Ana Rita Santigo da Silva - texto.pdf - RI UFBA - Universidade ...
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A voz de mulher preta não tem identi<strong>da</strong>de única e homogênea, haja vista que é<br />
forma<strong>da</strong> por metades e parte dela “[...] é fêmea de curvas bem defini<strong>da</strong>s e cheiro forte<br />
de mulher preta, a outra parte é um preto cismado, de pouca conversa e muito ciúme<br />
[...]”. Entre a voz feminina preta e enti<strong>da</strong>des espirituais afrobrasileiras não existe<br />
distanciamento, pois metade dela é “[...] Nana Agotimé e seus caprichos de rainha, a<br />
outra metade é um escravo aguadeiro [...]” (MUNZANZU, 2008). Ser rainha e escrava<br />
parece uma oposição inimaginável, mas como ela se apresenta construí<strong>da</strong> por<br />
identi<strong>da</strong>des fragmenta<strong>da</strong>s, é possível imaginá-la por diversas metades, inclusive por<br />
aquelas aparentemente desconexas.<br />
O título Encontro insinua a interação de suas diversi<strong>da</strong>des, que abarcam partes<br />
pequenas e mínimas como o Rio Una ou [...] um rio tortuoso, arriscado, que corta a<br />
mata com que<strong>da</strong>s violentas [...]” (MUNZANZU, 2008) e outras tantas imensuráveis em<br />
suas dimensões como uma Baía, o Mar <strong>da</strong> Gambôa e a ci<strong>da</strong>de do Rio de Janeiro. Ser<br />
várias em uma, mulher preta, contudo, não a afasta de afrodescendências, pois ela<br />
também é “[...] bateria <strong>da</strong> Mangueira, avisando que vai entrar na passarela, a outra parte<br />
é o Mundo Negro cantando a liber<strong>da</strong>de de Angola nas ruas do Curuzu” (MUNZANZU,<br />
2008).<br />
Ser parte não implica desenhá-la com traços de incompletudes, haja vista que ela<br />
é o tudo imbricado por ações, devaneios certos, sonhos possíveis, cálculos malucos e<br />
estratégias sem simétricas e com “[...] os sentimentos mais nobres guar<strong>da</strong>dos bem lá no<br />
fundo, para poucos, ou melhor, para poucas!”(MUNZANZU, 2008). Tal multiplici<strong>da</strong>de<br />
lhe permite, sem escrúpulos, retificar a quem indubitavelmente se destinam seus<br />
sentimentos: a poucas!. Desse modo, a mulher preta, embora se constitua de feições<br />
masculinas e femininas, sua afetivi<strong>da</strong>de se restringe a poucas.<br />
Forma<strong>da</strong> por movimentos e calmarias, a voz preta é tão dinâmica quanto o<br />
Barijó, enti<strong>da</strong>de africano-brasileira, caracteriza<strong>da</strong> pelo poeta Lepê Correia,<br />
ENU BA<strong>RI</strong>JÓ*<br />
Oh! Primogênito do Universo<br />
Oh! Senhor dos Caminhos<br />
Boca coletiva<br />
Eco de todos os tons.<br />
Nota de to<strong>da</strong>s as pautas<br />
Guardião de to<strong>da</strong>s as portas<br />
Movimento de todo o Universo<br />
Pés de to<strong>da</strong>s as rasteiras<br />
Pernas de todos os an<strong>da</strong>res.<br />
Conduz teu povo<br />
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