Instituto AMMA - Psique & Negritude - Imprensa Oficial
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ENTREVISTA COM<br />
ISILDINHA BAPTISTA NOGUEIRA<br />
40<br />
NINGUÉM FOGE<br />
DA PRÓPRIA HISTÓRIA<br />
Isildinha Baptista Nogueira é psicanalista. “Adoro o meu trabalho.<br />
Sinto imenso carinho pelas pessoas que eu atendo. Minha cliente<br />
mais velha tem 89 anos; o mais novo, 4 anos.” A bem-sucedida<br />
profissão, aparte os esforços e os estudos integrais, teve, nas<br />
palavras de Isildinha “uma ajuda da sorte”. Em 1984, ela viajou<br />
para a França com o objetivo de se especializar.<br />
De cara, em Paris, foi jantar na casa do renomado filósofo Felix<br />
Gattari. Ele a convidou para falar, no dia seguinte, em um congresso<br />
de psicanálise. Isildinha tremeu nas bases, ficou aflita,<br />
pois deveria falar sobre “Psicanálise e <strong>Negritude</strong>”, mas nunca<br />
havia pensando no tema negritude. Gattari então sugeriu: “Conte<br />
de você mesma. Fale da sua experiência como uma mulher<br />
negra”. Ela topou e passou a noite escrevendo acerca do que era<br />
ser uma brasileira negra morando em São Paulo. O que era ter<br />
sido a única aluna negra na escola e, mais tarde, uma das únicas<br />
da universidade. “Escrevi sobre como é sofrido ter um lugar que<br />
aparentemente é seu, mas que de fato não o é.”<br />
Sua fala no congresso foi um sucesso. A ponto de a grande psicanalista<br />
Radmila Zygouris declarar: “Isildinha, seu texto sangra,<br />
seu texto é você. Nós temos que nos envergonhar de nunca termos<br />
pensado a questão dos negros dentro da psicanálise”. A<br />
partir daí, a brasileira passou a conviver com monstros sagrados,<br />
entre eles, a brilhante Maud Mannoni (1923-1998). Isildinha foi<br />
convidada a concluir sua formação nos Ateliês Psicanalíticos –<br />
uma escola com visão socialista.<br />
De volta ao Brasil, ela não parou de trabalhar nem de produzir<br />
conhecimento. No seu entendimento: “o psicanalista não atua<br />
fora das estruturas de poder”. Sou uma profissional que trabalha<br />
levando em conta as questões sociais e as questões clínicas propriamente<br />
ditas.”<br />
Isildinha, que passa grande parte do seu tempo perscrutando<br />
experiências infantis de seus clientes, relata uma experiência<br />
fundamental da própria infância. Uma vez brincando na rua,<br />
outra criança disse que meu cabelo era ruim. Fui correndo, chorando<br />
até a minha avó. Ela me acolheu e disse: “Isildinha, seu<br />
cabelo não é ruim, é duro. Seu cabelo é lindo, ele é como o<br />
meu. Eu gosto dele, eu gosto de você.”