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Por uma normatização ortográfica de palavras latinas ... - UFF

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Prado, João Batista Toledo.<br />

<strong>Por</strong> <strong>uma</strong> <strong>normatização</strong> <strong>ortográfica</strong> <strong>de</strong> <strong>palavras</strong> <strong>latinas</strong> incorporadas ao português<br />

cost<strong>uma</strong>m ser presas da impressão <strong>de</strong> que se lida com o morto – visão que<br />

advém <strong>de</strong> um preconceito, afinal, línguas não morrem, visto que não são seres<br />

vivos; quem morre são seus falantes 9 , e, a <strong>de</strong>speito disso, as línguas seguem<br />

vivas, em estado <strong>de</strong> suspensão, nos textos produzidos pelas culturas que elas<br />

veiculam e animam – e, já que mortos não reclamam, são tentados a fazer<br />

pouco da ignorância alheia, porque o alheio, nesse caso, representa a imensa<br />

parcela da população (mesmo que se isole e se compute apenas a população<br />

<strong>de</strong> leitores do país) sem qualquer condição <strong>de</strong> aferir dados lingüísticos <strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />

língua antiga e <strong>de</strong>saparecida, como é o caso do latim.<br />

Está-se pensando, aqui, em particular e para ficar num único <strong>de</strong>ntre<br />

numerosos exemplos, no caso <strong>de</strong> artigos veiculados em prestigiados meios <strong>de</strong><br />

comunicação escrita, como aquele publicado no dia 15 <strong>de</strong> março <strong>de</strong> 2000, no<br />

jornal Folha <strong>de</strong> São Paulo, logo após o conhecido escândalo nacional, em que a<br />

esposa <strong>de</strong> Celso Pitta, então prefeito <strong>de</strong> São Paulo, conce<strong>de</strong>u <strong>uma</strong> entrevista à<br />

TV Globo, em que <strong>de</strong>latava um alastrado esquema <strong>de</strong> corrupção e enriquecimento<br />

ilícito, praticado por membros do partido <strong>de</strong> Pitta, a mando, segunda<br />

ela, do presi<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> seu partido, ex-governador e também ex-prefeito, Paulo<br />

Maluf. Não pretendo, aqui, entrar em <strong>de</strong>talhes, já que o fato é, presume-se,<br />

bem conhecido <strong>de</strong> todos. Para <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r-se da parte que lhe cabia nas implicações<br />

do caso, Maluf escreveu, poucos dias após o ocorrido, um artigo cujo<br />

título era Quis pro<strong>de</strong>st, e que ele próprio ali traduziu por “A quem favorece?”.<br />

Tal tradução é equivocada, porque o pronome interrogativo latino quis<br />

não significa a quem, mas, simplesmente, quem, com função subjetiva. A tradução<br />

está errada, porque errada está, antes, a citação feita pelo político: trata-se,<br />

<strong>de</strong> fato, <strong>de</strong> <strong>uma</strong> parte <strong>de</strong> um verso da tragédia Medéia, do filósofo e dramaturgo<br />

latino Sêneca, mais especificamente da parte em que a própria feiticeira da<br />

Tessália, irada com o esposo Jasão, que a trocou pela filha do rei <strong>de</strong> Tebas,<br />

afirma: [...] cui pro<strong>de</strong>st scelus,/ is fecit [...], algo como “[...] aquele a quem interessa<br />

o crime, / foi esse que o cometeu [...]” (vv. 500-501) 10 .<br />

9 A esse propósito, cf.: “O primeiro gran<strong>de</strong> equívoco em que se incidiu no estudo da língua<br />

latina foi aceitar o preconceito <strong>de</strong> que se lidava com o morto; sob esse princípio, todo o<br />

legado da literatura latina, por exemplo, transformou-se em um imenso ‘terreno sacrossanto’<br />

<strong>de</strong> on<strong>de</strong>, vez por outra, se procuravam (e ainda se procuram) ressuscitar alg<strong>uma</strong>s idéias ou<br />

pensamentos adormecidos; talvez por isso mesmo, haja os que confundam h<strong>uma</strong>nismo com<br />

verda<strong>de</strong>s eternas” (BRUNO, 1992: 75).<br />

10 SENECA IUNIOR. Me<strong>de</strong>a. In: PHI-5.3, 1991.

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