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Videmus nunc per speculum”: A (des)construção da memória ... - UTP

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foco e a intensi<strong>da</strong>de <strong>des</strong>sas marcas. Nas biografias escritas antes <strong>da</strong><br />

Legen<strong>da</strong> Maior, nota-se claramente que o foco central ain<strong>da</strong> é a pessoa<br />

de São Francisco. Seus feitos, seus milagres, seus ditos, mesmo que,<br />

como se verificou, algumas vezes silenciassem sobre os conflitos<br />

dentro <strong>da</strong> Ordem, tudo era organizado pelo seu autor para que o santo<br />

fosse exaltado, e para que em to<strong>da</strong> cristan<strong>da</strong>de se celebrasse a sua<br />

santi<strong>da</strong>de. Por sua vez, na Legen<strong>da</strong> Maior, há um sutil <strong>des</strong>locamento<br />

de foco: o “centro gravitacional” <strong>da</strong> obra deixa de ser São Francisco<br />

para se tornar a Ordem franciscana, isto é, a pessoa do fun<strong>da</strong>dor, do<br />

santo, não era o mais importante, mas sim a forma “correta” de se ler<br />

e interpretar a sua vi<strong>da</strong> e mensagem.<br />

Outro aspecto importante a ser considerado após o estudo <strong>da</strong><br />

produção hagiográfica franciscana no século XIII é que, se de um lado<br />

essas obras refletem as polêmicas institucionais <strong>da</strong> Ordo Minorum, por<br />

outro, refletem também uma vontade sincera e vigorosa de se querer<br />

solucioná-las.<br />

Neste ponto, ao que parece, a Legen<strong>da</strong> Maior, talvez por ter sido<br />

compila<strong>da</strong> com o claro objetivo de oferecer uma renova<strong>da</strong> e sóli<strong>da</strong><br />

formação aos fra<strong>des</strong>, baseando-se mecanismos jurídicos, como por<br />

exemplo, as Constituições de Narbonne, e em mecanismos teológicos,<br />

como por exemplo, o Itinerarium mentis in Deum, pode ser considera<strong>da</strong><br />

mais “positiva” e “eficaz” que as outras legen<strong>da</strong>s antigas. A Legen<strong>da</strong><br />

Maior surgiu, como vimos, para tentar oferecer respostas e resolver<br />

as questões espinhosas dentro <strong>da</strong> Ordem. Basta conferir os objetivos<br />

almejados por Frei Boaventura:<br />

1.<br />

Oferecer uma formação espiritual, cultural e apostólica aos<br />

fra<strong>des</strong>;<br />

2.<br />

3.<br />

4.<br />

Estimular a obediência à Regra;<br />

Inspirar nos fra<strong>des</strong> os ideais espirituais <strong>da</strong>s origens, para que<br />

estes estivessem presentes e o<strong>per</strong>antes em suas vi<strong>da</strong>s, animando<br />

seus novos trabalhos apostólicos;<br />

Atualizar o que considerava essencial nas origens para um<br />

apostolado mais eficaz;<br />

Para o franciscanólogo italiano, Alfonso Pompei, a ativi<strong>da</strong>de<br />

hagiográfica de Frei Boaventura, mesmo que tenha optado retratar um<br />

São Francisco de santi<strong>da</strong>de inalcançável e fora do mundo dos mortais,<br />

mostra, quase paradoxalmente, uma profun<strong>da</strong> consciência histórica<br />

por parte do Ministro geral, pois este <strong>des</strong>ejava que o<br />

“franciscanismo primitivo não se tornasse um venerável testemunho<br />

arqueológico, recor<strong>da</strong>do, como tantos outros movimentos, somente<br />

nos livros de História, mas <strong>per</strong>manecesse a fonte genuína e <strong>per</strong>ene<br />

<strong>da</strong> espirituali<strong>da</strong>de e <strong>da</strong> vitali<strong>da</strong>de <strong>da</strong> Ordem na história, de seu<br />

empenho em portar onde quer que seja o Evangelho (...) (POMPEI,<br />

2009, p. 351).<br />

Em suma, podemos concluir que a <strong>construção</strong> <strong>da</strong> <strong>memória</strong><br />

hagiográfica de São Francisco de Assis, do <strong>per</strong>íodo de sua morte até<br />

o governo geral de Frei Boaventura, apesar de todos os esforços dos<br />

hagiógrafos, oficiais ou proscritos, mostrou que to<strong>da</strong>s as tentativas<br />

de se <strong>da</strong>r um rosto “ver<strong>da</strong>deiro” a São Francisco tiveram êxito e, ao<br />

mesmo tempo, fracassaram. Tiveram êxito porque, ca<strong>da</strong> biografia, ao<br />

seu modo, conseguiu conservar em seus relatos e detalhes aquilo que<br />

era mais essencial na “novitas” <strong>da</strong> mensagem do santo: a vivência do<br />

Evangelho. Fracassaram porque ca<strong>da</strong> qual quis construir o “seu” São<br />

Francisco, não <strong>per</strong>mitindo que Francisco de Assis fosse ele mesmo, isto<br />

Monografias - Universi<strong>da</strong>de Tuiuti do Paraná 48<br />

| História | 2011

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