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Videmus nunc per speculum”: A (des)construção da memória ... - UTP

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eali<strong>da</strong><strong>des</strong> econômicas: a difusão maciça <strong>da</strong> economia monetária,<br />

do dinheiro, e a mu<strong>da</strong>nça do trabalho com a divisão do trabalho<br />

urbano, a extensão do trabalho assalariado, valorização do trabalho<br />

(LE GOFF, 2006, p.198).<br />

A moe<strong>da</strong> ganhava força e seu uso começava a ganhar espaço dentro<br />

<strong>des</strong>se cenário de trocas comerciais. Rapi<strong>da</strong>mente, os mercadores se<br />

deram conta disso e “criam logo entre eles um grupo de especialistas<br />

<strong>da</strong> moe<strong>da</strong>: os cambistas, que vão se tornar os banqueiros, substituindo<br />

nessa função os mosteiros (...) e os judeus (...)” (LE GOFF, Op. cit.,<br />

p. 25). Nesse espaço urbano, também as relações de poder ganharam<br />

novos rostos: o ci<strong>da</strong>dão burguês, que ao lado do poder representado<br />

pelo bispo e pelos senhores, conquistou, pelo dinheiro, ca<strong>da</strong> vez mais<br />

“liber<strong>da</strong><strong>des</strong>” e prestígio. O tabuleiro <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> social se modificava, pois,<br />

sem contestar os pilares econômicos e políticos do feu<strong>da</strong>lismo, os<br />

burgueses<br />

introduzem uma variante, criadora de liber<strong>da</strong>de (Stadtluft macht<br />

frei, dizem os alemães, “o ar <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de torna livre”) e de igual<strong>da</strong>de<br />

(o juramento cívico, o juramento comunal dão aos iguais os mesmos<br />

direitos), na qual a <strong>des</strong>igual<strong>da</strong>de que nasce do jogo econômico e<br />

social se fun<strong>da</strong> não sobre o nascimento, o sangue, mas sobre a<br />

fortuna, imobiliária e mobiliária, a posse do solo e dos imóveis<br />

urbanos, dos foros e ren<strong>da</strong>s, do dinheiro (LE GOFF, 2001, p. 25).<br />

Não se deve imaginar, entretanto, que o surgimento <strong>da</strong> burguesia<br />

implicou o <strong>des</strong>aparecimento automático do modelo feu<strong>da</strong>l. Como nos<br />

lembra Hilário Franco Júnior, o modelo burguês<br />

(...) não chegava a representar um novo ordo, mas apenas uma<br />

mobili<strong>da</strong>de horizontal no interior do grupo dos laboratores. Dentro<br />

dela, os laços sociais entre os indivíduos eram estabelecidos<br />

por um juramento, como ocorria na aristocracia. Os mais ricos<br />

procuravam imitar vários hábitos nobiliárquicos (FRANCO<br />

JÚNIOR, 2006, p. 95).<br />

É ain<strong>da</strong> Franco Júnior que chama a atenção para os contrastes<br />

existentes no bojo do novo centro urbano medieval que naquele <strong>per</strong>íodo<br />

ganhavam mais clareza e dinamici<strong>da</strong>de do que quando ocorriam nos<br />

meios rurais. Para ele, a ci<strong>da</strong>de era caracteriza<strong>da</strong> por dois mecanismos<br />

que favoreciam o surgimento de novas formas de marginalização social:<br />

seu caráter antifeu<strong>da</strong>l e anticlerical. Frequentemente, tais mecanismos<br />

se interligavam pois,<br />

(...) a negação de qualquer um dos aspectos <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de<br />

punha automaticamente em risco to<strong>da</strong> sua estrutura. Era o caso<br />

<strong>da</strong> exclusivi<strong>da</strong>de eclesiástica do sagrado (que os feiticeiros<br />

ameaçavam), do regionalismo e imobilismo dos costumes (que os<br />

estrangeiros rompiam), do controle cristão sobre a nova economia<br />

de mercado (que via nos judeus concorrentes), dos valores sexuais<br />

tradicionais (que os homossexuais <strong>des</strong>afiavam), <strong>da</strong> <strong>des</strong>igual<br />

distribuição social <strong>da</strong>s riquezas (que a presença dos pobres<br />

delatava) (FRANCO JÚNIOR, Ibid., p. 96).<br />

No imaginário medieval, a nova ci<strong>da</strong>de aparecia ora como uma<br />

Jerusalém, isto é, como um grande centro de possibili<strong>da</strong><strong>des</strong>, inclusive<br />

de salvação, ora como uma Babilônia, cerca<strong>da</strong> de tentações e <strong>des</strong>vios.<br />

Para Le Goff, ao traçar as raízes medievais <strong>da</strong> Europa, “no século XIII,<br />

a ci<strong>da</strong>de de Jerusalém rechaçou a ci<strong>da</strong>de <strong>da</strong> Babilônia, ain<strong>da</strong> que no<br />

fim <strong>da</strong> I<strong>da</strong>de Média as taras urbanas aparecessem” (LE GOFF, 2007,<br />

p. 157).<br />

Onde se situava Francisco de Assis nesta complexa transição do<br />

mundo feu<strong>da</strong>l para o mundo urbano? Para Iriarte, Francisco surgiu<br />

como um <strong>per</strong>sonagem emblemático, uma <strong>per</strong>sonali<strong>da</strong>de de fronteira,<br />

uma vez que<br />

(...) entre o feu<strong>da</strong>lismo e a comuna, entre o acaso do império unitário<br />

e o surgimento <strong>da</strong>s nações, entre a língua culta e a língua vulgar,<br />

Francisco de Assis encarna as virtu<strong>des</strong> ativas e construtivas do<br />

Monografias - Universi<strong>da</strong>de Tuiuti do Paraná 8<br />

| História | 2011

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