Os desassossegos do rei - Quintal dos Poetas

nomeado por ele para o cargo de chefe da Uchuaria, que vem
a ser a despensa real. Cultivava o hábito de requisitar
mantimentos muito acima do que era realmente consumido,
montando seu próprio armazém com o excesso amealhado.
Quando d. Pedro assumiu a regência, deu nele um acesso de
economia e ele acabou com a Uchuaria. Mas, em lugar de
mandar o ex-barbeiro para o olho da rua, fez pior do que o
pai dando-lhe o último cargo para o qual ele poderia ter
alguma qualificação, vale dizer, tesoureiro da casa real. Nesse
cargo criou o hábito de dar recibo aos fornecedores da casa
real em valores sempre superiores ao montante realmente
entregue ao credor que assim tinha que pagar uma taxa de
administração ao esperto ex-barbeiro.
A despeito da mediocridade geral da corja palaciana, é
inegável que a opinião de Francisco Gomes da Silva tinha
influência sobre o imperador. Mas também é muito provável
que ele não costumava confrontar o modo de pensar de d.
Pedro. Talvez o mais comum fosse que ele se antecipasse
espertamente, dando sugestões que sabia que agradariam ao
poderoso amigo. Além disso tinham gostos em comum,
apesar de que o imperador fosse um abstêmio convicto e
Gomes da Silva fosse um notório beberrão.
Na verdade, o tal ministério secreto não foi um pedra
apenas no sapato de Barbacena pois ele começou a ser criado
logo que d. João retornou a Portugal. O pai era a pessoa de
quem d. Pedro desconfiava menos. Nem mesmo para a
esposa ele abria inteiramente o flanco, sempre temeroso da
influência de Metternich sobre ela. Assim, quando a família
voltou para Portugal, o príncipe regente há de ter se sentido
um tanto abandonado. É compreensível, portanto, que ele
logo se fizesse cercar de um grupo de supostos amigos fieis.
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