11.05.2013 Views

Videmus nunc per speculum”: A (des)construção da memória ... - UTP

Videmus nunc per speculum”: A (des)construção da memória ... - UTP

Videmus nunc per speculum”: A (des)construção da memória ... - UTP

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

<strong>per</strong>severante e sempre o mesmo. Rápido para <strong>per</strong>doar e demorado<br />

para se irar, tinha a inteligência pronta, uma <strong>memória</strong> luminosa, era<br />

sutil ao falar, sério em suas opções e sempre simples. Era rigoroso<br />

consigo mesmo, paciente com os outros, discreto com todos. Muito<br />

eloqüente, tinha o rosto alegre e o aspecto bondoso, era diligente<br />

e incapaz de ser arrogante. Era de estatura um pouco abaixo <strong>da</strong><br />

média, cabeça proporciona<strong>da</strong> e redon<strong>da</strong>, rosto um tanto longo e<br />

fino, testa plana e curta, olhos nem gran<strong>des</strong> nem pequenos, negros<br />

e límpidos, cabelos castanhos, pestanas retas, nariz proporcional,<br />

delgado e reto, orelhas levanta<strong>da</strong>s, mas pequenas; têmporas<br />

achata<strong>da</strong>s, língua pacificadora, ardente e penetrante, voz forte,<br />

doce, clara e sonora, dentes unidos, alinhados e brancos, lábios<br />

pequenos e delgados, barba preta e um tanto rala, pescoço esguio,<br />

ombros retos, braços curtos, mãos delica<strong>da</strong>s, dedos longos, unhas<br />

compri<strong>da</strong>s, <strong>per</strong>nas delga<strong>da</strong>s, pés pequenos, pele fina, enxuto de<br />

carnes. Vestia-se rudemente, dormia pouco e era muito generoso.<br />

E como era muito humilde, mostrava to<strong>da</strong> a mansidão para com<br />

to<strong>da</strong>s as pessoas, a<strong>da</strong>ptando-se a todos com facili<strong>da</strong>de. Embora<br />

fosse o mais santo de todos, sabia estar entre os pecadores como<br />

se fosse um deles (1 Cel 83).<br />

Frei Tomás de Celano, mesmo que tivesse escrito uma obra<br />

conforme as exigências hagiográficas de seu tempo, não se <strong>des</strong>cuidou<br />

de procurar ser preciso nas <strong>da</strong>tas e na cronologia que apresentava,<br />

sendo este talvez, a maior contribuição ofereci<strong>da</strong> pela Vita I, <strong>per</strong>mitindo<br />

aos historiadores terem uma base confiável para uma re<strong>construção</strong><br />

histórica do <strong>per</strong>curso do santo.<br />

Além <strong>da</strong> Vita I, Frei Tomás de Celano também foi autor de outras<br />

biografias sobre São Francisco. É de sua pena que surgiram a Legen<strong>da</strong><br />

ad usum chori (“Legen<strong>da</strong> para uso do coro”), que na<strong>da</strong> mais era que<br />

um resumo <strong>da</strong> Vita I escrita para ser usa<strong>da</strong> nas celebrações litúrgicas<br />

dos fra<strong>des</strong>; a Vita II e o Tractatus Miraculis (“Tratado dos Milagres”).<br />

Se a Vita I silenciou-se sobre os problemas internos <strong>da</strong> Ordem<br />

franciscana, a segun<strong>da</strong> biografia sobre São Francisco, intitula<strong>da</strong> Vita<br />

II, trazia consigo as preocupações de Celano sobre os <strong>des</strong>vios de<br />

comportamento dos fra<strong>des</strong>. Escrita em 1247, a Vita II refletiu muito<br />

bem a imagem que se tinha de São Francisco vinte anos depois de<br />

sua morte.<br />

Neste estudo, buscamos concentrar a atenção não tanto numa<br />

análise pormenoriza<strong>da</strong> <strong>da</strong>s questões que envolviam a atitu<strong>des</strong><br />

questionáveis e condenáveis de certo número de fra<strong>des</strong> – isso exigiria<br />

uma pesquisa de maior fôlego -, mas, sim, visamos analisar como<br />

uma imagem de São Francisco foi construí<strong>da</strong> para, de alguma forma,<br />

responder a estes problemas.<br />

Entre os temas polêmicos tratados por Celano na Vita II,<br />

<strong>des</strong>tacamos, entre os mais relevantes nesta época, a questão <strong>da</strong><br />

pobreza, dos estudos e do poder.<br />

No que se refere ao tema <strong>da</strong> pobreza, é sabido que a maioria dos<br />

fra<strong>des</strong> já moravam em casas e conventos nesta época. Mesmo assim,<br />

Celano fez questão de recor<strong>da</strong>r, talvez com algum saudosismo, os<br />

tempos heróicos dos primeiros companheiros do santo narrando que<br />

estes<br />

(...) estavam contentes com uma única túnica, remen<strong>da</strong><strong>da</strong> às<br />

vezes por dentro e por fora (...). Cingiam-se com uma cor<strong>da</strong> e<br />

usavam calças de pano rude, fazendo o piedoso propósito de ficar<br />

simplesmente assim, sem ter mais na<strong>da</strong>. Naturalmente estavam<br />

seguros em qualquer lugar, sem nenhum temor, cui<strong>da</strong>do ou<br />

preocupação pelo dia seguinte, nem se incomo<strong>da</strong>vam com o abrigo<br />

que teriam à noite, mesmo nas gran<strong>des</strong> dificul<strong>da</strong><strong>des</strong>, freqüentes<br />

nas viagens. Pois, como muitas vezes nem tinham onde se abrigar<br />

do frio mais rigoroso, recolhiam-se a um forno ou se escondiam<br />

humildemente, à noite, em grutas ou cavernas. Durante o dia, os<br />

que sabiam trabalhavam com as próprias mãos, <strong>per</strong>manecendo nas<br />

casas dos leprosos ou outros lugares honestos, servindo a todos<br />

com humil<strong>da</strong>de e devoção (1 Cel 39).<br />

Monografias - Universi<strong>da</strong>de Tuiuti do Paraná 25<br />

| História | 2011

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!