Jornal 134 - Maio 2008.p65 - Arquidiocese de Florianópolis
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4 Tema do Mês<br />
<strong>Maio</strong> é para os católicos o mês<br />
<strong>de</strong> Maria. Os católicos temos um<br />
gran<strong>de</strong> amor à mãe <strong>de</strong> Jesus. Vemos<br />
nela a mãe <strong>de</strong> todos nós, da<br />
Igreja e da humanida<strong>de</strong>. Ficamos<br />
escandalizados ao ver que outros<br />
cristãos - evangélicos, pentecostais<br />
- parecem ter pouco amor e<br />
respeito por ela. Esquecemos que<br />
eles também se escandalizam<br />
pelo exagero <strong>de</strong> nossa <strong>de</strong>voção<br />
mariana. Por que acontece isso?<br />
Parece que Maria não tem vez nas<br />
outras igrejas e comunida<strong>de</strong>s cristãs.<br />
Por isso, é bom nos perguntarmos:<br />
Maria tem lugar na caminhada<br />
ecumênica? Po<strong>de</strong>m os católicos<br />
falar <strong>de</strong> Maria diante <strong>de</strong><br />
seus irmãos protestantes, evangélicos,<br />
pentecostais? Como? Po<strong>de</strong>m<br />
os evangélicos participar do<br />
ecume-nismo junto com os católicos,<br />
que têm tanto apreço por Maria?<br />
Os evangélicos têm algo a<br />
apren<strong>de</strong>r dos católicos a respeito<br />
do lugar <strong>de</strong> Maria na fé cristã? E<br />
os católicos têm algo a apren<strong>de</strong>r<br />
dos protestantes a respeito <strong>de</strong><br />
Maria e <strong>de</strong> sua vocação na história<br />
da salvação? Haverá um equilíbrio<br />
possível entre a gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>voção<br />
mariana dos católicos e a<br />
escassez mariana dos protestantes?<br />
Qual sua contribuição para o<br />
lugar <strong>de</strong> Maria no ecumenismo?<br />
A Mãe <strong>de</strong> Deus é empecilho, como<br />
parece à primeira vista, para a<br />
união dos cristãos? Ou, ao contrário,<br />
po<strong>de</strong> ser fator <strong>de</strong> coesão na<br />
busca da unida<strong>de</strong> da Igreja <strong>de</strong> seu<br />
Filho?<br />
A ORIGEM<br />
DOS PROBLEMAS<br />
Tudo se resume, <strong>de</strong> um lado,<br />
ao exagero dos católicos no espaço<br />
que reservam a ela, às vezes<br />
mais que ao Filho Salvador e, <strong>de</strong><br />
outro, ao esquecimento dos protestantes<br />
ou a sua pouca consi<strong>de</strong>ração<br />
diante daquela que tem<br />
uma missão única na história da<br />
salvação. No meio termo situamse<br />
os ortodoxos, com seu gran<strong>de</strong><br />
sentido da <strong>de</strong>voção, ao par <strong>de</strong> sua<br />
escassa preocupação com a doutrina<br />
mariana, e os anglicanos,<br />
com sua <strong>de</strong>voção e sua sobrieda<strong>de</strong><br />
doutrinal. Po<strong>de</strong>r-se-ia dizer que<br />
enquanto os católicos são<br />
maximalistas, porque procuram<br />
dizer o máximo sobre Maria, os<br />
protestantes são minimalistas,<br />
porque dizem o mínimo. Os ortodoxos<br />
e os anglicanos, por sua vez,<br />
são medianos, isto é, são <strong>de</strong>votos<br />
sem serem dogmáticos.<br />
Vê-se que também a respeito<br />
<strong>de</strong> Maria há um longo caminho a<br />
percorrer no diálogo ecumênico.<br />
Os documentos do magistério católico<br />
sobre o ecumenismo lembram<br />
que são muitas as questões<br />
A Virgem Maria e o Ecumenismo<br />
Maria é a mulher do "sim" à vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> Deus.<br />
teológico-eclesiais que trazem dificulda<strong>de</strong>s<br />
para a caminhada<br />
ecumênica: os sacramentos,<br />
notadamente os da Eucaristia e<br />
da Or<strong>de</strong>m; o ministério petrino,<br />
sobretudo o primado papal e a<br />
infalibilida<strong>de</strong> do magistério<br />
pontifício; o culto a Maria e aos<br />
santos. Também Maria entra,<br />
portanto, certamente não por sua<br />
culpa, com uma gran<strong>de</strong> dose <strong>de</strong><br />
incômodo. Dos quatro lados do<br />
quadrilátero ecumênico aparecem<br />
problemas: a) o dogmatismo<br />
católico, sobretudo quanto à dimensão<br />
antropológica <strong>de</strong> Maria -<br />
sua concepção e seu <strong>de</strong>stino, ou<br />
seja, sua origem e seu fim; b) a<br />
restrição protestante, sobretudo<br />
quanto à voz e vez <strong>de</strong> Maria na<br />
relação com os seguidores <strong>de</strong><br />
Cristo e membros <strong>de</strong> sua Igreja;<br />
c) o acento ortodoxo à <strong>de</strong>voção,<br />
sobretudo quanto à onipresença<br />
<strong>de</strong> Maria em suas <strong>de</strong>voções; d)<br />
e, junto com as restrições<br />
anglicanas, também as protestantes<br />
e as ortodoxas, à dogmática<br />
mariana católica.<br />
“Haverá um equilíbrio<br />
possível<br />
entre a gran<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>voção mariana<br />
dos católicos<br />
e a escassez<br />
mariana dos<br />
protestantes?”<br />
A BUSCA DE SOLUÇÕES<br />
O movimento ecumênico,<br />
além dos encontros para a oração<br />
em comum e o diálogo fraterno,<br />
incentiva o estudo e a reflexão teológica.<br />
O avanço dos estudos<br />
mariológicos ecumênicos ten<strong>de</strong> a<br />
enriquecer toda a caminhada<br />
ecumênica. Nesses estudos, pastores<br />
e teólogos <strong>de</strong>sses quatro<br />
gran<strong>de</strong>s ramos do cristianismo começam<br />
a perceber que não somente<br />
a sua mariologia é fiel e<br />
santa, mas também a dos outros;<br />
Arquivo/JA<br />
percebem que divergem não no<br />
conteúdo que ensinam e propõem,<br />
mas no modo como se<br />
acercam das fontes da fé. Há mais<br />
divergências na roupagem ou linguagem<br />
do que na mensagem.<br />
Além disso, como em Maria se dá<br />
uma concentração <strong>de</strong> todas as<br />
questões teológicas, nela também<br />
se concentram as questões<br />
ecumênicas.<br />
A mariologia - na perspectiva<br />
católica - é uma espécie <strong>de</strong> coroa<br />
<strong>de</strong> toda a dogmática cristã.<br />
No campo da mariologia se concentram<br />
as relações entre Deus<br />
e o ser humano, Cristo e sua Igreja,<br />
revelação e salvação, graça divina<br />
e liberda<strong>de</strong> humana, origem<br />
e <strong>de</strong>stino da humanida<strong>de</strong>. Conclui-se<br />
que quanto mais clareza<br />
os cristãos tiverem da figura e da<br />
missão <strong>de</strong> Maria, maior<br />
luminosida<strong>de</strong> terão para focarem<br />
os mistérios <strong>de</strong> Deus, da Igreja e<br />
do ser humano. Melhores discípulos<br />
<strong>de</strong> Cristo po<strong>de</strong>rão ser. No<br />
mo<strong>de</strong>lo da santida<strong>de</strong> e do<br />
discipulado <strong>de</strong> Maria, po<strong>de</strong>rão<br />
<strong>Maio</strong> 2008 <strong>Jornal</strong> da <strong>Arquidiocese</strong><br />
encontrar-se para celebrar a mesma<br />
fé, seja pelo conhecimento<br />
dogmático, seja, mais ainda, pelo<br />
seguimento <strong>de</strong> Cristo.<br />
OS CAMINHOS<br />
DIFERENTES<br />
Na mariologia, aparecem <strong>de</strong><br />
modo bastante claro as diferenças<br />
do método teológico dos católicos,<br />
dos protestantes, dos anglicanos<br />
e dos ortodoxos. Na mariologia,<br />
mais que diferenças <strong>de</strong> conteúdo,<br />
temos diferenças <strong>de</strong> método teológico.<br />
Os católicos lêem a Bíblia e<br />
fazem teologia com um olhar ampliado<br />
sobre a gran<strong>de</strong> Tradição, sobre<br />
o Magistério dos concílios e dos<br />
papas, sobre a história da teologia,<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a patrística e a escolástica<br />
até a teologia mo<strong>de</strong>rna, sobre a<br />
mística e a ascese dos santos, sobre<br />
o sensus fi<strong>de</strong>i, etc. Desse<br />
modo, a Maria que sai dos textos<br />
bíblicos é uma mulher grandiosa e<br />
singular, com uma missão privilegiada<br />
na relação com Cristo e com<br />
a Igreja e com cada discípulo <strong>de</strong><br />
Cristo. Já os protestantes e<br />
anglicanos, acostumados a ler a<br />
Bíblia com uma lente bastante restrita,<br />
com um olhar focalizado na<br />
única mediação do Cristo e da Palavra<br />
divina, produzem uma<br />
mariologia muito simples. Sua<br />
mariologia se fixa na história bíblica<br />
da mãe <strong>de</strong> Jesus <strong>de</strong> Nazaré; às<br />
vezes, com alguma <strong>de</strong>voção, sempre<br />
contida, à pessoa e missão <strong>de</strong><br />
Maria. Os ortodoxos lêem a Bíblia<br />
com o olhar dos Santos Padres,<br />
com a mística oriental da contemplação<br />
e da beleza. Sua mariologia<br />
é centrada na beleza <strong>de</strong> Maria,<br />
mulher para ser contemplada e<br />
venerada como toda santa e mo<strong>de</strong>lo<br />
<strong>de</strong> fé para todo cristão.<br />
De qualquer modo, Maria é uma<br />
figura bíblica. Ela é ponto <strong>de</strong> encontro<br />
entre o povo ju<strong>de</strong>u e a Igreja <strong>de</strong><br />
Cristo; é passagem entre a primeira<br />
e a nova aliança. Para todos os<br />
cristãos, ela é a mulher do "sim" à<br />
vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> Deus, exemplo <strong>de</strong> fé e<br />
<strong>de</strong> seguimento do Senhor. Como<br />
dizia Paulo VI, "nela tudo se refere a<br />
Cristo". Não há como permanecer<br />
focados em Maria. Ela é transparente,<br />
aponta imediatamente para o<br />
seu Filho. Com João Paulo II, somos<br />
convidados a contemplar Cristo com<br />
Maria, em Maria, através <strong>de</strong> Maria,<br />
como Maria. Por isso, quanto mais<br />
os católicos retomarem a leitura da<br />
Bíblia, juntamente com seus irmãos<br />
cristãos <strong>de</strong> outras igrejas, mais<br />
apren<strong>de</strong>rão com ela a ser verda<strong>de</strong>iros<br />
seguidores <strong>de</strong> Jesus Cristo, o<br />
único mediador <strong>de</strong> nossa salvação.<br />
P PPe.<br />
P e. Vit Vitor Vit or Galdino Galdino F FFeller<br />
F eller<br />
Prof. <strong>de</strong> Teologia e Diretor do ITESC<br />
Email: vitorfeller@arquifloripa.org.br