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A EDUCAÇÃO NA ALTA IDADE MÉDIA - SALA DO Professor Luiz

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A <strong>EDUCAÇÃO</strong> <strong>NA</strong> <strong>ALTA</strong> <strong>IDADE</strong> <strong>MÉDIA</strong> – MARIO ALIGHIERO MA<strong>NA</strong>CORDA, 1999<br />

<strong>Luiz</strong> Antonio de Oliveira<br />

O poder na Alta Idade Média se estabeleceu concentrou nos reinos bárbaros romanos, na Igreja e no<br />

Império Romano do Oriente.<br />

1 DECADÊNCIA DA CULTURA CLÁSSICA<br />

O que marcou da decadência da cultura clássica? A fragmentação do poder romano e o contato com as<br />

culturas bárbaras.<br />

Neste contexto a escola cristã substituiu a escola clássica grego-romana (alfabetização, leitura e leitura<br />

dos clássicos gregos e romanos). A escola cristã manifestou de duas formas: a escola episcopal nas<br />

cidades e escola cenobítica nos mosteiros. O nível cultural do princípio da Idade Média foi muito baixo,<br />

seja entre os bárbaros, homens da Igreja ou os membros dos impérios.<br />

O rei dos bárbaros ostrogodos Teodorico procurou manter as contribuições anonárias 1 aos que<br />

ensinavam parte das artes honestae (gramática e retórica). Sendo que a cultura das artes liberais o<br />

mesmo rei mantinha como ensino para os romanos, ou seja o conjunto do trivium e quadrivium. Enfim,<br />

os bárbaros se dedicavam à formação guerreira.<br />

O empobrecimento cultural também estava entre os homens de igreja (padres, monges, bispos). Em<br />

seus princípios a Igreja era contrária à cultura clássica, como se expressou oficialmente no Concílio de<br />

Cartago em 400 d.C. que proibiu aos bispos sua leitura.<br />

Já o Concílio de Roma em 463 d.C. discutiu o problema da total ignorância dos eclesiásticos proibindo<br />

que analfabetos buscassem pelas ordens sagradas. A situação levou o papa Gelásio I em 495 d.C. a<br />

confirmar a proibição do acesso ao sacerdócio dos que não conhecessem as letras e possuíssem defeito<br />

físico.<br />

O mesmo posicionamento se deu em relação aos candidatos a monges. Mesmo assim Cassiodoro<br />

informa que no Sínodo de Roma de 499 existiam bispos que não sabiam assinar o próprio nome.<br />

Segundo Manacorda essa situação se estenderá por mil anos e é reveladora da condição de retorno da<br />

cultura ocidental à barbárie após atingir o auge clássico na Grécia e Roma. A decadência não se deu<br />

somente nas regiões do decante Império Romano do Ocidente. Esteve presente também no Império do<br />

Oriente, como se percebe em 529 quando o imperador Justiniano sistematiza as leis romanas, e ao<br />

mesmo tempo fechava a escola filosófica de Atenas. Segundo informações contidas em “História<br />

Secreta” de Procópio de Cesaréia a ignorância era forte na corte oriental. O governante anterior a<br />

Justiniano, seu tio Justino, tinha uma forma usada para assinar os documentos. O próprio Justiniano,<br />

embora não analfabeto, era de estilo, aparência e mentalidade rude.<br />

O esquecimento da cultura clássica estava consolidado. As escolas de artes liberais permaneceram em<br />

alguns lugares, que por ação de governantes bárbaros como Teodorico na Itália. Como o fim da guerra<br />

grega-gótica 2 (do oriente contra o ocidente bárbaro), Justiniano atendeu ao pedido do papa Virgílio e em<br />

sua Pragmática Sansão, de 554, reafirmou as contribuições anonárias que Teodorico havia estabelecido<br />

para que os jovens fossem instruídos nos estudos liberais.<br />

1 Que se refere contribuir com os mestres com uma espécie de salário expresso em mantimentos, ou seja, das<br />

provisões mínimas necessárias à sua alimentação e outras necessidades. Tratava-se de pagamento com produtos<br />

pelo trabalho de ensinar.<br />

2 O imperador Justiniano do Império Romano do Oriente (527 – 565) travou a Guerra Gótica contra os ostrogodos<br />

na Itália (535 – 554).


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Entretanto Cassiodoro e mesmo Teodorico reclamava que após os estudos das letras os jovens se<br />

descuidavam da cultura clássica, internando-se em mosteiros ou voltando para casa. Um estudar para<br />

esquecer. Não cultivavam a referida cultura.<br />

Os primeiros bárbaros, que eram em grande parte cristãos se se aculturaram às culturas clássicas gregoromanas.<br />

Já no século VI a situação era diferente dos anos 300: a tradição de acultura despareceu<br />

quando Justiniano venceu os ostrogodos na Itália e is vândalos na África. Assim, a cultura clássica<br />

quando da conversão dos francos já estará morta. Seu renascimento terá ação exatamente do rei Franco<br />

Carlos Magno e, e depois por ação de seus filhos.<br />

2 A ESCOLAS CRISTÃ MORE SI<strong>NA</strong>GOGAE (114).<br />

A reorganização da sociedade nos tempos medievos coloca o problema do dualismo entre Estado e<br />

Igreja. Com o poder de Estado enfraquecido algumas ações se concentraram nas mãos da Igreja.<br />

Naquele contexto falar de Igreja significava falar dos romanos organizados politicamente em torno de<br />

sua Igreja: nas mãos deste permaneceram os aspectos administrativos e culturais. Por isso, a<br />

reorganização da escola e cultura foram obras da Igreja no medievo. Por questões administrativas e<br />

culturais muitos bispos foram funcionários dos governantes bárbaros.<br />

Em torno da dupla estrutura da Igreja Medieval (clero secular: bispados e paróquias; e clero regular:<br />

mosteiros) organizou-se a nova educação cristã e consequentemente a escola medieval em tempos dos<br />

domínios bárbaros (Alta Idade Média).<br />

A vida nos mosteiros, pelo próprio movimento de afastamento do mundo para viver outra vida longe da<br />

sociedade, repercutiu em rejeição da cultura clássica, considerada cultura mundana. Foram os padres das<br />

cidades que conservaram mais tempo a cultura clássica. Mas, foram estes e os mosteiros que<br />

contribuíram para a reorganização da cultura e da escola.<br />

O papa Zózimo em 418 instituiu as escolas religiosas para ensinar os sacerdotes e depois estes<br />

ensinassem. O ato de ensinar passa à condição de grupo eleito, não mais leigo como em Grécia e Roma.<br />

Formar sacerdotes-mestre era a primeira missão das escolas nas paróquias e bispados. Essas escolas se<br />

pautaram pela separação entre o dizer e o fazer (separação entre trabalho intelectual e trabalho físico).<br />

Seguiu-se o modelo que se instaurou após a destruição do Templo de Jerusalém e da Diáspora (tempo<br />

do exílio no século VI a. C., e da dispersão dos judeus pelo mundo), quando se tornou predominante a<br />

influência das Sinagogas por meio da MIDRASH (trata-se de comentários dos textos sagrados<br />

transmitidos, sobretudo de forma oral). As escolas da Igreja assumiram o modelo da Midrash nas<br />

sinagogas.<br />

Estabeleceu-se uma nova ordem mental que promovia a aculturação institucionalizada que caracterizava<br />

a escola dos sacerdotes, cujo objetivo era a preparação para o dizer os princípios bíblicos da fé. O<br />

método era ouvir e depois repetir, para em seguida demonstrar o que se aprendera ao mestre. Assim,<br />

grande peso se dava à memorização.<br />

3 AS ESCOLAS NOS BISPA<strong>DO</strong>S E MOSTEIROS (116).


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Em torno do Concílio de Roma (464), o papa Gelásio, São Ferréolo e São Cesário constataram a<br />

ignorância do clero (especialmente), e dos leigos. Neste tempo a instrução se deu nos bispados e nos<br />

mosteiros.<br />

Contribuição dos bispados: Ao tratar da instrução ministrada nos bispados e paróquias, Manacorda<br />

(1999) chama atenção para o fato de se darem pelas possibilidades que as situações daquele tempo<br />

permitiram segundos alguns concílios nacionais 3 :<br />

Espanha: Concílio de Toledo (527): a primeira ação da Igreja em relação às crianças entregues<br />

pelos pais ao sacerdócio era a instrução pelo pessoa (clérigo) indicada pelo bispo;<br />

França: Concílio de Vaison: todos os padres deveriam acolher em suas próprias casas os jovens e<br />

realizar sua formação espiritual e sua instrução na leitura bíblica e nos princípios da Igreja. Com<br />

o objetivo de formar sucessores.<br />

Na medida em que os concílios estabeleciam que os 18 anos os meninos podiam escolher entre<br />

matrimônio e sacerdócio, abriam-se as escolas também para a formação dos leigos.<br />

A contribuição dos mosteiros: a organização monástica cristã ocidental se deu por ação de Cassiodoro,<br />

São Cesário, São Ferréolo, São Bento e São Colombano. Nas regulas e as Consultudines monasticae<br />

(regras dos mosteiros) o tema escola é quase ausente, embora elas tratem de algum tipo de instrução.<br />

O oferecimento que famílias realizavam de seus filhos quando ainda crianças aos mosteiros indicam<br />

uma atividade de instrução e instrução religiosa. Esses eram os oblatos, os iniciados na vida monástica.<br />

Nas Regulas de São Bento (540), a grande preocupação era como a educação moral e a participação na<br />

liturgia, Hás indicações também da instrução literária, como indica a regra 38: a leitura durante as<br />

refeições por monge que soubesse “edificar os que ouvem.” (= os que lessem bem).<br />

A presença do instrumento de escrever (grafhium) e do material no qual se escrevia (tabulae)<br />

providenciados pelo abade aos oblatos informa a presença da instrução em sua formação.<br />

As regras monásticas prescrevem punições para os adultos que vão desde a advertência secreta, à<br />

pública, a excomunhão do trabalho, da mesa e da liturgia, até a expulsão.<br />

A contribuição do cristianismo em relação à educação dos jovens e crianças: as regras monásticas<br />

determinam em relação aos mais jovens e crianças (os oblatos): que se tenha paciência, considerando a<br />

idade infantil, lentamente foi se reforçando a defesa de uma relação mais afetuosa e menos punitiva. A<br />

disciplina, com moderação e prudência, mesmo com a relação pedagógica onde os aprendizes deviam<br />

sempre calar-se e ouvir.<br />

Uma situação contraditória, uma vez que o costume durante boa parte da Alta Idade Média ainda se<br />

valorizava diante de qualquer erro: o jejum prolongado e os açoites. A compreensão era de que quando a<br />

persuasão não funciona se usasse do castigo. O sadismo pedagógico era uma tradição nas culturas<br />

ocidentais. Prevalecia essa pedagogia. Porém, isso não invalida a contribuição do cristianismo, que daria<br />

seus frutos mais tarde. A regra 70 de São Bento procura enfrentar esse sadismo quando trata de seu<br />

moderado e da punição dos abusos.<br />

Isidoro de Sevilha (560 – 636) indicava que se usasse a leitura silenciosa porque ele permitiria a<br />

articulação da língua.<br />

3 Concílios de uma determinada região. Isso significa que outras regiões poderiam ter decidido de forma de diferente.


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4 A NOVA CULTURA ESCOLÁTICA (122).<br />

A nova cultura escolástica formou a base para o ensino eclesiástico, fosse dos futuros pares ou dos<br />

leigos cristãos. Embora, o primeiro objetivo fosse a formação dos padres.<br />

A instrução promovida pelos padres e monges nos primeiros cem anos do medievo alterou os conteúdos,<br />

de modo que os clássicos grego-romanos foram substituídos pela cultura bíblica: salmos e Sagradas<br />

Escrituras, as leis da Igreja, e a vida de Santos importantes. Tal ensino exigia conhecer o ler, o escrever<br />

e o contar. A gramática ensinada era somente a necessária para os estudos religiosos, conforme<br />

defenderam Cassiodoro e Isidoro de Sevilha. O acesso à cultura clássica era só o necessário para a<br />

compreensão e ensino da cultura bíblica e dos fundamentos da Igreja. Tratava-se das didascálias: o<br />

ensino das primeiras letras, e sua articulação aos significados das imagens do sagrado.<br />

A escola cristã em seus primeiros tempos era arredia à cultura clássica, daí o controle na indicação das<br />

leituras que se permitia realizar, como estabelecia os Statuta ecclesiaae em 475.<br />

Cassiodoro ao fundar um mosteiro em Vivarum (Calábria) buscou uma posição mais equilibrada no<br />

trato com a cultura clássica, no sentido de conciliar com o cristianismo. Procurou mostrar aos mestres<br />

não cristãos a identificarem nas Sagradas Escrituras as figuras retóricas (formas de literatura e<br />

gramática) que ensinavam. Além disso, defendia que os papas não haviam decretado a rejeição da<br />

cultura secular<br />

Papa Gregório I (540 – 604) promoveu a vida cultural, um dos maiores críticos da cultura clássica no<br />

medievo, afirmava que se uso deveria estar na condição de ajudar na compreensão das escrituras.<br />

Assim, a nova cultura escolástica é medieval. O que isso significa? Uma cultura que herdou a língua<br />

latina e os aspectos formais (formas de estilo e argumentos) da tradição clássica (não seus conteúdos, a<br />

não serem aqueles que serviam para sustentar os fundamentos religiosos da nova sociedade), mas de<br />

fontes já da decadência romana. A centralidade de nova cultura são os textos bíblicos da tradição<br />

hebraica do Velho Testamento e o Novo Testamento, buscando pelo sentido histórico, moral e espiritual<br />

dos textos sagrados [conforme defendia São Cesário (São Cesário (470 – 543)].<br />

O movimento da instrução na Alta Idade Média conduzido pela Igreja promoveu a sistematização<br />

definitiva das disciplinas em trivium (gramática, dialética, retórica) e quadrivium (aritmética, geometria,<br />

astronomia e música), denominadas de sete artes liberais.<br />

5 AS ESCOLAS CANÔNICAS URBA<strong>NA</strong>S (128).<br />

As escolas paroquiais respondem à necessidade de segurança da Igreja. Assim, O Concílio de Toledo,<br />

em 633 recomenda a formação de padres que conheçam as Escrituras e as leis da Igreja, para a direção<br />

de suas futuras igrejas. Desta forma, o recrutamento de meninos para serem padres e mesmo servos<br />

instruídos na fé. Estes ficavam sob a orientação de m mestre clérigo. (129).<br />

Na medida em que acontecia a reelaboração da cultura (a nova cultura escolástica) promovia-se também<br />

a preocupação de levá-la às crianças de classes sociais subalternas. Os discípulos são as crianças mais<br />

humildes e escravas de ultramar resgatas pelos conventos.


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Trata-se da abertura da educação a todos, ou de sua aculturação ao modo de pensar predominante.<br />

Assim, aos discípulos das escolas paroquiais e cenóbicas se impunha maior preocupação com<br />

aculturação que com instrução, conforme as definições dos Concílios espanhóis do século VII. (128):<br />

- Concilio de Toledo, 633: disciplinamento e adequação do comportamento das famílias dedicadas à<br />

igreja para a formação sacerdotal aos cuidados de ancião (mestre de doutrina e exemplo de vida). (128).<br />

- tais princípios e orientações se confirmam nas regulae das ordens monásticas. (128).<br />

Configuram-se como escolas paroquiais, com alunos recrutados nas famílias que pertencem à própria<br />

organização eclesiástica local. Assim, o Concílio de Merida em 666 recomenda que todos os padres de<br />

paróquias formem clérigos. (128).<br />

A iniciativa mais rica de conseqüências para o cristianismo ocidental deu-se pela ação de monges<br />

irlandeses no século VII, por ação de discípulos de São Colombano (534 -615) que em 614 fundaram o<br />

mosteiro de Bobbio que estabelecia como mínimo a leitura com maior incidência da cultura clássica<br />

antiga (Grega e Romana). Propagou-se o surgimento de novos mosteiros comprometidos com o<br />

compromisso cultural.<br />

O novo empenho educativo da Igreja nos mosteiros e igrejas identificou-se nas novas regras das escolas<br />

canonicais ou reinterpretações das antigas regras cenobiais, como a regra de Chrodegango, bispo de<br />

Metz de 742 a 765: os reitores das igrejas devem nutrir e instruir os meninos a eles confiados,<br />

submetidos à disciplina eclesiástica de forma a não pecar em sal idade sensual tendenciosa. Para tal<br />

deverá nomear um irão absolutamente exemplar. Também entregues a ancião exemplar... Evidencia a<br />

preocupação com a formação moral e co m a instrução, como maior preocupação com a moral. (129-<br />

130).<br />

No Período carolíngio (130), Paulo Diácono procurou reinterpretar as regras de São Bento, de forma a<br />

evidenciar mais a preocupação também com a com a cultura: Bento afirma que os meninos em grupos<br />

de mais ou menos dez devem ter entre três e quatro mestres, nunca serem deixados a sós, instruídos com<br />

muito cuidado, e colocados em contato com hóspedes doutos sob orientação do Prior que observaram<br />

como se comportaria, e se suas repostas foram inadequadas.<br />

A época carolíngia e o renascimento medieval – o que se conservou das tradições clássicas. A nona<br />

organização política no Império de Carlos Magno foi o instrumento para o crescimento e renovação das<br />

tradições culturais. (131).<br />

6 A ÉPOCA CAROLÍNGIA: A ESCOLA ENTRE O PAPA<strong>DO</strong> E O IMPÉRIO (131).<br />

A época carolíngia é definida por Manacorda como a “consolidação das sociedades que surgiram do<br />

encontro de romanos e bárbaros germânicos e também de um grande despertar no campo da cultura e da<br />

escola. Centro deste processo [...] é a dinastia carolíngia do reino franco, protagonista daquela renovatio<br />

imperii que repropõe os territórios de cultura latina como potência euromediterrânea ao lado do império<br />

romano bizantino e dos árabes.” (131).<br />

O novo poder estatal se consolidou em torno dos guerreiros e dos intelectuais, monges e clérigos que<br />

pensaram a política cultural e escolástica do novo império. O acolhimento de intelectuais na corte de<br />

Carlos Magno (131) promoveu um Estado que assumiu a responsabilidade pela instrução (embora


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<strong>Luiz</strong> Antonio de Oliveira<br />

permaneça na Igreja e pela Igreja). O que resultou em diversos documentos, os chamados Capitulares,<br />

como o Capitular de 787, pretendendo orientar a função de ensino dos eclesiásticos: não negligenciar os<br />

estudos literários, mas aprender para com eles penetrar mais corretamente os mistérios das páginas<br />

sagradas. (131 – 132).<br />

A grande referência se tornou a tradição anglo-saxônica de Alcuíno (735 – 804), beneditino, que<br />

promoveu a superação da polêmica entre o pensamento de Juliano, o Apostata (361 – 363) e Gregório de<br />

Nazianzo (329 – 389): a aceitação da cultura clássica para usos melhores, como pensava Isidoro de<br />

Sevilha. (132).<br />

O Império carolíngio cuida da preparação profissional dos sacerdotes, na condição de profissão de<br />

governo. Igreja subordinada ao Estado também num campo que lhe é próprio. (132), com o lugar de<br />

formação definido na residência episcopal.<br />

Estabeleceu-se um conflito no qual a Igreja passa a reivindicar o controle da formação não só de seus<br />

quadros, mas também dos demais jovens. Assim, Carlos Magno concedeu permissão que os pais<br />

mandassem seus filhos aos mosteiros para aprender o Pater, o /Credo, mesmo em seus dialetos. (132-<br />

133).<br />

Seu filho, Ludovico, o Pio – Luis, o piedoso (778 – 840), em documento de 817, prescreveu que nos<br />

mosteiros deveria se manter somente a escola para os oblatos. Há uma proibição de outro tipo de escola<br />

e freqüência nos mosteiros. (133).<br />

Lotário (795 – 855), em 825, liberou a Igreja da obrigação de instruir os leigos, consolidando a escola<br />

pública de Estado que pretendeu organizar em sedes mais importantes (centros urbanos da época). A<br />

iniciativa ficou por conta dos bispos, como os italianos e franceses que solicitaram a Lotário o<br />

afastamento da obrigação da instrução dos leigos, conforme Concílio de Paris de 829. (133).<br />

A Igreja logo em seguida reivindica o papel da instrução. Quais os motivos de tal alteração? A<br />

formação dos clérigos, o problema se arrastará e só terá encaminhamento mais definitivo quando o<br />

Concílio de Trento (1545 – 1564) definirá o seminário como lugar de formação dos padres. Enquanto<br />

isso, o Concílio de Roma, em 826, constatando a falta de mestres e interessados nos estudos das letras,<br />

impõe em todos os bispados, nas suas paróquias, e onde fosse necessário e possível, providências para<br />

nomeação de mestres e doutores para ensinar as letras, as artes liberais e os dogmas sagrados, as<br />

sagradas escrituras. (133 – 134).<br />

E a instrução dos leigos? O Concílio de Roma, de 853, sob orientação do papa Leão IV, reafirmou as<br />

escolas episcopais para os clérigos, e propõe as escolas paroquiais, de nível inferior, abertas também aos<br />

leigos, para o ensino noções da doutrina cristã. (134).<br />

As três modalidades de escolas: 1) do Estado para leigos nas principais cidades; 2) as eclesiásticas<br />

paroquiais, abertas também aos leigos, e, eclesiásticas episcopais para a formação exclusiva dos padres;<br />

3) dos mosteiros, para os oblatos, sem necessariamente excluir o acesso de leigos. Tais escolas estavam<br />

sob a temporária e frágil direção do Estado. (134).<br />

7. A EXPERIENCIA DE VIDA NUMA ESCOLA CENOBIAL (134).<br />

O relato “Lembranças de escola de Walafried Strato” na segunda parte do século IX – abade de<br />

Reichenau:<br />

Edifícios imponentes; acolhimento amigável de “grande número de companheiros”; confiado a um<br />

mestre, juntamente com outros meninos da mesma idade (mas mais adiantados), para aprender a ler;


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enfrentou com zelo as tarefas, aprendeu rápida a leitura do que escreviam para sua leitura, como os<br />

livros em latim; iniciado no alemão; aprendeu a ler e compreender o que lia.<br />

Em seguida aprendeu a conversação em latim (aprendeu frases de cor para se fazer entender aos seus<br />

colegas, que por estarem mais adiantados tinham de conversar só em latim; na sequência foi iniciado na<br />

gramática de Donato sob a orientação de um aluno mais experiente até que decorasse todas as<br />

declinações e as regras de uso das mesmas; nas duas primeiras horas o mestre orientava como fazer para<br />

aprender, depois só voltava para conferir com ao instrutor como tinha acontecido a tarefa. (135 – 136).<br />

Observe-se que o aprendiz era colocado com os textos; tratava-se de uma espécie de método mútuo<br />

(mestre e instrutor) com base na memorização, sob controle do mestre. (136).<br />

8. A <strong>EDUCAÇÃO</strong> FÍSICA E GUERREIRA (136).<br />

Trata-se do fazer das classes dominantes: libertar os meninos dos medos dos anciões e dos mestres e<br />

formá-los na coragem e nos atributos e uso das armas. Os bárbaros eram contrários à aculturação<br />

romana, sobretudo aquela que se dava nas escolas (escolas das letras humanas). Essas escolas<br />

representavam para a elas a submissão do espírito e do corpo, representada na ação das punições do<br />

chicote. O que criaria homens sem capacidade de reação para enfrentar o perigo da espada e da lança,<br />

portanto, contrários aos princípios de coragem e valentia próprios dos bárbaros. (136). Vide o repúdio da<br />

comunidade dos nobres godos contra Amalasunta por sua atitude de aculturação romana na educação de<br />

futuro rei, seu filho Atalarico.<br />

Manacorda observa nos tempos romanos-bárbaros a separação entre o dizer e o fazer, as letras e o valor:<br />

a resistência bárbara em constituir um lugar separado onde se ensina e a concepção da educação como<br />

treinamento guerreiro. Destaque-se a resistência bárbara à educação repressiva (o sadismo pedagógico<br />

das pancadas gera covardes!). (137).<br />

Carlos Magno estabeleceu uma relação diferenciada na formação de seus filhos, instruindo-os nas artes<br />

liberais e nas leis mundanas. De um Aldo os fez instruir por doutos clérigos da Corte. De outro, os<br />

adestrava na caça e na equitação conforme os costumes dos francos, portanto preparação militar.<br />

Entretanto, predominam as virtudes dos nobres: as da paz e as das guerras (caça, pesca conhecimento<br />

das regras da Corte e leis do Estado). (138).<br />

9 A PREPARAÇÃO PARA OS OFÍCIOS ARTESA<strong>NA</strong>IS (138).<br />

O aprendizado das atividades produtivas na Idade Média se dava pela observação e imitação, assim<br />

como no mundo antigo, como já observará Platão, mas também pela iniciação e aprimoramento por<br />

meio de um mestre.<br />

Assim se deu na sobrevivência das corporações artesanais nas cidades, representadas na atividade de<br />

ensino configuradas na relação entre os magistri e os discipuli. Não se trata somente de preservação de<br />

uma tradição romana, mas também se encontra presente entre os bárbaros.<br />

Lei do rei Astolfo, de 750 menciona: negocaitores (maiores, seqüentes e minores). Trata-se dos graus<br />

dos artífices. Os documentos do período (século XIII) apresentam: ourives, pintores, caldereiros,<br />

alfaiates, saboeiros, artífices de cobre, e os incisores. Dividem-se me mestres e discípulos.


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Sobreviveram as relações produtivas nos campos – segundo uma nova divisão do trabalho feudal:<br />

lavradores, pastores servos ministeriais (os trabalhos na Corte senhorial). Não se tem notícias de<br />

documentos que indiquem o treinamento em tais atividades.<br />

Ressalta ainda Manacorda, as atividades independentes da Corte e dos mosteiros, como os construtores,<br />

sobre as quais não existem registros de sua aprendizagem.

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