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pesquisa, por exemplo, agrava mais ainda, quando se percebem naturalizados os papéis sociais que lhes são atribuídos, não como cuidadoras de seus entes, mas como serviçais de lares de famílias abastadas. Assim, essa realidade suscita uma escrita de autoria feminina, sobretudo de autoras negras, que compõem o corpus do estudo, com tons de protesto e de reivindicação de direito à contrafala e às formações de si para além de estereótipos negativos e, mais ainda, a discursos diferenciadores daqueles que as subjugam ao espaço doméstico e ao silenciamento. 158 Para Guardia, preocupações em torno da educação feminina, advindas de alguns eventos históricos, como a constituição das repúblicas, as mudanças nas instituições de poder, vividas nos séculos XVII e XVIII, as revoluções francesa e industrial fomentaram a participação feminina na literatura e criação de organizações literárias, através de revistas e outras publicações escritas por elas e a elas designadas. Essa pesquisadora faz referência à ausência de escritoras na literatura latino-americana, que também se institui como uma voz hegemonicamente masculina, citando alguns de seus nomes e assinalando estratégias, por elas utilizadas, para proporcionar o reconhecimento de sua escrita. [...] não foi fácil romper o silêncio para as escritoras latino-americanas do século XIX, em um clima de intolerância e hegemonia do discurso masculino. Referimo-nos a Gertrudes Gómes de Avellaneda (Cuba 1814- 1873), Juana Manuela Gorriti (Argentina 1818-1892), Maria Firmina dos Reis (Brasil 185-1917), Mercedes Cabello de Carbonera (Peru184-1909), Lindaura Anzoátegui (Bolívia 1846-18980), Clorinda Matto de Turner (Peru 1858-1909), e Adélia Zamudio (Bolívia 1854-1928). Excluídas e marginalizadas do sistema de poder, estas escritoras outorgaram voz aos desvalidos excluídos, questionando as relações inter-raciais e de classe. (GUARDIA, 2007, p. 4). Os textos literários por elas produzidos, pois, fazem críticas ao silenciamento e questionam a cultura ocidental e tradicional, que figura como um discurso falocêntrico, pois, como afirma Guardia, “[...] Ao longo desta escritura, encontraremos eixos temáticos que aparecem de maneira permanente em romances, contos e poesia, que poderíamos sintetizar em um só anseio, a busca de uma voz própria” (GUARDIA, 2007, p. 2). Há, por isso, nas vozes literárias femininas, esforços no sentido de afirmação de uma de suas identidades: a autoral. A literatura feminina se destaca pelas enunciadoras: são sujeitos que vivem situações as mais adversas por serem mulheres e vislumbram outros mundos, outras vidas e outros homens e mulheres através da escrita literária. Elas ousam escrever de
si/nós como sujeitos que enunciam dizeres e contradizeres de si/nós. Com tal experiência, a escrita feminina se afirmou e se dinamizou, no século XX, ao interagir com as trajetórias, os pressupostos, postulados e ideais do movimento feminista. Foi, inclusive, nesse tempo, que a literatura feminina se consolidou, em meio a indagações e discussões sobre o binarismo homem x mulher, dominação masculina, gênero, relações de poder, corpo etc. Foi, nesse século, inclusive, a partir da década de 70, que ela se afirmou como possibilidade de ser uma voz mediante as tramas e realidades vividas pelas mulheres e como uma resposta resistente aos procedimentos de apagamentos a que foram subjugadas, por séculos. 159 Assim, através de narrativas e poéticas, um eu ficcional, apresentado por um eu autoral, tornou-se possível expressar dilemas constituídos entre a mulher literária e a mulher estereotipada pela cultura androcêntrica que lhe reduzira a rainha do lar, já que a arte literária, em muitos momentos, movida pela tradição patriarcal, incumbiu-se de reforçar uma suposta natureza feminina, pautada em domesticações, fragilidades, submissão, sentimentalismos, emoções e sensibilidades exacerbadas, além de pouca racionalidade. A escritura feminina se configura como narrativas e textos poéticos com marcas de jogos de resistência, de experiências, afetos e desafetos, sonhos, angústias e histórias de mulheres. A literatura de autoria feminina se mostra como possibilidade de, pela linguagem, tensionar a hegemonia e supremacia masculina, visto que, por meio dela, podem-se desenhar existências e práticas sociais diferenciadas de um eu feminino, com atributos e papéis distintos do masculino, mas não inferior e desigual. Nessa perspectiva, se apresenta o poema Paradoxo, de Mel Adún que, em um território discursivo e imaginário, desmobiliza ditos sobre identidades amparados em anulações e estigmas, riscando escritos que promovem novos lugares e posturas para uma voz feminina. Diferentemente de cantos que subestimam imagens femininas negras, no poema, a graça e o encanto delas são sobrelevados. Não vou mais lavar os pratos, Agradeço a Sobral. Vou ser agora meu bem, viu, meu mal? Cansei de ser você: de sonhar seus chatos sonhos Cansei de me emperiquitar Pra encontros enfadonhos. Agora serei meu bem, Vou reaprender a deitar E a sonhar sonhos meus Com minhas cores prediletas.
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si/nós como sujeitos que enunciam dizeres e contradizeres de si/nós. Com tal<br />
experiência, a escrita feminina se afirmou e se dinamizou, no século XX, ao interagir<br />
com as trajetórias, os pressupostos, postulados e ideais do movimento feminista. Foi,<br />
inclusive, nesse tempo, que a literatura feminina se consolidou, em meio a in<strong>da</strong>gações e<br />
discussões sobre o binarismo homem x mulher, dominação masculina, gênero, relações<br />
de poder, corpo etc. Foi, nesse século, inclusive, a partir <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> de 70, que ela se<br />
afirmou como possibili<strong>da</strong>de de ser uma voz mediante as tramas e reali<strong>da</strong>des vivi<strong>da</strong>s<br />
pelas mulheres e como uma resposta resistente aos procedimentos de apagamentos a que<br />
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Assim, através de narrativas e poéticas, um eu ficcional, apresentado por um eu<br />
autoral, tornou-se possível expressar dilemas constituídos entre a mulher literária e a<br />
mulher estereotipa<strong>da</strong> pela cultura androcêntrica que lhe reduzira a rainha do lar, já que<br />
a arte literária, em muitos momentos, movi<strong>da</strong> pela tradição patriarcal, incumbiu-se de<br />
reforçar uma suposta natureza feminina, pauta<strong>da</strong> em domesticações, fragili<strong>da</strong>des,<br />
submissão, sentimentalismos, emoções e sensibili<strong>da</strong>des exacerba<strong>da</strong>s, além de pouca<br />
racionali<strong>da</strong>de. A escritura feminina se configura como narrativas e <strong>texto</strong>s poéticos com<br />
marcas de jogos de resistência, de experiências, afetos e desafetos, sonhos, angústias e<br />
histórias de mulheres.<br />
A literatura de autoria feminina se mostra como possibili<strong>da</strong>de de, pela<br />
linguagem, tensionar a hegemonia e supremacia masculina, visto que, por meio dela,<br />
podem-se desenhar existências e práticas sociais diferencia<strong>da</strong>s de um eu feminino, com<br />
atributos e papéis distintos do masculino, mas não inferior e desigual. Nessa<br />
perspectiva, se apresenta o poema Paradoxo, de Mel Adún que, em um território<br />
discursivo e imaginário, desmobiliza ditos sobre identi<strong>da</strong>des amparados em anulações e<br />
estigmas, riscando escritos que promovem novos lugares e posturas para uma voz<br />
feminina. Diferentemente de cantos que subestimam imagens femininas negras, no<br />
poema, a graça e o encanto delas são sobrelevados.<br />
Não vou mais lavar os pratos,<br />
Agradeço a Sobral.<br />
Vou ser agora meu bem, viu, meu mal?<br />
Cansei de ser você: de sonhar seus chatos sonhos<br />
Cansei de me emperiquitar<br />
Pra encontros enfadonhos.<br />
Agora serei meu bem,<br />
Vou reaprender a deitar<br />
E a sonhar sonhos meus<br />
Com minhas cores prediletas.