a trajetória silenciosa de pessoas portadoras do hiv contada pela ...
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essas informações serão incorporadas para a ação, entendidos como socialmente construídos e coletiva por sua natureza (PARKER, 2000). Destarte, diante desse novo entendimento e do panorama da AIDS no mundo, evidencia-se que muitas das categorias e classificações centrais que tinham sido utilizadas para descrever a vida sexual na medicina ocidental e na epidemiologia como homossexualidade, heterossexualidade e bissexualidade, estão longe de serem universais ou de serem tomadas como dadas e naturais em todos os contextos culturais, em especial no contexto da cultura sexual brasileira, pois não são necessariamente estas categorias que a maioria dos brasileiros empregam ao pensar sobre a natureza da sua realidade sexual (PARKER, 1997; 2000). Parker (1997) refere que as mesmas têm sido tradicionalmente menos significativas dentro da estrutura ideológica da cultura sexual brasileira, em comparação às noções de ‘atividade’ e ‘passividade’, que não são apenas expressões da sexualidade, mas coordenadas-chave na organização de gênero, fundamentais ao que veio a ser descrito, tanto na cultura popular como na literatura especializada, como a cultura do machismo, ou seja: o complexo sistema ideológico que organiza as relações de gênero, hierarquicamente, estabelecendo as relações de poder e de domínio dos homens sobre as mulheres (PARKER, 1997; 2000). Pelo país afora, assim como em outras partes da América Latina, as relações de sexo ordenam-se em termos de noções prescritas de atividade ou domínio masculino, por um dado, em contraste com a passividade feminina ou submissão por um outro. A sexualidade masculina caracteriza-se por seu caráter expansivo e quase incontrolável, enquanto a sexualidade feminina é percebida como objeto do controle masculino (PARKER, 1997, p.66). Uma conseqüência importante desse sistema de relacionamento sexual é o fato de que os contatos sexuais do mesmo sexo também se estruturam, pelo menos em princípio, em termos de hierarquia de gênero seguindo o padrão ativo-passivo. Assim, as interações sexuais entre homens são conceitualizadas dentro do conjunto de relações macho-fêmea, e o papel dos parceiros, sendo ativo (o que penetra) ou passivo (o que é penetrado), é de certa maneira mais importante que a eleição do objeto sexual 37
(se macho ou fêmea) para demarcar a identidade e valores sexuais. Apesar de a conduta homossexual ser ainda estigmatizada e discriminada na nossa cultura, o parceiro ativo em interações com o mesmo sexo consegue dessa forma preservar o sentido de sua identidade masculina, não se diferenciando de outros homens machos e masculinos. Por um outro lado, os homossexuais passivos ou afeminados assumem um papel simbólico da mulher, e se sujeitam a estigmas, uma das respostas negativas, mais graves, que caracterizam as sociedades latino-americanas. Descortina-se, então, a existência de uma subcultura sexual distinta, na qual a sua organização particular de interações homossexuais, heterossexuais e bissexuais, tem ordenado a disseminação da epidemia, dando-lhe um caráter e uma direcionalidade singulares. O seu aparecimento precoce entre homens envolvidos em interações do mesmo sexo, junto com sua rápida evolução entre homens envolvidos em relações tanto com homens quanto com mulheres, com o passar do tempo foi acompanhada da crescente disseminação da infecção pelo HIV entre mulheres, cujo único fator de risco aparente seriam suas relações de poder profundamente desiguais com seus parceiros sexuais masculinos (PARKER, 1997). Certamente, o comportamento bissexual tem sido um importante elemento na rápida disseminação do HIV no Brasil, porém mais importante que classificar esta categoria é entender quais as crenças e práticas que estruturam as interações ou contatos sexuais dentro do contexto da cultura sexual do brasileiro. Além do que, as suas interações também ativas com os membros do sexo oposto ou seus papéis sociais como maridos ou pais podem ser mais significativas na construção de sua percepção de si mesmos do que em ocasionais relações com outros homens. Desta forma, se o homem faz o papel de ativo (o que penetra), mesmo que seja em intercursos com o mesmo sexo, pode não se perceber em risco, porque desta forma ele estará preservando o sentido de sua identidade de macho, distanciando-se da necessidade de se prevenir, pois o risco estaria atrelado aos homens afeminados e que assumem a posição de passivos (PARKER, 1997). 38
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Destarte, diante <strong>de</strong>sse novo entendimento e <strong>do</strong> panorama da AIDS no<br />
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longe <strong>de</strong> serem universais ou <strong>de</strong> serem tomadas como dadas e naturais em to<strong>do</strong>s os<br />
contextos culturais, em especial no contexto da cultura sexual brasileira, pois não<br />
são necessariamente estas categorias que a maioria <strong>do</strong>s brasileiros empregam ao<br />
pensar sobre a natureza da sua realida<strong>de</strong> sexual (PARKER, 1997; 2000).<br />
Parker (1997) refere que as mesmas têm si<strong>do</strong> tradicionalmente menos<br />
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Pelo país afora, assim como em outras partes da América Latina, as relações <strong>de</strong> sexo<br />
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A sexualida<strong>de</strong> masculina caracteriza-se por seu caráter expansivo e quase incontrolável,<br />
enquanto a sexualida<strong>de</strong> feminina é percebida como objeto <strong>do</strong> controle masculino<br />
(PARKER, 1997, p.66).<br />
Uma conseqüência importante <strong>de</strong>sse sistema <strong>de</strong> relacionamento sexual é o<br />
fato <strong>de</strong> que os contatos sexuais <strong>do</strong> mesmo sexo também se estruturam, pelo menos em<br />
princípio, em termos <strong>de</strong> hierarquia <strong>de</strong> gênero seguin<strong>do</strong> o padrão ativo-passivo. Assim,<br />
as interações sexuais entre homens são conceitualizadas <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> conjunto <strong>de</strong><br />
relações macho-fêmea, e o papel <strong>do</strong>s parceiros, sen<strong>do</strong> ativo (o que penetra) ou passivo<br />
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