AMABILIS DE JESUS DA SILVA FIGURINO-PENETRANTE: UM ...

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ficarem da origem destes jovens. Os relatórios policiais exumados desde então comprovam a participação dos cidevants (pessoas ligadas ao Antigo Regime por títulos e posição) e a outra grande maioria, jovens burgueses (auxiliares de cartório, escreventes de tabeliões, empregados de loja ou de administração, jornalistas, atores e escritores de toda espécie). Essa ambiguidade na origem é destacada por Bollon, por instigar sobre seus propósitos e funções. Não são partidários convictos do Antigo Regime, mas com certeza desprezam seus substitutos. Os muscadins formam um terceiro grupo, que sobrepuja os ideais construídos na imaterialidade da Revolução, e sendo homens de aparências, combateram as aparências por meio das aparências 40 . Reuniram-se pelo desejo de diferenciação e distinção. Quebrada a Santa Âmbula, os ensinamentos da corte francesa perduraram sobre as cinzas do corpo- inumano do rei. 1.4 Flor Azul Um outro eixo se faz notório para a história do figurino: a utilização da máscara e figurino-máscara com base na ocultação do corpo-atuante para estabelecer coesão dos objetivos da cena. Deste eixo, as heranças deixadas pelo simbolismo merecem destaque por repre- sentarem um extremo no tocante aos princípios nos quais se pontuam os modos operantes do corpo e os usos do figurino. E este eixo, fortalecido no início do século XX, gerou a primeira noção de desestabilização de hierarquias entre os elementos cênicos. Dos aspectos do simbolismo comentados por Charles Chadwick, o pessoal e o trans- cendental, o segundo parece acolher um número maior de opções estéticas, recombinando seus pressupostos de forma a resultar em pesquisas com aportes já longínquos dos iniciais. Neste as imagens concretas são utilizadas como símbolos, não pensamentos e sentimentos particulares inerentes ao poeta, mas de um mundo ideal vasto e abrangente, do qual o mun- do é apenas uma representação imperfeita 41 . Perseguindo o conceito da existência de um mundo ideal, encontrada nos escritos filosóficos de Platão, o simbolismo supõe a arte como apartada do mundo real, sem dever fidelidade às suas formas, cores, matérias, mas gerando um duplo que a ele se reporta, com suas leis próprias. Porém, se Platão vê na arte uma representação da representação, pois que a realidade é representação do mundo das idéias, e a 40 BOLLON, ibidem, p. 37. 41 CHADWICK, Charles. O Simbolismo. Trad. Maria Leonor de Castro H. Telles. Lisboa: Lysia, 1975, p. 12. 40

arte representação desta representação do mundo das idéias, a estética simbolista tomará a arte como possibilidade de comunicação imediata com este plano primeiro, plano das idéias, pela evocação. Desta forma, o sentido de mimese se esvazia ou, ao menos, ganha outras intenções. Por isso mesmo, a separação entre as concepções que utilizam máscara e figurino-máscara das que aceitam o corpo-atuante, sem ocultação, não se efetiva senão pelo estudo das suas muitas facetas. A imbricação nem sempre compreende a totalidade, ficando algumas das partes vinculadas aos conceitos anteriores. O teatro grego, que se pode pensar como inspirador para o simbolismo – com relação ao uso dos figurinos – não o poderia ser com relação à mimese. Diversamente aos intentos da imitação crível, verossímil do teatro grego, o simbolismo luta por um estatuto do distanciamento da realidade, conjugando o evocar com nublar, obscurecer. Decorre desta abordagem, um modo de lidar com a matéria (objeto) pautada na sugestão, na alusão, a desvelar apenas o suficiente para garantir ao público co-autoria, fican- do ao seu encargo a complementação da imagem ou da idéia. Assim, no simbolismo, o corpo-atuante parecerá como uma das problemáticas em função da impossibilidade de transformação de sua matéria, que se mostra desfavorável ao cumprimento dos objetivos ligados à mimese. E a solução quase sempre ocorre com a camu- flagem ou ocultação do corpo pelo figurino. Heinrich von Kleist constitui-se numa importante referência para as encenações simbolistas e outras que dela derivam, em algum sentido, ampliando os debates sobre o corpoatuante. Seu elogio às marionetes, que ao contrário do corpo humano não é provido de afeta- ção, sendo sua matéria inerte e indiferente às leis gravitacionais, proporcionará modificações na compreensão do corpo, sempre referentes ao distanciamento da realidade para melhor refleti-la. O argumento de Kleist, dado pela fala do personagem Sr. v. G., marca pontos de contatos e adiantamento das pretensões do simbolismo: Vemos que no mundo orgânico, à medida que a reflexão se torna mais obscura e mais fraca, a graça apresenta-se mais brilhante e magnífica 42 . Por esse veio, o cume das acepções do simbolismo que abordam o corpo camuflado pelo figurino tendo em vista a coesão da cena condensam-se nas pesquisas de três encenado- res, muito embora suas fontes sejam mais amplas e já contaminadas pelos acúmulos de in- 42 KLEIST, Heinrich von. Sobre o Teatro de Marionetes. Trad. Pedro Süssekind. Rio de Janeiro: Sette Letras, 1997, p. 39. 41

arte representação desta representação do mundo das idéias, a estética simbolista tomará a<br />

arte como possibilidade de comunicação imediata com este plano primeiro, plano das idéias,<br />

pela evocação.<br />

Desta forma, o sentido de mimese se esvazia ou, ao menos, ganha outras intenções.<br />

Por isso mesmo, a separação entre as concepções que utilizam máscara e figurino-máscara<br />

das que aceitam o corpo-atuante, sem ocultação, não se efetiva senão pelo estudo das suas<br />

muitas facetas. A imbricação nem sempre compreende a totalidade, ficando algumas das<br />

partes vinculadas aos conceitos anteriores. O teatro grego, que se pode pensar como inspirador<br />

para o simbolismo – com relação ao uso dos figurinos – não o poderia ser com relação à<br />

mimese.<br />

Diversamente aos intentos da imitação crível, verossímil do teatro grego, o simbolismo<br />

luta por um estatuto do distanciamento da realidade, conjugando o evocar com nublar,<br />

obscurecer. Decorre desta abordagem, um modo de lidar com a matéria (objeto) pautada na<br />

sugestão, na alusão, a desvelar apenas o suficiente para garantir ao público co-autoria, fican-<br />

do ao seu encargo a complementação da imagem ou da idéia.<br />

Assim, no simbolismo, o corpo-atuante parecerá como uma das problemáticas em<br />

função da impossibilidade de transformação de sua matéria, que se mostra desfavorável ao<br />

cumprimento dos objetivos ligados à mimese. E a solução quase sempre ocorre com a camu-<br />

flagem ou ocultação do corpo pelo figurino.<br />

Heinrich von Kleist constitui-se numa importante referência para as encenações simbolistas<br />

e outras que dela derivam, em algum sentido, ampliando os debates sobre o corpoatuante.<br />

Seu elogio às marionetes, que ao contrário do corpo humano não é provido de afeta-<br />

ção, sendo sua matéria inerte e indiferente às leis gravitacionais, proporcionará modificações<br />

na compreensão do corpo, sempre referentes ao distanciamento da realidade para melhor<br />

refleti-la. O argumento de Kleist, dado pela fala do personagem Sr. v. G., marca pontos de<br />

contatos e adiantamento das pretensões do simbolismo: Vemos que no mundo orgânico, à<br />

medida que a reflexão se torna mais obscura e mais fraca, a graça apresenta-se mais brilhante<br />

e magnífica 42 .<br />

Por esse veio, o cume das acepções do simbolismo que abordam o corpo camuflado<br />

pelo figurino tendo em vista a coesão da cena condensam-se nas pesquisas de três encenado-<br />

res, muito embora suas fontes sejam mais amplas e já contaminadas pelos acúmulos de in-<br />

42 KLEIST, Heinrich von. Sobre o Teatro de Marionetes. Trad. Pedro Süssekind. Rio de Janeiro: Sette<br />

Letras, 1997, p. 39.<br />

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