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Ana Rita Santigo da Silva - texto.pdf - RI UFBA - Universidade ...

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suas recor<strong>da</strong>ções no recôndito de sua casa. Contudo, O quarto e Yeyelodê se<br />

diferenciam no foco narrativo: enquanto a personagem Ma<strong>da</strong>lena, do primeiro, narra<br />

sobre si, escrevendo sua própria história, Yeyê, do segundo, é observa<strong>da</strong> por uma<br />

terceira pessoa. A voz narradora acompanha atentamente Yeyê em busca de seus alvitres<br />

para se situar diante do que se transformara.<br />

191<br />

Em casa, à noite, senta<strong>da</strong> e sozinha, Yeyê se pôs a pensar. Pensou nos<br />

Xangôs, nos Oguns. Lembrou dos homens que passaram por sua vi<strong>da</strong> e a<br />

transformaram na mulher que é. Ca<strong>da</strong> um com a sua colaboração. Montando<br />

com peças alegres, sofri<strong>da</strong>s e doí<strong>da</strong>s a realeza em que ela se transformara.<br />

Como ela amou e foi ama<strong>da</strong> por eles! [...] (ADÚN, 2007, p. 151)<br />

O título do conto, Yeyelodê, e o nome de sua única personagem, Yeyê, também<br />

não estão isentos de significações externas, como os nomes Ma<strong>da</strong>lena e João. Essas<br />

nomeações são recriações e derivam do título Iyáláòdê (Iyalodê), na tradição yorubana,<br />

conferido à pessoa que ocupa o lugar mais importante entre as mulheres <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de.<br />

Iyalodê também é um título concedido às mulheres rainhas e um dos nomes de Òsum,<br />

nome de um rio na Nigéria, em Ijexá e em Ijebú, no continente africano, e também<br />

nome de uma deusa africana, cultua<strong>da</strong> em religiões afrobrasileiras. Yeyelodê e Yeyê<br />

podem ser nomeações referencia<strong>da</strong>s ao vocativo designado a essa Iyabà (orisà<br />

feminino): Ora Yeyê ò ò.<br />

Essas informações apontam outra diferença entre O quarto e Yeyelodê no<br />

tocante à relação e sentidos dos nomes de suas personagens. No primeiro, a referência é<br />

<strong>da</strong> tradição ju<strong>da</strong>ico-cristã, enquanto, no segundo, prevalece aquela que provém do<br />

continente africano e de repertórios religiosos de matriz africana no Brasil. Ma<strong>da</strong>lena e<br />

Yeyê têm perfis afrodescendentes, mas a primeira participa de uma trama em que<br />

circulam experiências culturais ocidentais; já a segun<strong>da</strong>, em tudo à sua volta, inclusive<br />

seu nome, transitam traços culturais que envolvem africani<strong>da</strong>des e remissões à África-<br />

Mãe, remetendo ao desejo <strong>da</strong> autora de fazer uma literatura preta. A presença de<br />

africani<strong>da</strong>des, nesse conto, faz retomar as informações <strong>da</strong> autora, durante a entrevista,<br />

quando se refere ao seu pertencimento a uma roça, uma comuni<strong>da</strong>de religiosa de matriz<br />

africana e, sobretudo, ao seu envolvimento com a orisà Òsum, a quem chamou de mãe e<br />

declarou ser inicia<strong>da</strong>.<br />

Tais constatações garantem que Mel Adún, em Yeyelodê e em outras poéticas e<br />

narrativas afrofemininas, faz <strong>da</strong> linguagem literária um lugar profícuo de valorização de<br />

universos culturais negros, comprometi<strong>da</strong> com uma escrita que promova o

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