Os desassossegos do rei - Quintal dos Poetas
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si<strong>do</strong> a decisão mais rápida que o cauteloso <strong>rei</strong> tomou em toda<br />
a sua vida, não obstante a delicadeza da situação.<br />
Assim que d. Pedro obteve a aprovação <strong>do</strong> pai,<br />
montou em seu cavalo, voltou para o meio <strong>do</strong> povo, bra<strong>do</strong>u a<br />
boa nova e foi delirantemente ovaciona<strong>do</strong>. Era a primeira vez<br />
que o príncipe e seus súditos se olhavam de tão perto e a<br />
simpatia mútua foi imediata. Mas, o povo, sentin<strong>do</strong> que o<br />
momento era muito oportuno e que o príncipe mostrava<br />
muita disposição, achou por bem exigir um pouco mais. Quis<br />
que d. João VI, em pessoa viesse confirmar sua disposição de<br />
atender aqueles anseios populares que nem eram tão absur<strong>do</strong>s<br />
assim. D. Pedro não se fez de roga<strong>do</strong>, montou novamente e<br />
foi buscar o pai. Este ficou tão ator<strong>do</strong>a<strong>do</strong> que nem teve<br />
tempo de pensar em nada. Entrou no coche real meio zonzo<br />
e, com d. Pedro marchan<strong>do</strong> à frente, se dirigiu para a praça <strong>do</strong><br />
Rossio, onde a multidão o aguardava, vibrante de entusiasmo.<br />
A medida que o cortejo seguia o entusiasmo ia aumentan<strong>do</strong>.<br />
No largo de São Francisco o povo deteve a carruagem e<br />
desatrelou os cavalos. Sua Majestade entrou em pânico<br />
imaginan<strong>do</strong> que seria leva<strong>do</strong> direto para o cadafalso. Mas,<br />
nada disso, é só um susto. A multidão começa a dar vivas ao<br />
apavora<strong>do</strong> <strong>rei</strong>, conduzin<strong>do</strong> a carruagem sobre os próprios<br />
costa<strong>do</strong>s. D. João VI fica literalmente mu<strong>do</strong>. É coloca<strong>do</strong> num<br />
balcão para falar ao povo. Não consegue, a voz se esconde. D.<br />
Pedro interfere salva<strong>do</strong>r, desvia a atenção, toma-a sobre si e se<br />
dirige para o recinto da assembléia dan<strong>do</strong> ao pai a chance de<br />
escapar daquela situação desvairada. O <strong>rei</strong> pôde voltar para<br />
casa são e salvo, apenas lamentan<strong>do</strong> o fato de que, no meio da<br />
confusão, alguém lhe tinha furta<strong>do</strong> a bengala.<br />
No tumulto da assembléia d. Pedro toma a palavra e,<br />
em nome <strong>do</strong> <strong>rei</strong>, jura a constituição que se ia formar em<br />
Lisboa. Também anuncia que o ministério seria troca<strong>do</strong><br />
conforme estava sen<strong>do</strong> pedi<strong>do</strong>. A massa delirante aceita a<br />
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