Ana Rita Santigo da Silva - texto.pdf - RI UFBA - Universidade ...
Ana Rita Santigo da Silva - texto.pdf - RI UFBA - Universidade ...
Ana Rita Santigo da Silva - texto.pdf - RI UFBA - Universidade ...
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
O meu corpo não é objeto,<br />
sou revolução. (SEMOG, 1998, p. 57)<br />
150<br />
Os versos acima tensionam o show, em quem se materializam as ilusões <strong>da</strong>s<br />
construções de interculturali<strong>da</strong>des, visto que a voz poética rejeita fazer de conta que há<br />
espaço democrático para o seu corpo <strong>da</strong>nçar e encenar, reconhecendo que seu corpo não<br />
é objeto. O seu corpo não se configura apenas como um ente biológico; ao contrário, é<br />
também um ente sociocultural, por isso, quando <strong>da</strong>nça, expressa ancestrali<strong>da</strong>des,<br />
histórias, marcas culturais, recriando identi<strong>da</strong>des e resistindo, ante os olhos de quem<br />
pretende dominá-lo.<br />
Escritores/as negros/as não apenas apropriam-se <strong>da</strong> palavra poética para (des)<br />
contar o passado histórico de negros/as. Eles/as utilizam a LN também para provocar a<br />
socie<strong>da</strong>de brasileira quanto às relações étnico-raciais; para afirmar que a lógica do<br />
consumo, que sustenta os postulados e negócios <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de do espetáculo, define a<br />
comercialização de identi<strong>da</strong>des negras, a partir de uma exposição, por vezes,<br />
unificadora e estereotipa<strong>da</strong>, de elementos e vivências culturais homogêneas, fixas e sem<br />
dinamismo, inerente aos entrecruzamentos <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> em trânsito.<br />
Do mesmo modo, em Efeitos colaterais, Jamu Minka, escritor dos CN, inventa<br />
uma voz poética, através <strong>da</strong> qual desvela representações sobre a pseudo-democracia<br />
racial, as quais pintam o Brasil como um país miscigenado étnico-cultural e racialmente,<br />
de vivência harmoniosa, ocultando seus limites bastante enrijecidos, quando se trata de<br />
afirmar-se negro, de equi<strong>da</strong>de de direitos e de acesso aos bens sociais, civis, culturais e<br />
políticos.<br />
Na propagan<strong>da</strong> enganosa<br />
Paraíso racial<br />
Hipocrisia faz mal<br />
Nosso futuro num saco<br />
Sem fundo<br />
A gente vê<br />
E finge que não vê<br />
A ditadura <strong>da</strong> brancura<br />
Negros de alma negra se inscrevem<br />
Naquilo que escrevem<br />
Mas o Brasil nega<br />
Negro que não se nega.<br />
(MINKA, 1998, p. 76)<br />
Os versos também têm um tom denunciativo contra discursos hegemônicos que<br />
fantasiam a democracia racial, considerando-a como uma reali<strong>da</strong>de vivencia<strong>da</strong> por