Ana Rita Santigo da Silva - texto.pdf - RI UFBA - Universidade ...
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Assim, o recorte temporal da pesquisa se inseriu nesse movimento estético em que diversidades culturais tornam-se dimensões relevantes para se pensar identidades multifacetadas e plurais. A quarta circunstância aproxima-se da anterior, pois o ano de 1978 e os subsequentes configuraram-se como períodos marcantes da história dos movimentos sociais negros, haja vista que foi quando se iniciou a reorganização desse segmento de mobilização social através da criação do Movimento Negro Unificado contra a Discriminação Racial (MNUCDR), em 18 de junho de 1978, do Grupo Consciência Negra (GRUCON), em 1982, e de outros afins. Certamente, o surgimento dessas entidades propiciou a ampliação das discussões sobre o racismo e outros dramas vividos pelas populações negras no Brasil. Além disso, forjou agendas de reivindicações de demandas dessas populações e de políticas de combate ao racismo e às formas de exclusão que perpassam as relações na sociedade brasileira. Mais ainda, tais organizações também contribuíram para fortalecer a Literatura Negra (LN), vista aqui como um projeto literário, produzido por escritores/as negros/as, que se apóiam em histórias, memórias, culturas e imaginários para criarem seus textos literários. Com a LN, eles/as cantam suas africanidades, a qual tem uma extensão coletiva e não apenas a exibição de uma expressão artística individual. Também, em 1978, os Cadernos Negros (CN) começaram a ser editados. É uma publicação de contos e poesias, criada por escritores/as negros/as e hoje suas edições são organizadas pela Editora Quilombhoje (São Paulo). Por meio dos CN, personagens negras são tecidas de modo afirmativo, longe de estereótipos negativos. Culturas negras, ancestralidades africanas, escravidão, resistência negra, quilombos, amor, liberdade, diáspora, identidades negras 4 , poder, tradições religiosas de matriz africana, artes africanas e afrobrasileiras são algumas das temáticas neles presentes. Aline Costa, ao traçar lembranças e memórias dos CN, declarou: “Através do Quilombhoje e dos Cadernos negros, mulheres e homens negros têm perpetuado sua cultura e suas raízes, ambos exercem o papel de ferramenta da resistência [...]” (COSTA, 2008, p. 39). 4 Identidades negras são entendidas, de acordo com a Enciclopédia brasileira da diáspora africana, de Nei Lopes (2004), como uma categoria conceitual usada, no Brasil e em outras diásporas, para designar narrativas e construções individuais e coletivas, relacionadas à descendência africana, bem como ao pertencimento e à adesão a traços e repertórios culturais africano-brasileiros. 16
Os CN têm sido um dos responsáveis pela formação de públicos escritores e leitores de LN de várias partes do Brasil, como já afirmara a pesquisadora Florentina Souza, 17 Mesmo não constando das prateleiras das grandes livrarias, os Cadernos Negros ganham visibilidade e ampliam seus leitores entre os vários grupos e organizações negras que são fundados no Brasil a partir das décadas 70/80 do século 20; seus editores e escritores organizam e participam de encontros de literatura negra e seus textos ampliam o campo de circulação, de modo que hoje podemos encontrar vários trabalhos, dissertações e teses, que têm como tema aspectos relativos aos Cadernos Negros, tanto no Brasil quanto no exterior. Desse modo, os Cadernos Negros tornaram-se referência entre leitores mais intelectualizados, a ponto de artistas, jornalistas, professores, rappers, cineastas citarem os Cadernos como marco nas suas vidas de leitores. (SOUZA, 2008, p. 54) A LN, neste sentido, tornou-se um segmento literário que interessa não apenas aos/às escritores/as negros/as, mas a intelectuais, artistas e produtores/as culturais. E os CN colaboram incessantemente para a divulgação de produções da LN e para ampliação de seus/as leitores. Os CN já estão com 32 volumes, contando com a participação de literatos/as negros/as de várias regiões do Brasil, mas até o momento só três baianas participaram dessa publicação: Ana Célia Silva (nº 19), Mel Adún (nº 29, 30, 31 e 32) e Fátima Trinchão (nº 32). Apesar de reconhecer a oportunidade de visibilização da produção literária dessas autoras e de seus significativos envolvimentos com a LN, lamento essa presença mínima de escritoras baianas nos CN. Certamente, tal realidade não se estabelece sem motivos. Talvez a incipiência da divulgação dos CN, na Bahia, e a dinâmica de auto-sustentabilidade do projeto CN, através de consórcios, como uma das condições para integração ao grupo de escritores/as negros/as, envolvidos/as no trabalho de suas edições, já são suficientes para justificarem a pouca participação delas. As condições de escrita e publicação de mulheres negras baianas não parecem ainda muito favoráveis à divulgação e ao reconhecimento delas e de suas obras em redes de escritores/as negros/as. Ainda assim, reconheço, juntamente com Costa, que os CN, no cenário nacional, [...] têm sido importantes também para dar visibilidade à produção literária da mulher negra, esta que foi e é tão importante no Movimento Negro e que nas primeiras edições esteve presente em pequeno número e que, nos Cadernos Negros volume 30, aparece em maior quantidade, demonstrando assim que a escrita da mulher negra vem se articulando e ocupando seu espaço único e específico dentro da literatura afro-brasileira [...] (COSTA, 2008, p. 37)
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Assim, o recorte temporal <strong>da</strong> pesquisa se inseriu nesse movimento estético em<br />
que diversi<strong>da</strong>des culturais tornam-se dimensões relevantes para se pensar identi<strong>da</strong>des<br />
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A quarta circunstância aproxima-se <strong>da</strong> anterior, pois o ano de 1978 e os<br />
subsequentes configuraram-se como períodos marcantes <strong>da</strong> história dos movimentos<br />
sociais negros, haja vista que foi quando se iniciou a reorganização desse segmento de<br />
mobilização social através <strong>da</strong> criação do Movimento Negro Unificado contra a<br />
Discriminação Racial (MNUCDR), em 18 de junho de 1978, do Grupo Consciência<br />
Negra (GRUCON), em 1982, e de outros afins. Certamente, o surgimento dessas<br />
enti<strong>da</strong>des propiciou a ampliação <strong>da</strong>s discussões sobre o racismo e outros dramas vividos<br />
pelas populações negras no Brasil. Além disso, forjou agen<strong>da</strong>s de reivindicações de<br />
deman<strong>da</strong>s dessas populações e de políticas de combate ao racismo e às formas de<br />
exclusão que perpassam as relações na socie<strong>da</strong>de brasileira.<br />
Mais ain<strong>da</strong>, tais organizações também contribuíram para fortalecer a Literatura<br />
Negra (LN), vista aqui como um projeto literário, produzido por escritores/as negros/as,<br />
que se apóiam em histórias, memórias, culturas e imaginários para criarem seus <strong>texto</strong>s<br />
literários. Com a LN, eles/as cantam suas africani<strong>da</strong>des, a qual tem uma extensão<br />
coletiva e não apenas a exibição de uma expressão artística individual. Também, em<br />
1978, os Cadernos Negros (CN) começaram a ser editados. É uma publicação de contos<br />
e poesias, cria<strong>da</strong> por escritores/as negros/as e hoje suas edições são organiza<strong>da</strong>s pela<br />
Editora Quilombhoje (São Paulo).<br />
Por meio dos CN, personagens negras são teci<strong>da</strong>s de modo afirmativo, longe de<br />
estereótipos negativos. Culturas negras, ancestrali<strong>da</strong>des africanas, escravidão,<br />
resistência negra, quilombos, amor, liber<strong>da</strong>de, diáspora, identi<strong>da</strong>des negras 4 , poder,<br />
tradições religiosas de matriz africana, artes africanas e afrobrasileiras são algumas <strong>da</strong>s<br />
temáticas neles presentes. Aline Costa, ao traçar lembranças e memórias dos CN,<br />
declarou: “Através do Quilombhoje e dos Cadernos negros, mulheres e homens negros<br />
têm perpetuado sua cultura e suas raízes, ambos exercem o papel de ferramenta <strong>da</strong><br />
resistência [...]” (COSTA, 2008, p. 39).<br />
4 Identi<strong>da</strong>des negras são entendi<strong>da</strong>s, de acordo com a Enciclopédia brasileira <strong>da</strong> diáspora africana, de<br />
Nei Lopes (2004), como uma categoria conceitual usa<strong>da</strong>, no Brasil e em outras diásporas, para designar<br />
narrativas e construções individuais e coletivas, relaciona<strong>da</strong>s à descendência africana, bem como ao<br />
pertencimento e à adesão a traços e repertórios culturais africano-brasileiros.<br />
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