Os desassossegos do rei - Quintal dos Poetas

cera. Além disso, d. Carlota não tinha mesmo muito tempo
para os filhos, estando sempre ocupada mergulhada numa
atmosfera diuturna de fantasias musicais de mau gosto nos
jardins de Queluz. Típico de uma Versailles pobretona. Talvez
por isso ele se sentisse muito mais ligado ao pai do que
àquelas mulheres, apesar dele estar quase sempre mais
distante, em Mafra ou Vila Viçosa.
Os historiadores, em geral, informam que nosso Pedro
de Alcântara, teve uma educação descurada, especialmente por
ela, na sua essência, ter acontecido fora da Europa, num certo
país tropical, distante e iletrado. Apontam como prova disso,
sobretudo, a grafia claudicante dos seus escritos. Há um certo
exagero nessa conclusão, primeiro porque as regras
gramaticais e ortográficas naquele tempo não eram muito bem
convencionadas e segundo porque d. Pedro escrevia com
regular habitualidade, dispensando a ajuda de terceiros na
redação dos seus principais discursos. Seus textos, se não
primam propriamente pelo refinamento literário, também não
chegam a comprometer. Uma comparação cronológica dos
documentos que deixou mostra a clara melhoria do seu texto
ao longo dos anos. Era um missivista compulsivo que tinha o
hábito de escrever cartas em série tratando do mesmo assunto.
Sempre que se sentia ofendido publicava um artigo na
imprensa se defendendo sob pseudônimo. Gostava de inserir
expressões latinas nos seus textos e dizem que se distraiu na
travessia do Atlântico rumo ao Brasil lendo Virgílio no
original. Isso aos nove anos de idade! 18 Além disso, dominava
18
Embora haja um pouco de exagero, essa história não é de todo
impossível pois junto do pequeno príncipe viajou Frei Antônio da
Arrábida, franciscano que tinha sido bibliotecário da magnífica
livraria do palácio de Mafra. Ele bem pode ter aproveitado a
travessia para exercitar o futuro pupilo num pouco de latim.
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