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AMABILIS DE JESUS DA SILVA FIGURINO-PENETRANTE: UM ...

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como um mecanismo de controle térmico e como meio de definição do ser social 60 , já que é<br />

extensão da pele e a camada mais próxima do corpo.<br />

Um dado exemplar apontado por McLuhan, neste item, prenuncia as futuras pesqui-<br />

sas ligadas à subjetividade do ciborgue. O autor esclarece que boa parte de nossa audição se<br />

faz através da própria pele. Logo, durante os longos séculos de corpos cobertos por pesados<br />

tecidos (no Ocidente) houve perda da audição e uma readequação dos sentidos, assim como<br />

houve readequação dos sentidos com o advento da energia elétrica, pois a epiderme passa a<br />

assumir outras funções, livre das grandes camadas dos pesados tecidos.<br />

Ao prefaciar o livro Antropologia do ciborgue, como apresentação do Manifesto ciborgue,<br />

de Donna Haraway, Tomaz Tadeu da Silva parte do entendimento de que não existe<br />

nada mais que seja simplesmente “puro” em qualquer dos lados da linha de “divisão” 61 ,<br />

havendo um promíscuo acoplamento entre o humano e a máquina, portanto, entre ciência e<br />

política, entre tecnologia e sociedade, entre natureza e cultura. Os estudos de<br />

McLuhan são consolidados e consumados, sem chance de retorno e sem direito à nostalgia.<br />

Se os meios tecnológicos sempre influenciaram na subjetividade, as mudanças atuais<br />

se dão no plano de uma intrusão mais contundente, mais efetiva, levando à pergunta, e já à<br />

constatação: quando aquilo que é supostamente animado se vê profunda e radicalmente<br />

afetado, é hora de perguntar: qual é mesmo a natureza daquilo que anima o inanimado? É<br />

no confronto com clones, ciborgues e outros híbridos tecnonaturais que a “humanidade” de<br />

nossa subjetividade se vê colocada em questão 62 . Mas a dúvida já tinha sido posta, em fic-<br />

ção, por E. T. A. Hoffmann, em 1817, com a personagem Olímpia, a boneca articulada.<br />

Na novela O homem da areia, Natanael se apaixona inadvertidamente pela boneca<br />

rígida, com o olhar despido de calor e toda acuidade, com andar estranhamente cadenciado,<br />

de gestos e canto com ritmo odiosamente regular e sem alma como os de uma caixa de mú-<br />

sica 63 . Mas Natanael acredita que só às sensibilidades poéticas se revela tal organização! E<br />

apenas a ele foi dado perceber o olhar amoroso de Olímpia. Sua pouca fala (Ah, ah, ah e Boa<br />

noite!) seriam como hieróglifos de um mundo interior, onde reinam o amor e o conhecimen-<br />

to sublime da vida espiritual, contemplando a eternidade 64 .<br />

60<br />

MCLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação como extensões do homem. Trad. Décio Pignatari.<br />

São Paulo: Cultrix, 2001, p. 140.<br />

61<br />

<strong>SILVA</strong>, Tomaz Tadeu. (Org). Antropologia do ciborgue: as vertigens do pós-humano. Belo Horizonte:<br />

Autêntica, 2000, p. 13.<br />

62<br />

<strong>SILVA</strong>, ibdem, p. 12.<br />

63<br />

Descrição feita por um dos amigos do personagem Natanael, tentando preveni-lo de seu equívoco. Cf.<br />

HOFFMAN, E. T. A. O homem da areia. Trad. Ary Quintella. Rio de Janeiro: Rocco, 1986, p. 66.<br />

64<br />

HOFFMANN, ibdem, p. 67.<br />

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