12.05.2013 Views

Ana Rita Santigo da Silva - texto.pdf - RI UFBA - Universidade ...

Ana Rita Santigo da Silva - texto.pdf - RI UFBA - Universidade ...

Ana Rita Santigo da Silva - texto.pdf - RI UFBA - Universidade ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

229<br />

[...] Arlin<strong>da</strong> penava e relembrava os momentos em que vivera com seus pais<br />

ali, e após a morte deles, ela permanecera na casa, um dos poucos bens que o<br />

seu pai pode lhe deixar, mas, que até hoje, ela agradecia. A artrose já lhe<br />

dificultava os movimentos e as varizes, complicavam ain<strong>da</strong> mais. Acima do<br />

seu peso ideal, era-lhe sofrível as subi<strong>da</strong>s e desci<strong>da</strong>s porém, a vi<strong>da</strong> tinha que<br />

seguir em frente até quando desse e a velha fadiga não tinha espaço para<br />

importuná-la, mesmo porque tudo tinha suas compensações. Muitas foram as<br />

lutas, não poucas as batalhas, mas, era uma filha de Iansã, guerreira, altiva e<br />

por tão pouco não se deixava abater. Já de há muito que era acostuma<strong>da</strong> a<br />

guerrear, guerrear na vi<strong>da</strong> e pela vi<strong>da</strong>, "gente como a gente seo moço, não<br />

pode se deixar abater não, senão não vive". [...] Arlin<strong>da</strong> ia fazendo o seu<br />

caminho, desde moça fora assim, a garra com que vivera demonstrava a<br />

tantos quantos estivessem ao seu redor, a sua força e energia, força e energia<br />

que não eram à toa, já que nascera uma guerreira, uma filha de Iansã. Epa<br />

hei,minha mãe! [...] (T<strong>RI</strong>NCHÃO, 2010, p. 1)<br />

As memórias de Arlin<strong>da</strong> são como um legado de caráter cultural, familiar,<br />

grupal e social, a que se refere Ecléa Bosi (1994), quando apresentou o estudo sobre<br />

memórias e histórias de velhos, em seu livro, Memórias e socie<strong>da</strong>de. Elas não são<br />

apenas produtos pessoais, já que diversos eventos e espaços, como segmentos<br />

memoriais, também fazem história e constroem, concomitantemente, memórias<br />

individuais e coletivas. Ademais, as memórias não apenas reinventam o passado, mas<br />

também narram construções de autoconhecimento e elaboram significações sobre o<br />

presente. Mais ain<strong>da</strong>, segundo Pierre Nora,<br />

[...] A memória é vi<strong>da</strong>, sempre carrega<strong>da</strong> por grupos vivos e, nesse sentido,<br />

ela está em permanente evolução, aberta à dialética <strong>da</strong> lembrança e do<br />

esquecimento, inconsciente de suas deformações sucessivas, vulnerável a<br />

todos os usos e manipulações, suscetível de longas latências e de repentinas<br />

revitalizações [...] A memória é um fenômeno sempre atual, um elo vivido no<br />

eterno presente [...] ela se alimenta de lembranças vagas, telescópicas,<br />

globais ou flutuantes, particulares ou simbólicas, sensível a to<strong>da</strong>s<br />

transferências, cenas, censura ou projeções [...]; que ela é por natureza,<br />

múltipla e desacelera<strong>da</strong>, coletiva, plural e individualiza<strong>da</strong> [...] (NORA, 1993,<br />

p. 9)<br />

Pertencente a uma família negra, que valorizava as culturas e práticas religiosas<br />

de seus antepassados, ela prossegue a sua existência disposta e decidi<strong>da</strong> a lutar sempre.<br />

É uma atitude que não assumiu voluntariamente, mas que derivou de referências e<br />

exemplos depreendidos do convívio com sua família.<br />

[...] como eu ia lhe dizendo, papai ia saindo um dia do cais, bem de noite,<br />

bem tarde, e ai, apareceram três indivíduos querendo tirar idéia com ele, ele<br />

ficou na dele, não era possível uma coisa <strong>da</strong>quelas [...] um deles veio e<br />

empurrou meu pai, o outro tentou tirar a sacola que ele levava com as roupas<br />

de trabalho e o terceiro avançou pra ele com um punhal; meu pai entendeu a<br />

situação, aquele pessoal não ‘tava para brincadeira. Ele se encostou à parede,

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!