Ana Rita Santigo da Silva - texto.pdf - RI UFBA - Universidade ...
Ana Rita Santigo da Silva - texto.pdf - RI UFBA - Universidade ...
Ana Rita Santigo da Silva - texto.pdf - RI UFBA - Universidade ...
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
175<br />
O Baobá, incontestavelmente, como uma árvore firme, mas não tão vulnerável e<br />
breve como são as flores, pode simbolizar, no poema, histórias, desejos e ações do eu<br />
feminino, porque a mulher preta apresenta-se e pode-se, por ela, talvez desenhar<br />
performances de mulheres, já que há nele uma afirmação de si, enquanto sujeito poético<br />
feminino negro. A autopercepção, marca<strong>da</strong> pela subjetivi<strong>da</strong>de de um eu performático,<br />
desfila como um ato político, já que assumir-se mulher preta, ou seja, a invenção dessas<br />
identi<strong>da</strong>des não ocorre isola<strong>da</strong>mente, mas nas relações com o outro, com quem há<br />
pontos de identificações ou com aqueles que se destacam e se aproximam,<br />
simultaneamente, pelas suas diferenciações. Hall problematiza a constituição <strong>da</strong>s<br />
identi<strong>da</strong>des por entender que elas<br />
[...] são construí<strong>da</strong>s por meio <strong>da</strong> diferença e não fora dela. Isso implica o<br />
reconhecimento radicalmente perturbador de que é apenas por meio <strong>da</strong> relação<br />
com o Outro, <strong>da</strong> relação com aquilo que não é, com precisamente aquilo que<br />
falta, com aquilo que tem sido chamado de seu exterior constitutivo, que o<br />
significado “positivo” de qualquer termo – e, assim, sua “identi<strong>da</strong>de” – pode<br />
ser construído [...] (HALL, 2000, p. 110)<br />
Talvez, por isso, seja na relação com o seu homem-amante que a mulher preta<br />
tece a sua constituição, tornando possível não apenas se apresentar, mas também<br />
construir, cultural e socialmente, acima de tudo, o seu feminino, fugindo <strong>da</strong>quele que é<br />
elaborado por fragili<strong>da</strong>des, como as flores, e por recalques. Ela alcança o<br />
empoderamento, que reside em ser capaz e livre para mostrar-se com a certeza de que,<br />
como rainha caprichosa, poderá descolonizar pensamentos e relações e forjar outras<br />
formas de viver no espaço privado, como a família. No convívio com o seu amante, ela<br />
adquire o poder de discernir e escolher aquilo que seja firme e não tão vulnerável<br />
quanto às flores.<br />
Com as possíveis diferenças entre as flores e o Baobá, ela constrói discursos<br />
sobre si e desvela seus sonhos, excluindo de seu mundo aquilo que não deseja: “Não<br />
quero flores. Quero um baobá” (MUNZANZU, 2008, p. 1). Tomaz Tadeu <strong>da</strong> <strong>Silva</strong>, ao<br />
discutir a produção <strong>da</strong> identi<strong>da</strong>de e <strong>da</strong> diferença, assegura que a afirmação <strong>da</strong> identi<strong>da</strong>de<br />
e a marcação <strong>da</strong> diferença também pressupõem movimentos de inclusão e de exclusão,<br />
pois, segundo ele,<br />
[...] dizer “o que somos” significa também dizer “o que não somos”. A<br />
identi<strong>da</strong>de e a diferença se traduzem, assim, em declarações sobre quem<br />
pertence e sobre quem não pertence, sobre quem está incluído e quem está<br />
excluído. Afirmar a identi<strong>da</strong>de significa demarcar fronteiras, significa fazer<br />
distinções entre o que fica dentro e o que fica fora. A identi<strong>da</strong>de está sempre<br />
liga<strong>da</strong> a uma forte separação entre “nós” e “eles”. Essa demarcação de