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MARLUI MIRANDA<br />
A dama da tribo<br />
Marlui Miranda consagra sua pesquisa sobre a música indígena com uma missa sensacional.<br />
Os índios da Amazônia não entendem bem o que quer aquela mulher de cabelos longos e olhos<br />
esbugalhados que visita as aldeias regularmente, se hospeda nas ocas, reparte com eles as refeições de frutas<br />
nativas com macarrão de branco e se diverte muito com seus cantos e danças. Eles só sabem que a visitante é bem<br />
mais simpática que os burocratas da Funai e que de vez em quando até lhes manda algum dinheiro, dizendo que<br />
corresponde a "direitos autorais". Essas visitas se repetiram vinte vezes nos últimos anos, e em todas elas a cantora<br />
e compositora Marlui Miranda voltou para São Paulo, onde mora, carregando um estoque de fitas gravadas com<br />
canções indígenas. A partir delas, Marlui vem construindo uma das obras mais originais da música brasileira do<br />
momento. Sua arte é uma transposição dos sons indígenas para o mundo das harmonias e melodias a que os<br />
ouvintes do lado de fora da “taba” estão acostumados. Longe de ser mais uma corriqueira fusão de ritmos, dessas<br />
que juntam reggae com forró, é um trabalho intrincado, na fronteira das experiências da música erudita.<br />
O melhor do trabalho de Marlui Miranda pode ser ouvido em seu novo CD, o desconcertante 2 Ihu. O disco<br />
traz a missa indígena composta por ela e apresentada em 1997 na Catedral da Sé, em São Paulo, durante as<br />
comemorações dos 400 anos da morte do padre José de Anchieta. Embora o espetáculo tenha sido grandioso, e<br />
muito concorrido, no disco pode-se apreciar com maior detalhamento a qualidade da música. Acompanhando os<br />
vocais de Marlui estavam a Orquestra Jazz Sinfônica, o Coral Sinfônico do Estado de São Paulo, um coro montado<br />
especialmente para o projeto e mais um conjunto com piano, baixo e percussão. Ao todo são setenta músicos e 82<br />
vozes, fora a de Marlui. A missa tem as divisões convencionais (ofertório, comunhão etc.) e é construída sobre<br />
músicas das tribos aruá, tupari e urubu-kaapor. As letras, todas em tupi (traduzidas para o português no encarte,<br />
com revisão do poeta José Paulo Paes), foram tiradas dos próprios textos de José de Anchieta. No século XVI, o<br />
jesuíta foi o primeiro a transpor o idioma indígena para a linguagem escrita, em sua gramática tupi-guarani,<br />
facilitando o trabalho de catequese de seus colegas. Escreveu também o Catecismo da Língua Brasílica, justamente<br />
a obra que serve de base para as letras da missa de Marlui. É evidente que 2 Ihu não tem vocação para as paradas<br />
de sucesso nem serve para embalar festinhas. Tampouco se destina apenas a etnomusicólogos ou a paladares<br />
extravagantes. Qualquer ouvinte é capaz de apreciar a obra: basta ouvi-la com atenção e se deixar envolver pela<br />
espetacular tessitura sonora, pelas vocalizações da autora, pela dramaticidade crescente ao longo da obra. "Não<br />
pretendo fazer leituras sociológicas da música indígena nem tenho objetivos acadêmicos, sou uma compositora de<br />
música popular", afirma Marlui, explicando por que sua obra, embora complexa, não persegue o exótico e não soa<br />
pretensiosa. Considerando-se as características dessa obra, até que Marlui não faz feio no mercado de discos. Seu<br />
CD anterior, Ihu Todos os Sons, o quarto de sua carreira e o primeiro em que ela se dedica exclusivamente aos<br />
sons indígenas, vendeu 6.000 cópias no Brasil, 14.000 nos Estados Unidos sem o apoio de shows locais, e 5.000 na<br />
Europa. "Não sou o tipo de artista que persegue as grandes massas: meu trabalho, em primeiro lugar, tem de fazer<br />
sentido para mim mesma", ela diz.<br />
Como ganha pouco dinheiro com sua arte, Marlui é movida a patrocínio. Boa parte de seu tempo é gasta<br />
com visitas a empresas e instituições. Ela raramente tem dificuldade em conseguir as verbas de que precisa. Afinal,<br />
tem em seu currículo prestigiosas bolsas de pesquisa como da Rockfeller Foundation e da John Simon Guggenheim<br />
Memorial Foundation. Também se relaciona bem com um emaranhado de ONGs que atuam nas causas indígenas.<br />
Elas costumam servir de ponte para suas temporadas entre as tribos amazônicas, que podem durar semanas. Não<br />
seria desconfortável passar tanto tempo sem dispor ao menos de um banheiro? "Quando estou com os índios, o<br />
conforto não faz falta, a gente se acostuma rapidamente", garante Marlui. Entre outras técnicas de sobrevivência, a<br />
compositora aprendeu, por exemplo, a tomar banho em rio infestado de piranha. "Há horas indicadas e maneiras<br />
corretas de entrar nos rios a dica é seguir as crianças", ela explica.
Marlui Miranda aproveita sua intimidade com a cultura indígena para explorar outras frentes de trabalho.<br />
Foi peça-chave, por exemplo, nas filmagens de Brincando nos Campos do Senhor, o belo épico do diretor Hector<br />
Babenco passado no coração da selva amazônica. Coube a ela não apenas adaptar a música indígena à trilha sonora<br />
como também treinar os figurantes que interpretaram os índios do filme. Eram 140 deles, apenas 20% indígenas de<br />
verdade. Aos brancos teve de explicar como se comportar como índios. Aos índios, o que é cinema e o que<br />
deveriam fazer diante da câmara. "Sem o trabalho desenvolvido pela Marlui não haveria filme", diz Babenco.<br />
Marlui repetiu a experiência em Lá Vem Nossa Comida Pulando, adaptação para as telas da obra do escritor alemão<br />
Hans Staden, dirigida por Luiz Alberto Pereira e em fase de filmagem no litoral paulista. Assistir ao trabalho de<br />
Marlui com os atores é uma experiência curiosa. Ela encarna uma índia de verdade e consegue reproduzir<br />
fielmente todos os seus gestos, passos de dança e sons. "Entre os índios, a música e a dança sempre vêm juntas,<br />
são indissociáveis, o som parte do movimento do corpo", ensina. Por isso mesmo, em suas apresentações no palco,<br />
Marlui foi uma das primeiras cantoras brasileiras a adotar aquele microfone sem fio acoplado à cabeça, que parece<br />
equipamento de telefonista, popularizado por Madonna. A engenhoca permite que ela reproduza todos os<br />
movimentos dos índios.<br />
O interesse de Marlui Miranda pela música indígena começou há mais de três décadas, quando ela tomou<br />
conhecimento de uma série de gravações feitas em tribos por um padre salesiano. Pediu as gravações<br />
emprestadas, reproduziu-as e passou a incorporá-las em seu trabalho. Marlui nasceu no Ceará e foi criada em<br />
Brasília, onde trocou o curso de arquitetura pela música depois de vencer um festival local. Em 1971 mudou-se<br />
para o Rio, onde conheceu o compositor Egberto Gismonti e acabou recrutada para seu conjunto, o Academia de<br />
Danças. Na época, sua parceira musical mais constante era a irmã, Ana Miranda, hoje consagrada autora de<br />
romances históricos como Boca do Inferno e A Última Quimera. Gismonti acabou produzindo o primeiro LP de<br />
Marlui, Olho d'Água, um tremendo disco de estréia, que imediatamente chamou a atenção do meio musical. Suas<br />
composições foram gravadas por artistas como Ney Matogrosso, Jards Macalé e até pela atriz Norma Bengell, que<br />
na época arriscou uma incursão na música popular. Nesse período ela também acompanhou o compositor Taiguara<br />
em turnês pelo país, estudou cavaquinho, guitarra, percussão e violão clássico. Nos trabalhos seguintes de Marlui a<br />
música indígena foi tomando cada vez mais espaço. Nos CDs Ihu e 2 Ihu, finalmente, a compositora começou a<br />
explorá-la em profundidade. Marlui afirma que esses dois CDs são apenas o começo de um projeto no qual<br />
pretende mergulhar em todo o espectro da música indígena e suas relações com os sons da natureza. Marlui foi<br />
beneficiada com uma bolsa da Fundação Vitae para desenvolver o projeto, batizado de Mavite Uara Ang Ihura?, ou<br />
Que Corrente Sonora Qualquer É Essa? Vale a pena conhecer o trabalho dessa compositora que não encontra<br />
paralelo na MPB.<br />
Faixas do CD 2 Ihu Kewere: Rezar 1997 (Marlui Miranda)<br />
1. Canto De Entrada (Marlui Miranda / Índios Aruá / José de Anchieta)<br />
2. Kyrie (Marlui Miranda)<br />
3. Glória (Marlui Miranda / Índios Tupari / José de Anchieta)<br />
4. Aleluia: Aclamação Ao Evangelho (Marlui Miranda / José de Anchieta)<br />
5. Credo (Marlui Miranda / Índios Urubu-Kaapor / José de Anchieta)<br />
6. Ofertório (Marlui Miranda / Índios Aruá)<br />
7. Pai Nosso (Marlui Miranda)<br />
8. Agnus Dei (Marlui Miranda / Índios Aruá / José de Anchieta)<br />
9. Comunhão (Marlui Miranda / Índios Aruá / José de Anchieta)<br />
10. Ação De Graças (Marlui Miranda / Índios Urubu / Kaapor)<br />
11. Canto Final (Marlui Miranda / Índios Aruá / José de Anchieta)<br />
Fonte: http://veja.abril.com.br/291097/p_126.html (com adaptações)<br />
VÍDEOS:<br />
Documentário: http://www.youtube.com/watch?v=8TAyHcy6jMU<br />
Araruna: http://www.youtube.com/watch?v=KT-OfgWsQ3Y<br />
Kworo Kango: http://www.youtube.com/watch?v=hA8o22lLk64<br />
Canto Triste:<br />
http://www.youtube.com/watch?v=hr8wV7AjB7A&feature=results_video&playnext=1&list=PL1473A75BF8BFD53B
JULGUE OS ITENS:<br />
01. Marlui construiu uma das obras mais originais da música brasileira através das visitas e experiências que fez<br />
com os índios da Amazônia. Sua arte é uma transposição dos sons metálicos para o mundo das harmonias e<br />
melodias a que os ouvintes já estão acostumados a apreciar.<br />
02. Marlui construiu uma das obras mais originais da música brasileira através das visitas e experiências que fez<br />
com os índios da Amazônia. Sua arte é uma transposição dos sons indígenas para o mundo das harmonias e<br />
melodias a que os ouvintes do lado de fora da “taba” estão acostumados.<br />
03. O trabalho de Marlui Miranda está longe de ser mais uma corriqueira fusão de ritmos, dessas que juntam<br />
reggae com forró, é um trabalho intrincado, na fronteira das experiências da música erudita.<br />
04. O trabalho de Marlui Miranda é nada mais nada menos, uma fusão de ritmos, dessas que juntam reggae<br />
com forró, é um trabalho comum, inspirado na fronteira das experiências da música de vanguarda .<br />
05. No álbum “Rezar”, as composições da missa tem as divisões convencionais: ofertório, comunhão etc., e é<br />
construída sobre músicas da Igreja católica.<br />
06. No álbum “Rezar”, as composições da missa tem as divisões convencionais: ofertório, comunhão etc., e é<br />
construída sobre músicas das tribos aruá, tupari e urubu-kaapor.<br />
07. No álbum “Rezar”, as letras da missa todas em Timbira (traduzidas para o português) foram tiradas dos<br />
próprios textos de José de Anchieta, padre jesuíta que foi o primeiro a transpor o idioma indígena para a<br />
linguagem escrita, em sua gramática Timbira-Apãniekrá, facilitando o trabalho de catequese de seus<br />
colegas. Escreveu o Catecismo da Língua Brasílica, justamente a obra que serve de base para as letras da<br />
missa de Marlui.<br />
08. No álbum “Rezar”, as letras da missa todas em tupi (traduzidas para o português) foram tiradas dos<br />
próprios textos de José de Anchieta, padre jesuíta que foi o primeiro a transpor o idioma indígena para a<br />
linguagem escrita, em sua gramática tupi-guarani, facilitando o trabalho de catequese de seus colegas.<br />
Escreveu o Catecismo da Língua Brasílica, justamente a obra que serve de base para as letras da missa de<br />
Marlui.<br />
09. O interesse de Marlui Miranda pela música indígena começou há mais de três décadas, quando ela tomou<br />
conhecimento de uma série de gravações feitas em tribos por um padre, ela pediu as gravações<br />
emprestadas, reproduziu-as e passou a incorporá-las em seu trabalho.<br />
10. O interesse de Marlui Miranda pela música indígena começou há mais de três décadas, quando ela tomou<br />
conhecimento de uma série de gravações feita pela FUNAI, ela pediu as gravações emprestadas,<br />
reproduziu-as e passou a incorporá-las em seu trabalho.<br />
GABARITO<br />
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E C C E E C E C C E