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Ana Rita Santigo da Silva - texto.pdf - RI UFBA - Universidade ...

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que ficcionais, possivelmente forjam memórias não apenas para trazer à baila<br />

imaginários milenares africanos, mas também para contribuir com (re) elaborações de<br />

afrodescendências. Tal inferência pode mostrar um provável desejo <strong>da</strong> autora,<br />

apresentado durante a entrevista, de que figuras míticas e aspectos culturais negros<br />

sejam evidenciados, dinamizados e, acima de tudo, tornem-se efetivas referências em<br />

múltiplos processos de formação de memórias de identi<strong>da</strong>des negras.<br />

228<br />

As memórias, em Arlin<strong>da</strong>, também se apresentam através de duas formas de<br />

escritas de si e do outro, pois o foco narrativo de Arlin<strong>da</strong> oscila entre duas vozes: a <strong>da</strong><br />

protagonista – Arlin<strong>da</strong> – e a de uma voz ausente e observadora. To<strong>da</strong> a narrativa é<br />

estrutura<strong>da</strong> em um parágrafo e desenvolvi<strong>da</strong> em uma linguagem coloquial, contando<br />

memórias <strong>da</strong> personagem principal, uma mulher negra pobre, adepta <strong>da</strong> fé em Òrisàs e<br />

moradora de um morro de uma ci<strong>da</strong>de grande.<br />

Da casa do alto do morro, divisava o mundo do asfalto. É bem ver<strong>da</strong>de que<br />

para chegar aqui embaixo e retornar todos os dias, era uma dificul<strong>da</strong>de muito<br />

grande, pois aquela esca<strong>da</strong>, com aqueles cento e cinqüenta degraus, todos os<br />

dias era muito puxa<strong>da</strong>, quando mais jovem, não tinha esse problema não,<br />

subia e descia quantas vezes fossem necessárias, levava e trazia trouxas e<br />

mais trouxas de roupas, de longe, que lavava, quarava e botava pra secar, ali,<br />

quando tinha muito mato verde [...] (T<strong>RI</strong>NCHÃO, 2010, p. 1)<br />

As memórias de Arlin<strong>da</strong> compõem-se por acontecimentos vividos, em varia<strong>da</strong>s<br />

épocas, espaços, reali<strong>da</strong>des, sentimentos e simbologias, que transitam entre o passado e<br />

o presente e entre o individual e o coletivo. Elas assim se constituem porque as<br />

memórias se processam, associa<strong>da</strong>mente, segundo Giovanna Leone (1998), em variados<br />

campos, a saber: psicológico (análise <strong>da</strong>s características e mecanismos que a sustentam;<br />

percepção e acúmulo do conhecimento); sociológico (criação de arquivos e<br />

instrumentos externos para habili<strong>da</strong>des individuais, a fim de potencializar e desenvolver<br />

a memória); histórico (interação <strong>da</strong> memória com a história; ca<strong>da</strong> lembrança é uma re-<br />

elaboração criativa); pessoal (produção de diários, autobiografias, literatura de<br />

testemunho etc) e autorreferencial (memória autobiográfica; relaciona<strong>da</strong> com as<br />

implicações sociais e coletivas).<br />

A voz ausente e aquela presente no conto reúnem lembranças pessoais e as<br />

resultantes de sua inserção em vários espaços e instâncias, para continuarem com a<br />

ocupação de apresentar Arlin<strong>da</strong>. Já envelheci<strong>da</strong>, ela enfrenta os limites físicos deixados<br />

pelo tempo e pela labuta em favor <strong>da</strong> sobrevivência e relembra os vários momentos<br />

vividos: dificul<strong>da</strong>des, soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong>de, vi<strong>da</strong> em família e em comuni<strong>da</strong>de etc.

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