AMABILIS DE JESUS DA SILVA FIGURINO-PENETRANTE: UM ...
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valores datados, apegados à uma idéia de realidade utópica. Ou talvez, o confronto mostras- se a atualidade dos estudos do Dr. Flügel que a quase um século atrás vislumbrou - e sentiu medo - uma paisagem de seres mutantes, de corpos transformados, que encontram beleza na mistura do natural com o artificial, sem limites, sem pudores quanto às divisões das ordens, sem escrúpulos quanto à uma possível ética em relação à preservação do corpo “original” e extensão da face, com corpos-frankensteins, insatisfeitos, insaciáveis, em busca do elo com o paraíso perdido. Monges de hábitos entranhados, de hábitos mortificadores. Mongeshábitos. Hábitos-permeáveis, cortantes, penetrantes. Monges-marchetados, escarificados, crucificados. Hábitos-próteses. Monges-metamorfoseados, recriados, ficcionados. Hábitosmonges. Em confrontos, o Body Hacktivim Manifesto 2.0 talvez se colocasse com incongruidade, acatando os restolhos, as sobras descartadas. Talvez lhe bastasse o impróprio, o maldito. Body Hacktivim partido do corpo grotesco, fazendo desmoronar as barreiras do dentro e do fora. Corpo-carne-volúpia-peste-morte. Corpo-natureza naturante, a criar seu próprio destino. Parto destes confrontos. E de outros. Mas pensando em colisão: passado/futuro, lowtech/high-tech. Parto dos Modernos-Primitivos (ModsPrims), selvagens, faquires, sedentos de si mesmos, a exibir os frêmitos da carne, abnegados, com seus corpos suspensos por gan- chos, chagados, meio primitivos, modernos, sem dilema entre alma e matéria. Em entrevista à BME Columnist, Fakir Mustafar, expoente da arte do corpo e líder dos ModsPrims, esclarece que seu codinome foi inspirado em um desenho animado, o Ripley’s, mais exatamente num episódio que exibia um homem persa, velho, vivido no século XII em Meshed, de nome Fahkeer Mooshuhfar. Com grandes piercings permanentes nos mamilos, seis adagas fincadas na pele e perfurações na parte de cima e abaixo do braço feitas pelas pesadas ferraduras, Mooshuhfar aparece para deixar uma mensagem: Você pode aprender sobre Deus através de seu corpo. Reconhecendo nos seus próprios propósitos a mensagem do personagem, Mustafar seguiu desde os 14 anos de idade a furar, modificar, penetrar, cortar e queimar seu corpo, sempre com o objetivo de entrar em estados de consciência e descobrir a verdadeira natureza de si mesmo 72 . O incentivo veio, sobretudo, pelas imagens de aborígines e tribos hindus retiradas da National Geografic. Dos pregadores de roupa, usados escondido desde a infância, passando por agulhamentos, tatuagens, piercings, até chegar aos ganchos, Mustafar guiou-se pela i- 72 Entrevista disponível em http://www.bme.com/news/fakir-all.html, acesso em 21/10/2009. 58
déia de um rito de passagem, de iniciação, de transformação, e nunca pelo decorativo: Ritual é simplesmente entrar em um ato. É como um jogo. Segundo o artista é preciso preparação para fazer do piercing um ato xamânico. Os exercícios de respiração profunda são procedimentos adotados para que a colocação do aço na carne não seja mera perfuração, mas um ato de penetração psíquica, abrindo vagas (espa- ços) no corpo. A abordagem do corpo é abertura e acesso ao material interior, o espaço interior para mudar algo no corpo físico. Na visão de Steve Mizrach os modsPrims muito mais que a simples função de des- crever fases temporais colidem o passado e o futuro, pervertendo o tempo linear das culturas ocidentais capitalistas. Trata-se de um tipo estranho de justaposição de alta tecnologia e “baixo” tribalismo, animismo e intervenção no corpo – uma espécie de “Tecnoxamanismo”, se se quiser. Ao mesmo tempo “transe” de possessão e dança cinética 73 . Já Philippe Liotard 74 analisa a Body Modification (bodmods), voltando-se mais para os adeptos da Body Hackitivim, liderados por Lucas Zpira, situando-os como Quasímodos que respondem à história política do corpo com um aceno de adeus às fronteiras entre natu- ral e artificial. O breve apanhado histórico de Liotard, mostra que as modificações do corpo sempre existiram cumprindo funções utilitárias, como as cirurgias de fins terapêuticos e de correções, ou as modificações para corresponder à um modelo estético. A bodmods, ao con- trário, não usam deste recurso com intenções utilitárias, mas para a exploração individual, para afirmar a total liberdade, e o único modelo a seguir é o do seu próprio corpo. É neste sentido, que a bodmods é entendidas como uma ação, sobretudo, política, e pública. Para Liotard, além da ação corporal que se torna pilar da relação com o outro, há o sentir diferenciado do corpo, e o testemunho da dor e/ou prazer que faz desta experiência um momento forte da história individual. Tais experiências permitem, também, uma relação tátil incomum, por isso muitas vezes ligada à erotização. Outra conseqüência indicada por Liotard é a forma de pensar o corpo. A análise de significação do corpo supõe, notadamente, uma interrogação das realidades subjetivas individuais e coletivas, porque obrigam a notar que o corpo vem sendo muito mais uma realidade fantasmática do que cultural, que sempre se disse humana. 73 MIZRACH, Steve. “Primitivos Modernos: a acelerada colisão entre o passado e o futuro na era pósmoderna”. Trad. Rita Amaral. In: Revista Digital de Antropologia Urbana. Disponível em WWW.aguaforte.com/antropologia/osurbanistas/revista/modprim.htm, acesso em 22/09/2009. 74 LIOTARD, Philippe. “Revue Quasimodo”. In: Le corps interrogé. Disponível em WWW.bodyart.net/v6.0/Kortext/PLtxt1fr.html, acesso em 10/03/2007. 59
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déia de um rito de passagem, de iniciação, de transformação, e nunca pelo decorativo: Ritual<br />
é simplesmente entrar em um ato. É como um jogo.<br />
Segundo o artista é preciso preparação para fazer do piercing um ato xamânico. Os<br />
exercícios de respiração profunda são procedimentos adotados para que a colocação do aço<br />
na carne não seja mera perfuração, mas um ato de penetração psíquica, abrindo vagas (espa-<br />
ços) no corpo. A abordagem do corpo é abertura e acesso ao material interior, o espaço<br />
interior para mudar algo no corpo físico.<br />
Na visão de Steve Mizrach os modsPrims muito mais que a simples função de des-<br />
crever fases temporais colidem o passado e o futuro, pervertendo o tempo linear das culturas<br />
ocidentais capitalistas. Trata-se de um tipo estranho de justaposição de alta tecnologia e<br />
“baixo” tribalismo, animismo e intervenção no corpo – uma espécie de “Tecnoxamanismo”,<br />
se se quiser. Ao mesmo tempo “transe” de possessão e dança cinética 73 .<br />
Já Philippe Liotard 74 analisa a Body Modification (bodmods), voltando-se mais para<br />
os adeptos da Body Hackitivim, liderados por Lucas Zpira, situando-os como Quasímodos<br />
que respondem à história política do corpo com um aceno de adeus às fronteiras entre natu-<br />
ral e artificial. O breve apanhado histórico de Liotard, mostra que as modificações do corpo<br />
sempre existiram cumprindo funções utilitárias, como as cirurgias de fins terapêuticos e de<br />
correções, ou as modificações para corresponder à um modelo estético. A bodmods, ao con-<br />
trário, não usam deste recurso com intenções utilitárias, mas para a exploração individual,<br />
para afirmar a total liberdade, e o único modelo a seguir é o do seu próprio corpo. É neste<br />
sentido, que a bodmods é entendidas como uma ação, sobretudo, política, e pública.<br />
Para Liotard, além da ação corporal que se torna pilar da relação com o outro, há o<br />
sentir diferenciado do corpo, e o testemunho da dor e/ou prazer que faz desta experiência<br />
um momento forte da história individual. Tais experiências permitem, também, uma relação<br />
tátil incomum, por isso muitas vezes ligada à erotização.<br />
Outra conseqüência indicada por Liotard é a forma de pensar o corpo. A análise de<br />
significação do corpo supõe, notadamente, uma interrogação das realidades subjetivas individuais<br />
e coletivas, porque obrigam a notar que o corpo vem sendo muito mais uma realidade<br />
fantasmática do que cultural, que sempre se disse humana.<br />
73 MIZRACH, Steve. “Primitivos Modernos: a acelerada colisão entre o passado e o futuro na era pósmoderna”.<br />
Trad. Rita Amaral. In: Revista Digital de Antropologia Urbana. Disponível em<br />
WWW.aguaforte.com/antropologia/osurbanistas/revista/modprim.htm, acesso em 22/09/2009.<br />
74 LIOTARD, Philippe. “Revue Quasimodo”. In: Le corps interrogé. Disponível em WWW.bodyart.net/v6.0/Kortext/PLtxt1fr.html,<br />
acesso em 10/03/2007.<br />
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