ocorrido há um dia e meio.<br />

Histórico do animal: Os proprietários adotaram a gata com<br />

2 anos de idade de um abrigo e não tinham observado<br />

qualquer problema no passado. Relataram a inexistência de<br />

poliúria ou polidipsia. A gata vive exclusivamente em<br />

ambiente fechado, sem outros animais de companhia e<br />

consome um alimento seco comercial para felinos.<br />

Exame físico: De maneira geral, o exame não destacou<br />

observações especiais, com exceção de perda de pêlo inguinal<br />

bilateral e auto-escoriações óbvias na mesma área (Figura 1).<br />

Apresentava bexiga pequena e a gata ressentiu-se durante a<br />

palpação deste órgão.<br />

Escore de Condição Corporal (ECC) =6/9.<br />

Lista de problemas:<br />

1. DTUI caracterizadas sobretudo por periúria, hematúria e<br />

estrangúria.<br />

2. Perda de pêlo inguinal e auto-escoriações.<br />

Avaliações: O diagnóstico diferencial para as DTUI,<br />

num gato com esta idade, inclui: CIF, urolitíase,<br />

problemas comportamentais e infecção do trato<br />

urinário. Outras afecções, como neoplasia,<br />

divertículo da bexiga, outras anormalidades<br />

anatômicas ou estenoses uretrais, são menos prováveis<br />

em felinos que apresentem estes sinais clínicos e esta<br />

anamnese. Provavelmente, a alopecia é auto-induzida<br />

em resultado da dor provocada pela doença da bexiga.<br />

Em alguns casos individuais, poderá ser considerada a<br />

Figura 1.<br />

Alopecia simétrica na<br />

virilha e abdome<br />

ventral, no Caso 1.<br />

Vol 17 No 1 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / 11


COMO ABORDAR...<br />

Figura 2.<br />

Aumento da liberação de norepinefrina (NE) durante período de<br />

stress, em gatos com CIF, comparativamente aos controles.<br />

NE (pg/ml)<br />

10,000<br />

7500<br />

5000<br />

2500<br />

existência de distúrbios dermatológicos primários.<br />

Plano de diagnóstico: Apesar de se tratar da primeira<br />

manifestação de DTUI, o proprietário optou pela realização<br />

de procedimentos de diagnóstico adicionais. Foi realizada<br />

radiografia abdominal, com o cuidado de incluir todo o<br />

trato urinário inferior; não foram detectadas alterações e a<br />

bexiga apresentava-se pequena. A análise e cultura urinárias<br />

revelaram densidade de 1,049 com> 100 RBC/hpf<br />

(Glóbulos vermelhos por campo de ampliação). A cultura<br />

urinária apresentou resultado negativo.<br />

Diagnóstico: Grande probabilidade de CIF.<br />

Recomendações no caso da Onion: As causas de CIF não<br />

estão ainda totalmente elucidadas. Felizmente, cerca de<br />

85% dos gatos com CIF não apresentam recorrência<br />

subsequente dos sinais clínicos. De acordo com a minha<br />

própria experiência, é bastante útil esclarecer aos proprietários<br />

sobre a doença, transmitindo os conhecimentos<br />

clínicos, para que estes possam compreender os sinais<br />

clínicos do animal.<br />

Uma premissa universal é que a CIF não constitui um simples<br />

distúrbio da bexiga, mas que envolve interações complexas<br />

dos dois principais ramos do sistema de resposta corporal ao<br />

stress: o sistema nervoso simpático e o sistema endócrino. Nos<br />

seres humanos ocorre uma doença semelhante denominada<br />

cistite intersticial. Ambas parecem apresentar evolução com<br />

‘‘altos e baixos’’, exacerbado pelos fatores de stress (5). O<br />

sistema nervoso simpático age através da liberação de<br />

catecolaminas, como a norepinefrina (NE) e a epinefrina,<br />

enquanto as glândulas adrenais liberam cortisol e um<br />

conjunto de outros esteróides. A CIF caracteriza-se por uma<br />

sobreatividade do sistema nervoso simpático (6) e por uma<br />

fraca resposta endócrina (7) a fatores de stress que parecem<br />

não afetar os gatos saudáveis. Alguns estudos demonstraram<br />

12 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / Vol 17 No 1<br />

0 10 20 30 40<br />

Dias<br />

CIF<br />

Saudáveis<br />

aumento de NE e de outros metabólitos de catecolaminas em<br />

gatos com CIF face a um fator de stress ligeiro, em comparação<br />

a felinos saudáveis (Figura 2). Qualquer estratégia de<br />

tratamento que diminua a descarga do sistema nervoso<br />

simpático pode revelar-se importante para a redução dos<br />

sinais clínicos, assim como reduzir a nocividade da urina para<br />

a parede lesada da bexiga e normalizar a permeabilidade<br />

deste órgão.<br />

Além do sistema nervoso simpático, também se observam<br />

anomalias no eixo hipotalâmico-pituitário-adrenal<br />

(HPA) em gatos com CIF. Após administração de dose<br />

elevada (125g) de ACTH sintético, os felinos com esta<br />

afecção evidenciaram decréscimo significativo nas respostas<br />

de cortisol sorológico, em comparação com os animais<br />

saudáveis (8). Muito embora não tenham sido identificadas<br />

alterações histológicas óbvias, as áreas constituídas pelas<br />

zonas fasciculadas e reticuladas eram consideravelmente<br />

menores em secções das glândulas dos gatos com CIF que nos<br />

animais saudáveis. Assim, enquanto o sistema simpáticoneural<br />

parece encontrar-se totalmente ativado neste<br />

distúrbio, o mesmo não sucede com o eixo HPA.<br />

É provável que a patofisiologia da CIF envolva interações<br />

complexas entre diversos sistemas do organismo. As<br />

anomalias não se localizam apenas na bexiga, mas também,<br />

nos sistemas ner voso, endócrino, gastrintestinal,<br />

comportamental e até cardiovascular (9). Não foi ainda<br />

determinado porque estes sistemas se manifestam sob a<br />

forma de CIF em certos gatos e em outros não. No entanto, o<br />

padrão de imprevisibilidade sustenta a presença de uma<br />

alteração subjacente comum que se expressa de forma<br />

distinta, com base na susceptibilidade individual. Para que<br />

possam proporcionar um tratamento mais adequado a estes<br />

doentes, é importante que os clínicos compreendam que esta<br />

síndrome não constitui apenas uma “doença da bexiga”,<br />

controlável pelo simples uso de terapias dietéticas ou<br />

quimioterápicas.<br />

Com base nos dados obtidos em pesquisas conduzidas em<br />

gatos com CIF, parece tratar-se de uma síndrome dolorosa.<br />

No decurso de episódios agudos deve ser prescrita terapia<br />

analgésica. Um sedativo ligeiro também pode ser benéfico<br />

para diminuir a ansiedade observada durante crises agudas<br />

repentinas. Em geral, esta terapia é aplicada durante 4 a 6<br />

dias, prestando especial atenção à existência de micções,<br />

ainda que de pequeno volume, especialmente no caso dos<br />

machos. No caso da Onion, foi prescrita buprenorfina<br />

(0,03mg/kg PO, BID, durante 4 dias). Embora seja preferível<br />

utilizar a buprenorfina, as estratégias analgésicas alternativas<br />

podem incluir: adesivos de fentanil, butorfanol, oximorfona


ou, eventualmente, fármacos anti-inflamatórios não<br />

esteróides, como o meloxicam.<br />

Foi também considerado o meio envolvente de ‘‘Onion’’,<br />

visto ter-se descoberto que, através do ‘‘enriquecimento’’ do<br />

ambiente em que estes gatos se inserem, é possível diminuir<br />

a “superatividade” simpática e aumentar o intervalo entre<br />

crises (10). Foram efetuadas as seguintes recomendações<br />

para esta gata:<br />

1. Caixas de areia: recomendou-se a colocação da caixa de<br />

areia numa área sossegada e acessível da casa e proceder seu<br />

esvaziamento (diário) e limpeza (semanal) de forma regular.<br />

A cobertura da caixa de areia foi retirada, indicando-se o uso<br />

de areia para gatos, inodora.<br />

2. Alimentação e água: foi recomendada dieta<br />

comercial de manutenção, de apresentação úmida. Os<br />

alimentos úmidos são preferíveis para gatos com CIF, uma<br />

vez que o aumento do teor de água dilui quaisquer<br />

componentes potencialmente nocivos na urina e ajuda a<br />

diminuir a dor associada a este distúrbio. Foi demonstrada<br />

em estudos diminuição na taxa de recorrência de<br />

CIF em gatos alimentados com dieta úmida, em<br />

comparação com outros alimentos com dieta seca com<br />

idêntica formulação (Urinary S/O ® , <strong>Royal</strong> <strong>Canin</strong> Veterinary<br />

Diet) (11). Proporcionar a opção de escolha entre alimentos<br />

secos e úmidos em recipientes adjacentes, separados, ao<br />

invés de substituir a dieta habitual por outra nova, permite<br />

que o animal expresse as suas preferências. Se os gatos (ou<br />

os proprietários) recusarem os alimentos úmidos, devem ser<br />

pesquisadas outras formas de aumentar a ingestão de água,<br />

de acordo com as particularidades do animal (fontes,<br />

torneiras gota-a-gota, etc.).<br />

Nesta altura, não foram feitas outras sugestões uma vez<br />

que, tal como referido anteriormente, a maioria dos gatos<br />

não apresenta episódios recorrentes após a primeira crise<br />

de CIF. Além disso, a alteração simultânea de vários<br />

elementos no ambiente do gato poderia ser tão<br />

“estressante” como não efetuar qualquer alteração.<br />

Adendo: Os proprietários da Onion foram contactados 3<br />

dias após a consulta e o gato apresentava-se clinicamente<br />

normal. O acompanhamento subsequente, 3 semanas e 3<br />

meses após a consulta, revelou que o gato permanecia<br />

assintomático.<br />

Nota: No caso de Onion, o diagnóstico foi realizado a pedido<br />

do proprietário, no sentido de auxiliar a esclarecer a causa<br />

da DTUI. Se os proprietários não estivessem interessados na<br />

condução de testes adicionais, ou manifestassem razões de<br />

ordem financeira, a terapia com analgésicos e explicações<br />

para os proprietários sobre a doença teriam sido<br />

GATOS COM SINTOMAS DO TRATO URINÁRIO INFERIOR<br />

suficientes. Na maioria dos casos, a densidade urinária<br />

exclui a existência de doença renal subjacente. Contudo, se<br />

os sinais clínicos persistirem ou recidivarem, deve ser<br />

recomendado veementemente a realização de exames<br />

diagnósticos complementares.<br />

Caso Nº 2<br />

Casey é um macho esterilizado da raça Himalaia, com 6<br />

anos de idade, levado à consulta na nossa clínica devido a<br />

DTUI recorrente e a uma história de obstrução uretral,<br />

iniciada há 6 meses.<br />

Histórico do paciente: Casey foi levado à consulta veterinária<br />

há cerca de dois anos devido a uma história de estrangúria,<br />

polaquiúria e hematúria, com duração média de 3 a<br />

4 dias e recaídas com intervalos de 2 a 3 meses. O hemograma<br />

completo e o perfil bioquímico realizados há um ano não<br />

revelavam alterações. As radiografias abdominais não<br />

evidenciavam a presença de cálculos no interior do trato<br />

urinário. As diversas culturas urinárias realizadas durante os<br />

últimos dois anos apresentavam resultados negativos. Em<br />

todas as urinálises foi constatada densidade específica<br />

superior a 1,035 e os sedimentos urinários apenas destacavam<br />

hematúria e, ocasionalmente, uma ligeira piúria (5-7/CA). Ao<br />

longo dos últimos 2 anos foram administrados diversos<br />

antibióticos distintos, incluindo amoxicilina com ácido<br />

clavulânico e enrofloxacina, sem registo de qualquer melhoria<br />

consistente. Há cerca de seis meses Casey foi levado a um<br />

serviço de urgências devido a estrangúria persistente, tendo<br />

sido diagnosticada obstrução uretral. Foi tratado e recebeu<br />

alta após internamento hospitalar durante 3 dias. A dieta de<br />

Casey era composta por diversos alimentos secos comerciais<br />

para felinos. A caixa de areia era renovada diariamente e<br />

lavada com regularidade. O animal dispõe de várias<br />

janelas com parapeitos e diversos brinquedos,<br />

recomendados pelo veterinário. Casey tem um modo de<br />

vida exclusivamente de interior, coabitando com dois outros<br />

gatos.<br />

Exame físico: O exame físico de Casey não revelou<br />

nenhuma alteração. ECC =5/9.<br />

Lista de problemas: Os episódios de melhora e piora da<br />

DTUI, durante os últimos 2 anos, e a história de obstrução<br />

uretral, ocorrida há 6 meses.<br />

Avaliação: Uma vez tendo o médico veterinário excluído<br />

diversas causas de DTUI na espécie felina, como cálculos<br />

císticos e infecções do trato urinário, o diagnóstico<br />

diferencial aponta com maior probabilidade para CIF. No<br />

entanto os sinais clínicos de Casey persistiram, devendo ser<br />

Vol 17 No 1 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / 13


COMO ABORDAR...<br />

considerados outros diagnósticos diferenciais, como<br />

neoplasia, divertículos e coágulos sanguíneos. Na<br />

minha opinião, por vezes a obstrução uretral constitui uma<br />

manifestação de CIF em felinos machos. É possível que a<br />

proteína, os cristais (habitualmente de estruvita), as células<br />

e os fragmentos presentes no soro sejam retidos e formem<br />

um plug de muco (Figura 3).<br />

Plano: Foram consideradas outras possibilidades<br />

diagnosticas no caso de Casey devido à ausência de<br />

resposta à terapia e persistência dos sinais clínicos.<br />

1. Foi realizado novo hemograma e perfil bioquímico para<br />

confirmar a inexistência de sinais de alterações sistêmicas,<br />

como doença renal ou anemia. Não foram registadas<br />

alterações.<br />

2. Foi efetuado novo exame de urina, sobretudo para avaliar a<br />

densidade da urina. Esta apresentou valor de 1,048, não<br />

tendo sido detectadas outras alterações nesta consulta.<br />

3. Foi realizada ultrassonografia abdominal para garantir a<br />

inexistência de massas, lesões, coágulos sanguíneos,<br />

pequenos cálculos não radiopacos, ou cálculos de dimensões<br />

reduzidas no interior do trato urinário.<br />

4. Procedeu-se um cistouretrograma contrastado para<br />

verificar a inexistência de outras anormalidades<br />

anatômicas. Este estudo revelou espessamento da parede<br />

da bexiga, sem presença de outras alterações. Todas estas<br />

informações são compatíveis com CIF (12). Devido à<br />

persistência de sinais clínicos, foi realizada cistoscopia.<br />

Durante o exame, a bexiga evidenciou friabilidade e<br />

inúmeras pequenas hemorragias petequiais localizadas<br />

(glomerulações). A bexiga apresentava um edema<br />

moderado, mas com distensão normal (Figura 4).<br />

Diagnóstico: CIF e histórico de obstrução uretral.<br />

Recomendações no caso de Casey: após o diagnóstico foi<br />

agendada outra consulta com os proprietários para discutir<br />

o problema do animal e fornecer o máximo de informação<br />

sobre medidas para amenizar os sinais clínicos do Casey e<br />

espaçar o intervalo entre episódios da doença.<br />

Uma lista contendo recursos ambientais foi discutida com<br />

os proprietários, e os seguintes detalhes foram obtidos:<br />

1. Casey vive numa casa de dois andares, com 3 quartos, um<br />

14 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / Vol 17 No 1<br />

Figura 3.<br />

Plug mucoso<br />

composto por<br />

estruvita,<br />

fragmentos<br />

celulares e<br />

proteínas.<br />

pequeno escritório e uma área de lavanderia.<br />

2. Existiam apenas 2 caixas de areia para 3 gatos (embora os<br />

proprietários considerassem adequado), colocadas lado a<br />

lado na lavanderia. Os proprietários utilizavam areia<br />

higiênica inodora e esvaziavam as caixas sanitárias<br />

diariamente. Uma delas era coberta com tampa e ambas as<br />

caixas eram minuciosamente limpas duas vezes por mês.<br />

3. Os três gatos partilhavam comedouros e bebedouros,<br />

colocados na lavanderia e também na cozinha. Os recipientes<br />

eram limpos com regularidade e todos os gatos tinham acesso<br />

aos alimentos secos e aos úmidos.<br />

4. Dispunham de janelas com parapeitos num quarto do<br />

andar superior, assim como diversos brinquedos que eram<br />

usados rotativamente pelos animais.<br />

5. Não possuíam arranhadores para gatos.<br />

6. Casey não dispunha de uma zona de “fuga” dos outros<br />

gatos, como por exemplo outro quarto ou um armário.<br />

Durante o questionamento referente ao relacionamento<br />

entre o Casey e os outros dois gatos, descobrimos que um<br />

gato parecia ser dominante e “atacava” frequentemente<br />

Casey enquanto este descansava.<br />

Recomendações no caso de Casey:<br />

1. Foi prescrita terapia analgésica. Embora o animal não se<br />

apresentasse sintomático durante a consulta, foi fornecido<br />

butorfanol aos proprietários, com instruções para<br />

administrar este medicamento (1mg 2 a 3 vezes ao dia,<br />

durante um período máximo de 3 dias) caso se<br />

desenvolvessem sinais clínicos. Foi também fornecido um<br />

antagonista não seletivo do adrenoreceptor alfa<br />

fenoxibenzamina - para utilizar em caso de necessidade. A<br />

fenoxibenzamina auxilia a relaxar a uretra, situação que pode<br />

revelar-se importante nos machos desta espécie. Como<br />

alternativa, poderia prescrever-se o antagonista do<br />

adrenoreceptor alfa-1, mais seletivo – Prazosin (CoVM1). Os<br />

antagonistas alfa caracterizam-se também por um efeito<br />

sedativo. Com esta medicação em casa, os proprietários não<br />

teriam necessidade de retornar à consulta com Casey, caso<br />

este apresentasse estabelecer novo episódio. O animal não<br />

tolera muito bem as viagens de automóvel e não sendo<br />

necessário outro diagnóstico, é preferível reduzir o stress<br />

associado ao transporte até à clínica veterinária.<br />

2. Com base em estudos anteriores efetuados em gatos com<br />

CIF crônica recorrente, demonstramos um aumento das<br />

catecolaminas e a má-resposta do eixo hipotalâmicopituitário,<br />

durante um fator de stress moderado. Além disso,<br />

foi documentado um déficit da função do adrenoreceptor de<br />

alfa-2 em gatos com CIF, em comparação com gatos<br />

saudáveis sob as mesmas situações de stress (13). Baseado<br />

nesses dados, estratégias de tratamento objetivando a<br />

redução do tônus simpático no intuito de reduzir estes tipos


Figura 4.<br />

Imagem citoscópica da<br />

parede da bexiga<br />

apresentando várias<br />

pequenas hemorragias<br />

petequiais.<br />

de anomalias tem sido publicadas (10). Nesse ensaio foi<br />

recomendado aos proprietários de 46 gatos com CIF,<br />

habitantes de ambientes internos, alguns métodos de<br />

enriquecimento ambiental multimodal (MEMO) baseados na<br />

história ambiental detalhada, tal como a que foi coletada<br />

para Casey. Os casos foram acompanhados durante 10 meses<br />

através do contato com os clientes para determinar o efeito<br />

dos MEMO nas DTUI e em outros sinais. Foram identificadas<br />

reduções significativas nas DTUI, no medo, nervosismo,<br />

sinais relativos ao trato respiratório, manifestando-se<br />

também tendência (P


COMO ABORDAR...<br />

tocas, com diversos níveis. Em geral, os gatos sentem-se<br />

“seguros” quando se encontram num nível mais elevado do<br />

que a sua “presa” ou ameaça ambiental. Graças a este<br />

dispositivo com formato de escada, Casey poderá subir e<br />

afastar-se dos outros gatos sempre que quiser. Se a estrutura<br />

for colocada perto da janela, o animal poderá contemplar o<br />

exterior.<br />

6. Foi igualmente recomendada aos clientes a consulta do<br />

seguinte website: www.indoorcat.org, no sentido de<br />

obterem ideias adicionais e favorecer a implementação<br />

gradual das recomendações anteriormente mencionadas.<br />

O contato persistente com os clientes, mantendo-os<br />

informados sobre a CIF, tem sido muito útil pois permite<br />

certificar que estes se sentem confortáveis e “com controle”<br />

da doença do seu gato. O acompanhamento é essencial e a<br />

comunicação contínua é benéfica. Após 3 dias, quando os<br />

proprietários foram contactados por telefone, informaram<br />

que Casey estava se recuperando bem, que tinham<br />

adquirido a nova caixa de areia e o arranhador, e que<br />

tinham ajustado os recipientes do alimento e da água.<br />

Estavam tendo dificuldades em encontrar o Feliway ® , e<br />

então foram informados sobre um website para os auxiliar.<br />

Após três semanas os proprietários tinham implementado<br />

lentamente as alterações prescritas e Casey estava bem. O<br />

nosso técnico voltou a contactá-los três meses depois;<br />

informaram que Casey havia apresentado “urina<br />

ensanguentada” 2 semanas antes e que o tinham tratado<br />

com os medicamentos prescritos. O episódio durou 36<br />

horas e os proprietários não tinham procurado cuidados<br />

veterinários. Os proprietários foram também informados<br />

que se a CIF do Casey continuasse a progredir, além de outra<br />

terapia MEMO poderíamos prescrever um anti-depressivo<br />

tricíclico, tal como amitriptilina ou a clomipramina. Estes<br />

medicamentos são, por vezes, usados em casos crônicos<br />

graves de CIF após terem sido implementados todos os<br />

esforços de enriquecimento ambiental (16).<br />

Caso Nº 3<br />

Mischa é uma fêmea esterilizada de raça Siamês Mestiça,<br />

com 11 anos de idade, que foi levada ao nosso hospital para<br />

avaliação de periúria e hematúria que durava 2 semanas.<br />

Após um questionário mais aprofundado, os proprietários<br />

não achavam que Mischa apresentasse esforço ao urinar,<br />

mas notaram que as gotas de urina encontradas no tapete<br />

eram bastante pequenas (o que nos sugeria a presença<br />

de polaquiúria). Informaram ainda que a gata lambia com<br />

muita frequência a região perineal. Mischa não tinha tido<br />

problemas de saúde até aquele momento. Os proprietários<br />

não tinham certeza sobre sua ingestão de ração e água<br />

porque tinham outros 2 gatos e todos os animais<br />

16 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / Vol 17 No 1<br />

partilhavam os mesmos comedouros. Era fornecido<br />

aos gatos um alimento seco comercial ad libitum. Mischa só<br />

tinha autorização para sair ocasionalmente até o pátio.<br />

Exame físico: Não foram detectadas alterações, exceto<br />

desconforto à palpação abdominal caudal. A bexiga<br />

apresentava-se moderadamente cheia. ECC = 5/9.<br />

Problemas: Hematúria, periúria e possível polaquiúria.<br />

Avaliação: os diagnósticos diferenciais são semelhantes aos<br />

discutidos nos dois casos anteriores, contudo, a maioria dos<br />

gatos com CIF são, geralmente, mais jovens e apresentam<br />

sinais de DTUI distintos. Deste modo, deve-se<br />

encorajar a realização de avaliações diagnósticas em casos<br />

como este, uma vez que é menos provável que se trate de<br />

CIF.<br />

Plano: Foram realizados hemograma, perfil bioquímico,<br />

urinálise com cultura e radiografias abdominais.<br />

O hemograma e perfil bioquímico apresentavam resultados<br />

normais (BUN=25 mg/dL (8,9 mmol/L), creatinina =1,5<br />

mg/dL (134 mmol/L)). A densidade específica da urina era<br />

de 1,049. O sedimento urinário revelou > 100 RBC/hpf, sem<br />

indícios de piúria, e a cultura era negativa. As radiografias<br />

abdominais revelaram a presença de mineraliza-ção renal<br />

moderada, suspeitando-se da existência de um urólito no<br />

ureter esquerdo (Figura 5). Notou-se uma pequena<br />

quantidade de “fragmentos cristalinos” na bexiga, mas não<br />

foram identificados verdadeiros cálculos.<br />

Recomendou-se a realização de ultrassonografia abdominal,<br />

de modo a caracterizar mais detalhadamente os sedimentos<br />

da bexiga, a mineralização renal e o cálculo uretral. Este<br />

teste evidenciou apenas uma ligeira dilatação do uréter<br />

esquerdo. Os rins apresentavam leve diminuição da<br />

definição corticomedular e a pélvis renal esquerda estava<br />

ligeiramente distendida. O cálculo encontrado no ureter<br />

encontrava-se a cerca de 3 cm da bexiga. Não foi notada a<br />

presença de outros cálculos.<br />

A micção de Mischa foi monitorada no hospital durante as<br />

24 horas seguintes. Pode ser muito útil observar os hábitos<br />

urinários e efetuar avaliação direcionada a DTUI sempre<br />

que possível, em animais que são levados a consulta devido<br />

a distúrbios urinários. Neste caso tivemos sorte e<br />

descobrimos que Mischa urinava sem qualquer estrangúria<br />

ou polaquiúria. No entanto, verificou-se a presença de<br />

hematúria grave.<br />

Diagnóstico: Mineralização renal e cálculos uretrais.<br />

Plano: Sugeriu-se a realização de CT contrastada para<br />

auxiliar a definir a extensão do uréter esquerdo que se


Figura 5.<br />

Radiografia lateral do Caso 3, demonstrando cálculos uretrais e<br />

mineralização renal.<br />

encontrava obstruída, mas os proprietários recusaram.<br />

Nesta fase a cirurgia para retirar o cálculo não foi<br />

recomendada devido ao fato deste ser um procedimento<br />

invasivo, e o gato se encontrar estável e estar bem, e<br />

também devido às limitações financeiras dos<br />

proprietários. Nos gatos, os cálculos uretrais são muito<br />

frustrantes e normalmente reserva-se a cirurgia para casos<br />

em que a função renal se encontre gravemente<br />

comprometida. As características clínico-patológicas e o<br />

manejo de casos de obstrução uretral estão bem descritos<br />

na literatura (17,18).<br />

A maioria dos cálculos no trato urinário superior dos gatos é<br />

composta por oxalato de cálcio (19, 20). Ocasionalmente,<br />

encontram-se relatos de cálculos de fosfato de cálcio ou de<br />

sangue solidificado (21). Não está disponível qualquer<br />

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />

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Am Small Anim Pract 1996; 26: 317-326.<br />

2. Osborne CA, Caywood DD, Johnston GR, et al. Feline perineal urethrostomy: a<br />

potential cause of feline lower urinary tract disease. Vet Clin North Am Small Anim<br />

Pract 1996; 26: 535-549.<br />

3. Bartges J. Lower urinary tract diseases in geriatric cats. ACVIM Forum 1997.<br />

4. Buffington CA, Chew DJ, Kendall MS, et al. Clinical evaluation of cats with<br />

nonobstructive urinary tract diseases. J Am Vet Med Assoc 1997; 210: 46-50.<br />

5. Westropp JL, Buffington CA. In vivo models of interstitial cystitis. J Urol 2002;<br />

167: 694-702.<br />

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with idiopathic cystitis. Am J Vet Res 2006; 67: 731-736.<br />

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antagonist on hypothalamic-pituitary-adrenal activation in response to crf in<br />

cats with interstitial cystitis. Research Insights into Interstitial Cystitis 2003.<br />

8. Westropp JL, Welk K, Buffington CA. Small adrenal glands in cats with feline<br />

interstitial cystitis. J Urol 2003; 170 (6): 2494-2497.<br />

9. Westropp JL, Buffington CA. Feline idiopathic cystitis: current understanding of<br />

pathophysiology and management. Vet Clin North Am Small Anim Pract 2004;<br />

34: 1043.<br />

10. Buffington CA, Westropp JL, Chew DJ, et al. Clinical evaluation of multimodal<br />

environmental modification (MEMO) in the management of cats with<br />

idiopathic cystitis. J Feline Med Surg 2006; 8: 261-268.<br />

11. Markwell PJ, Buffington CA, Chew DJ, et al. Clinical evaluation of commercially<br />

available urinary acidification diets in the management of idiopathic cystitis in<br />

cats. J Am Vet Med Assoc 1999; 214: 361-365.<br />

GATOS COM SINTOMAS DO TRATO URINÁRIO INFERIOR<br />

protocolo de dissolução para a urolitíase de oxalato de<br />

cálcio, e por isso foi prescrito à Mischa uma dieta úmida,<br />

não acidificante, de modo a evitar a reincidência de<br />

formação de oxalato do cálcio. As dietas úmidas parecem<br />

constituir método mais fácil de aumentar a ingestão de<br />

água, o que é benéfico para a redução da carga de solutos e<br />

evitar a formação de cálculos (22). Foi escolhida uma dieta<br />

não acidificante devido ao presumível componente de<br />

oxalato de cálcio do cálculo. Recomendou-se a periódica<br />

realização de hemogramas e avaliação da função renal.<br />

Procedeu-se também o monitoramento da gata através de<br />

ultrassonografia, relativamente ao agravamento progressivo<br />

da obstrução uretral.<br />

Este caso foi apresentado para ilustrar a importância da coleta<br />

detalhada de sinais, do histórico e do exame físico na<br />

avaliação de gatos com DTUI. Embora mais de dois terços dos<br />

gatos que sofrem de DTUI não apresentem uma causa<br />

identif icável e seja estabelecido o diagnóstico de CIF,<br />

são normalmente gatos mais jovens ou de meia-idade. Os<br />

gatos com CIF apresentam normalmente um ou mais sinais<br />

dos mencionados nos primeiros dois casos.<br />

12. Scrivani PV, Chew DJ, Buffington T, et al. Results of retrograde urethrography<br />

in cats with idiopathic, nonobstructive lower urinary tract disease and their<br />

association with pathogenesis: 53 cases (1993-1995). JAVMA 1997; 211:<br />

741-748.<br />

13. Westropp JL, Buffington CA, Kass PH. In vivo evaluation of the alpha-2<br />

adrenoceptors in cats with Idiopathic cystitis. AJVR 2006; In press.<br />

14. Griffith CA, Steigerwald ES, Buffington CA. Effects of a synthetic facial<br />

pheromone on behavior of cats. J Am Vet Med Assoc 2000; 217: 1154-1156.<br />

15. Buffington CA. External and internal influences on disease risk in cats. J Am<br />

Vet Med Assoc 2002; 220: 994-1002.<br />

16. Chew DJ, Buffington CA, Kendall MS, et al. Amitriptyline treatment for severe<br />

recurrent idiopathic cystitis in cats. J Am Vet Med Assoc 1998; 213: 1282-1286.<br />

17. Kyles AE, Hardie EM, Wooden BG, et al. Clinical, clinicopathologic, radiographic,<br />

and ultrasonographic abnormalities in cats with ureteral calculi: 163 cases<br />

(1984-2002). J Am Vet Med Assoc 2005; 226: 932-936.<br />

18. Kyles AE, Hardie EM, Wooden BG, et al. Management and outcome of cats with<br />

ureteral calculi: 153 cases (1984-2002). J Am Vet Med Assoc 2005; 226: 937-<br />

944.<br />

19. Lekcharoensuk C, Osborne CA, Lulich JP, et al. Trends in the frequency of<br />

calcium oxalate uroliths in the upper urinary tract of cats. J Am Anim Hosp<br />

Assoc 2005; 41: 39-46.<br />

20. Westropp JL, Ruby AL, Bailiff NL, et al. Dried solidified blood calculi in the<br />

urinary tract of cats. J Vet Intern Med 2006; 20: 828-834.<br />

21. Cannon AB, Westropp JL, Kass PH, et al. Trends in feline urolithiasis: 1985-<br />

2004. UC Davis, Unpublished data 2006.<br />

22. Lekcharoensuk C, Osborne CA, Lulich JP, et al. Association between dietary<br />

factors and calcium oxalate and magnesium ammonium phosphate<br />

urolithiasis in cats. J Am Vet Med Assoc 2001; 219: 1228-1237.<br />

Vol 17 No 1 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / 17


Nutrição e distúrbios<br />

urinários em gatos<br />

esterilizados:<br />

estudo exploratório retrospectivo<br />

Jean-Jacques Bénet, DVM<br />

Escola de Medicina Veterinária de Alfort, Departamento<br />

de Doenças Contagiosas, Maisons-Alfort, França<br />

O Prof. Bénet formou-se na Escola de Medicina Veterinária<br />

de Lyon, em 1971. Especializou-se em Microbiologia e<br />

Imunologia em 1975 e em Epidemiologia em 1979.<br />

Atualmente é Professor na Escola de Medicina Veterinária<br />

de Alfort (França), na Unidade de Doenças Contagiosas e<br />

é também o docente responsável pela<br />

pós-graduação em Epidemiologia. A área de pesquisa do<br />

Prof. Bénet centra-se nas zoonoses transmitidas pelos<br />

animais de companhia e na tuberculose bovina.<br />

Morgane Lamarche, DVM<br />

<strong>Royal</strong> <strong>Canin</strong>, Aimargues, França<br />

Morgane Lamarche é formada na Escola de Medicina<br />

Veterinária de Alfort. Trabalhou primeiro num serviço de<br />

emergências de pequenos animais e, atualmente,<br />

desempenha as funções de diretora-adjunta de produtos<br />

na <strong>Royal</strong> <strong>Canin</strong>.<br />

18 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / Vol 17 No 1 / / 2007<br />

Introdução<br />

Já estão disponíveis na maioria dos países industrializados<br />

alimentos adaptados às necessidades dos gatos<br />

esterilizados. Na França, uma variedade de produtos<br />

específicos para este setor da população felina é<br />

comercializado em clínicas veterinárias desde 1998<br />

(Neutered Cat ® <strong>Royal</strong> <strong>Canin</strong>). Trata-se de um alimento<br />

seco (com 7% de umidade) apresentado sob a forma<br />

de croquetes, com características nutricionais<br />

direcionadas para a redução dos riscos relacionados<br />

com cálculos urinários, frequentes em gatos esterilizados.<br />

Este estudo teve como objetivo analisar a relação<br />

entre a nutrição e as afecções urinárias em gatos<br />

esterilizados.<br />

Materiais e métodos<br />

Desenho experimental<br />

O estudo retrospectivo baseou-se em dois grupos de<br />

gatos esterilizados. A um grupo foi administrado o<br />

alimento em avaliação (designado por “Grupo A”)<br />

enquanto que o outro grupo foi alimentado com<br />

outras dietas comercializadas em clínicas veterinárias<br />

(“Grupo B”).<br />

O estudo foi limitado a alimentos disponíveis no<br />

circuito veterinário por razões relacionadas com os<br />

próprios produtos (os produtos vendidos em<br />

supermercados são mais variados em sua composição<br />

e são, normalmente, alimentos úmidos), motivos<br />

relacionados aos proprietários (partindo do princípio<br />

que os proprietários que adquirem a alimentação na<br />

clínica veterinária estão mais preocupados com a


saúde do seu gato) e por uma questão de<br />

rastreabilidade (os clínicos, bem como, os<br />

membros de sua equipe podem ajudar a<br />

confirmar se o gato tem recebido o<br />

mesmo alimento desde o momento da<br />

esterilização).<br />

Os dados obtidos incluem informações<br />

relativas aos últimos 7 anos, que correspondem<br />

ao período durante o qual a<br />

gama de alimentos se encontrou<br />

disponível.<br />

Concepção do plano de amostragem<br />

> Seleção dos indivíduos e do plano de amostragem<br />

Foi disponibilizado um questionário inicial dirigido<br />

aos proprietários de gatos, em regime self-service, em<br />

seis clínicas veterinárias da região de Paris, com o<br />

objetivo de obter 100 gatos para cada um dos grupos.<br />

O principal fator limitante era a obtenção de<br />

participantes suficientes para o Grupo A. Foram<br />

assegurados os seguintes critérios de seleção: idade<br />

compreendida entre 2 e 13 anos, utilização constante<br />

do alimento (1 a 8 anos) e, naturalmente, autorização<br />

do proprietário para o animal participar do estudo.<br />

Organização dos dados recolhidos<br />

Nesta consulta foi preenchido um segundo<br />

questionário, que incluía uma seção dirigida ao<br />

proprietário e outra ao veterinário, na sequência de<br />

um exame não invasivo ao gato. Durante uma reunião<br />

preliminar com os seis veterinários que participaram<br />

da pesquisa, foi acordada a metodologia e aplicação<br />

do questionário.<br />

A informação recolhida junto aos proprietários<br />

baseou-se na condição física do animal, no modo de<br />

vida, no alimento (quantidade fornecida, número de<br />

refeições diárias, método de fornecimento e consumo<br />

de água). No decurso da consulta, o veterinário<br />

70<br />

60<br />

50<br />

40<br />

30<br />

20<br />

10<br />

0<br />

Número de gatos<br />

macho fêmea<br />

sexo<br />

não sim<br />

raça<br />

2 a9 anos 10 a13 anos


Descrição das amostras<br />

Não foram observadas diferenças entre os dois grupos<br />

relativamente à demografia da população felina<br />

(Figura 1) e dos seus proprietários (idade, categoria<br />

sócio-econômica).<br />

Saúde Animal<br />

> Estado geral de saúde dos animais<br />

A proporção de animais com problemas de saúde<br />

(levados à consulta pelo menos uma vez devido a uma<br />

razão de ordem patológica) antes da esterilização<br />

revelou-se semelhante nos dois grupos (3 animais em<br />

cada grupo). Contudo, a proporção foi mais elevada<br />

no Grupo B após a esterilização, com uma diferença<br />

significativa (RR = 1,46 [1,06 – 2,01]) (Tabela 1).<br />

> Afecções urinárias<br />

Os dados recolhidos referem-se à história e aos registos<br />

médicos do animal. Os gatos do Grupo A apresentaram<br />

menos distúrbios urinários (Tabela 2) que os gatos do<br />

Grupo B, diferença considerada significativa (p<br />


NUTRIÇÃO E DISTÚRBIOS URINÁRIOS EM GATOS ESTERILIZADOS: ESTUDO EXPLORATÓRIO RETROSPECTIVO<br />

Tabela 3.<br />

Análise dos alimentos (%)<br />

Grupo A Grupo B<br />

MÉDIO MÍN MÁX MÉDIO MÍN MÁX<br />

Umidade 7 7 7 7 5,5 42,7<br />

Proteína * 36 28 38 34 25,5 42,0<br />

Gordura* 10 10 15 22 8,0 23,2<br />

Fibra bruta* 6,7 3,7 6,8 3,3 0,8 14,8<br />

Sódio* 0,75 0,39 0,75 0,30 0,23 0,6<br />

influência no risco da ocorrência de urólitos. Um teor<br />

maior de sódio estimula a diurese e, por<br />

consequência, produz a diluição urinária que limita a<br />

formação de cristais na urina (3). A variedade de<br />

alimentos estudada (Grupo A) continha um teor médio<br />

de sódio de 0,75% na matéria seca, o dobro do<br />

nível contido nos alimentos do Grupo B (Tabela 3).<br />

Esta diferença em termos de formulação é um<br />

elemento que explica a variação dos riscos observados.<br />

Conclusão<br />

Este ensaio retrospectivo demonstrou a viabilidade do<br />

tema em análise, na prática. Produziu resultados<br />

interessantes a favor da variedade de alimentos<br />

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />

1. Lekcharoensuk C, Osborne CA, Lulich JP. Epidemiologic study of risk factors for<br />

lower urinary tract diseases in cats. J Am Vet Med Assoc 2001; 218: 1429-1435.<br />

2. Lekcharoensuk C, Lulich JP, Osborne CA, et al. Association between patientrelated<br />

factors and risk of calcium oxalate and magnesium ammonium<br />

phosphate urolithiasis in cats. J Am Vet Med Assoc 2000; 217: 520-525.<br />

*Expressa em<br />

porcentagem da<br />

matéria seca.<br />

estudada, sugerindo que estes produtos exercem<br />

efetivamente um impacto na redução dos riscos<br />

de distúrbios urinários, justificando pesquisas mais<br />

aprofundadas. Os dados obtidos deverão ser<br />

confirmados por estudos realizados em larga escala.<br />

Os autores agradecem aos Drs. Pascal Bounous, Etienne<br />

Calais, Bertrand Hollanders, Maurice Kaiser, Delphine<br />

Lacaze-Masmonteil, Jean-Pierre Leroux, Thierry Rabot,<br />

assim como aos seus colegas que disponibilizaram a sua<br />

preciosa colaboração para a concretização dos objetivos<br />

do presente estudo.<br />

3. Tournier C, Aladenise S, Vialle S, et al. The effect of dietary sodium on urine<br />

composition and calcium oxalate relative supersaturation in healthy cats, in<br />

Proceedings. 10 th ESVCN congress 2006, pp. 189<br />

Vol 17 No 1 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / 21


Análise quantitativa<br />

dos cálculos urinários<br />

em cães e gatos<br />

Andrew Moore, MSc<br />

Centro Veterinário de Urólitos do Canadá, Universidade<br />

de Guelph, Serviços Laboratoriais, Guelph, Ontário,<br />

Canadá<br />

Andrew Moore concluiu o Mestrado em Botânica em<br />

1990 e exerce a função de supervisor do Laboratório<br />

de Microscopia Analítica, Serviços Laboratoriais da<br />

Universidade de Guelph, desde 1992. Esta unidade<br />

laboratorial realiza a identificação de substâncias<br />

estranhas em produtos alimentares para a indústria e<br />

para o governo, e presta serviços de microscopia como<br />

meio complementar de diagnóstico<br />

no âmbito das patologias animais e vegetais. Em 1998,<br />

Andrew Moore ajudou a criar o Centro Veterinário de<br />

Urólitos do Canadá, que efetua análises quantitativas de<br />

urólitos para os clínicos canadenses, em parceria<br />

com a Medi-Cal/ Dietas Veterinárias <strong>Royal</strong> <strong>Canin</strong>.<br />

22 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / Vol 17 No 1<br />

Introdução<br />

A identificação rigorosa do tipo, ou tipos, de minerais<br />

contidos num urólito é fundamental para a aplicação<br />

do regime preventivo e terapêutico mais adequado.<br />

Os urólitos podem ser recolhidos através de micções<br />

espontâneas (devendo utilizar-se uma rede de pesca<br />

de aquário para a sua coleta), de descargas por<br />

uroidropropulsão, aspiração por cateter uretral,<br />

citoscopia ou remoção cirúrgica (1,2,3). Todos os<br />

urólitos obtidos devem ser submetidos à análise<br />

quantitativa em laboratórios especializados para<br />

determinar a composição mineral de cada uma das 4<br />

camadas que podem estar presentes (Figura 1).<br />

Existem diversas técnicas de análise quantitativa: a<br />

microscopia de luz polarizada, a estreptoscopia por<br />

infra-vermelhos, a microscopia eletrônica de varredura<br />

com microanálise de raio-X e a difração de raio-X,<br />

que serão abordadas, individualmente no presente<br />

artigo. Centros que disponibilizam este tipo de<br />

análise: Centro Veterinário de Urólitos do Canadá,<br />

Universidade de Guelph; Centro de Urólitos de<br />

Minnesota, Faculdade de Medicina Veterinária,<br />

Universidade de Minnesota; Departamento de<br />

Urologia de Bona, Alemanha; Laboratório de Análise<br />

de Cálculos Urinários, Universidade da Califórnia,<br />

Davis, e o Centro de Urólitos de Budapeste.


Os urólitos que contêm pelo menos 70% de um único<br />

mineral são classificados como sendo daquele<br />

mineral (4). Os urólitos com núcleo e revestimento de<br />

diferentes tipos de minerais são classificados como<br />

compostos (4). Os urólitos com


composição dos urólitos (6). Os tipos de cristais<br />

presentes podem ser totalmente diferentes da<br />

composição do urólito, eventualmente não passar<br />

para a urina e, por vezes, são observados diversos<br />

tipos de cristais na mesma amostra de urina. A Figura<br />

4 evidencia cristais de estruvita, brushita e diidrato<br />

de oxalato de cálcio, presentes simultâneamente na<br />

urina de um cão macho SRD.<br />

A análise quantitativa é disponibilizada há vários anos<br />

sob a forma de kits comerciais baseados em testes de<br />

identificação química, com alterações específicas de<br />

cor em contato com porções fragmentadas de um<br />

cálculo. A eficácia deste método de análise de urólitos<br />

foi revista em outro estudo, sendo estes kits<br />

conhecidos por produzir resultados falso positivo e<br />

falso negativo (7,8,9) (Tabela 1). Por outro lado,<br />

também não estão preparados para detectar a sílica.<br />

Análise Quantitativa<br />

A análise quantitativa total de um urólito envolve<br />

diversas fases e procedimentos analíticos distintos que<br />

contribuem individualmente para a sua identificação.<br />

Alguns cálculos são mais complexos que outros e, por<br />

isso, requerem testes mais exaustivos. O<br />

procedimento a seguir descrito é o que se utiliza no<br />

Centro Veterinário de Urólitos do Canadá (CVUC).<br />

Este centro iniciou a sua atividade em 1998, e realizou<br />

até a presente data análises quantitativas em mais de<br />

9.000 cálculos felinos e 31.000 cálculos caninos (10,11).<br />

Em primeiro lugar, os cálculos são submetidos a um<br />

exame visual minucioso e, em seguida, seccionados<br />

em duas partes iguais e analisados num microscópio<br />

de dissecação. Procede-se o registro das camadas ou<br />

zonas existentes no seu interior, recolhendo cuidado-<br />

Figura 5.<br />

Cálculo de estruvita felino, com núcleo de urato de amônio.<br />

24 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / Vol 17 No 1<br />

samente uma amostra de cada para análise individual.<br />

Em termos descritivos, o cerne óbvio ou ponto de<br />

início denomina-se “núcleo”, a massa do urólito<br />

designa-se por “pedra”, a camada exterior distinta<br />

atribui-se a designação “revestimento” e as projeções<br />

superficiais ou áreas aguçadas são denominadas<br />

“cristais de superfície” (Figura 1). É essencial<br />

determinar a existência de um núcleo no interior do<br />

cálculo e, em caso afirmativo, qual a sua composição.<br />

É também importante conhecer a composição das<br />

outras camadas, apesar do manejo/tratamento da<br />

urolitíase se basear sobretudo nos elementos que<br />

compõem o núcleo, uma vez que é a origem do<br />

cálculo. A composição das camadas exteriores pode<br />

ser diferente da detectada no núcleo, no entanto,<br />

parte-se do princípio de que a totalidade dos urólitos<br />

tenha sido removida do paciente e que o<br />

tratamento será direcionado para a prevenção da<br />

recorrência das condições que induziram a formação<br />

do cálculo original.<br />

Por exemplo, todos os urólitos predispõem o paciente<br />

a infecções do trato urinário. Se a infecção for<br />

provocada por bactérias produtoras de urease, os<br />

subsequentes depósitos de minerais no urólito terão<br />

maior probabilidade de ser de estruvita (12). O tipo<br />

de cálculo composto mais comum que tivemos<br />

oportunidade de analisar apresenta um núcleo de<br />

oxalato de cálcio, rodeado por uma pedra de<br />

estruvita, embora também tenham sido observadas<br />

pedras de estruvita com um núcleo de urato de<br />

amônio, de fosfato de cálcio ou sílica. As Figuras 5 e 6<br />

ilustram dois exemplos diferentes destes tipos de<br />

cálculos.<br />

Figura 6.<br />

Cálculo de estruvita canino, com núcleo de oxalato.


Cristalografia Óptica<br />

Denomina-se por cristalografia óptica a<br />

principal técnica utilizada na análise de cálculos no<br />

Centro de Urólitos. Após identificação visual de cada<br />

região do cálculo, recolhe-se uma amostra de cada<br />

uma destas áreas. As amostras são individualmente<br />

fragmentadas e examinadas em um microscópio de<br />

luz polarizada, por imersão em um líquido de<br />

índice de refração determinado. Graças à<br />

determinação do índice de refração dos diversos<br />

componentes cristalinos é possível obter a identidade<br />

e a proporção de cada camada. Este método permite<br />

identificar e quantificar com rapidez e precisão a<br />

maioria dos componentes.<br />

Se um cálculo contiver minerais pouco habituais ou<br />

metabólitos de fármacos, ou se for constituído por<br />

núcleo de dimensões muito reduzidas, diferente do<br />

resto do cálculo, utilizam-se técnicas adicionais para<br />

confirmar a composição.<br />

Microscopia eletrônica<br />

O laboratório trabalha com microscópio eletrônico de<br />

varredura, equipado com um sistema de microanálise<br />

de raios X (espectômetro de dispersão de energia), que<br />

permite o exame e análise de amostras muito pequenas.<br />

É possível seccionar o cálculo em duas partes, colocá-las<br />

sob o microscópio e proceder a análise das diferentes<br />

áreas no seu interior. Cada cristal pode ser<br />

individualmente ampliado, sem afetar mesmo o<br />

núcleo mais diminuto, evitando-se o risco de o perdê-lo<br />

por completo durante remoção com bisturi e agulha.<br />

Permite igualmente obsevar camadas muito finas no<br />

interior do cálculo e determinar a sua composição.<br />

Contagem<br />

1000<br />

500<br />

O Si<br />

1 2 3 4 KeV<br />

Figura 7.<br />

Espectro de raios X de um núcleo minúsculo de sílica, num cálculo de<br />

oxalato de cálcio canino.<br />

ANÁLISE QUANTITATIVA DOS CÁLCULOS URINÁRIOS EM CÃES E GATOS<br />

Tabela 1.<br />

Análise Quantitativa<br />

Tipo de cálculo Falso - Falso +<br />

Oxalato de cálcio<br />

Sílica<br />

Urato<br />

Carbonato<br />

Brushita<br />

Xantina<br />

4<br />

4<br />

4<br />

4<br />

4<br />

O sistema de microanálise de raios X, anexado ao SEM,<br />

determina a composição básica de qualquer material<br />

examinado, mesmo cristais isolados colocados lado a<br />

lado, podem ser analisados separadamente. Os<br />

elementos individuais presentes na amostra são<br />

identificados através da medição dos raios X emitidos<br />

da amostra bombardeada pelo feixe de elétrons do<br />

microscópio (Figura 7). O SEM e a microanálise de<br />

raios X são muito eficazes para a análise de materiais<br />

inorgânicos, como os minerais, embora não<br />

consigam diferenciar compostos semelhantes, como a<br />

brushita e a apatita, que são formas de fosfato de<br />

cálcio, ou materiais orgânicos, como a xantina e o ácido<br />

úrico. Para separar estes tipos de compostos é<br />

necessário recorrer à análise por infra-vermelho.<br />

Espectroscopia por infra-vermelho<br />

A análise por infra-vermelho permite identificar<br />

grande variedade de materiais orgânicos, incluindo<br />

diversos componentes habitualmente observados nos<br />

cálculos urinários. É um instrumento inestimável para<br />

estabelecer a diferença entre os diferentes tipos de<br />

urato, como o urato de amônio e de sódio, o ácido úrico<br />

e a xantina. Também pode ser utilizado para<br />

diferenciar o monoidrato e o diidrato de oxalato de<br />

Figura 8.<br />

Núcleo de um cálculo de estruvita canino.<br />

4<br />

Vol 17 No 1 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / 25


Copr. © 1980, 1981-1999 Sadtler. Todos os Direitos Reservados<br />

Figura 9.<br />

Micrografia de luz polarizada dos cristais de carbonato de cálcio no<br />

núcleo.<br />

cálcio, bem como os diferentes fosfatos: bruxita,<br />

apatita e o fosfato tricálcio. Um microscópio de infravermelho<br />

anexado a um espectrofotômetro de infravermelho<br />

com transformador Fourier (FTIR), permite<br />

a análise de quantidades microscópicas de material.<br />

Esta técnica tem-se revelado muito útil para identificar<br />

núcleos muito pequenos ou cristais individuais. No<br />

exemplo apresentado abaixo de uma fêmea esterilizada,<br />

SRD, com 10 anos de idade, o núcleo do cálculo de<br />

estruvita era composto por um aglomerado de minúsculas<br />

esferas vermelhas (Figura 8). No microscópio de<br />

luz polarizada, parecia tratar-se de carbonato de cálcio,<br />

componente pouco habitual dos cálculos caninos ou<br />

felinos (Figura 9). A microanálise de raios X no<br />

microscópio eletrônico de varredura indicou que as<br />

micro-esferas continham apenas cálcio, carbono e<br />

oxigênio, dados insuficientes para as distinguir do<br />

oxalato de cálcio. No entanto, a análise de infravermelhos<br />

produziu um espectro a partir de um único<br />

cristal, que correspondeu com exatidão ao espectro<br />

Unidades de absorção<br />

1.0<br />

0.8<br />

0.6<br />

0.4<br />

0.2<br />

0.0<br />

26 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / Vol 17 No 1<br />

Carbonato de Cálcio<br />

Número de ondas cm-1 3500 3000 2500 2000 1500 1000 500<br />

Figura 11.<br />

Duas metades de um cálculo de estruvita ligadas por um pedaço de<br />

sutura, incluindo uma porção de um nó.<br />

de referência do carbonato de cálcio (Figura 10).<br />

A análise em FTIR (Fourier Transform Infrared) temse<br />

revelado muito importante para a identificação<br />

de cálculos pouco comuns. O laboratório recebeu<br />

um urólito irregular, de cor verde-escura, recolhido de<br />

um macho castrado, Schipperke de 4 anos. O exame<br />

inicial através do microscópio de luz polarizada não<br />

permitiu identificar a amostra, e a microanálise de<br />

raio-X indicou material orgânico com teor elevado de<br />

nitrogênio. A análise FTIR determinou a composição<br />

do cálculo como sendo 100% diidroxi-2,8 adenina, um<br />

metabolito da purina e, consequentemente, o paciente<br />

recebeu tratamento para urolitíase de urato.<br />

Diversos cálculos são originados por substâncias<br />

estranhas que conseguem penetrar na bexiga. A<br />

vantagem de uma análise microscópica reside no<br />

fato de ser possível identificar até mesmo os<br />

componentes menos comuns. Fragmentos de material<br />

vegetal ou fibras de madeira são rapidamente<br />

identificados através de microscopia<br />

luminosa. As partículas metálicas<br />

requerem microanálise por raio-X, e<br />

para a detecção dos polímeros<br />

recorre-se à tecnologia do FTIR.<br />

Entre as substâncias mais insólitas<br />

detectadas no núcleo de cálculos,<br />

podem citar-se fragmentos de agulhas<br />

de pinheiro em urólitos de estruvita e<br />

uma agulha de costura, ingerida por<br />

um cão, que posteriormente migrou<br />

para a bexiga (13).<br />

Figura 10.<br />

Espectro FTIR do carbonato de cálcio.


Alguns materiais enviados para análise foram<br />

coletados pelos proprietários pensando tratar-se de<br />

cálculos da bexiga excretados através da urina. Com<br />

base em técnicas de microscopia o laboratório<br />

conseguiu identificar em diversos casos pedaços de<br />

areia higiênica e pequenos blocos de amido,<br />

considerados como cálculos urinários.<br />

Os corpos estranhos mais comuns observadas na<br />

composição dos núcleos de muitos cálculos são<br />

suturas resultantes de cistotomias anteriores. Por<br />

vezes, são óbvias logo ao exame visual, quando o<br />

cálculo apresenta a forma de um nó (Figura 11), mas<br />

com frequência, são apenas pequenos fragmentos<br />

ocultos no centro do cálculo. Podem ser identificadas<br />

através do microscópio luminoso, mas para confirmar<br />

o tipo de material de sutura (sutura de seda, sintética<br />

vs. monofilamento, etc.) recorre-se à análise FTIR.<br />

Por vezes, são também utilizados métodos de análise<br />

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />

1. Osborne CA, Kruger JM, Lulich JP, et al. Feline Lower Urinary Tract Diseases.<br />

In: Ettinger SJ, Feldman EC (eds). Textbook of Veterinary Internal Medicine.<br />

WB Saunders Co, Philadelphia 2000; 5: 1710-1747.<br />

2. Lulich JP, Osborne CA. Catheter assisted retrieval of urocystoliths from dogs<br />

and cats. J Am Vet Med Assoc 1992; 201: 111-113.<br />

3. Lulich JP, Osborne CA, Carlson M, et al. Nonsurgical removal of urocystoliths in<br />

dogs and cats by voiding urohydropropulsion. J Am Vet Med Assoc 1993; 203:<br />

660-663.<br />

4. Osborne CA, Lulich JP, Polzin DG, et al. Analysis of 77,000 canine uroliths:<br />

Perspectives from the Minnesota Urolith Center. In: Osborne CA, Lulich JP,<br />

Bartges JW eds. Vet Clin North Am Small Anim Pract 1999; 29: 17-38.<br />

5. Weichselbaum RC, Feeney DA, Jessen CR, et al.. Evaluation of the morphologic<br />

characteristics and prevalence of canine urocystoliths from a regional urolith<br />

center. Am J Vet Res 1998; 59: 379-387.<br />

6. Buffington CA, Chew DJ. Diet therapy in cats with lower urinary tract disorders.<br />

Vet Med 1999; 94: 626-630.<br />

ANÁLISE QUANTITATIVA DOS CÁLCULOS URINÁRIOS EM CÃES E GATOS<br />

suplementares, como a difração por raios X, para<br />

facilitar a identificação de amostras pouco comuns.<br />

Resumo<br />

A análise quantitativa rigorosa dos cálculos caninos e<br />

felinos é importante, uma vez que ajuda o veterinário<br />

a determinar as causas subjacentes da urolitíase e a<br />

prescrever o tratamento mais eficaz para o paciente.<br />

As técnicas microscópicas permitem detectar núcleos<br />

diminutos, determinar se a sua composição é<br />

diferente das restantes zonas do cálculo, conseguindo<br />

identificar com precisão os componentes do urólito,<br />

frequentemente negligenciados ou incorretamente<br />

classificados através de métodos qualitativos. Os<br />

dados coletados em conjunto com a amostra enviada<br />

para análise também se revelam muito úteis para a<br />

pesquisa das causas de urolitíase.<br />

7. Bovee KC, McGuire T. Qualitative and quantitative analysis of uroliths in dogs:<br />

definitive determination of chemical type. J Am Vet Med Assoc 1984; 185: 983-987.<br />

8. Osborne CA, Clinton CW, Moran HC, et al. Comparison of qualitative and<br />

quantitative analyses of canine uroliths. Vet Clin North Am Small Anim Pract<br />

1986; 16: 317-323.<br />

9. Ruby AL, Ling GV. Methods of analysis of canine uroliths. Vet Clin North Am<br />

Small Anim Pract 1986; 16: 293-301.<br />

10. Houston DM, Moore AE, Favrin MG, et al. Feline urethral plugs and bladder<br />

uroliths: a review of 5484 submissions 1998-2003. Can Vet J 2003;<br />

44: 974-977.<br />

11. Houston DM, Moore AEP, Favrin MG, et al. <strong>Canin</strong>e urolithiasis: A look at over<br />

16000 urolith submissions to the Canadian Veterinary Urolith Centre from<br />

February 1998 to April 2003. Can Vet J 2004; 45: 225-230.<br />

12. Seaman R, Bartges JW. <strong>Canin</strong>e struvite urolithiasis. Comp Cont Educ Pract Vet<br />

2001; 23: 407-420.<br />

13. Houston DM, Eaglesome H. Unusual case of foreign body-induced struvite<br />

urolithiasis in a dog. Can Vet J 1999; 40: 125-126.<br />

Vol 17 No 1 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / 27


COMO TRATAR...<br />

O gato com DTUI -<br />

perspectiva do cirurgião<br />

Giselle Hosgood BVSc, MS, PhD, FACVSc,<br />

Dipl. ACVS<br />

Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade do<br />

Estado da Louisiana, Baton Rouge, LA 70803, EUA<br />

A Drª Hosgood é formada pela Universidade de Queensland<br />

e foi interna de cirurgia na Universidade de Murdoch, antes<br />

de iniciar a residência cirúrgica na Universidade de Purdue,<br />

em Indiana. Atualmente, é Professora e Diretora dos<br />

Serviços de Cirurgia de Animais de Companhia da<br />

Universidade Estadual da Louisiana. A sua principal área de<br />

interesse é a cirurgia de tecidos moles. A Drª Hosgood é<br />

autora de inúmeros trabalhos publicados na literatura<br />

científica sobre diversos aspectos da cirurgia clínica<br />

e experimental.<br />

A filosofia<br />

O manejo clínico da DTUI (Doença do trato urinário<br />

inferior) felina evoluiu significativamente ao longo<br />

dos últimos 15 a 20 anos, evidenciando progressos<br />

consideráveis quanto à compreensão da influência da<br />

nutrição e manipulação dietética, à crescente<br />

conscientização por parte dos médicos veterinários e<br />

proprietários, da qual resulta a detecção precoce dos<br />

problemas, assim como o manejo rigoroso dos gatos<br />

acometidos. Por consequência, o papel da cirurgia<br />

frente a gatos com esta afecção sofreu uma alteração.<br />

28 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / Vol 17 No 1<br />

Embora a maioria dos clínicos e cirurgiões concordem<br />

que a cirurgia não constitui a primeira linha de<br />

atuação, existem casos em que a inter venção<br />

cirúrgica está preconizada ou é escolhida para facilitar<br />

o manejo dos gatos com DTUI. A perspectiva sobre as<br />

situações em que se deverá recorrer a este procedimento<br />

permite melhorar os resultados tanto para o<br />

gato, como para a satisfação do cliente.<br />

Quais são os procedimentos<br />

cirúrgicos mais indicados?<br />

São três os procedimentos cirúrgicos que se utilizam<br />

na abordagem da DTUI felina. Indiscutivelmente, o<br />

procedimento mais importante, com o qual o clínico<br />

deverá estar familiarizado, que não deverá hesitar em<br />

realizar e o único imprescindível numa emergência é a<br />

cistostomia com sonda. Esta intervenção requer a<br />

colocação cirúrgica de uma sonda através da parede<br />

ventral do abdome até à bexiga (1). Deve realizar-se,<br />

preferencialmente, com o animal anestesiado – embora<br />

se trate de uma cirurgia de curta duração – mas<br />

também pode ser efetuada sob sedação e anestesia<br />

local, se necessário. Foram descritas técnicas<br />

percutâneas com cateteres especiais em cães. A<br />

colocação de uma sonda de cistostomia diminui a<br />

obstrução de fluxo urinário e favorece a subsequente<br />

estabilização do animal, ajuda a manter a descompressão<br />

em caso de distensão extrema da bexiga, o que<br />

facilita a recuperação do músculo detrusor, permite<br />

que a uretra se restabeleça da inflamação e trauma<br />

induzidos pela doença ou por tentativas de sondagem.<br />

Além disso, por se tratar de um sistema fechado<br />

para a coleta de urina, facilita o monitoramento da<br />

excreção urinária e da recuperação renal. Uma<br />

cistostomia com sonda torna desnecessária a<br />

colocação de um catéter permanente, passível de<br />

aumentar a inflamação da uretra, nos casos em que se


permitem a sua inserção. Qualquer cateter interno que<br />

permaneça aberto aumenta o risco de contaminação<br />

ambiental do tubo, impossibilitando a quantificação<br />

da urina.<br />

Os outros procedimentos utilizados no manejo da<br />

DTUI são a uretrostomia perineal (Figura 1) e a<br />

uretrostomia antepúbica. A uretrostomia perineal cria<br />

uma abertura uretral no períneo, na uretra<br />

membranosa (2,3). A uretrostomia antepúbica produz<br />

uma abertura uretral na parede ventral do abdome<br />

e constitui, claramente, uma intervenção de emergência<br />

(4). Está indicada em situações de danos<br />

irreparáveis na uretra membranosa distal, frequentemente<br />

originados por tentativas repetidas de<br />

cateterismo, que impossibilitam a realização da<br />

uretrostomia perineal. A posterior formação de<br />

estenoses, que não permitam a ressecção, também<br />

pode-se constituir em indicação (Figura 2). Foi<br />

descrita uma modificação dos procedimentos, com<br />

criação de um óstio transpélvico (5). As indicações<br />

para esta intervenção são idênticas às das outras<br />

uretrostomias.<br />

Relativamente à uretrostomia perineal, as suas indicações<br />

por vezes são claras, e em outros casos, controversas.<br />

Trata-se de uma intervenção claramente<br />

indicada, sempre que existem danos irreparáveis na<br />

uretra peniana. Mais preocupante ainda é a tentativa<br />

de realizar este procedimento quando a obstrução não<br />

pode ser aliviada. A uretrostomia perineal não se<br />

constitui em uma intervenção de emergência, sendo<br />

mais indicado proceder a cistostomia com sonda nos<br />

casos de difícil desobstrução. Uma vez estabilizado o<br />

animal, e após o intervalo de tempo necessário para a<br />

recuperação da uretra, novas tentativas controladas<br />

de reduzir a obstrução poderão ser realizadas. Está<br />

fora de questão realizar uretrostomia perineal num<br />

gato com episódios recorrentes de obstrução, ao invés<br />

de se proceder manejo médico específico rigoroso.<br />

Efetuar este tipo de intervenção em um gato com essas<br />

características pressupõe uma decisão informada ao<br />

cliente. Como não dispomos de um método de<br />

predição do futuro que permita saber se o animal<br />

voltará a sofrer nova obstrução, não é possível tomar<br />

uma decisão com a máxima certeza em situações deste<br />

tipo. De qualquer forma, se pode determinar se o<br />

sucesso do tratamento ocorreu por causa do<br />

procedimento, que previne novas obstruções, ou se o<br />

gato realmente não apresenta novos episódios<br />

obstrutivos.<br />

Quais são as consequências da<br />

uretrostomia?<br />

As alterações anatômicas associadas à uretrostomia<br />

perineal incluem a redução do seu comprimento a<br />

provavelmente menos de 1/3, através da remoção<br />

da uretra peniana. O novo óstio é criado na zona de<br />

maior diâmetro da uretra membranosa, na altura das<br />

glândulas bulbouretrais. A consequência prevista para<br />

esta alteração consiste na perda dos mecanismos de<br />

defesa natural, habitualmente providenciados pela<br />

estreita uretra peniana, que evitam sobretudo a<br />

contaminação ascendente. Em geral, a primeira<br />

manifestação de obstrução uretral em gatos com DTUI<br />

não está associada a uma infecção bacteriana (6-8).<br />

Este tipo de infecção é mais provável na sequência de<br />

manipulação, incluindo cateterismo periódico ou<br />

Figura 1.<br />

Uretrostomia perineal completa destacando a ampla abertura do<br />

óstio, na altura das glândulas bulbouretrais (indicada pela seta), e<br />

a uretra aberta, que se prolonga até ao períneo.<br />

Figura 2.<br />

Aspecto típico da<br />

zona de uma<br />

uretrostomia<br />

perineal estenosada<br />

(indicada pela seta),<br />

habitualmente<br />

secundária a uma<br />

dissecação<br />

inadequada da<br />

uretra na altura das<br />

glândulas<br />

bulbouretrais.<br />

Vol 17 No 1 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / 29


O GATO COM DTUI – PERSPECTIVA DO CIRURGIÃO<br />

permanente e obstrução recorrente. É interessante<br />

notar que os gatos com DTUI e infecção bacteriana,<br />

submetidos a uretrostomia perineal, apresentaram<br />

recorrência de infecções do trato urinário, enquanto<br />

os felinos saudáveis sujeitos a uretrostomia perineal<br />

por outros motivos, não desenvolvem infecções do<br />

trato urinário (9,10). Desconhece-se se a recorrência<br />

nos gatos com DTUI poderia ser diferente da situação<br />

sem a intervenção cirúrgica. Assim, a uretrostomia<br />

perineal não pressupõe um risco do animal contrair<br />

uma infecção do trato urinário, exceto se apresentar<br />

histórico de recorrência de infecções urinárias<br />

bacterianas.<br />

A uretrostomia antepúbica provoca alterações<br />

anatômicas semelhantes, embora reduza ainda mais o<br />

comprimento uretral. A localização física do óstio no<br />

abdome ventral aumenta o risco de contaminação<br />

ascendente. As queimaduras pela urina podem<br />

também constituir um problema. Embora a junção<br />

vesico-uretral não deva ser afetada, por vezes, a<br />

incontinência urinária representa um problema. Num<br />

estudo composto por 16 gatos, 13 dos quais com DTUI,<br />

foram observadas infecções bacterianas recorrentes<br />

do trato urinário em 5 animais e sinais de DTUI em<br />

oito (4). Nenhum dos gatos sujeitos a uretrostomia<br />

antepúbica por trauma desenvolveu infecção<br />

bacteriana do trato urinário, o que coincide com os<br />

resultados observados para a uretrostomia perineal.<br />

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />

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cat. Lea and Febiger, Malvern 1992, pp. 152-154.<br />

2. Griffin DW, Gregory CR, Kitchell RL. Preservation of striated-muscle urethral<br />

sphincter function with use of a surgical technique for perineal urethrostomy in<br />

cats. J Am Vet Med Assoc 1989; 194: 1057-1060.<br />

3. Sackman JE, Sims MH, Krahwinkel DJ. Urodynamic evaluation of lower urinary<br />

tract function in cats after perineal urethrostomy with minimal and extensive<br />

dissection.Vet Surg 1991; 20: 55-60.<br />

4. Baines SJ, Rennie S, White RS. Prepubic urethrostomy: A long-term study in 16<br />

cats. Vet Surg 2001; 30: 107-113.<br />

5. Bernarde A, Viguier E. Transpelvic urethrostomy in 11 cats using an ischial<br />

ostectomy. Vet Surg 2004; 33: 246-252.<br />

30 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / Vol 17 No 1<br />

Quais são as complicações da<br />

uretrostomia perineal?<br />

A hemorragia provocada pelo corte do tecido peniano é<br />

a complicação precoce mais frequente, solucionada<br />

sem intervenção. A longo prazo, a complicação mais<br />

comum é a estenose associada a uma técnica cirúrgica<br />

inadequada, a cateterismo permanente e a trauma<br />

auto-induzido. Preferencialmente esta cirurgia deverá<br />

ser realizada por um clínico experiente. O cateterismo<br />

permanente não é indicado. Se for necessário a<br />

descompressão urinária da bexiga ou desvio uretral,<br />

deverá considerar-se como recurso a cistostomia com<br />

sonda. É imperativo reduzir o trauma auto-induzido.<br />

Resumo<br />

Todos os esforços devem ser realizados para conduzir<br />

manejo clínico rigoroso e aplicar estratégias de<br />

prevenção em gatos com DTUI. A cistostomia com<br />

sonda constitui importante instrumento de manejo,<br />

sobretudo em caso de urgência. Face à presença de<br />

trauma uretral irreparável, a indicação de<br />

uretrostomia é óbvia. A uretrostomia perineal, por si<br />

só não está indicada no tratamento da DTUI. Optar<br />

pela realização deste procedimento em gatos com<br />

obstrução recorrente, mesmo com um manejo clínico<br />

rigoroso, deverá ser uma decisão informada e tomada<br />

de acordo com a análise individual de cada caso.<br />

6. Kruger JM, Osborne CA, Goyal SM, et al. Clinical evaluation of cats with lower<br />

urinary tract disease. J Am Vet Med Assoc 1991; 199: 211-216.<br />

7. Kruger JM, Osborne CA. The role of uropathogens in feline lower urinary tract<br />

disease. Clinical implications. Vet Clin North Am Small Anim Pract 1993; 23: 101-<br />

123.<br />

8. Martens JG, McConnels S, Swanson CI. The role of infectious agents in naturally<br />

occurring feline urologic syndrome. Vet Clin N Am 1984; 14: 503-511.<br />

9. Griffin DW, Gregory CR. Prevalence of bacterial urinary tract infection after<br />

perineal urethrostomy in cats. J Am Vet Med Assoc 1992; 200: 681-684.<br />

10. Bass M, Howard J, Gerber B, et al. Retrospective study of indications for and<br />

outcome of perineal urethrostomy in cats. J Small Anim Pract 2005 ; 46: 227-<br />

231.


Endo-urologia e radiologia<br />

de intervenção do<br />

trato urinário<br />

Allyson C. Berent, DVM, Dipl. ACVIM<br />

Hospital Veterinário Matthew J. Ryan da Universidade da<br />

Pensilvânia, Filadélfia, PA, EUA<br />

A Drª. Berent é formada pela Universidade de Cornell e<br />

completou a residência em medicina interna na Universidade<br />

da Pensilvânia. Obteve uma bolsa de estudos em radiologia<br />

interventiva e foi Conferencista Waltham sobre diagnósticos<br />

e terapêuticas minimamente invasivas, na Universidade da<br />

Pensilvânia e na Universidade Thomas Jefferson. Atualmente,<br />

faz parte da equipe veterinária de medicina interna e<br />

radiologia interventiva de pequenos animais, da Universidade<br />

da Pensilvânia, como especialista em radiologia e endoscopia<br />

de intervenção. A principal área de interesse da Drª Berent é a<br />

endo-urologia interventiva.<br />

Introdução<br />

A endocirurgia/endoscopia interventiva (EI) envolve a<br />

utilização de equipamento endoscópico em conjunto com<br />

outras modalidades contemporâneas de imagiologia<br />

endoscópica, como a fluoroscopia e/ ou a ultrassonografia,<br />

para a condução de procedimentos terapêuticos e<br />

de diagnóstico praticamente em qualquer parte do corpo<br />

a que se tenha acesso através de um endoscópio<br />

(gastrintestinal, biliar, respiratório, trato urinário, etc.).<br />

A radiologia interventiva (RI) utiliza a fluoroscopia, com<br />

ou sem ultrassonografia, para acessar vasos sanguíneos e<br />

diversos lúmens, de modo a coletar materiais específicos<br />

para fins de diagnóstico e tratamento.<br />

Este artigo apresenta uma perspectiva resumida sobre<br />

alguns dos procedimentos urológicos minimamente<br />

invasivos, aplicados com crescente frequência em<br />

pacientes veterinários, bem como sobre algumas aplicações<br />

futuras mais promissoras da endourologia e RI,<br />

atualmente em fase de pesquisa.<br />

Equipamento<br />

Os procedimentos endocirúrgicos interventivos tradicionais<br />

requerem diversos tipos de endoscópios flexíveis<br />

e rígidos. A citoscopia rígida é realizada frequentemente<br />

em fêmeas para acessar à uretra, bexiga e ureteres. Os<br />

diâmetros recomendados situam-se entre 1,9 e 7,5 mm,<br />

consoante ao tamanho do paciente.<br />

Recorre-se a ureteroscópios flexíveis para explorar a<br />

uretra e bexiga de cães macho (2,5 a 3,4 mm), e<br />

acesso uretral em todos os animais com dimensões<br />

suficientes para permitir a aplicação destes diâmetros. Os<br />

nefroscópios rígidos são usados (2,8 a 7,3 mm de<br />

diâmetro) em nefrolitotomias percutâneas ou para<br />

ablação de tumores do trato urinário superior, numa<br />

abordagem anterógrada. Podem ser utilizados diversos<br />

tipos de litotriptores e lasers intracorpóreos nestes<br />

procedimentos, como os lasers ultrassônicos, pneumáticos,<br />

eletroidráulicos, de holmio: laser YAG (ítrio,<br />

alumínio, granada), e lasers de tipo díodo. A litotripsia<br />

extracorpórea por onda de choque (ESWL) é adequada<br />

para nefrólitos, urólitos e cistólitos caninos de menores<br />

dimensões.<br />

Na maioria dos procedimentos RI comuns a utilização de<br />

uma unidade de fluoroscopia tradicional é suficiente. Já<br />

Vol 17 No 1 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / 31


um equipamento de fluoroscopia com braço-C comporta<br />

a vantagem da mobilidade do intensificador de imagem,<br />

permitindo diversas visualizações tangenciais, sem<br />

mover o paciente. A ultrassonografia facilita o acesso de<br />

agulha percutânea ao interior dos vasos ou a outras<br />

estruturas (bexiga urinária, pélvis renal, etc.).<br />

São necessários fios condutores de diversos tamanhos,<br />

formas e grau de rigidez, bem como cateteres e stents,<br />

para cada intervenção (ver abaixo).<br />

Técnicas<br />

Rim e uréter<br />

> Colocação de um stent ureteral<br />

Procede-se à colocação de um stent ureteral no caso de<br />

diversos distúrbios, para desviar a urina da pelve renal<br />

para a bexiga urinária. Esta técnica pode revelar-se útil em<br />

pacientes com obstrução ureteral decorrente de uma<br />

urolitíase ou neoplasia obstrutiva ureteral ou trigonal<br />

(Figura 1), após ureteroscopia, nefrolitotomia percutânea,<br />

remoção de um cálculo ureteral (por meio de catéteres ou<br />

de litotripsia ureteral), em caso de anastomose ureteral<br />

pós-operatória, de laceração ou espasmo ureteral, ou de<br />

ureterite. Além disso, a presença de um stent ureteral<br />

pode favorecer uma dilatação ureteral passiva, de modo a<br />

permitir a passagem de ureterólitos até aí obstrutivos, ou<br />

de um ureteroscópio flexível para condução da intervenção<br />

ureteral indicada.<br />

Em caso de neoplasia ureteral, por exemplo, o acesso da<br />

nefrostomia percutânea através de uma técnica anterógrada<br />

pode realizar-se sob orientação de ultrassom<br />

(Figura 1A) ou fluoroscópica (Figura 2A), passando o fio<br />

condutor pelo uréter e interior da bexiga de forma a sair<br />

pela uretra (Figura 1B). O dilatador ureteral é inserido<br />

em sobreposição ao fio, numa abordagem retrógrada, de<br />

forma a dilatar a junção vésico-ureteral (Figura 1C), e<br />

então stent uretral pode ser deslocado (Figura 1D).<br />

> Nefrolitotomia percutânea (NLPC)<br />

A nefrolitíase ou as obstruções ureterais proximais,<br />

secundárias a ureterólitos, podem dar origem a insuficiência<br />

renal progressiva, piolonefrite intratável, hematúria,<br />

cólica ureteral e hidronefrose. Um cálculo bastante<br />

pequeno poderá passar, contudo, outros cálculos requerem<br />

cirurgia para aliviar a obstrução ou evitar danos permanentes<br />

nos néfrons. As nefrotomias, pielotomias ou<br />

ureterotomias são cirurgias invasivas e complicadas,<br />

passíveis de provocar uma morbidade significativa (1).<br />

Recentemente foi realizada uma nefrolitotomia percutânea.<br />

Trata-se de um procedimento pouco invasivo que tem<br />

como objetivo minimizar a morbidade e preservar ao<br />

máximo a função renal.<br />

32 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / Vol 17 No 1<br />

Figura 1.<br />

Imagem fluoroscópica abdominal lateral de um cão com 6,5kg e uma<br />

obstrução do uréter esquerdo, induzida por carcinoma celular transitório<br />

(TCC). A. Pielocentese percutânea com um cateter de calibre 18, e<br />

ureteropielografia de contraste apresentando hidronefrose (asterisco<br />

branco) e hidroureter (setas brancas). Setas pretas = cateter marcador do<br />

cólon. B. Colocação anterógrada de fio condutor e cateter hidrofílicos num<br />

ângulo de 0.035”(setas brancas), ao longo da obstrução e saindo através<br />

do pênis. C. Dilatação ureteral retrógrada com dilatador ureteral de 6Fr,<br />

colocado sobre o fio (setas brancas). D. Stent ureteral multifenestrado<br />

permanente de 4,7Fr x 12 cm (setas brancas) colocado desde a pélvis<br />

renal (asterisco branco) até à bexiga urinária (BU), para descompressão.<br />

Como descrito anteriormente, a ureteropielografia<br />

retrógrada requer o uso de cistoscopia e fluoroscopia. O<br />

acesso por cateter ureteral é mantido para proteger o<br />

uréter de uma eventual penetração de fragmentos do<br />

cálculo e permitir - se necessário - a repetição da<br />

intervenção. A abordagem retrógrada poderá não ser<br />

possível em gatos machos ou cães machos de raças<br />

pequenas, realizando-se o acesso anterógrado por via<br />

percutânea, com orientação fluoroscópica ou ultrassonográfica.<br />

Após inserir a agulha percutânea e o fio<br />

condutor até à pélvis renal, orientado por fluoroscopia, é<br />

introduzido um balão dilatador em sobreposição ao fio,<br />

para realizar a dilatação percutânea do trato até à pélvis<br />

renal, de forma a atingir as dimensões que permitam a<br />

colocação de uma bainha suficientemente grande (Figura<br />

2A), para permitir o acesso do nefroscópio com litotriptor.<br />

Procede-se à introdução do nefroscópio através da bainha<br />

de acesso e o nefrólito ou urólito proximal é identificado e<br />

fragmentado através de litrotripsia laser ultrassônica ou<br />

pneumática (Figuras 2B e 3). Se o cálculo for pequeno<br />

pode ser extraído através do canal de trabalho do<br />

nefroscópio. Os fragmentos são removidos por sucção,<br />

pinça de coleta, ou de um cesto urológico pela mesma via.<br />

Após a remoção do urólito (Figura 2C), coloca-se uma<br />

sonda de nefrostomia percutânea, durante 7 a 14 dias,<br />

para permitir o fechamento da via de acesso. Em caso de<br />

trauma ou inflamação ureteral, deverá optar-se pela<br />

colocação de um stent nefroureteral percutâneo (Figura 2D)<br />

ou de um stent ureteral duplo permanente «pigtail»<br />

(Figura 1D) mantendo a patência a partir da pele, indo<br />

através da pelve renal e descendo pelo ureter até a bexiga.


Figura 2.<br />

Imagem fluoroscópica lateral de um cão com nefrólitos bilaterais.<br />

A. Após nefrostomia percutânea, introdução de um fio condutor em<br />

toda a extensão e de uma guia de segurança (setas brancas), é<br />

colocada uma bainha de acesso (seta preta) até ao nefrólito<br />

(asterisco branco). B. Posiciona-se um nefroscópio com litotriptor de<br />

ultrassons (seta branca) no interior da bainha, o nefrólito é<br />

fragmentado (setas pretas) e procede-se à remoção dos fragmentos.<br />

C. Imagem fluoroscópica de um rim sem cálculos. D. Colocação de um<br />

stent nefro-ureteral (setas brancas) após litotripsia.<br />

Se houver suspeita de trauma ureteral, o stent deverá<br />

permanecer colocado durante 4 a 6 semanas (2).<br />

> Colocação de uma sonda de nefrostomia percutânea<br />

As obstruções ureterais, secundárias a ureterólitos ou a<br />

tumor canceroso, se forem bilaterais ou se ocorrerem em<br />

animais com insuficiência renal concomitante podem<br />

desencadear uma hidronefrose grave e/ou azotemia<br />

mortal. Alguns pacientes poderão receber cuidados<br />

paliativos até à passagem do urólito, no entanto outros<br />

requerem uma abordagem cirúrgica. As ureterotomias são<br />

cirurgias complicadas e relativamente longas para este<br />

tipo de doente que, em geral, se apresentam já<br />

debilitados. Uma possibilidade consiste na colocação de<br />

sonda de nefrostomia percutânea, para minimizar<br />

rapidamente a obstrução e verificar se há função renal<br />

adequada, antes de submeter o animal a uma anestesia<br />

prolongada para condução da manobra cirúrgica.<br />

O acesso à pelve renal com agulha percutânea efetua-se de<br />

acordo com o procedimento anteriormente descrito, com<br />

orientação ultrassonográfica (Figura 1A). Insere-se um fio<br />

condutor na pelve renal, conduzindo-o (se possível) até ao<br />

uréter, por expansão do trato com dilatadores sequenciais<br />

ou um sistema de dilatação por balão. Um cateter de<br />

drenagem com alça de fixação é avançado sobre o fio para<br />

formar uma alça no interior da pelve renal (Figura 4). O<br />

cateter é ligado a um sistema de coleta de urina e fixado à<br />

parede abdominal com sutura «finger-trap» e múltiplos<br />

pontos simples separados. A presença de sonda de<br />

nefrostomia facilita o acesso à urina produzida pelo rim,<br />

bem como a realização de posterior pieloureterografia de<br />

contraste ou intervenção ureteral percutânea (litotripsia,<br />

ENDO-UROLOGIA E RADIOLOGIA DE INTERVENÇÃO DO TRATO URINÁRIO<br />

Figura 3.<br />

Yorkshire Terrier, fêmea esterilizada,<br />

com 7 anos de idade. Imagem<br />

nefroscópica de um nefrólito de<br />

oxalato de cálcio no interior da pélvis<br />

renal. Trata-se da imagem<br />

endoscópica do cão referido na<br />

Figura 2B.<br />

NLPC, colocação de um stent, etc).<br />

> Ablação de ureter ectópico a laser, guiado por<br />

citoscopia<br />

Os ureteres ectópicos são uma malformação anatômica<br />

congênita, comum em cães com o orifício ureteral em<br />

posição distal ao trígono da bexiga, no interior da uretra,<br />

vagina, vestíbulo ou útero. Mais de 95% dos canídeos com<br />

ureteres ectópicos apresentam um transverso intramural e<br />

são candidatos a esta intervenção minimamente invasiva.<br />

Foi realizada com sucesso a reparação endoscópica dos<br />

ureteres ectópicos em mais de 20 cães, procedimento<br />

efetuado por meio de fluoroscopia, citoscopia e laser YAG:<br />

diodo ou holmio no decurso da citoscopia de diagnóstico.<br />

De forma geral, a correção cirúrgica de ureteres ectópicos<br />

revela resultados de incontinência persistente, com<br />

intervenção médica concomitante em aproximadamente<br />

40 a 71% dos casos, devido a incompetência do mecanismo<br />

do esfíncter uretral (SMI-Sphincter Mechanism<br />

Incompetence) (3,4). Até o momento, e de acordo com a<br />

experiência da autora, a continência tem sido mantida<br />

com (80%) ou sem (60%) medicação concomitante<br />

(fenilpropanolamina), graças a esta intervenção. Será<br />

necessário conduzir um estudo num número superior<br />

de casos com período de acompanhamento mais<br />

amplo que permita estabelecer comparação mais precisa<br />

entre estes procedimentos.<br />

> ESWL (Extracorporeal Shock-Wave Lithotripsy) para a<br />

nefro/ureterolitíase<br />

A litotripsia extracorpórea por onda de choque constituise<br />

em outra alternativa minimamente invasiva para<br />

remoção de cálculos do trato superior na pélvis renal, ou<br />

nos ureteres. Esta técnica utiliza ondas de choque<br />

externas que passam através de meio aquoso, através de<br />

orientação fluoroscópica em 2 planos. O cálculo é sujeito<br />

a cerca de 1.000 a 3.500 choques, com diferentes níveis<br />

de energia, de modo a permitir a sua implosão e<br />

pulverização. Aguarda-se cerca de 1 a 2 semanas para<br />

permitir a passagem dos fragmentos do cálculo através<br />

do uréter até à bexiga urinária. Trata-se de um<br />

procedimento realizável com segurança em nefrólitos<br />

Vol 17 No 1 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / 33


com menos de 5 mm e em ureterólitos inferiores a 3 mm.<br />

Para cálculos de maiores dimensões deverá colocar-se um<br />

stent ureteral duplo permanente «pigtail» antes da<br />

litotripsia ESWL para facilitar a expulsão dos fragmentos<br />

do cálculo. Para cálculos consideravelmente superiores,<br />

recomenda-se a NLPC (5-8).<br />

Bexiga e uretra<br />

> Litotripsia<br />

A litotripsia por laser é uma técnica inovadora que<br />

envolve a fragmentação intracorpórea de urólitos, com<br />

recurso de um citoscópio ou ureteroscópio rígido ou<br />

flexível. O primeiro relato de aplicação da litotripsia com<br />

laser de holmio data de 1995, em medicina humana (9).<br />

O laser de holmio: YAG (ítrio, alumínio, granada) é um<br />

laser pulsado de estado sólido que emite luz com 2.100 nm<br />

de comprimento de onda de infra-vermelhos (10). A<br />

energia é absorvida em menos de 0,5 mm de fluído, o que<br />

permite pulverização segura dos urólitos em zonas de<br />

dimensões reduzidas, como o interior da uretra, do<br />

ureter, da pelve renal ou da bexiga urinária, e risco<br />

limitado de danos uroteliais (10). Esta técnica combina a<br />

secção de tecidos e propriedades coagulantes, com a<br />

capacidade de fragmentar cálculos por contato (10).<br />

Fibras de diâmetro reduzido (200, 365, 550 microns) são<br />

guiadas através do canal de trabalho de citoscópios/<br />

ureteroscópios, flexíveis ou rígidos, também de pequeno<br />

diâmetro. Muito embora os diversos modelos de<br />

litotriptores comercializados apresentem ligeiras variações,<br />

a duração do pulsado dos lasers de holmio varia<br />

entre 250-750 micro-segundos, a energia do pulsado<br />

entre 0,2-4,0J/pulsos e a frequência entre 5-45Hz, com<br />

potência média situada entre 3,0-100W. A potência deve<br />

Figura 4.<br />

A. Radiografia abdominal dorsoventral de um cão com 6,5 kg,<br />

apresentando ureterólitos e nefrólitos bilaterais, após stent ureteral<br />

duplo «pigtail» (a seta branca corresponde ao lado direito; a seta<br />

amarela ao lado esquerdo) e colocação de uma sonda de nefrostomia<br />

(ponta da seta branca).<br />

B. Radiografia lateral do mesmo cão, destacando um «pigtail» do stent<br />

ureteral na pélvis renal (seta amarela) e outro na bexiga (seta preta), e<br />

a sonda de nefrostomia no rim direito (ponta da seta branca).<br />

34 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / Vol 17 No 1<br />

ser selecionada em função<br />

da utilização que se pretende<br />

dar ao equipamento.<br />

A energia do laser concentrase<br />

na superfície do urólito,<br />

orientada por citoscopia. A<br />

energia irradiada pelo laser<br />

pulsado é absorvida pela<br />

água existente no interior do<br />

urólito, produzindo um efeito<br />

fototérmico que provoca a<br />

fragmentação do cálculo. O<br />

laser de holmio exerce a sua<br />

ação no cálculo através de<br />

Figura 5.<br />

Imagem citoscópica de<br />

litotripsia por laser na bexiga<br />

urinária, devido a cálculos<br />

císticos. A fibra azul<br />

corresponde ao laser de<br />

hólmio: YAG, inserido no canal<br />

de trabalho do endoscópio.<br />

uma bolha de vapor, que se forma quando a energia do<br />

laser pulsado, propagada pela água existente na<br />

extremidade da fibra, se imobiliza dentro da bolha<br />

(efeito Moses). Se a ponta da fibra estiver posicionada a<br />

uma distância igual ou superior a 0,5 mm do tecido, a<br />

bolha de vapor desfaz-se, a água absorve a energia e não<br />

ocorre qualquer impacto. Se a extremidade se situar a<br />

menos de 0,5 mm do cálculo, a bolha de vapor entra em<br />

contato com o urólito e pulveriza-o. Quanto mais perto<br />

a ponta da fibra estiver do alvo, maior será o efeito. O<br />

cálculo deverá ser fragmentado até obtenção de<br />

pedaços suficientemente pequenos para serem<br />

removidos de forma normógrada através do orifício<br />

uretral, seja por via uroidropropulsão de esvaziamento,<br />

ou por meio de um cesto para cálculos. Este processo<br />

revela-se bastante útil em caso de cálculos ureterais,<br />

císticos e uretrais (Figura 5). Todos os tipos de cálculos<br />

podem ser fragmentados através de litotripsia por laser<br />

(11,12).<br />

Outras aplicações urológicas para a litotripsia por laser<br />

incluem: a incisão de estenoses uretrais e ureterais; a<br />

ablação de carcinoma de células de transição superficiais/<br />

adenocarcinoma prostático, no interior do lúmen uretral, e<br />

ablação de pólipos urinários com laser (Figura 6). Os<br />

pólipos da bexiga são comuns no cão e podem estar<br />

associados a infecções crônicas recorrentes do trato<br />

urinário e à formação de cistólitos, frequentemente<br />

confundidos com neoplasia cística. É possível remover os<br />

pólipos sem intervenção cirúrgica, através da cauterização<br />

do pedúnculo por citoscopia associada ao uso de cestos ou<br />

de litotripsia por laser.<br />

> Colocação de um stent uretral em obstruções malignas<br />

As obstruções malignas da uretra são responsáveis pelo<br />

mal-estar acentuado, disúria e azotemia não tratável.<br />

Mais de 80% dos animais com carcinoma celular


transitório (TCC) da uretra e/ou carcinoma prostático<br />

apresentam disúria e destes, aproximadamente 10%<br />

desenvolvem obstrução total do trato urinário (13-15). A<br />

quimioterapia e a radiação têm sido bem sucedidas no<br />

abrandamento do crescimento tumoral, mas a cura total é<br />

pouco comum. Face à manifestação de sinais de<br />

obstrução, preconiza-se uma terapia mais agressiva.<br />

Foram descritas outras abordagens: inserção de tubos de<br />

cistostomia, ressecções transuretrais e procedimentos<br />

cirúrgicos de desvio, no entanto, são intervenções<br />

invasivas potencialmente associadas a um resultado<br />

indesejável, devido à drenagem manual da urina,<br />

morbilidade, micções frequentes e infecção. A colocação<br />

de stents expansores metálicos, por orientação<br />

fluoroscópica e abordagem transuretral, pode revelar-se<br />

uma alternativa rápida, confiável e segura para a<br />

desobstrução uretral, tanto em machos quanto em<br />

fêmeas, considerando-se os resultados paliativos<br />

evidenciados: 86% bons a excelentes.<br />

A colocação de um stent uretral também pode ser útil em<br />

doentes com estenoses uretrais benignas ou dissinergia<br />

ref lexa, sempre que as terapias tradicionais não<br />

Figura 6.<br />

Imagem fluoroscópica abdominal lateral de um cão com Carcinoma<br />

Celular Transitório prostático e uretral. A. Cistouretrograma de<br />

contraste que evidencia extravasamento do contraste para o tecido<br />

prostático e atenuação do contraste devido a estreitamento uretral ao<br />

nível da próstata. (3) Cateter marcador de 2cm, colocado no interior do<br />

reto, para efeito de medição. (4) Medição do diâmetro uretral, caudal à<br />

uretra doente. B. Colocação de SEMS parcial durante a visualização<br />

fluoroscópica. C. Cistouretrograma de contraste, realizado<br />

imediatamente após a colocação de um stent total, que demonstra a<br />

desobstrução uretral.<br />

ENDO-UROLOGIA E RADIOLOGIA DE INTERVENÇÃO DO TRATO URINÁRIO<br />

produzam resultados, face a recusa ou não indicação da<br />

opção cirúrgica. Os casos de mortalidade animal após<br />

colocação de um stent uretral resultaram de causas não<br />

relacionadas com a obstrução urinária, na sua maioria<br />

associados a doença metastática distante (13).<br />

Realiza-se um cistouretrograma de contraste, avançando<br />

ao longo da constrição maligna com um fio condutor<br />

transuretral retrógrado ou anterógrado. Após medição do<br />

diâmetro normal da uretra e da extensão da obstrução<br />

procede-se à escolha de um stent uretral metálico autoexpansor<br />

(SEMS) (aproximadamente com mais 10 a 15%<br />

do que o diâmetro uretral e ultrapassando em 1cm a<br />

obstrução, em ambas as extremidades, cranial e caudal).<br />

O stent é colocado com orientação fluoroscópica,<br />

realizando-se novo cistouretograma de contraste para<br />

documentar a desobstrução uretral.<br />

> Implantação transuretral de colágeno na sub-mucosa<br />

Diversas instituições têm recorrido à aplicação de uma<br />

injeção de colágeno com monitoramento uretroscópico<br />

em casos de USMI. Trata-se de uma intervenção indicada<br />

nos casos em que a terapia médica para a SMI não tenha<br />

produzido resultados, esteja contra-indicada ou não seja<br />

tolerada. De forma geral, o sucesso da intervenção é<br />

excelente, muito embora a média de manutenção da<br />

continência, relatada após este procedimento, seja de 17<br />

meses, e bastante comum o recurso a de reaplicações daí<br />

em diante (16).<br />

Procede-se a sondagem da uretra por meio de um<br />

citoscópio rígido, identificando-se uma área no seu<br />

interior imediatamente caudal ao trígono da bexiga. É<br />

inserida uma agulha «heuber» com seringa, previamente<br />

Figura 7.<br />

Cadela Labrador Retriever esterilizada, com 4 anos de idade,<br />

apresentando SMI. A. Imagem citoscópica da uretra, imediatamente<br />

caudal ao trígono, anterior à aplicação da injeção de colágeno.<br />

B. Agulha Heuber com diâmetro 21, introduzida no canal de trabalho<br />

do citoscópio, logo após a primeira injeção de colágeno sub-mucosal.<br />

C. Após 3 injeções de colágeno, aplicadas da esquerda para a direita.<br />

D. Após a última injeção de colágeno.<br />

Vol 17 No 1 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / 35


ENDO-UROLOGIA E RADIOLOGIA DE INTERVENÇÃO DO TRATO URINÁRIO<br />

Figura 8.<br />

Cadela Labrador Retriever esterilizada, com 6 meses de idade e<br />

ureteres ectópicos bilaterais, visualizados através de citoscopia.<br />

A. Imagem citoscópica do orifício ureteral, na uretra distal (seta preta).<br />

B. Ablação por laser do uréter ectópico sob orientação citoscópica. O<br />

cateter amarelo encontra-se no interior do túnel ureteral protegendo a<br />

parede posterior do uréter (seta preta), enquanto a fibra de laser (seta<br />

branca) avança no lúmen ureteral, ao lado do cateter, cortando a<br />

membrana fina até ao lúmen uretral. C. Imagem da membrana ureteral,<br />

seccionada no interior do lúmen uretral, após intervenção com laser.<br />

D. Perspectiva citoscópica trigonal, 6 semanas após a intervenção: o<br />

novo orifício ureteral é visível no interior do lúmen vesical (seta<br />

branca). Boa cicatrização da membrana lisa (seta amarela).<br />

repleta de colágeno no canal de trabalho do citoscópio.<br />

Aplica-se uma injeção sub-mucosal, colocando uma<br />

vesícula no lúmen uretral. Este procedimento é efetuado<br />

em 3 a 4 áreas, de forma a criar um novo estreitamento<br />

no interior do lúmen uretral (Figura 7).<br />

> Cateterismo uretral anterógrado<br />

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />

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ureteral calculi: 153 cases (1984–2002). JAVMA 2005; 226: 937-944.<br />

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system. CVT XIV (in press), 2006.<br />

3. Mayhew P, Lee K, Gregory S, et al. Comparison of two surgical techniques for<br />

management of intramural ureteral ectopia in dogs: 36 cases (1994–2004).<br />

JAVMA 2006; 229: 389-393.<br />

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Clin Tech Small Anim Pract 2000; 15: 17-24.<br />

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lithotripsy. Vet Clin North America Small Anim Pract 1999; 29:293-302.<br />

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lithotripsy for treatmet of nephrolithiasis and ureterolithiasis in five dogs.<br />

JAVMA. 1996; 208: 531-536. Current Opinion in Urology 2002; 12: 277-280.<br />

7. Bartges JW, Kirk C, Lane IF, et al. Update: Management of calcium oxalate<br />

uroliths in dogs and cats. Vet Clin North Am Small Anim Pract<br />

2004; 34: 969-987.<br />

8. Lane IF. Lithotripsy: an update on urologic applications in small animals. Vet Clin<br />

North Am Small Anim Pract 2004; 34: 1011-1025.<br />

36 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / Vol 17 No 1<br />

O cateterismo uretral realiza-se por rotina em doentes<br />

veterinários. Ocasionalmente, pode revelar-se difícil<br />

efetuar um cateterismo retrógrado standard em fêmeas<br />

muito pequenas, fêmeas com tumores obstrutivos ou em<br />

felinos com dilaceração uretral (Figura 8A), na<br />

sequência de tentativas de desobstrução ou secundários<br />

a trauma.<br />

O cateterismo uretral anterógrado, realizado sob<br />

visualização fluoroscópica direta, pode ser efetuado de<br />

forma rápida, fácil e segura, em doentes nos quais as<br />

tentativas de condução de cateterismo retrógrado de<br />

rotina não tenha produzido resultados.<br />

A cistocentese é realizada sob anestesia geral, com um<br />

cateter de 18g, sobre a agulha e através da injeção de<br />

contraste para definir a bexiga urinária e a uretra<br />

(Figura 8B). Procede-se a introdução de um fio condutor<br />

na bexiga, através de abordagem anterógrada e<br />

monitorização fluoroscópica, descendente até à uretra e<br />

saindo pelo pênis ou pela vulva (Figura 8C). Insere-se<br />

um cateter urinário na bexiga (com pontas abertas ou<br />

«pigtail») por via retrógrada, em sobreposição ao fio<br />

(Figura 8D) e, em seguida, retira-se o fio condutor. O<br />

cateter urinário é fixado através do processo de rotina.<br />

> Outras situações<br />

A hematúria renal idiopática é uma doença muito rara<br />

relatada nos cães. A autora possui alguma experiência<br />

com este distúrbio e, caso os leitores estejam<br />

interessados, terá todo o prazer em compartilhar as suas<br />

opiniões. A cistotomia percutânea é analisada no artigo<br />

9. Denstedt JD,Razvi HA, Sales JL, et al. Preliminary experience with holmium:<br />

YAG laser lithotripsy. Endourology 1995; 9: 255-258.<br />

10. Wollin T, Denstedt J. The holmius laser in urology. J Clin Laser Med Surg 1998;<br />

16: 13-20.<br />

11. Davidson EB, Ritchey JW, Higbee RD, et al. Laser lithotripsy for treatment of<br />

canine uroliths. Vet Surg 2004; 33: 56-61.<br />

12. Bagley DH, Das A. Endourologic use of the holmium laser. Text: 2001. Tenton<br />

NewMedia, Jackson, WY.<br />

13. Weisse C, Berent A, Solomon J, et al. Evaluation of palliative stenting for<br />

management of malignant urethral obstructions in dogs. JAVMA 2006; 229:<br />

226-234.<br />

14. Knapp DW, Glickman NW, DeNicola DB, et al. Naturally occurring canine<br />

transitional cell carcinoma of the urinary bladder. A relevant model of human<br />

invasive bladder cancer. Urol Oncol 2000; 5: 47.<br />

15. Norris AM, Laing EJ, Valli VEO, et al. <strong>Canin</strong>e bladder and urethral tumors: a<br />

retrospective study of 115 cases (1980-1985). J Vet Intern Med 1992; 16:145.<br />

16. Barth A, Reichler IM, Hubler M, et al. Evaluation of long-term effects of<br />

endoscopic injection of collagen into the urethral submucosa for treatment of<br />

urethral sphincter incompetence in female dogs: 40 cases (1993-2000).<br />

JAVMA 2005; 226: 73.


Métodos para medir o<br />

potencial de cristalização<br />

da urina - RSS vs. APR<br />

William G. Robertson BSc, PhD, DSc<br />

O Dr. Robertson é bioquímico clínico e trabalha atualmente no<br />

Departamento de Fisiologia (Centro de Nefrologia) da <strong>Royal</strong> Free and<br />

University College Medical School, Londres, Inglaterra. Os principais<br />

interesses do Dr. Robertson são a urolitíase e as áreas de pesquisa<br />

relacionadas com estas afecções. Ao longo de 40 anos, o seu<br />

trabalho de pesquisa incidiu sobretudo sobre o campo da urolitíase<br />

humana mas, durante a última década tem supervisionado<br />

diversos projetos relacionados com a formação de cálculos em<br />

animais de companhia. Além disso, o Dr. Robertson colabora com a<br />

Lithoscreen, um serviço de monitorização dos pacientes que ele<br />

próprio fundou, com o objetivo de identificar a(s) causa(s) dos<br />

cálculos renais e preconizar o tratamento mais adequado para<br />

evitar a formação de novos cálculos.<br />

Abigail E. Stevenson PhD, BSc, MIBiol, Cbiol<br />

A Dra Stevenson formou-se com distinção na Universidade de<br />

Stirling, em 1992. Depois de trabalhar durante 6 meses na Universidade<br />

de Anchorage, Alasca, como assistente de pesquisa foi nomeada<br />

para o cargo de técnica de pesquisa do Centro de Nutrição<br />

WALTHAM para Animais de Companhia para estudar o metabolismo<br />

da vitamina A e da taurina em felinos. Em 1995, foi promovida a<br />

Cientista de Pesquisa, passando a trabalhar na área da saúde do<br />

trato urinário, tema sobre o qual apresentou a sua tese de<br />

doutorado em 2002. Recentemente, a Dra Stevenson aceitou um<br />

cargo na área de Comunicações Científicas da WALTHAM.<br />

Para médicos e pesquisadores é extremamente útil<br />

conseguir prever a probabilidade de cristalização, em<br />

urina recém coletada, dos sais e ácidos responsáveis<br />

pela formação de cálculos. Trata-se de um fator que<br />

tanto se aplica aos estudos conduzidos em seres<br />

humanos como em animais de companhia. No caso dos<br />

primeiros, os cinco principais componentes dos cálculos<br />

são o oxalato de cálcio (OxCa), o fosfato de cálcio (PCa),<br />

o fosfato de amônio magnesiano (FAM ou estruvita), o<br />

ácido úrico (AU) e a cistina. Nos animais de companhia,<br />

os dois principais constituintes são OxCa e estruvita,<br />

embora tenham sido relatados alguns casos de cistina, e<br />

de urato de amônio em certas raças de cães, por<br />

exemplo, Dálma-tas. Enquanto o PCa e o AU são<br />

bastante comuns nos cálculos dos seres humanos,<br />

raramente constituem os componentes primários<br />

dos cálculos observados nos animais de companhia.<br />

O principal fator que determina o potencial de<br />

cristalização da urina é o nível de supersaturação das<br />

diversas substâncias responsáveis pela formação dos<br />

cálculos. O conceito de supersaturação é abordado<br />

detalhadamente na presente edição, no artigo assinado<br />

por Vincent Biourge (ver página 41). Em síntese, a<br />

literatura apresenta dois métodos principais para<br />

avaliar a supersaturação urinária – a Supersaturação<br />

Relativa (RSS) e a Razão do Produto de Atividade<br />

(APR). Ambos os métodos têm origem em estudos<br />

realizados em urina humana, no final dos anos 60 (1) e<br />

início dos anos 70 (2), mas apenas foram transpostos<br />

para o campo dos animais de companhia durante a<br />

última década. De forma geral, a RSS foi adotado como<br />

método de eleição pela pesquisa veterinária, no RU e na<br />

Europa. Nos EUA, tem sido aplicada uma combinação do<br />

Vol 17 No 1 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / 37


Tabela 1.<br />

Resumo dos valores RSS calculados em equilíbrio, em diversas amostras de urina, através dos sistemas<br />

SUPERSAT e EQUIL (de 3)<br />

RSS do OxCa RSS da estruvita<br />

Solução de equilíbrio<br />

SUPERSAT EQUIL SUPERSAT EQUIL<br />

Solução inorgânica 1,00 ± 0,01 (n=14) 1,01 ± 0,01 (n=14) 0,99 ± 0,02 (n=6) 4,70 ± 0,70** (n=6)<br />

Urina humana 1,00 ± 0,06 (n=6) 1,01 ± 0,07 (n=6) 0,99 ± 0,05 (n=6) 6,57 ± 0,67** (n=6)<br />

Urina canina 1,21 ± 0,03 (n=6) 1,52 ± 0,03* (n=6) 1,48 ± 0,25 (n=3) 6,61 ± 1,17* (n=3)<br />

Urina felina 0,97 ± 0,03 (n=6) 1,14 ± 0,03* (n=6) 1,35 ± 0,15 (n=4) 5,74 ± 0,58* (n=4)<br />

* EQUIL > SUPERSAT (P> SUPERSAT (P


MÉTODOS PARA MEDIR O POTENCIAL DE CRISTALIZAÇÃO DA URINA - RSS vs. APR<br />

inibidores de cristalização sobre a taxa de obtenção de<br />

equilíbrio entre a solução e os cristais), poderá<br />

argumentar-se que constitui um método razoável de<br />

medição global da supersaturação e da atividade<br />

inibitória, em conjunto. De fato, à primeira vista esta<br />

teoria poderá ter algum mérito. No entanto, o APR acaba<br />

por ser uma função de outros fatores, tal como a<br />

supersaturação e os inibidores. Estima-se que, no total,<br />

resulte no mínimo de cinco fatores: (a) do nível de<br />

supersaturação inicial da urina, (b) das concentrações<br />

dos vários inibidores e promotores urinários, (c) do<br />

oxalato inicial: razão inicial de oxalato: cálcio na urina<br />

(Figura 1), (d) da fraca densidade da mistura de cristais<br />

e urina (ex. massa de cristais adicionada por unidade de<br />

volume de urina) (Figura 2) e (e) do tempo de<br />

incubação (arbitrariamente, estabelecido em 48 horas,<br />

pelos criadores originais deste método) (Figura 3). Uma<br />

vez que os primeiros quatro fatores podem influenciar a<br />

curva do produto de atividade real, por oposição ao<br />

tempo de incubação de uma urina com excesso de<br />

cristais de OxCa ou PCa, a inclinação da curva de<br />

supersaturação pode variar consideravelmente em<br />

termos de forma, frente à alteração de qualquer uma<br />

destas variáveis (ex. como na Figura 2). Muito embora a<br />

baixa densidade e o tempo de incubação sejam<br />

estabelecidos de forma arbitrária, as variações na<br />

razão oxalato: cálcio podem dar origem a diferenças<br />

acentuadas na quantidade de OxCa precipitada<br />

(Figura 1). Presumivelmente, a quantidade de OxCa<br />

precipitada (ex. cristalúria) é a variável que determina<br />

o risco de formação de cálculos com o maior grau de<br />

proximidade.<br />

Considere-se, por exemplo, duas urinas simples que<br />

representem exatamente o mesmo produto de<br />

atividade inicial (APt=0), mas com concentrações iniciais<br />

de cálcio distintas<br />

(TCa t=0) e de oxalato (TOx t=0).<br />

Urina 1: TCa t=0= 10mmol/L e TOx t=0 = 0,4mmol/L<br />

Urina 2: TCa t=0= 5mmol/L e TOx t=0= 0,8mmol/L<br />

Ambas representarão o mesmo AP t=0= 4.<br />

Suponhamos que ambas possuem um AP t=48 = 1,96<br />

idêntico às 48 horas, o que lhes atribuiria valores idênticos<br />

de APR de 4/1,96 = 2,04, de acordo com os autores do<br />

cálculo original. Contudo, quando se calcula a quantidade<br />

de OxCa precipitado em cada urina, para atingir um AP t=48<br />

de 1,96 às 48 horas, a urina 1 sofrerá uma precipitação de<br />

0,2 mmol/L de OxCa e a urina 2 de 0,376 mmol/L de<br />

OxCa, o que representa quase o dobro da urina 1. A lógica<br />

aponta para um maior potencial de formação de cálculos<br />

por parte da urina 2 comparativamente à urina 1, muito<br />

embora ambas representem os mesmo valores de APR!<br />

Continuando a usar as mesmas amostras de urina,<br />

consideremos agora que a urina 2 precipita a mesma<br />

Volume de cristais de OxCa (mm 3 /L)<br />

100<br />

80<br />

60<br />

40<br />

RSS OxCa<br />

17<br />

15<br />

14<br />

20<br />

Urina felina<br />

Urina canina<br />

Urina humana<br />

0<br />

0.01 0.1 1 10<br />

Logaritmo oxalato/cálcio (mmol/mmol)<br />

Figura 1.<br />

Relação entre a cristalúria de OxCa e a razão urinária de Ox/Ca.<br />

Logaritmo SSR de OxCa<br />

15<br />

10<br />

5<br />

0.01 g CaOx/ 20 mL<br />

0.10 g CaOx/20 mL<br />

1.00 g CaOx/20 mL<br />

0<br />

0 2 4 6 8<br />

PS**<br />

10<br />

Tempo (dias)<br />

Figura 2.<br />

Efeito da baixa densidade (concentração de cristais) e do tempo de<br />

incubação na abordagem da RSS em equilíbrio, na urina humana.<br />

*Produto de formação, ** Produto de solubilidade<br />

APR calculado<br />

15<br />

10<br />

5<br />

0.01 g CaOx/ 20 mL<br />

0.10 g CaOx/20 mL<br />

1.00 g CaOx/20 mL<br />

Figura 3.<br />

Efeito da baixa densidade (concentração de cristais) e do tempo de<br />

incubação no valor do APR na urina humana, calculado através dos<br />

dados da Figura 2.<br />

*Produto de formação, ** Produto de solubilidade<br />

PF*<br />

PF*<br />

0<br />

0 2 4 6 8<br />

SP**<br />

10<br />

Tempo (dias)<br />

Vol 17 No 1 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / 39


MÉTODOS PARA MEDIR O POTENCIAL DE CRISTALIZAÇÃO DA URINA - RSS vs. APR<br />

quantidade de OxCa que a urina 1 durante 48 horas.<br />

Esta situação traduz-se num APR calculado de 1,96 na<br />

urina 1, tal como sucedeu anteriormente, e um APR de<br />

1,39 na urina 2, o que sugere que esta última comporta<br />

um potencial de formação de cálculos bastante inferior<br />

à da urina 1, ainda que ambas precipitem a mesma<br />

quantidade de cristais de OxCa!<br />

Podem aplicar-se os mesmos argumentos à medição do<br />

APR no caso da estruvita.<br />

Em resumo, tanto o numerador como o denominador da<br />

expressão para determinar o APR são suspeitos, no caso<br />

do OxCa, ou no caso da estruvita. O numerador do APR<br />

calculado através do sistema EQUIL sobrestima a RSS<br />

para o OxCa e para a estruvita (sobretudo no caso do<br />

último) na urina de cães e gatos. O denominador da<br />

expressão do APR depende consideravelmente da baixa<br />

densidade de cristais e do tempo de incubação,<br />

utilizados nos estudos de equilíbrio. Assim, esta<br />

medição, também denominada “atividade inibitória”,<br />

pode ser artificialmente induzida para produzir um<br />

resultado baixo ou alto, consoante as condições do<br />

ensaio. O denominador também está dependente da<br />

RSS da urina original e da razão urinária de Ox/Ca.<br />

Embora o risco de formação de cálculos seja uma função<br />

decorrente ou do aumento do nível de supersaturação –<br />

em termos dos sais de formação de cálculos – ou da<br />

diminuição do nível de atividade inibitória na urina, o<br />

APR por si só, e na sua forma original, não pode ser<br />

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />

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normal and stone-forming urines. Br Med J 1966; 1: 450-453.<br />

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Acta 1969; 24: 149-157.<br />

40 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / Vol 17 No 1<br />

usado de forma confiável para avaliar globalmente o<br />

potencial de formação de cálculos de uma amostra de<br />

urina, uma vez que depende, em larga escala, das<br />

condições dos estudos de equilíbrio, do RSS e do Ox/Ca<br />

da urina original, como anteriormente mencionado. Em<br />

teoria, o melhor método para medir o risco de formação<br />

de cálculos será o RSS (calculado através do SUPERSAT,<br />

e não do EQUIL, pelas razões indicadas na Tabela 1) em<br />

conjunto com as concentrações dos inibidores reais de<br />

cristalização, com valores determinados na urina. Na<br />

rotina apenas se realiza a medição do citrato e do<br />

magnésio na urina dos animais de companhia, dentre os<br />

inibidores detectáveis da urina humana. Destes, o<br />

citrato constitui um potente inibidor da cristalização<br />

dos sais de cálcio, muito embora na urina dos animais<br />

de companhia seja observado apenas em concentrações<br />

muito baixas, sendo improvável que possua alguma<br />

relevância para a determinação do risco de formação de<br />

cálculos. O magnésio é um inibidor muito fraco da<br />

cristalização dos sais de cálcio, e não evidenciou<br />

qualquer diferença na urina de animais com formação<br />

de cálculos e na urina de animais em que esse fenômeno<br />

não se produziu. Ainda não foi determinada a existência<br />

ou inexistência de inibidores não identificados de<br />

cristalização na urina dos animais de companhia. Até<br />

o presente momento a medição da supersaturação<br />

urinária através da RSS continua a ser o método mais<br />

eficaz para determinar o risco de formação de cálculos<br />

em gatos e em cães.<br />

4. Werness PG, Brown CM, Smith LH, et al. EQUIL 2: A BASIC computer program for<br />

the calculation of urinary saturation. J Urol 1985; 134: 1242-1244.<br />

5. Robertson WG, Jones JS, Heaton MA, et al. Predicting the crystallization<br />

potential of urine from cats and dogs with respect to calcium oxalate and<br />

magnesium ammonium phosphate (Struvite). J Nutrition 2002; 132:1637S-<br />

1641S.<br />

6. Robertson WG, Markwell PJ. Predicting the calcium oxalate crystallisation<br />

potential of cat urine. WALTHAM <strong>Focus</strong> 9, issue 3, 32-33.


Diluição urináriaum<br />

fator-chave na prevenção<br />

de urólitos de estruvita e de<br />

oxalato de cálcio<br />

Vincent Biourge, DVM, PhD, Dipl. ACVN,<br />

Dipl. ECVCN<br />

Centro de Pesquisa <strong>Royal</strong> <strong>Canin</strong>, Aimargues, França<br />

O Dr. Biourge é formado pela Faculdade de Medicina<br />

Veterinária da Universidade de Liége (Bélgica), em 1985.<br />

Foi assistente no Departamento de Nutrição durante 2<br />

anos, antes de ingressar no Hospital Veterinário da<br />

Universidade de Pensilvânia (Filadélfia, EUA) e, mais tarde,<br />

no Hospital Veterinário da Califórnia (Davis, EUA) onde<br />

realizou o doutorado e residência em Nutrição Clínica. Em<br />

1993, apresentou sua tese de doutorado em Nutrição, na<br />

Universidade da Califórnia, e obteve o diploma do Colégio<br />

Americano de Nutrição Veterinária. Em 1994, entrou para o<br />

Centro de Pesquisa <strong>Royal</strong> <strong>Canin</strong>, em Aimargues (França),<br />

como Diretor de Comunicação Científica e Nutricionista.<br />

Desde Janeiro de 1999, é o responsável pelo programa de<br />

pesquisa nutricional <strong>Royal</strong> <strong>Canin</strong>.<br />

pH urinário, estruvita e oxalato<br />

de cálcio<br />

Em meados dos anos 80 a descoberta de que um pH<br />

urinário alcalino (pH >6,5) constituía o principal fator<br />

da patofisiologia dos cristais e cálculos de estruvita,<br />

levou a indústria a reformular as suas dietas (1,2). De<br />

PONTO DE VISTA ROYAL CANIN<br />

PONTOS-CHAVE<br />

➧ A forma mais fácil de reduzir a supersaturação<br />

urinária e, consequentemente, os riscos de<br />

formação de cristais, é aumentar o volume da urina.<br />

➧ O aumento do teor de cloreto de sódio (NaCl) na dieta<br />

aumenta a ingestão de água, bem como, a produção<br />

de urina e diminui a supersaturação urinária.<br />

➧ Pode ser formulada uma única dieta acidificante,<br />

moderadamente suplementada com NaCl, tanto<br />

para a prevenção de urólitos de estruvita e de<br />

oxalato de cálcio, como para a dissolução de<br />

cálculos de estruvita.<br />

acordo com os especialistas, a generalização das<br />

chamadas “dietas acidificantes” conseguiu induzir uma<br />

diminuição assinalável da prevalência de gatos com<br />

sinais de obstrução uretral levados às clínicas veterinárias<br />

(1). Por outro lado, também iniciaram-se os debates<br />

dentro da comunidade veterinária sobre os potenciais<br />

riscos para a saúde, associados à superacidificação (2).<br />

O fato é que a patofisiologia dos urólitos de OxCa não foi<br />

ainda totalmente elucidada e que a sua associação às<br />

dietas acidificantes pode resultar da confusão com<br />

outros fatores, como o aumento da esperança de vida<br />

dos animais de companhia, bem como de alterações<br />

introduzidas na formulação dos alimentos ao longo<br />

deste período(3). Além disso, esta associação não se<br />

aplica aos cães, para os quais as dietas acidificantes são<br />

muito menos comuns.<br />

Vol 17 No 1 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / 41


PONTO DE VISTA ROYAL CANIN<br />

Figura 1.<br />

Zonas de supersaturação relativa (RSS). (modificado a partir de 7)<br />

Contrariamente aos cristais de estruvita, a solubilidade dos cristais<br />

de oxalato é muito reduzida. No caso do OxCa, é quase impossível<br />

obter um valor de RSS inferior a 1.<br />

RSS<br />

OxCa 12<br />

Estruvita<br />

2,5<br />

Com base em estudos epidemiológicos que associam o<br />

potencial das dietas acidificantes aos riscos de formação<br />

de cálculos de OxCa, uma corrente de pesquisadores<br />

acredita que o pH urinário constitui o fator mais<br />

importante na prevenção da recorrência de urólitos de<br />

OxCa (4). De acordo com esta teoria, é impossível<br />

formular uma dieta que previna, simultaneamente, a<br />

formação de cálculos de estruvita e de OxCa, uma vez<br />

que o primeiro requer pH urinário baixo, enquanto o<br />

segundo requer pH mais alcalino.<br />

pH urinário e supersaturação relativa<br />

Considerado isoladamente, o pH da urina não permite<br />

avaliar o risco de formação de cristais de OxCa no trato<br />

urinário, sendo que a supersaturação urinária relativa<br />

(RSS) constitui uma ferramenta bem mais eficaz. Tratase<br />

do método utilizado com maior<br />

frequência em seres humanos e que já foi<br />

validado, tanto em urina canina, como felina<br />

(5), (Consultar artigo de B. Robertson e A.<br />

Stevenson, na página 37).<br />

A formação, crescimento e dissolução dos cristais<br />

urinários depende das concentrações dos<br />

minerais de que são compostos (ex: cálcio e<br />

oxalato) e passíveis de reagir livremente entre si<br />

(5). É possível calcular as frações de cálcio e<br />

oxalato. O produto das concentrações dessas<br />

frações livres denomina-se produto de<br />

atividade. Define-se a RSS de um determinado<br />

sal como a razão do produto de atividade,<br />

dividido pelo produto de solubilidade termodinâmica<br />

para o sal em questão.<br />

42 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / Vol 17 No 1<br />

SUPERSATURAÇÃO INSTÁVEL<br />

Cristalização espontânea<br />

Rápido crescimento de cristais<br />

Produto de formação<br />

SUPERSATURAÇÃO METASTÁVEL<br />

Sem dissolução de cristais<br />

Sem cristalização espontânea<br />

Produto de solubilidade<br />

SUB-SATURAÇÃO<br />

Sem cristalização<br />

Dissolução dos cristais<br />

RSS OxCa<br />

O produto de solubilidade termodinâmica consiste na<br />

quantidade máxima de um determinado sal que pode<br />

ser dissolvida num solvente (ex. água), a uma dada<br />

temperatura (ex. 37°C) e com um determinado pH<br />

(ex. 6.0).<br />

- RSS 1 significa que a urina se encontra supersaturada<br />

e que pode ocorrer formação de cristais, mas<br />

não a sua dissolução.<br />

Num meio complexo como a urina, é possível observar<br />

um RSS de OxCa ou de estruvita acima de 1, sem<br />

ocorrer precipitação espontânea de cristais (6), nível<br />

que se classifica como supersaturação metastável<br />

(Figura 1). Neste nível de saturação, os cristais de OxCa<br />

não se formam espontaneamente, mas podem surgir em<br />

presença de um núcleo.<br />

Com teores mais elevados de minerais na urina, os cristais<br />

produzem-se de forma espontânea em alguns minutos<br />

a horas e designa-se por supersaturação instável<br />

(Figura 1). O limite entre a supersaturação metastável e<br />

instável é denominado produto de formação. Estudos<br />

de precipitação cinética de urina demonstraram que a RSS<br />

do produto de formação se situa em 2,5 no caso da<br />

estruvita e em 12 para o OxCa. O cálculo do RSS, com base<br />

na urina de cães e gatos alimentados com dieta específica,<br />

pode ser utilizado para estudar o efeito exercido por<br />

esse alimento no potencial de cristalização da urina (5,6).<br />

Tanto as dietas comerciais, como experimentais, foram<br />

Dados individuais de 125 dietas<br />

RSS de OxCa reduzida apesar do pH baixo<br />

Alimento seco<br />

Alimento úmido<br />

Produto de<br />

formação<br />

pH urinário<br />

Produto de<br />

solubilidade<br />

5 5.5 6 6.5 7 7.5 8 8.5<br />

Figura 2.<br />

Relação entre o pH urinário e os cristais de oxalato de cálcio (OxCa) em gatos<br />

saudáveis.


DILUIÇÃO URINÁRIA- UM FATOR-CHAVE NA PREVENÇÃO DE URÓLITOS DE ESTRUVITA E DE OXALATO DE CÁLCIO<br />

avaliadas através deste método pelos nossos serviços no<br />

Centro WALTHAM de Nutrição Animal, assim como por<br />

outros pesquisadores. Como previsto, os estudos<br />

comprovaram que as dietas caninas e felinas podem ser<br />

formuladas para induzir urina sub-saturada (RSS


DILUIÇÃO URINÁRIA- UM FATOR-CHAVE NA PREVENÇÃO DE URÓLITOS DE ESTRUVITA E DE OXALATO DE CÁLCIO<br />

Figura 4.<br />

Relação entre a supersaturação relativa (RSS) do sódio dietético e do oxalato de cálcio<br />

(OxCa).<br />

RSS de OxCa<br />

cães saudáveis são também eficazes em cães com<br />

urólitos de OxCa. O maior teor de umidade diminuiu<br />

igualmente o RSS do OxCa em gatos com predisposição<br />

para a formação de cálculos (12).<br />

Estudos epidemiológicos conduzidos sobre os fatores<br />

dietéticos e a prevalência de cálculos de OxCa em cães e<br />

gatos apresentaram conclusões semelhantes quanto aos<br />

benefícios do sódio e do teor de umidade da dieta<br />

(2,13,14).<br />

Sódio dietético e excreção de cálcio<br />

A ligação entre o Na dietético e a excreção urinária de Ca<br />

levou a teoria que as dietas com teor elevado de sódio<br />

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />

1. Osborne CA, Kruger JM, Lulich JP, et al. Feline Lower Urinary Tract Diseases.<br />

In: Ettinger S & Feldman E (eds). Textbook of Veterinary Internal medicine.<br />

WB Saunders, Philadelphia 2000, pp 1710-1746.<br />

2. Kirk CA, Ling GV, Franti CE, et al. Evaluation of factors associated with<br />

development of calcium oxalate urolithiasis in cats. J Am Vet Med Assoc<br />

1995; 207:1429-1434.<br />

3. Stevenson AE, Blackburn JM, Markwell PJ, et al. Nutrient intake and urine<br />

composition in calcium oxalate stone-forming dogs: comparison with<br />

healthy dogs and impact of dietary modification. Vet Ther 2004; 5: 218-231.<br />

4. Bartges JW, C Kirk, IF Lane. Update: management of calcium oxalate<br />

uroliths in dogs and cats. Vet Clin North Am Small Anim Pract 2004; 34:<br />

969-987.<br />

5. Robertson WG, Jones JS, Heaton MA, et al. Predicting the crystallisation<br />

potential of urine from cats and dogs with respect to calcium oxalate and<br />

magnesium ammonium phosphate (struvite). J Nutr 2002; 132: 1637s-<br />

1641s.<br />

6. Markwell PJ, Smith BHE, McCarthy KP. A non-invasive method for assessing<br />

the effect of diet on urinary calcium oxalate and struvite relative<br />

supersaturation in the cat. Animal Technology 1999; 50: 61-67.<br />

7. Stevenson AE, Markwell P. A comparison of urine parameters produced by<br />

healthy Labradors and Miniature Schnauzers. Am J Vet Res 2001; 62: 1782-<br />

1786.<br />

44 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / Vol 17 No 1<br />

Na < 0,5% Na > 0,5%<br />

20<br />

18<br />

Alimento seco Alimento úmido<br />

16<br />

14<br />

Produto de<br />

12<br />

formação<br />

10<br />

8<br />

6<br />

Produto de<br />

4<br />

solubilidade<br />

2<br />

0<br />

0.00 0.20 0.40 0.60 0.80 1.00 1.20 1.40 1.60 1.80 2.00<br />

Na Dietético (% MS)<br />

poderiam promover a formação de cálculos<br />

de oxalato de cálcio em cães e em gatos,<br />

recomendando-se, por isso, a incorporação<br />

de baixo teor de Na (1,11) nos alimentos<br />

formulados para o manejo da DTUI. Apesar<br />

da maior ingestão de sódio estar associada<br />

ao aumento da excreção de cálcio, a concentração<br />

deste mineral não aumenta, devido<br />

ao acréscimo concomitante do volume<br />

urinário, sendo observada uma diminuição<br />

significativa do RSS de OxCa (11).<br />

Conclusão<br />

Foi demonstrado que o RSS constitui<br />

instrumento valioso para avaliar o efeito dos<br />

fatores dietéticos na saturação urinária. No<br />

entanto, são necessários estudos mais<br />

aprofundados para compreender a<br />

patofisiologia dos urólitos de OxCa, as variações<br />

individuais e as especificidades das raças, bem como,<br />

para descobrir outras estratégias que possam influenciar<br />

as concentrações em minerais da urina.<br />

Tanto os nossos resultados, como os estudos publicados,<br />

sugerem fortemente que o aumento do teor de umidade<br />

e/ou de NaCl em dieta acidificante, reduz os riscos de<br />

formação de cristais de OxCa e de estruvita (3,7,10-12). Até<br />

à data, não existem dados publicados que sustentem um<br />

eventual efeito nocivo desta estratégia nutricional em gatos<br />

saudáveis.<br />

8. Burger I, Anderson RS, Holme DW. Nutritional factors affecting water<br />

balance in dog and cat. In: Anderson RS (ed). Nutrition of the Cat and Dog.<br />

Pergamon Press, Oxford 1980, pp. 145-156.<br />

9. Biourge V, Devois C, Morice G, et al. Increased Dietary NaCl significantly<br />

increases urine volume but does not increase urinary calcium oxalate<br />

supersaturation in healthy cats. Proceedings of the 19th American<br />

Congress of Veterinary Internal Medicine, Denver, Colorado, 2001, pp. 866.<br />

10. Hawthorne AJ, Markwell PJ. Dietary sodium promotes increased water<br />

intake and urine volume in cats. J Nutr 2004; 134: 2128s-2129s.<br />

11. Lulich JP, Osborne CA, Sanderson SL. Effects of dietary supplementation<br />

with sodium chloride on urinary relative supersaturation with calcium<br />

oxalate in healthy dogs. Am J Vet Res 2005; 66: 319-324.<br />

12. Lulich JP, Osborne CA, Lekcharoensuk C, et al. Effects of diet on urine<br />

composition of cats with calcium oxalate urolithiasis. J Am Anim Hosp<br />

Assoc 2004; 40: 185-191.<br />

13. Lekcharoensuk C, Osborne CA, Lulich JP, et al. Association between<br />

dietary factors and calcium oxalate and magnesium phosphate<br />

urolithiasis in cats. J Am Vet Med Assoc 2001; 219:1228-1237.<br />

14. Lekcharoensuk C, Osborne CA, Lulich JP, et al. Associations between dry<br />

dietary factors and canine calcium oxalate. Am J Vet Res 2002; 63:330-<br />

337.


Sal, hipertensão<br />

e doença renal crônica<br />

Scott A. Brown, VMD, PhD, Dipl. ACVIM<br />

Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade da<br />

Geórgia, Athens, Geórgia, EUA<br />

O Dr. Brown é formado em Medicina Veterinária em 1982, na<br />

Universidade da Pensilvânia. Completou internato e<br />

residência em Medicina Interna de Pequenos Animais no<br />

Hospital Escolar da Universidade da Geórgia, em 1986. Em<br />

1987 obteve a certificação em Medicina Interna pelo Colégio<br />

Americano de Medicina Interna Veterinária. Entre 1984 e<br />

1989, o Dr. Brown concluiu seu Doutorado em Patofisiologia<br />

Renal, na Universidade da Geórgia. Desde 1989 faz parte do<br />

corpo docente desta Universidade, com cargo conjunto nos<br />

Departamentos de Fisiologia e de Medicina de Pequenos<br />

Animais, onde é atualmente Professor de Fisiologia. As suas<br />

áreas de interesse na pesquisa incidem na progressão da<br />

doença renal crônica e na hipertensão sistêmica.<br />

Foi sugerido que em gatos com doença renal crônica<br />

(DRC) possa existir relação entre a pressão sanguínea<br />

elevada, aporte excessivo de sal (NaCl) e a expansão do<br />

volume de fluído extracelular. O sódio e o cloro são os<br />

principais eletrólitos do fluído extracelular e, de uma<br />

forma geral, restritos a este compartimento de fluído.<br />

Deste modo, alterações no teor corporal total de NaCl<br />

irão eventualmente conduzir a alterações correspondentes<br />

no volume de fluído extracelular. Como o<br />

volume de fluído extracelular constitui fator<br />

determinante no valor da pressão sanguínea, a<br />

regulação do teor corporal de NaCl é fator central no<br />

controle da pressão arterial. Em virtude da<br />

importância do teor corporal de NaCl torna-se evidente<br />

a complexidade do seu equilíbrio, que depende de<br />

mecanismos de regulação renais, hormonais e neurais.<br />

As alterações do teor corporal de NaCl são devidas à<br />

diferenças entre o aporte e a excreção. Infelizmente, a<br />

regulação fisiológica do aporte gastrintestinal e da<br />

excreção fecal é muito reduzida. Por causa disso,<br />

os mecanismos centrais de regulação do sódio<br />

localizam-se nos rins, nos quais variações do aporte de<br />

NaCl conduzem a alterações compensatórias da<br />

excreção urinária (1). Apesar da capacidade do rim<br />

para manter o equilíbrio do teor corporal total de NaCl<br />

se tratar de um mecanismo renal inerente, pode ser<br />

modulada por uma variedade de fatores neurohumorais<br />

e por processos patológicos. Por exemplo, existem<br />

sensores de volume nos átrios, no ventrículo direito,<br />

e em inúmeros vasos sanguíneos. A distensão<br />

destes receptores de volume (geralmente, devido à<br />

expansão do volume de fluído extracelular) provoca um<br />

aumento da excreção renal de sódio, mediada pela<br />

secreção da hormônio natriurético atrial e, também, por<br />

alteração da atividade nervosa renal. Existem,<br />

adicionalmente, outros fatores hormonais que<br />

modulam o controle renal de NaCl. É neste grupo de<br />

fatores que se incluem a angiotensina e a aldosterona,<br />

ambas responsáveis por um decréscimo da excreção<br />

renal de sódio.<br />

Assim como foi referido anteriormente, os gatos com<br />

DRC apresentam uma elevada prevalência de<br />

hipertensão sistêmica (2,3). Uma vez que a alteração da<br />

função renal pode influenciar a pressão sanguínea<br />

através dos efeitos exercidos sobre a excreção de<br />

sódio e sobre a homeostase dos fluídos corporais, tem<br />

Vol 17 No 1 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / 45


SAL, HIPERTENSÃO E DOENÇA RENAL CRÔNICA<br />

sido colocada a hipótese de que a suplementação da<br />

dieta com sal poderia agravar a hipertensão em gatos<br />

com DRC, através da indução de uma expansão de<br />

volume.<br />

Efetivamente já foram estudados os efeitos da ingestão<br />

de sódio dietético sobre a pressão sanguínea. Em várias<br />

linhagens de ratos que apresentavam redução da massa<br />

renal, o consumo de teores elevados de NaCl<br />

aumentou a pressão arterial, efeito que se designa por<br />

sensibilidade ao sal (4). No entanto, algumas linhagens<br />

de ratos são insensíveis ao sal (5), porque os seus rins<br />

conseguem compensar as alterações na ingestão de<br />

NaCl impedindo assim, oscilações da pressão sanguínea.<br />

Curiosamente, a maioria das pessoas revela<br />

também relativa insensibilidade ao sal. Estudos<br />

realizados em cães saudáveis demonstraram que o<br />

aumento da ingestão de NaCl de 8 para 120mol/kg<br />

não afeta a pressão sanguínea, sugerindo que os cães<br />

saudáveis são insensíveis ao sal (6). Este fato significa<br />

que, nestes animais, a regulação renal do teor corporal<br />

total de NaCl é eficiente e capaz de responder<br />

adequadamente a alterações no consumo de sal.<br />

Embora se pudesse pressupor que os cães com DRC<br />

fossem eventualmente sensíveis ao sal, alguns estudos<br />

experimentais em cães com azotemia induzida,<br />

semelhante às Fases II e III da DRC definidas pela IRIS,<br />

indicaram não ser esse o caso (7), uma vez que a<br />

variação da ingestão de NaCl não afetou a pressão<br />

sanguínea destes animais. Embora seja provável a<br />

ocorrência de variação animal individual, devida a<br />

fatores genéticos, ambientais e patológicos, os cães<br />

saudáveis e os cães nas fases I-III da DRC não parecem<br />

ser particularmente sensíveis ao sal.<br />

E quanto aos gatos com DRC? Serão sensíveis ao sal assim<br />

como acontece com algumas linhagens de ratos, ou se<br />

assemelharão mais aos cães e aos seres humanos?<br />

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />

1. Brown SA, Brown CA, Jacobs G, et al. Effects of the angiotensin converting enzyme<br />

inhibitor benazepril in cats with induced renal insufficiency. Am J Vet Res 2001; 62:<br />

375-383.<br />

2. Elliott J, Barber PJ, Syme HM, et al. Feline hypertension: clinical findings and response<br />

to antihypertensive treatment in 30 cases. J Small Anim Pract 2001; 42: 122-129.<br />

3. Syme HM, Barber PJ, Markwell PJ, et al. Prevalence of systolic hypertension in cats<br />

with chronic renal failure at initial evaluation. J Am Vet Med Assoc 2002; 220: 1799-<br />

1804.<br />

4. Sterzel R, Luft FC, Gao Y, et al. Renal disease and the development of hypertension in<br />

salt-sensitive Dahl rats. Kidney Int 1988; 33: 1119-1129.<br />

5. Rapp JP. Development of inbred Dahl salt-sensitive and inbred Dahl salt-sensitive rats.<br />

Hypertension 1987; 9 Suppl 1: I-21-I-23.<br />

6. Krieger JE, Liard JF, Cowley AW. Hemodynamics, fluid volume, and hormonal<br />

responses to chronic high-salt intake in dogs. Am J Physiol 1990; 259: H1629- H1636.<br />

7. Greco DS, Lees GE, Dzendzel G, et al. Effects of dietary sodium intake on blood<br />

46 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / Vol 17 No 1<br />

Recentemente, um estudo experimental conduzido em<br />

gatos, sobre azotemia induzida num grau semelhante ao<br />

das Fases II e III da DRC (IRIS), a alteração na ingestão de<br />

sal não produziu qualquer efeito sobre a pressão<br />

sanguínea (8). Além disso, o nível mais baixo de consumo<br />

de NaCl foi associado aos valores mais reduzidos para a<br />

TFG (taxa de filtração glomerular), à caliurese<br />

hipocalêmica inadequada e à ativação do sistema reninaangiotensina-aldosterona.<br />

Estes resultados de insensibilidade<br />

ao sal da pressão sanguínea foram espantosamente<br />

semelhantes aos observados em gatos saudáveis (8).<br />

Analisados em conjunto, os estudos conduzidos em cães e<br />

gatos sugerem que em ambas as espécies, nem a pressão<br />

sanguínea, nem a hipertensão sistêmica são sensíveis ao<br />

sal. Uma vez que ambos os grupos objetos de estudo<br />

apresentavam azotemia semelhante à encontrada na Fase<br />

III, ou numa fase mais precoce da DRC, será necessário<br />

realizar estudos adicionais para determinar se os gatos ou<br />

os cães na Fase IV da DRC evidenciam, igualmente,<br />

uma insensibilidade ao sal.<br />

Não foi surpreendente constatar que a restrição alimentar<br />

de NaCl ativa o eixo renina-angiotensina-aldosterona em<br />

gatos com DRC, uma vez que este sistema hormonal age<br />

no sentido de impedir alterações no equilíbrio do sódio<br />

corporal. Enquanto a ativação deste sistema hormonal<br />

minimiza os efeitos da restrição de sal sobre a pressão<br />

sanguínea, a angiotensina II (9,10) e a aldosterona (11,12)<br />

podem provocar fibrose cardíaca e renal contribuindo<br />

para a progressão da DRC. Deve prestar-se especial<br />

atenção aos efeitos potencialmente nocivos da ativação<br />

deste sistema hormonal nos pacientes. Assim, sempre que<br />

seja preconizada ingestão reduzida de NaCl, deve<br />

considerar-se a administração de inibidores do eixo<br />

renina-angiotensina-aldosterona, tais como os IECA’s<br />

(inibidores da enzima conversora da angiotensina) e/ou os<br />

antagonistas dos receptores da aldosterona ou da<br />

angiotensina II.<br />

pressure measurements in partially nephrectomized dogs. Am J Vet Res 1994; 55:<br />

160-165.<br />

8. Buranakarl C, Mathur S, Brown SA. Effects of dietary sodium chloride intake on renal<br />

function and blood pressure in cats with normal and reduced renal function. Am J Vet<br />

Res 2004; 65: 620-627.<br />

9. Mezzano SA, Aros CA, Droguett A, et al. Renal angiotensin II up-regulation and<br />

myofibroblast activation in human membranous nephropathy. Kidney Int Suppl 2003,<br />

pp. 39-45.<br />

10. Weber KT, Brilla CG. Myocardial fibrosis and the reninangiotensin-aldosterone<br />

system. J Cardiovasc Pharmacol 1992; 20 Suppl 1: 48-54.<br />

11. Sato A, Saruta T. Aldosterone-induced organ damage: plasma aldosterone leveland<br />

inappropriate salt status. Hypertens Res 2004; 27: 303-310.<br />

12. Zhou X, Ono H, Ono Y, et al. Aldosterone antagonism ameliorates proteinuria and<br />

nephrosclerosis independent of glomerular dynamics in L-NAME/SHR model. Am J<br />

Nephrol 2004; 24: 242-249.


✂<br />

• Em geral, os cálculos são brancos ou amarelos e<br />

duros; transformam-se em pó quando triturados.<br />

Cristal de diidrato de<br />

oxalato de cálcio<br />

ESTRUVITA<br />

Cristais de estruvita Cálculos de estruvita<br />

OXALATO DE CÁLCIO<br />

Cálculos de<br />

oxalato de cálcio<br />

• Os cálculos apresentam frequentemente<br />

contornos bastante irregulares.<br />

Cristais de monoidrato<br />

de oxalato de cálcio<br />

Cristais de cistina Cálculos de cistina<br />

Cristais de urato Cálculos de urato<br />

Fêmea ≥ Macho<br />

2 a 6 anos de idade<br />

Sem predisposição racial<br />

Gatos de interior<br />

Obesidade<br />

Esterilização<br />

• Os cristais de estruvita podem<br />

ser um dos componentes dos<br />

plugs uretrais.<br />

GUIA DESTACÁVEL<br />

Atlas de sedimento urinário<br />

PONTOS-CHAVE<br />

➧ A urina deve ser avaliada imediatamente após sua<br />

coleta.<br />

➧ Habitualmente, a urina apresenta quantidades<br />

reduzidas de cristais.<br />

➧ Um gato pode ter cálculos, sem presença de cristais.<br />

➧ Na urolitíase, o tipo de cristais observado pode não<br />

refletir o tipo de cálculo presente.<br />

C á l c u l o s n ã o r a d i o p a c o s C á l c u l o s r a d i o p a c o s<br />

CISTINA<br />

URATO DE AMÔNIO<br />

➧ Um estudo demonstrou que 92% das amostras urinárias<br />

evidenciam cristais quando analisadas 24 horas após a<br />

coleta, versus 24% quando observadas imediatamente.<br />

➧ A viagem de carro até à clínica é suficiente para<br />

aumentar o pH urinário do gato. De fato, o pH da urina<br />

sofre alterações por ação do stress, podendo sofrer um<br />

acréscimo de 1,4 em consequência da alcalose<br />

induzida pela hiperventilação.<br />

Predisposição e idade média de ocorrência<br />

Gato<br />

Gato<br />

Fêmea ≥ Macho<br />

7 a 9 anos de idade<br />

Persa / Burmês<br />

Gatos de interior<br />

Obesidade<br />

Esterilizado<br />

Cão<br />

Fêmea >> Macho<br />

2 a 8 anos de idade<br />

Schnauzer Miniatura /<br />

Cocker Spaniel / Bichon Frise / Shih<br />

Tzu / Yorkshire Terrier /<br />

Poodle Miniatura<br />

• Associado a infecções do trato<br />

urinário em cães.<br />

Cão<br />

Macho >> Fêmea<br />

5 a 12 anos de idade<br />

Schnauzer Miniatura /<br />

Lhasa Apso / Yorkshire Terrier /<br />

Caniche Miniatura / Bichon Frise<br />

• Cristal de monoidrato; frequentemente associado a intoxicação<br />

por etilenoglicol.<br />

Gato<br />

Macho > ou = Fêmea<br />

± 3,5 anos de idade<br />

(4 meses a 12 anos)<br />

Nenhum<br />

Cão<br />

Macho > Fêmea<br />

± 5 anos de idade (1 a 8 anos)<br />

Teckel / Bulldog Inglês /<br />

Terra Nova / Staffordshire Bull Terrier /<br />

Welsh Corgi / Basset Hound<br />

• Pode estar associado a um distúrbio de reabsorção tubular renal.<br />

Gato<br />

Sem predisposição<br />

Cão<br />

Macho > Fêmea<br />

Se não existir shunt porto-sistêmico, em caso contrário<br />

Macho = Fêmea<br />

± 3,5 anos de idade sem shunt<br />

> 1 ano com shunt<br />

Dálmata / BulLdog Inglês /<br />

Schnauzer Miniatura<br />

• Observado com frequência em animais com doença hepática ou<br />

shunt porto-sistêmico.<br />

Vol 17 No 1 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / 47


ATLAS DE SEDIMENTO URINÁRIO<br />

48 / / Veterinary <strong>Focus</strong> / / Vol 17 No 1<br />

Cilindro hialino Bilirrubina<br />

Leucócitos Eritrócitos Células epiteliais transitórias Células transitórias neoplásicas<br />

Aumento de leucócitos<br />

- infecção do trato urinário<br />

- urolitíase<br />

- neoplasia<br />

Aumento de eritrócitos<br />

- cistite<br />

- urolitíase<br />

- trauma (cistocentese, etc.)<br />

- contaminação (próstata, prepúcio)<br />

Células epiteliais transitórias<br />

- infecção<br />

- neoplasia<br />

Aumento de cilindros leucocitários<br />

- pielonefrite<br />

- nefrite intersticial<br />

Fosfato de cálcio amorfo: formação em<br />

pH neutro e alcalino, podem ser observados na<br />

urina de gatos saudáveis.<br />

Tirosina: formação em pH ácido.<br />

Situação rara e sempre anômala. Indica<br />

a presença de doença hepática.<br />

NORMAL<br />

• Baixo número de eritrócitos e leucócitos.<br />

• Escassas células epiteliais escamosas ou cilindros hialinos.<br />

• Presença de cristais de bilirrubina na urina canina<br />

concentrada, sobretudo em machos. A presença deste tipo<br />

de cristais em gatos é sempre uma situação anômala.<br />

PATOLÓGICO<br />

CRISTAIS ATÍPICOS<br />

Fosfato de cálcio – brushita:<br />

formação em pH ácido, pouco comum.<br />

Sulfonamida – metabolitos urinários:<br />

formação em pH ácido e neutro.<br />

Aumento de cilindros eritrocitários<br />

- glomerulonefrite<br />

- trauma<br />

Aumento de cilindros hialinos<br />

- febre<br />

- doença glomerular primária<br />

- congestão passiva do rim<br />

Bactérias<br />

- infecção (especialmente, se a presença de bactérias<br />

estiver associada a um aumento de leucócitos)<br />

- contaminação<br />

- amostra exposta durante excessivo tempo à<br />

temperatura ambiente, antes da análise.<br />

Xantina: formação em pH ácido e neutro.<br />

Situação rara e sempre anômala. Poderá resultar<br />

da administração de alopurinol.<br />

Carbonato de cálcio:<br />

formação em pH neutro e alcalino. Muito raro.<br />


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