AMABILIS DE JESUS DA SILVA FIGURINO-PENETRANTE: UM ...
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Natureza/Cultura Campos de diferença Sexo Engenharia genética Mente Inteligência artificial Patriarcado capitalista branco Informática da dominação 66 Por conseqüência destas mudanças, a tecnologia não pode ser mais entendida como exterior ao corpo, como mediadora, e sim como parte do corpo, criando o que Bernard An- drieu 67 denomina de design biosubjetivo da matéria. Ou seja, há uma redefinição da natureza pela ação sobre a matéria primeira, e com isso a encarnação do sujeito nesta matéria combi- nada. Os estudos de Andrieu se voltam para as questões genéticas. Segundo o autor, os corpos se utilizam da biosubjetividade não mais para se reproduzir, mas para produzir, e produzir espécies de indivíduos inéditos na natureza, gerando uma nova hermenêutica do corpo. Mantém-se viva, deste modo, a dialética: identidade/mutabilidade 68 . A principal característica dos adeptos da bodmods, a transitoriedade, parece afetar as antigas noções da anatomia. A identidade torna-se algo instável e a anatomia, como coloca David Le Breton, não é mais um destino, senão um acessório da presença. O corpo se torna uma representação provisória, um lugar ideal da encarnação para efeito especial 69 , alte- rando o dualismo alma/matéria. Para Le Breton o corpo não é mais somente a assinatura de uma identidade intangí- vel, a encarnação irredutível do sujeito, seu ser-no-mundo, mas uma construção, uma ins- tância de canais, um terminal, um objeto transitório e manipulável suscetível de grande emparelhamento 70 . E com as novas noções de corpo, a construção da subjetividade também se torna transitória, complexa e de referências múltiplas, pois ao mudar o corpo o indivíduo utiliza-se de bricolagens de referências, de tradições. Mas se há um consenso de que as mudanças efetivam novos rumos para o estudo das subjetividades, o plano de Haraway é ousado, e se constitui na construção de um mito políti- co, cuja base é a ironia. Segundo a autora, a ironia não se põe no extremo, e sim nas contra- 66 HARAWAY in SILVA, ibdem, p. 65-6. 67 ANDRIEU, Bernard. “Une peau de cyborg”. In: HTTP://www.staps.uhp-nancy.fr /bernard/ doc.pdf /peau-cyborg.pdf, p. 07. Acesso em 23/04/2008. 68 ANDRIEU, Bernard. “La représentation du corps, inventrice de normes biosubectives”. In: HTTP://www.staps.uhp-nancy.fr/bernard/doc.pdf/normesbiosubjectives.pdf, p. 05. Acesso em 23/04/2008. 69 LE BRETON, David. “L’identité à fleur de peau: tatouages, percings, etc). In: http://www.body- Art.net/v6.0/Kortext/DLBtxt2fr.html, p. 01. Acesso em 10/03/2007. Confira também, neste mesmo site os textos “Obsolescence contemporaine du corps” e “Lukas Zpira ou le hacker corporel”. 70 LE BRETON, ibdem, 2007, p. 01. 108
dições que não se resolvem – ainda que dialeticamente. Por se colocar no lugar das contra- dições gera uma tensão ao manter juntas coisas incompatíveis, necessárias e verdadeiras. A imagem do ciborgue é a imagem da ironia, da blasfêmia. O ciborgue, criatura simultaneamente animal e máquina, põe fim à história da narra- tiva edipiana, pois rompe com as narrativas dirigidas ao “estado original”, desprendendo-se do fascínio por uma totalidade orgânica. Tal desprendimento, para Haraway, faz reavaliar dois mitos advindos da psicanálise e do marxismo: desenvolvimento individual e história. A partir desta base, a natureza e a cultura são reestruturadas, e uma não pode ser mais objeto de apropriação ou incorporação pela outra, derrubando as dominações hierárquicas. Haraway aponta três quebras de fronteiras cruciais postas pelo ciborgue: a fronteira entre o humano e o animal; entre o animal-humano (organismo) e máquina; e a fronteira entre o físico e o não-físico. Estas quebras, por sua vez, balançam as bases, antes sólidas, de nomeações universais tais como gênero, raça e classe social, ao indicarem que tudo é construção, e passível de mudanças. Por isso, estes “lugares” não podem ser entendidos como estáveis e nem mesmo um ponto de ligação, um traço em comum. A autora exemplifica dizendo que não existe nada no fato de ser “mulher” que naturalmente una as mulheres 71 . Todas as fronteiras, de um modo ou de outro, servem como matriz de dominações. Vendo no ciborgue a imagem da criatura de um mundo pós-gênero, Haraway argu- menta sobre a necessidade de se assumir a responsabilidade das relações sociais da ciência e tecnologia, significando recusar uma metafísica anti-ciência para abraçar a habilidosa tarefa de reconstruir as fronteiras da vida cotidiana, em conexão parcial com os outros, em comunicação com todas as nossas partes 72 . A antropologia ciborguiana é a aceitação de um mundo monstruoso, combinação de diferentes naturezas e, sobretudo, de corpos incompletos e em conexões. 2.7 Prometeu 2.0 O conceito de taylorismo, advindo de Frederick Wislow Taylor (1856-1915), estruturou procedimentos na área de administração e economia, visando impedir o desperdício de 71 HARAWAY, ibdem, p. 52. 72 HARAWAY, ibdem, p. 108. 109
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Natureza/Cultura Campos de diferença<br />
Sexo Engenharia genética<br />
Mente Inteligência artificial<br />
Patriarcado capitalista branco Informática da dominação 66<br />
Por conseqüência destas mudanças, a tecnologia não pode ser mais entendida como<br />
exterior ao corpo, como mediadora, e sim como parte do corpo, criando o que Bernard An-<br />
drieu 67 denomina de design biosubjetivo da matéria. Ou seja, há uma redefinição da natureza<br />
pela ação sobre a matéria primeira, e com isso a encarnação do sujeito nesta matéria combi-<br />
nada.<br />
Os estudos de Andrieu se voltam para as questões genéticas. Segundo o autor, os<br />
corpos se utilizam da biosubjetividade não mais para se reproduzir, mas para produzir, e<br />
produzir espécies de indivíduos inéditos na natureza, gerando uma nova hermenêutica do<br />
corpo. Mantém-se viva, deste modo, a dialética: identidade/mutabilidade 68 .<br />
A principal característica dos adeptos da bodmods, a transitoriedade, parece afetar as<br />
antigas noções da anatomia. A identidade torna-se algo instável e a anatomia, como coloca<br />
David Le Breton, não é mais um destino, senão um acessório da presença. O corpo se torna<br />
uma representação provisória, um lugar ideal da encarnação para efeito especial 69 , alte-<br />
rando o dualismo alma/matéria.<br />
Para Le Breton o corpo não é mais somente a assinatura de uma identidade intangí-<br />
vel, a encarnação irredutível do sujeito, seu ser-no-mundo, mas uma construção, uma ins-<br />
tância de canais, um terminal, um objeto transitório e manipulável suscetível de grande<br />
emparelhamento 70 . E com as novas noções de corpo, a construção da subjetividade também<br />
se torna transitória, complexa e de referências múltiplas, pois ao mudar o corpo o indivíduo<br />
utiliza-se de bricolagens de referências, de tradições.<br />
Mas se há um consenso de que as mudanças efetivam novos rumos para o estudo das<br />
subjetividades, o plano de Haraway é ousado, e se constitui na construção de um mito políti-<br />
co, cuja base é a ironia. Segundo a autora, a ironia não se põe no extremo, e sim nas contra-<br />
66 HARAWAY in <strong>SILVA</strong>, ibdem, p. 65-6.<br />
67 ANDRIEU, Bernard. “Une peau de cyborg”. In: HTTP://www.staps.uhp-nancy.fr /bernard/<br />
doc.pdf /peau-cyborg.pdf, p. 07. Acesso em 23/04/2008.<br />
68 ANDRIEU, Bernard. “La représentation du corps, inventrice de normes biosubectives”. In:<br />
HTTP://www.staps.uhp-nancy.fr/bernard/doc.pdf/normesbiosubjectives.pdf, p. 05. Acesso<br />
em 23/04/2008.<br />
69 LE BRETON, David. “L’identité à fleur de peau: tatouages, percings, etc). In: http://www.body-<br />
Art.net/v6.0/Kortext/DLBtxt2fr.html, p. 01. Acesso em 10/03/2007. Confira também, neste mesmo site os<br />
textos “Obsolescence contemporaine du corps” e “Lukas Zpira ou le hacker corporel”.<br />
70 LE BRETON, ibdem, 2007, p. 01.<br />
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