Ana Rita Santigo da Silva - texto.pdf - RI UFBA - Universidade ...
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I CAPÍTULO ALGUMAS ESCRITORAS NEGRAS BAIANAS: ENTRE O TORNAR-SE E O DEVIR 8 (Vera Duarte – Moçambique) Fonte da foto: . Aceso em 30/07/2010. Queria ser um poema lindo cheirando a terra com sabor a cana Queria ver morrer assassinado um tempo de luto de homens indignos Queria desabrochar — flor rubra — do chão fecundado da terra ver raiar a aurora transparente se r´bera d´julion em tempo de São João nos anos de fartura d´espiga d´midje. E ser riso flor fragrante em cânticos na manhã renovada. (DUARTE, 2008) Este capítulo foi elaborado a partir de informações adquiridas em encontros com as colaboradoras do estudo, através de entrevistas realizadas entre os anos de 2007 e 2008, e de alguns textos que a elas aludem. O objetivo não é salientar os dados biográficos das autoras, mas apresentá-los em diálogo com diversos textos, tais como fotolog, álbuns etc. Pretende este capítulo referenciá-los, quando oportuno, associados com seus relatos e depoimentos em blog e entrevistas, com suas obras literárias, fortuna 8 Devir aqui tem o sentido atribuído por Gilles Deleuze e Félix Guattari (1997, p. 18-19): “Um devir não é uma correspondência de relações. Mas tampouco ele é uma semelhança, uma imitação e, em última instância, uma identificação [...]. O devir não é uma evolução, ao menos uma evolução por dependência e filiação. O devir nada produz por filiação; toda filiação seria imaginária. O devir é sempre de uma ordem outra que a da filiação. Ele é da ordem da aliança”. 34
crítica, ainda em construção, e ─ de algumas ─ com ensaios e artigos sobre suas trajetórias como autoras negras. Desse modo, não é meta desta parte do texto a criação de suas biografias, mas fazer uma leitura crítica-biográfica já que, como afirma Souza, “[...] ao escolher tanto a produção ficcional quanto a documental do autor – correspondência, depoimentos, ensaios, crítica – desloca o lugar exclusivo da literatura como corpus de análise e expande o feixe de relações culturais [...]” (SOUZA, 2002, p. 105). O sentido deste capítulo se insere no desejo de que discursos, poéticas e narrativas de oito escritoras negras baianas sobre si sejam interpretados em consonância com os sentidos e interpretações que elas atribuem aos seus textos e vivências. Sendo assim, importa narrar, compreender e interpretar histórias, contadas por elas, no que se refere à formação da identidade autoral, do público leitor e aos possíveis traços de identidades negras em suas invenções poéticas e ficcionais, haja vista a coerência do que indica Souza sobre a crítica biográfica: “Os princípios básicos da crítica biográfica resultam ainda na produção de um saber narrativo, engendrado pela conjunção da teoria e da ficção e pelo teor documental e simbólico do objeto de estudo” (SOUZA, 2002, p. 108). Suas trajetórias, aqui narradas e interpretadas, não são de modo algum consideradas definidas e dadas, tampouco vistas de modo acabado, linear, contínuo e naturalizado. Ao contrário, elas são aqui “lidas” como um descontínuo discursivo e narrativo e um fragmentário movimento de construção de si e de suas identidades autorais, motivado por uma multiplicidade de devires e acontecimentos cotejados pelas narratividades de si. Ao atribuir significados aos processos de constituição das autoras, percebi que algumas dimensões, tais como dificuldades de publicação e de divulgação de suas obras; a preocupação com a formação intelectual; a função social da literatura e suas possíveis e instigantes relações com demandas de gênero e étnico-raciais e publicações em ambiente digital como blogs e sites ganham destaque e se entrecruzam nos caminhos e redes por elas traçados. Essas interseções não sobressaem sem razões, ao contrário se justificam pelo apagamento, pelo desconhecimento público de escritoras negras em ambientes literários e pelas oportunidades e espaços que as tecnologias atuais da comunicação e da informação e as redes sociais criam, facilitando a divulgação de suas produções literárias. 35
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ALGUMAS ESC<strong>RI</strong>TORAS NEGRAS BAIANAS:<br />
ENTRE O TORNAR-SE E O DEVIR 8<br />
(Vera Duarte – Moçambique)<br />
Fonte <strong>da</strong> foto: . Aceso em 30/07/2010.<br />
Queria ser um poema lindo<br />
cheirando a terra<br />
com sabor a cana<br />
Queria ver morrer assassinado<br />
um tempo de luto<br />
de homens indignos<br />
Queria desabrochar<br />
— flor rubra —<br />
do chão fecun<strong>da</strong>do <strong>da</strong> terra<br />
ver raiar a aurora transparente<br />
se r´bera d´julion<br />
em tempo de São João<br />
nos anos de fartura d´espiga d´midje.<br />
E ser<br />
riso<br />
flor<br />
fragrante<br />
em cânticos na manhã renova<strong>da</strong>. (DUARTE, 2008)<br />
Este capítulo foi elaborado a partir de informações adquiri<strong>da</strong>s em encontros com<br />
as colaboradoras do estudo, através de entrevistas realiza<strong>da</strong>s entre os anos de 2007 e<br />
2008, e de alguns <strong>texto</strong>s que a elas aludem. O objetivo não é salientar os <strong>da</strong>dos<br />
biográficos <strong>da</strong>s autoras, mas apresentá-los em diálogo com diversos <strong>texto</strong>s, tais como<br />
fotolog, álbuns etc. Pretende este capítulo referenciá-los, quando oportuno, associados<br />
com seus relatos e depoimentos em blog e entrevistas, com suas obras literárias, fortuna<br />
8 Devir aqui tem o sentido atribuído por Gilles Deleuze e Félix Guattari (1997, p. 18-19): “Um devir não<br />
é uma correspondência de relações. Mas tampouco ele é uma semelhança, uma imitação e, em última<br />
instância, uma identificação [...]. O devir não é uma evolução, ao menos uma evolução por dependência e<br />
filiação. O devir na<strong>da</strong> produz por filiação; to<strong>da</strong> filiação seria imaginária. O devir é sempre de uma ordem<br />
outra que a <strong>da</strong> filiação. Ele é <strong>da</strong> ordem <strong>da</strong> aliança”.<br />
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