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À literatura negra brasileira não cabe a idealização fácil. Pelo contrário, é seu
papel fundamental desidealizar o “negro” e o “branco”, investindo contra os
estereótipos, e demonstrar que nem tudo o que seduz é “branco”, captando os
movimentos sinuosos da ideologia racista na variada gama de situações
sociais. [...]
Escritores negros que, produzindo no Brasil, optaram pelo rompimento com o
silêncio ideológico do racismo, aportaram ao leitor que se permite “perder-se”
no ato da leitura inúmeras respostas acerca da convivência inter-racial.
Também formulam questões para uma nova ordem de maior auto-estima,
tolerância e solidariedade. Isso porque, ao abordarem uma das zonas litigiosas
do inconsciente coletivo brasileiro, onde se abrigam medos, fantasias, ódios,
incompreensões, rancores, atração, repulsa, inveja etc, trazem a subjetividade
do segmento historicamente mais oprimido. (SILVA, 2002, p. 34)
A LN, como apresenta L. Cuti, contesta rastros identitários, advindos das
práticas de racismo, que fixam estereótipos negativos de africanidades e ameaçam o
convívio inter-racial e o exercício da alteridade. Além disso, por esse segmento literário,
é possível, até mesmo, desconstruir, pela linguagem, significações e significantes de
repertórios culturais negros. Em textos das escritoras que informaram integrar tal
projeto estético, por equivalente viés, aparecem significantes e significados desenhando
identidades femininas negras com perfis móveis e dinâmicos, mas relacionadas com
suas referências afrodescendentes. O poema A Trama da trança, de Fátima Trinchão,
pode servir de ilustração dessas afirmações.
A trama das tranças dos cabelos das negras
Coroas que fazem rainhas, princesas,
Cabelos bonitos,
Assaz trazem nisso,
Mistérios suaves
Profundos segredos.
E os trazem consigo
Distante no tempo
De tempos seculares,
Com elas chegaram,
Vieram ao degredo,
Trazendo consigo,
Profundos segredos.
Com seus mis ardis,
a trama da trança transcende
tudo aquilo que o tempo vela e em arte
Se revela.
A trama da trança transcende o tempo.
Tramando futuros
Derrubando muros,
Espantando medos,
Escrevendo tratados,
Tecendo segredos.
Profundos segredos!
A trama da trança
Que orná-lhe a cabeça
E generosa guarda
Milenares segredos