Ana Rita Santigo da Silva - texto.pdf - RI UFBA - Universidade ...
Ana Rita Santigo da Silva - texto.pdf - RI UFBA - Universidade ...
Ana Rita Santigo da Silva - texto.pdf - RI UFBA - Universidade ...
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
(des) trama memórias. Assim, as tranças não são somente adereços e adornos de<br />
cabeças negras, já que elas cumprem um papel indicativo de esconder segredos e narrar<br />
tramas.<br />
146<br />
Diante disso a tessitura de identi<strong>da</strong>des, nesse longo poema, se dá através de<br />
entrecruzamentos de sentimentos e lutas, de passados, futuros e sonhos, entremeados<br />
pelas tramas <strong>da</strong>s tranças e pelas atribuições de significados ao presente que se iniciara<br />
no reino <strong>da</strong> Deusa Òsum. As tranças são referências que apontam contingências,<br />
lugares, formações discursivas de identi<strong>da</strong>des, garantindo a inferência de que a voz<br />
poética deseja forjar identi<strong>da</strong>des negras femininas com traços de africani<strong>da</strong>des, passado<br />
histórico e práticas tradicionais culturais significativos.<br />
Os trançados do poema, enquanto signos passíveis de plurissignificações como<br />
referências, são móveis e transitórias, ao mesmo tempo em que são suplementares, ou<br />
seja, acessórios, por serem adereços que adornam e sugerem, por um lado, preservação,<br />
singulari<strong>da</strong>des, coletivi<strong>da</strong>des e ressignificações. Por outro lado, elas sinalizam<br />
distinções, tornando-se um convite ao exercício <strong>da</strong> alteri<strong>da</strong>de, ao se reconhecer a beleza<br />
dos cabelos trançados e, ao mesmo tempo, inventar significados para as tramas de<br />
trançar e dos trançados.<br />
Luis Cuti <strong>Silva</strong>, um escritor de grande relevância para a constituição e<br />
manutenção <strong>da</strong> LN no Brasil, em Para ouvir e entender “estrela”, de igual modo a<br />
Fátima Trinchão, apresenta fios poéticos de identi<strong>da</strong>des negras que desafiam práticas<br />
culturais hegemônicas que pouco reconhecem as diversi<strong>da</strong>des étnico-raciais e culturais.<br />
Se Papai Noel<br />
Não trouxer boneca preta<br />
Neste Natal<br />
Meta-lhe o pé no saco! (SILVA, 1998, p. 51)<br />
Esses versos têm um tom reivindicatório em prol de visibili<strong>da</strong>de de um objeto<br />
feminino negro – uma boneca preta –. Como exercício de poder, a voz poética sugere<br />
uma ação de resistência que não se esgota na força física, mas se estende ao protesto.<br />
Pela exigência de uma boneca preta, possivelmente perpassa o interesse de incluir, em<br />
uma dimensão de interculturali<strong>da</strong>des 30 , figuras negras como repertórios também<br />
30 Interculturali<strong>da</strong>des, aqui, são entendi<strong>da</strong>s como um conjunto de propostas de convivência democrática<br />
entre diferentes culturas, buscando a integração entre elas sem anular suas diversi<strong>da</strong>des, ao contrário,<br />
incentivando a criativi<strong>da</strong>de advin<strong>da</strong> de diversas relações entre os sujeitos em seus diferentes con<strong>texto</strong>s.<br />
FLEU<strong>RI</strong>, 2005).