Os desassossegos do rei - Quintal dos Poetas

Claro parece ficar, que não foi por pura lerdeza e
indecisão que d. João retardou a fuga o quanto pôde e só
ordenou o embarque depois de saber que Junot já estava às
portas de Lisboa a alguns passos de apeá-lo do trono.
Acrescente-se ainda às razões retardatárias de d. João o fato de
que ele não queria deixar Portugal antes de estar plenamente
caracterizado que Junot havia tomado Lisboa, justificando a
sua apertada escapada deixando seu país em situação de
orfandade. O general francês sabia disso e contava em
alcançá-lo antes que ele se fizesse ao mar. Tanto que o
primeiro ponto que mirou ao invadir a capital do reino
portugues foi a torre de Belém de onde pensava barrar a
passagem dos barcos em fuga. Quando lá chegou, porém, as
embarcações já tinham deixado a barra. Por outro lado, sabese
que o embaixador inglês - lord Strangford - exagerou um
pouco no seu papel na indução da fuga pois ele não teve
contato com o regente nos últimos dias que antecederam a
fuga e quando percebeu a frota lusa já se encontrava ao mar
pronta para zarpar, apenas esperando Junot chegar às portas
de Lisboa. Strangford seguiu para Londres com parte da frota
britânica e o almirante Smith escoltou d. João e sua comitiva
ao Brasil. 11
11 Strangford foi pego mais de uma vez mentindo sobre negócios
portugueses. Além de exagerar sua influência no convencimento
para que d. João partisse para o Brasil, ele foi autor de uma tradução
fraudulenta dos Lusíadas. Descobriu-se que ele tinha copiado
estrofes inteiras da obra de um poeta inglês e inserido no texto
como se fossem de Camões. Anos mais tarde é que os ingleses iriam
conhecer uma tradução autêntica da obra, desta vez traduzida pelo
famoso Richard Francis Burton que conhecia muito bem a língua
portuguesa e era admirador de José de Alencar.
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