Videmus nunc per speculum”: A (des)construção da memória ... - UTP
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crucificado foi obter os sete sinais <strong>da</strong> cruz, prova de que<br />
chegou à <strong>per</strong>feição evangélica).<br />
Conclusão<br />
14. Sua admirável paciência e morte.<br />
15. Sua canonização e trasla<strong>da</strong>ção de seus restos mortais.<br />
16. Alguns milagres realizados após a morte de São Francisco.<br />
A partir <strong>des</strong>se modelo esquemático, a vi<strong>da</strong> de São Francisco foi<br />
narra<strong>da</strong> por Frei Boaventura de modo a mostrar aos fra<strong>des</strong> as três<br />
etapas <strong>da</strong> trajetória espiritual do santo rumo à <strong>per</strong>feição divina.<br />
Entretanto, ao mesmo tempo em que a Legen<strong>da</strong> Maior deveria servir<br />
de modelo de <strong>per</strong>feição evangélica, cui<strong>da</strong>va também de colocar o santo<br />
num patamar tão alto que era impossível alcançá-lo.<br />
Esse cui<strong>da</strong>do em colocar São Francisco em um estado de <strong>per</strong>feição<br />
inalcançável servia também, como já foi visto na primeira parte <strong>des</strong>te<br />
capítulo, para silenciar os mestres seculares <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong>de de Paris e<br />
suas acusações contra os fra<strong>des</strong>. Na tentativa de defender a existência<br />
<strong>da</strong> Ordem franciscana e a santi<strong>da</strong>de inquestionável de seu fun<strong>da</strong>dor,<br />
Frei Boaventura teve a necessi<strong>da</strong>de de apresentar São Francisco<br />
como um “anjo do sexto selo do qual fala o livro do Apocalipse: “et vidi<br />
alterum angelum ascedentem ab ortu solis habentem signum Dei vivi”<br />
(“Vi outro anjo que subia do nascente do sol, tendo o selo do Deus<br />
vivo”) (Ap 7,2)” (BARTOLI, Apud. MOREIRA, Op. cit., p. 74).<br />
Isso explica porque, para Frei Boaventura, deixar claro na Legen<strong>da</strong><br />
Maior, que São Francisco havia recebido, ao fim de sua vi<strong>da</strong>, os<br />
estigmas <strong>da</strong> paixão de Cristo, era essencial, pois, significavam<br />
(...) a revelação de Deus a mostrar que Francisco não era um<br />
homem qualquer, mas o anjo chamado para <strong>da</strong>r início à última i<strong>da</strong>de<br />
do mundo, e os filhos de São Francisco são o exército dos homens<br />
espirituais, que tem a missão de chefiar a batalha final <strong>da</strong> história<br />
(BARTOLI, Apud. MOREIRA, Id.).<br />
A cena narra<strong>da</strong> na Legen<strong>da</strong> Maior sobre o momento em que São<br />
Francisco recebeu no Monte Alverne as chagas de Cristo, serviu de<br />
base para que Frei Boaventura escrevesse sua obra mais famosa, o<br />
Itinerarium mentis in Deum, pois é a partir <strong>da</strong> visão do Crucificado<br />
encoberto por seis asas, que o autor elabora os seis passos a serem<br />
seguidos para se chegar até Deus:<br />
(...) depois que o ver<strong>da</strong>deiro amor de Cristo transformou aquele<br />
que o amava em sua imagem, quando acabaram os quarenta dias<br />
que tinha decidido ficar na solidão, e tendo chegado também a<br />
festa de São Miguel Arcanjo, Francisco, o homem angélico, <strong>des</strong>ceu<br />
do monte. Trazia consigo a imagem do Crucificado, não grava<strong>da</strong> à<br />
mão em tábuas de pedra ou de madeira, com artifícios, mas escrita<br />
nos membros <strong>da</strong> carne pelo dedo de Deus vivo. E como é bom<br />
esconder o sacramento do Rei, (cfr. Tb 12,7) o homem que era<br />
cônscio do segredo real ocultava como podia aqueles sinais santos<br />
(LM, 13, 5).<br />
Para a religiosi<strong>da</strong>de medieval, receber os “sinais” <strong>da</strong> paixão<br />
de Cristo na carne, era como se igualar ao próprio Salvador,<br />
isto é, alcançar o último nível de santi<strong>da</strong>de. Por isso, mais uma<br />
vez, era importante apresentar São Francisco como um homem<br />
“ver<strong>da</strong>deiramente cristianíssimo, que procurou ser conforme pela<br />
imitação: vivo ao Cristo vivo; morrendo, ao Cristo moribundo; e<br />
morto ao Cristo morto, e mereceu ser ornado com essa semelhança<br />
expressa” (LM, 14, 4).<br />
O fato de Frei Boaventura ter feito de São Francisco um “anjo do<br />
sexto selo” e um “<strong>per</strong>feito imitador de Cristo”, ou, em outras palavras,<br />
Monografias - Universi<strong>da</strong>de Tuiuti do Paraná 44<br />
| História | 2011