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Ana Rita Santigo da Silva - texto.pdf - RI UFBA - Universidade ...

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Sem pensar em sentar de pernas cruza<strong>da</strong>s<br />

Sem ligar pra depilar<br />

Não quero baile de debutantes,<br />

Tampouco ter filhos ou casar.<br />

Agora vou ser meu bem, viu meu mal?<br />

Vou ser pós-moderna, pelo tempo que quiser<br />

Brilhar como Yaa Asantewaa<br />

Vou voltar a ser mulher.<br />

Quando um dia acor<strong>da</strong>r<br />

E lavar os pratos por vontade<br />

E me emperiquitar por vai<strong>da</strong>de.<br />

Casar porque me apaixonei<br />

E parir porque eu quis,<br />

Serei para todo o sempre meu bem<br />

Viu meu mal? (ADÚN, 2008, p. 40)<br />

160<br />

A voz poética decide-se por abolir papéis serviçais, a ela atribuídos, que<br />

indiquem negação de si para viver em função de projetos de vi<strong>da</strong> e sonhos de outrem,<br />

optando por assumir os rumos de sua vi<strong>da</strong>, querendo-se senhora de suas vontades,<br />

paixões e ações. Sua luta parece ser solitária, pois consiste em voltar a si mesma,<br />

colocando-se também no centro <strong>da</strong>s palavras e a brilhar como a Yaa Asantewaa 31 . Em<br />

sua busca e conquista de liber<strong>da</strong>de ecoam, silenciam e ruminam outras vozes poéticas<br />

que também decidem mostrar-se e assinar a autoria de seus destinos.<br />

A voz dialoga com a outra de Não vou mais lavar os pratos, de Cristiane Sobral,<br />

escritora dos CN, a quem Mel Adún dedica seus versos. De subalternas e<br />

invisibiliza<strong>da</strong>s, as vozes poéticas dos poemas se contornam donas de si e livres para ser,<br />

agir e sentir. Em ambos, prevalecem os mesmos desejos: libertar-se do jugo <strong>da</strong><br />

submissão e começar a ser, a pensar e a decidir sobre si e, acima de tudo, a querer bem a<br />

si mesma.<br />

Não vou mais lavar os pratos. Nem limpar a poeira dos móveis.<br />

Sinto muito. Comecei a ler. Abri outro dia um livro e uma semana depois<br />

decidi.<br />

Não levo mais o lixo para a lixeira. Nem arrumo mais a bagunça <strong>da</strong>s folhas<br />

no quintal.<br />

Sinto muito. Depois de ler percebi a estética dos pratos, a estética dos traços,<br />

a ética, a estática.<br />

Olho minhas mãos bem mais macias que antes e sinto que posso começar a<br />

ser a todo instante.<br />

31 Yaa Asantewaa, (1850-1920), de acordo com <strong>Silva</strong> (2005), foi líder <strong>da</strong> última resistência realiza<strong>da</strong> no<br />

século passado em território africano, diretamente contra o colonialismo britânico feito pela civilização<br />

Ashanti, uma confederação de reinos que se desenvolveu no sul de Gana nos séculos XVIII e XIX, tendo<br />

a sua capital na ci<strong>da</strong>de de Kumasi, com edifícios feitos de terra, madeira e palha, que hoje são<br />

considerados patrimônios <strong>da</strong> humani<strong>da</strong>de. Yaa Asantewaa opôs-se bravamente contra as normas<br />

estabeleci<strong>da</strong>s e ao domínio masculino. Foi exila<strong>da</strong>, só retornando à África vinte anos depois. Foi bem<br />

consciente dos elementos que compunham a sua identi<strong>da</strong>de ashante: mulher, filha, mãe, irmã, esposa,<br />

avó, agricultora, líder política, guerreira e Nanã, mãe-rainha.

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