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GOFFMAN, Erving. Manicômios, Prisões e Conventos

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pital a firn. de guardá-lo com seguranca. Um paciente as<br />

vezes usava outro paciente como banco, as vezes para pagamento<br />

de urna taxa.<br />

No Hospital Central, os objetos e servicos iIicitamente<br />

comprados pelos pacientes, bem como as fontes de fundos<br />

ilicitamente empregadas, eram ilegais em diferentes graus.<br />

Havia o ato muito proibido de comprar ou vender<br />

bebida alcoólica, contrabandeada para dentro do estabelecimento.<br />

Os pacientes diziarn que as bebidas alcoólicas<br />

podiarn ser regularmente obtldas por dinheiro; embora,<br />

algumas vezes, eu tenha bebido, tanto coro auxiliares quanto<br />

coro pacientes, nao tenho conhecimento de uro mercado<br />

dessa mercadoria. Parece, também, que algumas mulheres se<br />

prostituíam ocasionalmente por algo menos do que um<br />

dólar, mas nao tenho pravas conc1usivas a respeito. Nao<br />

tenho pravas de que houvesse um mercado de tóxicos.<br />

AIguns pacientes, segundo o sabiam outros internados e<br />

pessoas da equipe dirigente, emprestavam dinheiro a pacientes<br />

e auxiliares, cobrando juros relativamente altos, de<br />

vinte e cinco por cento durante um período curto; nesses<br />

casos, parece que o "usurário" tinha tanto interesse pelo<br />

papel social decorrente de seu negócío quanto pelo lucro<br />

obtido.<br />

Outros servicos que podiam ser comprados com dinheiro<br />

eram menos proibidos. Os pacientes diziam que poderiam<br />

mandar passar as calcas por vinte e cincc cears.<br />

Vários ex-barbeiros profissionais faziam um "bom" corte<br />

de cabelo em troca de cigarros ou dinhciro; essc mercado<br />

era criado pelos "maus" cortes de cabelo de que os pacientes<br />

podiam dispar comurnentet'". Um relojociro nUID dos<br />

servícos estava táo bem estabelecido em seu oficio, que<br />

muitas pessoas da equipe dirigente, bem como pacientes,<br />

pagavam por seus servicos, que custavam aproximadamente<br />

a metade do que fora se pagarla por eles. Alguns pacientes<br />

atuavam como mensageiros no hospital, e pelo menos um<br />

deles pagaya ajudantes. Uro paciente que nao podia sair do<br />

hospital pagaya trinta e cinco cents para outro, com Iícenca<br />

para ir a cidade, para levar um terno ao tintureiro e trazé-lo<br />

de volta (um servico para o qual havia procura, mas talvez<br />

nao houvesse preco padronizado), e pagaya al:' trabalhador<br />

da sapataria para colocar saltos novas no seu sapato<br />

particular.<br />

(129) Um paciente muito simpático, e que era barbelro proñaslonal,<br />

dizia que poderia ganhar oitenta dólares por mes no hospital, exercendo<br />

o seu ofíc¡o. Depo-s de ter saído do edifício de máxima seguranca penal,<br />

ocasionalmente era levado de votta para lá, quando cometia algum delito<br />

e estava com Iiberdade de circulacño dentro do hospital. Dizia que urna<br />

das contingencias desse afastamcnto periódico era que, cada vez que<br />

taso ocorr¡a, perdia sua clientela e precísava conquistá-la novamente quando<br />

voltava para o hospital proprjamente dito.<br />

218<br />

Embora todos esses servicos fossem comprados e vendidos,<br />

nao o era m por todos os pacientes. Urna das atividades<br />

mais difundidas de compras refería-se a fósforos,<br />

formalmente ilegais, mas cuja posse era ignorada, a nao ser<br />

no caso de pacientes que, segundo se sabia, ofereciam perigo<br />

na provocacáo de incendios. Uro paciente era conhecido<br />

em todo o hospital como vendedor de fósforos ­<br />

um penny por caixa - e durante todo o dia pacientes que<br />

ele fiaD conhecia o procuravam com um penny na máo,<br />

para comprar fósforos.<br />

A principal fonte de renda em dinheiro para os pacientes<br />

era, além do que era autorizado ou trazido por<br />

parentes, a Iavagem de carros. Em todos os níveis da equipe<br />

dirigente havia fregueses, tanto em base "regular" ­<br />

aproximadamente dais dólares por més - ou urna lavagern<br />

por vez, na base de cinqüenta a setenta e cinco cents. (O<br />

preco comercial predominante para urna única lavagem era<br />

de um dólar e vinte e cinco centavos a um dólar e meio.)<br />

As vezes, os visitantes eram "abordados", como fregueses<br />

potenciais, peJos lavadores de carro.<br />

Alguns pacientes também enceravam automóveis, mas<br />

isso exigia capital para comprar a cera, bem como uro contato<br />

externo para comprar esse material. O negócio de<br />

carros, ao contrário do que ocorria coro a maioria dos<br />

outros no hospital, tinha criado certa dívisáo do trabalho:<br />

uro paciente vendia grandes latas d'água, por cinco cents,<br />

para os lavadores; outro dizia ter contratado vários pacientes<br />

cuja lavagem tinha conseguido combinar; outro dizia<br />

que, usualmente, recebia cinqüenta cents de gorjeta para<br />

conseguir um trabalho de encerar carro.<br />

Os pacientes comecaram a sentir que a Iavagem de<br />

carros era urna prerrogativa legítima e que o trabalho do<br />

hospital poderia interferir injustamente nessa forma de ganhar<br />

dinheiro. As vezes se faziam acordos extra-oficiáis, de<br />

forma que um paciente pudesse fazer seu trabalho no hospital<br />

e ainda ter tempo para o que as vezes chamava de<br />

seu "trabalho de verdade"., Pode-se acrescentar que, ernbora<br />

algumas pacientes lavassem carros, essa fonte de renda,<br />

tal como ocorria com a maioria das fontes nao-autorizadas<br />

de obtencáo de dinheiro, era considerada adequada<br />

apenas para homens.<br />

Havia algumas outras formas secundárias de conseguir<br />

dinheiro. Alguns pacientes engraxavam sapatos, tanto<br />

para os auxiliares quanto para outros pacientes. Nos jogos<br />

internos, alguna pacientes vendiam refrigerantes com certo<br />

lucro. Em algumas enfermarias, os pacientes compravam o<br />

pó "Kool" na cantina, e vendlam um refrigerante gelado.<br />

Um ou dais pacientes colhiam amoras nos bosques do hos-<br />

219<br />

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