AMABILIS DE JESUS DA SILVA FIGURINO-PENETRANTE: UM ...
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cava sua correspondência nos figurinos. A lei do ator era preponderante na criação do perso-<br />
nagem: Desta lei jorrava o conceito de perejivanie (revivescência), contraposto ao de<br />
predstavlenie (representação): encaixando-se sem reservas na figura encarnada, o intérpre-<br />
te deveria sofrer o papel, como um trecho de vida autêntica 66 . O conceito de revivescência<br />
se estende ao figurino - e é importante sublinhar - com dupla função. A primeira função,<br />
mais óbvia: materializar as características do personagem. A segunda, por vezes despercebi-<br />
da: o lugar da revivescência, pois uma vez encontradas as características materiais, o corpo-<br />
ator não prescinde de seus aparatos, de seus contornos.<br />
Contudo, o exemplo do exercício proposto a partir do fraque mofado – buscar carac-<br />
terísticas psicológicas para este figurino – mostra um lapso factível: aspectos psicológicos<br />
previamente formados e enquadrados, retirados da própria realidade. São duas as questões:<br />
por um lado a tipificação ou psicologização da roupa, comum no cotidiano, e por outro a<br />
dificuldade de se manter fiel ao processo voltado para o interior, ou sucumbência ao processo<br />
exterior.<br />
Quando Ripellino discorre sobre a recorrência às minúcias e quinquilharias, no teatro<br />
naturalista, observando que por diversas vezes o exterior prevalecia, cita uma passagem<br />
envolvendo o próprio Tchekhov:<br />
Embora se queixasse frequentemente desta encarniçada análise do pormenor, Tchekhov<br />
não estava assim tão distante do escrúpulo de Stanislavski; ele também agigantava as futilidades.<br />
Exigiu que Lopákhin usasse sapatos amarelos. Para Trigórin queria “calças<br />
xadrez e sapatos furados” e mostrou-se aflito com Stanislavski, que o inter pretava vestindo<br />
calças brancas e sapatilhas de praia 67 .<br />
Trago esta passagem para salientar que o psicologismo no figurino pode recair na tipificação.<br />
Sabendo que no período em que se passa a peça não era habitual usar sapatos amarelos,<br />
ao ver o personagem com tais sapatos em cena o espectador logo buscaria uma<br />
classificação para dar respostas ao estranhamento, já que se trata de uma montagem naturalista,<br />
em busca da “realidade”.<br />
O ensejo de trazer o real para a cena e a insistência no historicismo igualmente criam<br />
uma atmosfera teatral, irreal, por conta dos exageros nas diferenciações entre os persona-<br />
66 RIPELLINO, ibdem, p. 68.<br />
67 RIPELLINO, ibidem, p. 41.<br />
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