Ana Rita Santigo da Silva - texto.pdf - RI UFBA - Universidade ...

Ana Rita Santigo da Silva - texto.pdf - RI UFBA - Universidade ... Ana Rita Santigo da Silva - texto.pdf - RI UFBA - Universidade ...

repositorio.ufba.br
from repositorio.ufba.br More from this publisher
12.05.2013 Views

III CAPÍTULO LITERATURA AFROFEMININA: INTERROGANDO E PLURALIZANDO FEMININOS 156 (Ana Paula Tavares – Angola) Fonte da foto: . Acesso 30/07/2010. Hoje levantei-me cedo Pintei de tácula a água fria O corpo aceso Não bato a manteiga Não ponho o cinto Vou Para o sul saltar cercado. (TAVARES, 2006) 3.1 Autoria Feminina e Escrita Literária Afrofeminina Estudos sobre literatura de autoria feminina, escritura feminina, literatura de mulheres e literatura feminina, evidenciam argumentos e contra-argumentos, permeados de indagações, que garantem agendas e fóruns acadêmicos e literários, bem como estudos e publicações concernentes às temáticas afins a tais designações. Não sem menos conflitos que sobre a LN, debates também se acirram em torno da literatura afrofeminina, provocando estudos e pesquisas sobre a escrita literária de autoras negras. Diante de tal contexto, a finalidade deste capítulo é apresentar uma discussão sobre literatura de autoria feminina negra e analisar alguns poemas de Jocélia Fonseca, Rita Santana e Urânia Munzanzu, integrantes do corpus da pesquisa, com ênfase na criação de vozes poéticas e nas construções discursivas e imaginárias de femininos e feminismo negro, cotejadas por anseios por escrita e vozes literárias que vislumbrem emancipação e resistência.

157 Liane Schneider, ao discutir sobre mulher e literatura, reconhece possíveis desconfortos e limites provocados pelas tentativas de denominá-las. Ela chama a atenção para a necessidade do enfrentamento das múltiplas tensões recorrentes no projeto literário de escrita feminina/feminista: Assim, se as literaturas produzidas por mulheres que se vinculam a tais projetos emancipatórios e antipatriarcais são definidos como ‘escrita feminina’, deve-se garantir que esse significante (escrita feminina) esteja carregado de todas as tensões que compõem o tecido cultural, não sendo inscrito nem limitado por uma visão binária e naturalizada de mundo. [...] mais uma vez aqui, mesmo denominando-se eventualmente tal produção de ‘escrita feminista’, também não estaríamos seguras quanto a qual dos feminismos (da experiência, da diferença, da desconstrução, marxista, etc.) estaríamos nos referindo. Além disso, haveria (assim como há) autoras que produziriam um texto ‘feminista’, sem, no entanto, aceitarem, de bom grado, tal classificação [...] (SCHNEIDER, 2007, p. 1) Em meio a questionamentos e tensões sobre a pertinência de conceitos como literatura escrita por mulheres, literatura feminina, que se define, segundo Sara E. Guardia (2007), como um conjunto de textos literários produzidos por mulheres e escritura/escrita feminina, para indicar a participação de mulheres na produção literária, conforme Schneider (2007), admitindo que a literatura, como uma expressão de arte, produzida em sociedades hierárquicas e patriarcais, tais como as ocidentais e oriundas delas, é uma manifestação artística em que, embora, invisibilizada, a mulher se fez presente. Ainda assim, só entre os séculos XVIII e XIX, começaram a aparecer mulheres escritoras na tradição literária ocidental, como declara Raquel E. Gutiérrez, até então negadas em “[...] um cânone quase exclusivamente masculino e predominantemente do primeiro mundo, europeu e da classe dominante [...]” (GUTIÉRREZ, 2004, p. 33). Além disso, mesmo sendo esse o contexto em que apareceram algumas mulheres escritoras no cenário literário europeu, há de se estar ciente de que não foi apenas nesse continente e período que elas iniciaram sua escrita. Todavia, é importante assinalá-lo, pois é um dos indicativos de transgressão e de conquista das mulheres da esfera pública, contrariando a natureza e o espaço a elas destinados pelo poder masculino: subalternas e cuidadoras de entes e do lar. Como se percebe, o silêncio cerca historicamente a prática literária de mulheres, provocando indiferença acerca de suas produções. Tal apagamento invisibiliza seus nomes e obras. O cerceamento e desconhecimento de autoras negras, participantes da

157<br />

Liane Schneider, ao discutir sobre mulher e literatura, reconhece possíveis<br />

desconfortos e limites provocados pelas tentativas de denominá-las. Ela chama a<br />

atenção para a necessi<strong>da</strong>de do enfrentamento <strong>da</strong>s múltiplas tensões recorrentes no<br />

projeto literário de escrita feminina/feminista:<br />

Assim, se as literaturas produzi<strong>da</strong>s por mulheres que se vinculam a tais<br />

projetos emancipatórios e antipatriarcais são definidos como ‘escrita<br />

feminina’, deve-se garantir que esse significante (escrita feminina) esteja<br />

carregado de to<strong>da</strong>s as tensões que compõem o tecido cultural, não sendo<br />

inscrito nem limitado por uma visão binária e naturaliza<strong>da</strong> de mundo. [...]<br />

mais uma vez aqui, mesmo denominando-se eventualmente tal produção de<br />

‘escrita feminista’, também não estaríamos seguras quanto a qual dos<br />

feminismos (<strong>da</strong> experiência, <strong>da</strong> diferença, <strong>da</strong> desconstrução, marxista, etc.)<br />

estaríamos nos referindo. Além disso, haveria (assim como há) autoras que<br />

produziriam um <strong>texto</strong> ‘feminista’, sem, no entanto, aceitarem, de bom grado,<br />

tal classificação [...] (SCHNEIDER, 2007, p. 1)<br />

Em meio a questionamentos e tensões sobre a pertinência de conceitos como<br />

literatura escrita por mulheres, literatura feminina, que se define, segundo Sara E.<br />

Guardia (2007), como um conjunto de <strong>texto</strong>s literários produzidos por mulheres e<br />

escritura/escrita feminina, para indicar a participação de mulheres na produção literária,<br />

conforme Schneider (2007), admitindo que a literatura, como uma expressão de arte,<br />

produzi<strong>da</strong> em socie<strong>da</strong>des hierárquicas e patriarcais, tais como as ocidentais e oriun<strong>da</strong>s<br />

delas, é uma manifestação artística em que, embora, invisibiliza<strong>da</strong>, a mulher se fez<br />

presente.<br />

Ain<strong>da</strong> assim, só entre os séculos XVIII e XIX, começaram a aparecer mulheres<br />

escritoras na tradição literária ocidental, como declara Raquel E. Gutiérrez, até então<br />

nega<strong>da</strong>s em “[...] um cânone quase exclusivamente masculino e predominantemente do<br />

primeiro mundo, europeu e <strong>da</strong> classe dominante [...]” (GUTIÉRREZ, 2004, p. 33).<br />

Além disso, mesmo sendo esse o con<strong>texto</strong> em que apareceram algumas mulheres<br />

escritoras no cenário literário europeu, há de se estar ciente de que não foi apenas nesse<br />

continente e período que elas iniciaram sua escrita. To<strong>da</strong>via, é importante assinalá-lo,<br />

pois é um dos indicativos de transgressão e de conquista <strong>da</strong>s mulheres <strong>da</strong> esfera pública,<br />

contrariando a natureza e o espaço a elas destinados pelo poder masculino: subalternas e<br />

cui<strong>da</strong>doras de entes e do lar.<br />

Como se percebe, o silêncio cerca historicamente a prática literária de mulheres,<br />

provocando indiferença acerca de suas produções. Tal apagamento invisibiliza seus<br />

nomes e obras. O cerceamento e desconhecimento de autoras negras, participantes <strong>da</strong>

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!