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procuradoria da república no município de blumenau-sc

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Revista Eletrônica PRPE, Dezembro <strong>de</strong> 2004<br />

PROCURADORIA DA REPÚBLICA NO MUNICÍPIO DE<br />

BLUMENAU-SC<br />

“Justiça Pública”<br />

João Marques Brandão Néto<br />

Procurador <strong>da</strong> República em Blumenau/SC<br />

EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(A) FEDERAL DA<br />

VARA CRIMINAL DE BLUMENAU-SC<br />

Processo <strong>no</strong> 2004.72.05.000315-0<br />

Autor: Ministério Público Fe<strong>de</strong>ral<br />

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pelo Procurador <strong>da</strong> República<br />

signatário, vem ante Vossa Excelência, <strong>no</strong>s autos do procedimento epigrafado, dizer e<br />

requerer o que segue:<br />

1. O primeiro código ibérico <strong>de</strong> que se tem <strong>no</strong>ticio foi o Código Visigótico,<br />

<strong>de</strong>rivado, em parte,<strong>da</strong>s leis romanas.<br />

2. Do Século V ao Século VIII o atual território português foi dominado pelos<br />

Visigodos, em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> uma aliança <strong>de</strong>stes com os roma<strong>no</strong>s. Os<br />

godos eram um povo germânico originário <strong>da</strong>s regiões meridionais <strong>da</strong><br />

E<strong>sc</strong>andinávia. (...) O povo godo abando<strong>no</strong>u a região do rio Vístula, que<br />

correspon<strong>de</strong> à atual Polônia, durante o reinado <strong>de</strong> Filimer, na segun<strong>da</strong><br />

meta<strong>de</strong> do século II, e chegou ao mar Negro após muitas aventuras. (...)<br />

Durante o século III, foram muitas as incursões go<strong>da</strong>s nas províncias<br />

romanas <strong>da</strong> Anatólia e <strong>da</strong> península balcânica: eles saquearam as costas<br />

asiáticas, <strong>de</strong>struíram o templo <strong>de</strong> Éfeso, chegaram a penetrar em Atenas<br />

e avançaram sobre Ro<strong>de</strong>s e Creta. Durante o regime <strong>de</strong> Aurelia<strong>no</strong> (270-<br />

275), obrigaram os roma<strong>no</strong>s a se retirar <strong>da</strong> província <strong>da</strong> Dácia, <strong>no</strong> outro


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lado do Danúbio. Os godos que viviam entre os rios Danúbio e Dniester<br />

receberam o <strong>no</strong>me <strong>de</strong> visigodos. Os do outro ramo, que <strong>no</strong> século IV se<br />

haviam estabelecido na área que viria a ser a Ucrânia, foram<br />

<strong>de</strong><strong>no</strong>minados ostrogodos (...). Ostrogodos. O rei<strong>no</strong> ostrogodo, que se<br />

estendia do mar Negro até o Báltico, alcançou o po<strong>de</strong>rio máximo com<br />

Ermanarico, mas foi dominado pelos hu<strong>no</strong>s por volta do a<strong>no</strong> 370. Após o<br />

colapso do império hu<strong>no</strong> em 455, dois a<strong>no</strong>s <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> morte <strong>de</strong> seu chefe<br />

Átila, os ostrogodos penetraram na Panônia (Danúbio central) e dirigiram-<br />

se para a Itália (...). Visigodos. (...) Conquistaram, <strong>no</strong> século III, a Dácia,<br />

província romana situa<strong>da</strong> na Europa centro-oriental. No século IV, ante a<br />

ameaça dos hu<strong>no</strong>s, o imperador Valente conce<strong>de</strong>u refúgio aos visigodos<br />

ao sul do Danúbio, mas a arbitrarie<strong>da</strong><strong>de</strong> dos funcionários roma<strong>no</strong>s os<br />

levou à revolta. Penetraram <strong>no</strong>s Balcãs e, em 378, esmagaram o exército<br />

do imperador Valente nas proximi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Adrianópolis. Quatro<br />

a<strong>no</strong>s <strong>de</strong>pois, o imperador Teodósio I o Gran<strong>de</strong> conseguiu estabelecê-los<br />

<strong>no</strong>s confins <strong>da</strong> Mésia, província situa<strong>da</strong> ao <strong>no</strong>rte <strong>da</strong> península balcânica.<br />

Tor<strong>no</strong>u-os fe<strong>de</strong>rados do império e <strong>de</strong>u-lhes posição proeminente na<br />

<strong>de</strong>fesa. Os visigodos prestaram uma aju<strong>da</strong> eficaz a Roma até 395,<br />

quando começaram a mu<strong>da</strong>r-se para oeste. Em 401, chefiados por Alarico<br />

I, que rompera com os roma<strong>no</strong>s, entraram na Itália e invadiram a planície<br />

do Pó, mas foram repelidos. Em 408 atacaram pela segun<strong>da</strong> vez e<br />

chegaram às portas <strong>de</strong> Roma, que foi toma<strong>da</strong> e saquea<strong>da</strong> em 410. Nos<br />

a<strong>no</strong>s seguintes, o rei Ataulfo estabeleceu-se com seu povo <strong>no</strong> sul <strong>da</strong> Gália<br />

e na Hispânia e, em 418, firmou com o imperador Constâncio um tratado<br />

pelo qual os visigodos se fixavam como fe<strong>de</strong>rados na província <strong>de</strong><br />

Aquitania Secun<strong>da</strong>, na Gália. A monarquia visigo<strong>da</strong> consolidouse com<br />

Teodorico I, que enfrentou os hu<strong>no</strong>s <strong>de</strong> Átila na batalha dos Campos<br />

Catalâunicos. Em 475, Eurico <strong>de</strong>clarou-se monarca in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do rei<strong>no</strong><br />

visigodo <strong>de</strong> Tolosa (Toulouse), que incluía a maior parte <strong>da</strong>s Gálias e a<br />

Espanha. Seu reinado foi extremamente benéfico para o povo visigodo:<br />

além <strong>da</strong> obra política e militar, Eurico cumpriu uma monumental tarefa<br />

legislativa ao reunir as leis dos visigodos, pela primeira vez, <strong>no</strong> Código <strong>de</strong>


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Eurico, conservado num palimpsesto em Paris. Seu filho Alarico II<br />

codificou, em 506, o direito <strong>de</strong> seus súditos roma<strong>no</strong>s, na Lex romana<br />

visigothorum, mas carecia dos dotes políticos do pai e per<strong>de</strong>u quase todos<br />

os domínios <strong>da</strong> Gália em 507, quando foi <strong>de</strong>rrotado e morto pelos francos<br />

<strong>de</strong> Clóvis, na batalha <strong>de</strong> Vouillé, perto <strong>de</strong> Poitiers. Desmoro<strong>no</strong>u então o<br />

rei<strong>no</strong> <strong>de</strong> Tolosa e os visigodos foram obrigados a transferir-se para a<br />

Espanha. O rei<strong>no</strong> visigodo na Espanha estava inicialmente sob o domínio<br />

dos ostrogodos <strong>da</strong> Itália, mas logo tor<strong>no</strong>u-se in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte. Para<br />

conquistar o domínio <strong>da</strong> península ibérica, os visigodos enfrentaram<br />

suevos, ala<strong>no</strong>s e vân<strong>da</strong>los, povos bárbaros que haviam ocupado o país<br />

antes <strong>de</strong> sua chega<strong>da</strong>. A unificação quase se concretizou durante o<br />

reinado <strong>de</strong> Leovigildo, mas ficou comprometi<strong>da</strong> pelo problema religioso:<br />

os visigodos professavam o arianismo e os hispa<strong>no</strong>roma<strong>no</strong>s eram<br />

católicos. O próprio filho <strong>de</strong> Leovigildo, Hermenegildo, chegou a sublevar-<br />

se contra o pai <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> converter-se à religião católica. Mas esse<br />

obstáculo para a fusão com os hispa<strong>no</strong>-roma<strong>no</strong>s se resolveu em 589, a<strong>no</strong><br />

em que o rei Recaredo proclamou o catolicismo religião oficial <strong>da</strong> Espanha<br />

visigótica. (...). Fonte: Encyclopaedia Britannica.<br />

3. O Código <strong>de</strong> Eurico, <strong>de</strong>pois Lex romana visigothorum,“ Código Revisado”<br />

por Leovegildo e o “Livro dos Juízes”, <strong>de</strong> Recesvindo dos reis visigodos),<br />

sofreu acré<strong>sc</strong>imos e modificações, parte <strong>de</strong>las em <strong>de</strong>corrência <strong>da</strong><br />

proclamação do catolicismo como religião oficial <strong>da</strong> Espanha visigótica.<br />

Estes acré<strong>sc</strong>imos e modificações foram efetuados pelos Concílios <strong>de</strong><br />

Toledo (IV – 633, V – 636, VI – 638 e VIII - 653). Foi este Código<br />

modificado (o Livro dos Juízes – Fuero Juzgo) que a Real Aca<strong>de</strong>mia<br />

Espanhola publicou em 1815, sendo uma edição fac-similar <strong>de</strong>sta obra<br />

que hoje se encontra <strong>no</strong> mercado (Editora Lex Nova, Madri, 1ª. Edição,<br />

1990, 242 páginas) e disponível na íntegra (em latim e espanhol) na<br />

Internet. Deste código são extraí<strong>da</strong>s as informações que seguem.<br />

4. No Fuero Juzgo (Código Visigótico) não é clara a distinção entre “justiça<br />

pública” e “justiça priva<strong>da</strong>”, pois o Juiz era pago pelas partes e po<strong>de</strong>ria ser


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juiz quem fosse man<strong>da</strong>do pelo príncipe ou eleito pelas partes, com o<br />

testemunho dos homens bons. O po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> julgar era recebido do príncipe,<br />

do senhor <strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> ou <strong>de</strong> outros juízes (estes podiam transferir o po<strong>de</strong>r<br />

<strong>de</strong> julgar) – Livro 2,Título1, XIII. Havia uma justiça cível e criminal (Os<br />

juízes <strong>de</strong>vem ser estabelecidos <strong>de</strong> tal maneira que tenham po<strong>de</strong>r <strong>de</strong><br />

terminar os pleitos, tanto <strong>da</strong>s malfeitorias, quanto <strong>da</strong>s outras coisas). E o<br />

rei po<strong>de</strong>ria man<strong>da</strong>r man<strong>da</strong>tários para colocar a paz entre as partes (L2T1,<br />

XV). Quem fosse chamado em juízo e não comparecesse, <strong>de</strong>veria pagar<br />

cinco soldos <strong>de</strong> ouro ao autor <strong>da</strong> <strong>de</strong>man<strong>da</strong> e cinco soldos <strong>de</strong> ouro ao juiz.<br />

E se persistisse na recusa, receberia 50 açoites na frente do juiz. Não<br />

vindo a juízo e não tendo on<strong>de</strong> pagar os cinco soldos, o réu receberia 30<br />

açoites. Se o réu jurasse que não pô<strong>de</strong> vir a juízo, não receberia as penas<br />

<strong>da</strong> revelia. Se um bispo não respon<strong>de</strong>sse ao chamado do juiz, nem<br />

<strong>no</strong>measse procurador, pagaria 50 soldos, dos quais 20 seriam para o juiz<br />

e 30 para o autor <strong>da</strong> <strong>de</strong>man<strong>da</strong> (os números, <strong>no</strong> Fuero Juzgo, são sempre<br />

grafados em algarismos roma<strong>no</strong>s). Sacerdotes, diáco<strong>no</strong>s, subdiáco<strong>no</strong>s,<br />

clérigos e regulares em geral que não aten<strong>de</strong>ssem ao chamado dos<br />

juízes, receberiam a mesma pena que os leigos. E se não tiverem on<strong>de</strong><br />

pagar, o bispo os obrigaria a jejuar por 30 dias, jejum este que consistia<br />

em receber um pouco <strong>de</strong> pão e um pouco <strong>de</strong> água à tar<strong>de</strong>. Se o revel<br />

fosse fraco ou doente <strong>de</strong> modo a não po<strong>de</strong>r suportar a pena, esta seria<br />

aplica<strong>da</strong> <strong>de</strong> modo a não causar gran<strong>de</strong> enfermi<strong>da</strong><strong>de</strong> ou morte (L2T1,<br />

XVII). Aos juízes já se aplicava o que hoje se conhece por princípio <strong>da</strong><br />

impessoali<strong>da</strong><strong>de</strong>: não <strong>de</strong>viam julgar por amor ou por ódio. Os juízes<br />

podiam folgar em suas casas dois dias por semana, ou to<strong>da</strong>s as tar<strong>de</strong>s,<br />

quando não haveria pleitos. Fora <strong>de</strong>stes horários <strong>de</strong> folga, os juízes<br />

<strong>de</strong>viam ouvir os pleitos e sentenciá-los, sem maiores dilações (L2T1,<br />

XVIII). Se o juiz julgasse torto e privasse alguém <strong>de</strong> seus bens, o próprio<br />

juiz <strong>de</strong>veria <strong>de</strong>volver o que recebeu in<strong>de</strong>vi<strong>da</strong>mente e pagaria o mesmo<br />

tanto <strong>de</strong> seus bens; e se o juiz não tiver bens para entregar, receberia 50<br />

acoites publicamente. Mas se o juiz jurasse que julgou torto por ig<strong>no</strong>rância<br />

e não por amor, nem por cobiça, nem para aten<strong>de</strong>r a pedidos, não sofreria


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pena alguma (L2T1, XIX). Os juízes eram exortados a não prolongarem<br />

muito as <strong>de</strong>man<strong>da</strong>s e não criar muitas dificul<strong>da</strong><strong>de</strong>s às partes, <strong>de</strong> modo<br />

que um pleito não durasse mais do que oito dias. Se o juiz tivesse que<br />

julgar um pleito maior do rei ou do conselho, <strong>de</strong>veria dizer às partes para<br />

voltarem em <strong>da</strong>ta certa, para então <strong>de</strong>man<strong>da</strong>rem (L2T1, XX). Po<strong>de</strong>ria<br />

haver apelação para o príncipe (L2T1, XXII). Há um tabelamento dos<br />

“serviços judiciais”, com as penas para quem os <strong>de</strong>srespeitasse: Por que<br />

viemos ya muchos iuezes é muchos meri<strong>no</strong>s, é muchos sayones que por cobdicia<br />

pasavam el man<strong>da</strong>do <strong>de</strong> la ley, é tomavam la tercia parte <strong>de</strong> la <strong>de</strong>man<strong>da</strong> <strong>de</strong>l pleyto:<br />

por en<strong>de</strong> estabelecemos en esta presente ley, por toller esta cobdicia <strong>de</strong> los iuezes,<br />

que nieguen iuez <strong>de</strong> pleito que sea iudgado, ó tratado antel, <strong>no</strong>n ose tomar <strong>de</strong> XX.<br />

sueldos mas <strong>de</strong> u<strong>no</strong> por su trabaio, assim cuemo es dicho en la ley <strong>de</strong> suso, é si<br />

algu<strong>no</strong> tomar mas <strong>de</strong>sto que <strong>no</strong>s avemos dicho, pier<strong>da</strong> todo loque <strong>de</strong>via aver<br />

segund la ley, é quanto tomó mas contra <strong>de</strong>recho, que <strong>no</strong>n man<strong>da</strong>va la ley, pechelo<br />

en duplo a aquel á quien lo tomó. Otrosi porque enten<strong>de</strong>mos que los sayones, que<br />

an<strong>da</strong>n en los pleytos, tomavan mas que <strong>no</strong>n <strong>de</strong>vien por su trabaio: por en<strong>de</strong><br />

establecemos en esa ley que <strong>no</strong>n tomen mas <strong>de</strong> la décima parte <strong>de</strong> la <strong>de</strong>man<strong>da</strong>: é si<br />

mas tomaren, pier<strong>da</strong>n lo que <strong>de</strong>ven aver segund la ley, é <strong>de</strong>mas lo que tomó péchelo<br />

em duplo á aquel á quien lo tomó. (Por que já vimos muitos juízes, meirinhos<br />

e saiones, que, por cobiça, excediam o man<strong>da</strong>do <strong>da</strong> lei, e tomavam a<br />

terça parte do requerido <strong>no</strong> pleito, estabelecemos na presente lei, para<br />

afastar esta cobiça dos juízes, que nenhum juiz do pleito que seja julgado<br />

ou tratado perante ele, não ouse tomar mais <strong>de</strong> vinte soldos por seu<br />

trabalho, assim como diz a lei. E se algum tomar mais que isto, perca tudo<br />

que <strong>de</strong>veria receber segundo a lei e quanto tomou a mais contrariamente<br />

ao direito e pague em dobro àquele a quem tomou. Outrossim, porque<br />

enten<strong>de</strong>mos que os saiones que fazem as diligências do pleito, tomam<br />

mais do que <strong>de</strong>vem receber por seu trabalho, estabelecemos nesta lei que<br />

não tomem mais do que a décima parte <strong>da</strong> <strong>de</strong>man<strong>da</strong>; e se mais tomarem,<br />

percam o que <strong>de</strong>veriam receber segundo a lei e o mais que tomaram


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paguem o dobro àquele <strong>de</strong> quem tomou.)<br />

5. Segundo CONDE 1 , saihon ou sayon tem origem <strong>no</strong> germânico sagjo, que<br />

significa aquele que executa a sentença; magistrado judicial subalter<strong>no</strong>,<br />

com funções policiais; verdugo. Também segundo CONDE, soldo vem do<br />

latim solidus (moe<strong>da</strong> <strong>de</strong> ouro). O solidus ou soldo era uma uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

conta <strong>no</strong> sistema monetário carolíngio. Correspondia a 1/20 <strong>da</strong> libra e a 12<br />

dinheiros. Mas a única uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> conta que efetivamente se cunhava<br />

<strong>no</strong>s rei<strong>no</strong>s cristãos era o dinheiro. Meri<strong>no</strong>, por seu tur<strong>no</strong>, origi<strong>no</strong>u<br />

“meirinho” <strong>no</strong> português, originando-se ambos os vocábulos do latim<br />

“maiorinus”, que significaria “maiorzinho”, pois estaria subordinado ao<br />

“majordomo”, termo que origi<strong>no</strong>u “mordomo”. O meri<strong>no</strong> era encarregado<br />

<strong>da</strong> administração dos bens <strong>da</strong> coroa 2 mas também po<strong>de</strong>ria ter funções <strong>de</strong><br />

juiz. O pagamento ao juiz e ao sayon seria feito <strong>de</strong>duzindose <strong>da</strong> coisa<br />

objeto <strong>da</strong> <strong>de</strong>man<strong>da</strong> ou <strong>de</strong> quem <strong>de</strong>veria entregá-la ou não o fez; mas se o<br />

pleito fosse entre her<strong>de</strong>iros ou se não fosse apurado <strong>de</strong> quem era a culpa<br />

pelo pleito, ambas as partes pagariam ao juiz e ao sayon. Em caso <strong>de</strong><br />

revelia, o revel pagaria o trabalho do juiz e do sayon. Se o sayon não<br />

quisesse fazer o que o juiz mandou, pagaria um soldo <strong>de</strong> ouro por ca<strong>da</strong><br />

onça <strong>de</strong> ouro que valesse o pleito. Se o sayon fosse plebeu, receberia<br />

duas cavalgaduras empresta<strong>da</strong>s para o serviço e, se fosse <strong>no</strong>bre,<br />

receberia não mais do que seis cavalgaduras (L2T1, XXIV). Os juízes<br />

podiam julgar por man<strong>da</strong>do do rei ou por vonta<strong>de</strong> <strong>da</strong>s partes. O duc, o<br />

con<strong>de</strong> e o “vicário” (= lugartenente, substituto, <strong>de</strong>legado) podiam julgar por<br />

man<strong>da</strong>do do rei ou por vonta<strong>de</strong> <strong>da</strong>s partes. E uma vez recebido o po<strong>de</strong>r<br />

<strong>de</strong> julgar, <strong>de</strong>viam ter o <strong>no</strong>me <strong>de</strong> juiz, suportando os ônus e os bônus <strong>de</strong> tal<br />

condição, segundo man<strong>da</strong> a lei (L2T1, XXV). Se os juízes julgassem torto,<br />

o pleito na<strong>da</strong> valeria. Note-se que, na ementa do artigo, o juiz é chamado<br />

<strong>de</strong> alcai<strong>de</strong>. Eram também nulos os julgamentos ocorridos por pressão dos<br />

po<strong>de</strong>rosos: quando os juízes julgassem torto (ou seja, nem conforme o<br />

1CONDE, Manuel Sílvio. Os forais tomarenses <strong>de</strong> 1162 e 1174. in Revista <strong>de</strong> Guimarães, n.º 106, 1996, pp. 193-249<br />

(obtido <strong>no</strong> site www.cs.uminho.pt)<br />

2REILLY, Bernard. Cristãos e Muçulma<strong>no</strong>s – A Luta Pela Península Ibérica. Tradução <strong>de</strong> Maria José Giesteira. Lisboa,<br />

Teorema, 1992, p. 75.


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direito, nem segundo a lei) a mando dos príncipes ou por medo. E mesmo<br />

que na<strong>da</strong> valesse o julgamento, os juízes não sofreriam penas se<br />

jurassem que não julgaram torto por sua vonta<strong>de</strong>, mas por medo do rei<br />

(L2T1, XXVII). Na ementa do item XXVIII se <strong>de</strong>clarava que os bispos<br />

tinham po<strong>de</strong>r sobre os juízes que julgassem torto: XXVIII. Do po<strong>de</strong>r que<br />

têm os bispos sobre os juízes que julgam torto Nós admoestamos aos<br />

bispos <strong>de</strong> Deus, que <strong>de</strong>vem ter guar<strong>da</strong> sobre os pobres e sobre os<br />

coitados, por mando <strong>de</strong> Deus; que eles admoestem os juízes que julgam<br />

torto contra os povos, para que melhorem e que façam boa vi<strong>da</strong> e que<br />

<strong>de</strong>sfaçam o que julgaram mal. E se eles não quiserem aten<strong>de</strong>r a<br />

admoestação dos bispos, e quiserem julgar torto, o bispo em cuja terra<br />

está, <strong>de</strong>ve chamar o juiz que dizem que julgou torto, e outros bispos, e<br />

outros homens bons, e emen<strong>da</strong>r o pleito com o juiz, segundo o que é <strong>de</strong><br />

direito. E se o juiz for tão <strong>de</strong>sleal que não queira emen<strong>da</strong>r o julgamento<br />

com o bispo, então este po<strong>de</strong> julgar por si, e faça um e<strong>sc</strong>rito <strong>de</strong> como<br />

emendou o julgamento e envie este e<strong>sc</strong>rito ao rei, juntamente com a<br />

pessoa que estava agrava<strong>da</strong>, para que o rei confirme o que lhe parecer<br />

que é direito. E se o juiz impedir que vá ao bispo aquele homem que antes<br />

era agravado por ele, juiz, com torto, pague o juiz duas libras <strong>de</strong> ouro ao<br />

rei..<br />

6. É interessante <strong>no</strong>tar que há, <strong>no</strong> Fuero Juzgo, um germe do Ministério<br />

Público ibérico: após asseverar que quanto mais os senhores julgam os<br />

pleitos, mais se <strong>de</strong>vem guar<strong>da</strong>r <strong>de</strong> os estorvar, o Fuero Juzgo <strong>de</strong>termina<br />

que quando o bispo ou o príncipe entram em alguma <strong>de</strong>man<strong>da</strong> com outro<br />

homem, <strong>de</strong>vem <strong>no</strong>mear procuradores para figurarem na <strong>de</strong>man<strong>da</strong> por<br />

eles. Isto porque pareceria <strong>de</strong>sonra a tão gran<strong>de</strong>s homens se algum<br />

homem que lhes fosse inferior contestasse o que dissessem na <strong>de</strong>man<strong>da</strong>.<br />

E se o rei quisesse estar em pessoa na <strong>de</strong>man<strong>da</strong>, quem ousaria contestá-<br />

lo? Assim, para que por medo do po<strong>de</strong>r não <strong>de</strong>sfaleça a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />

man<strong>da</strong>mos que não tratem eles (bispos e príncipes) o pleito por si, mas<br />

por seus man<strong>da</strong>tários 3 (L2T3, I).<br />

3 Los sen<strong>no</strong>res quanto mas <strong>de</strong>vem iudgar los pleytos, tanto mas <strong>de</strong>vem guar<strong>da</strong>r <strong>de</strong> los <strong>de</strong>storbar. On<strong>de</strong> si el obispo ó el


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7. Os muçulma<strong>no</strong>s dominaram a península ibérica <strong>de</strong> 711 a 1492. Mas por<br />

volta do a<strong>no</strong> 1000 os cristãos já dominavam quase a meta<strong>de</strong> <strong>da</strong><br />

península. Do que é hoje Portugal, a parte <strong>no</strong>rte – até Coimbra – era já<br />

cristã e, o sul, incluindo Lisboa, ain<strong>da</strong> estava sob domínio muçulma<strong>no</strong>.<br />

Lisboa, então, pertencia à Taifa <strong>de</strong> Ba<strong>da</strong>jós. Pois bem, entre os<br />

muçulma<strong>no</strong>s, a justiça era feita pelo Cádi, um cargo “público”. A palavra<br />

Cádi origi<strong>no</strong>u Alcai<strong>de</strong> em português que, em alguns momentos <strong>da</strong> história,<br />

exerceu a magistratura.<br />

8. Já em Portugal (<strong>de</strong>pois que se tor<strong>no</strong>u in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte), a separação entre<br />

administração e justiça só se fez, com niti<strong>de</strong>z, em 1832. A palavra juiz, até<br />

então, era emprega<strong>da</strong> comumente na acepção <strong>de</strong> presi<strong>de</strong>nte ou<br />

autori<strong>da</strong><strong>de</strong> principal, apesar <strong>de</strong> <strong>de</strong><strong>no</strong>tar, prevalentemente, o sentido <strong>de</strong><br />

administrador <strong>de</strong> justiça. Mas já <strong>no</strong> reinado <strong>de</strong> Afonso II (1211) havia<br />

juízes municipais (também chamados juízes <strong>da</strong> terra) e juízes <strong>de</strong>signados<br />

pelo rei. Entretanto a instrução dos processos que era oral, segundo<br />

CAETANO - e a <strong>de</strong>finição do direito aplicável era feita por homens bons<br />

e<strong>sc</strong>olhidos <strong>de</strong> uma assembléia judicial, composta por vizinhos <strong>de</strong> um<br />

concelho. Os concelhos eram formados por diversas povoações. Os<br />

homens-bons eram os vizinhos mais sisudos e experientes, com mais tempo<br />

disponível e mais interesse pelas coisas públicas (CAETANO, 1992: 215 a 224).<br />

9. No tocante às leis criminais, também segundo CAETANO, o início <strong>de</strong><br />

Portugal conheceu a justiça pública (aplica<strong>da</strong> pelo rei, juízes, senhores e<br />

concelhos) e a justiça priva<strong>da</strong> (exerci<strong>da</strong> pelos ofendidos: vítima, parentes,<br />

vizinhos ou grupo protetor). Dentre as formas <strong>de</strong> justiça priva<strong>da</strong>, havia a<br />

composição: pecuniária, mediante in<strong>de</strong>nização; corporal ou por açoites,<br />

em que o agressor entrava às varas, ou seja, era surrado com varas; por<br />

missas, em que o ofensor pagava a celebração <strong>de</strong> missas pelo ofendido;<br />

por prisão, ou seja, em cárcere privado. Após a composição, havia um<br />

principe an pleyto con algun omne, ellos <strong>de</strong>ven <strong>da</strong>r otros personeros, que trayan el pleyto por ellos. Ca<strong>de</strong>sondra semeiarie á<br />

tan gran<strong>de</strong>s omnes, sí algun omne rafez les contradixiesse lo que dixiessen en el pleyto. Hy el rey si quisiere traer el pleyto<br />

por si, ¿quien le osará contra<strong>de</strong>cir? On<strong>de</strong> que por el miedo <strong>de</strong>l po<strong>de</strong>rio <strong>no</strong>n <strong>de</strong>sfalezca la ver<strong>da</strong>d, man<strong>da</strong>mos que <strong>no</strong>n tracten<br />

ellos pleyto por si, mas por sus man<strong>da</strong><strong>de</strong>ros.


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ritual <strong>de</strong> reconciliação. A vingança priva<strong>da</strong>, porém, passou a ser coibi<strong>da</strong> já<br />

em 1211, pelo Rei D. Afonso II. A execução <strong>da</strong> justiça priva<strong>da</strong> só era<br />

permiti<strong>da</strong> fora <strong>da</strong>s povoações: era a paz urbana. A<strong>de</strong>mais, era exigido<br />

maior polimento dos costumes na urbs, don<strong>de</strong> veio a expressão<br />

urbani<strong>da</strong><strong>de</strong>. Esta manutenção <strong>da</strong> or<strong>de</strong>m nas povoações chamava-se paz<br />

urbana. Mais importante do que a paz urbana era a paz doméstica: a casa<br />

era asilo inviolável, servindo inclusive para proteção <strong>de</strong> crimi<strong>no</strong>sos que<br />

nelas se refugiassem. A violação <strong>de</strong> domicílio já era <strong>de</strong>lito grave em<br />

legislação portuguesa do a<strong>no</strong> <strong>de</strong> 1211. No tocante à justiça pública, <strong>de</strong> se<br />

lembrar que a justiça era um dos primeiros, senão o mais importante,<br />

<strong>de</strong>veres do rei. Mas justiça priva<strong>da</strong> e justiça pública ain<strong>da</strong> coexistiam,<br />

sendo esta última exerci<strong>da</strong> pelo rei (por meio dos juízes régios), pelos<br />

senhores (por meio dos juízes senhoriais) e pelas assembléias municipais<br />

(que eram presidi<strong>da</strong>s por juízes municipais, os quais também, às vezes,<br />

julgavam <strong>de</strong> forma singular) (CAETANO, 1992:248).<br />

10.Nas Or<strong>de</strong>nações Filipinas (com vigência a partir <strong>de</strong> 1603), o Estado tinha<br />

duas ativi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, a administrativa (Fazen<strong>da</strong>) e judiciária (Justiça), como se<br />

vê do seguinte trecho: Or<strong>de</strong>nações Filipinas (Primeiro Livro, Título 99 - p.<br />

237 <strong>da</strong> edição utiliza<strong>da</strong>): Porquanto por confiarmos <strong>de</strong> algumas pessoas,<br />

que <strong>no</strong>s serviram bem e fielmente, e como cumpre a <strong>no</strong>sso serviço e bem<br />

<strong>da</strong> Justiça, <strong>de</strong><strong>sc</strong>argo <strong>de</strong> <strong>no</strong>ssa con<strong>sc</strong>iência e proveito <strong>da</strong> <strong>no</strong>ssa Fazen<strong>da</strong>,<br />

os encarregados <strong>de</strong> alguns Ofícios <strong>da</strong> Justiça, ou <strong>da</strong> <strong>no</strong>ssa Fazen<strong>da</strong>, e<br />

assim por lhes fazermos mercê (a qual porém lhes não faríamos, posto<br />

que boa vonta<strong>de</strong> lhes tenhamos, se não fosse a confiança, que neles<br />

temos),e <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> os assim termos encarregados <strong>no</strong>s tais Ofícios, vêm<br />

às vezes à <strong>no</strong>ssa <strong>no</strong>tícia que os não servem como são obrigados, e<br />

conforme a confiança, que neles tínhamos, quando dos tais Ofícios os<br />

provemos. E posto que nas coisas, que assim dos sobreditos sabemos, e<br />

que à <strong>no</strong>ssa <strong>no</strong>tícia vem, às vezes não há provas tão claras, porém há<br />

quanto basta para sermos certo, que somos <strong>de</strong>les mal servido, e eles<br />

errarem <strong>no</strong>s ditos Ofícios, <strong>de</strong> maneira que será mais serviço <strong>de</strong> Deus e<br />

<strong>no</strong>sso serem-lhes tirados, que <strong>de</strong>ixá-los estar neles. Pelo que, e por


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outros respeitos, que <strong>no</strong>s movem, <strong>de</strong> muito serviço <strong>de</strong> Deus e <strong>no</strong>sso, bem<br />

<strong>da</strong> Justiça e gover<strong>no</strong> <strong>de</strong> <strong>no</strong>ssos Rei<strong>no</strong>s e Senhorios, <strong>de</strong>terminamos que<br />

quaisquer Ofícios, que <strong>de</strong>rmos, assim <strong>da</strong> Justiça, como <strong>de</strong> <strong>no</strong>ssa<br />

Fazen<strong>da</strong>, ou <strong>de</strong> qualquer outra sorte e quali<strong>da</strong><strong>de</strong> que seja, quando quer<br />

que nós soubermos, e <strong>no</strong>s certificarmos em <strong>no</strong>ssa con<strong>sc</strong>iência, que<br />

alguns dos ditos Oficiais <strong>no</strong>s servem neles mal, e fazem o que não<br />

<strong>de</strong>vem, ou <strong>da</strong>nificam e roubam <strong>no</strong>ssa Fazen<strong>da</strong>, lhos possamos tirar e <strong>da</strong>r<br />

a quem <strong>no</strong>ssa mercê for, sem por isso lhes sermos em obrigação alguma,<br />

assim <strong>no</strong> foro <strong>da</strong> con<strong>sc</strong>iência, como <strong>no</strong> foro judicial, para por isso haverem<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>man<strong>da</strong>r <strong>no</strong>sso Procurador, nem requerer a Nós satisfação, porque<br />

<strong>de</strong> todo os excluímos.<br />

11.A Justiça era exerci<strong>da</strong> por diversos órgãos: a Casa <strong>da</strong> Suplicação era o<br />

maior tribunal (Livro 1, Título 1), seguindo-se o Desembargo do Paço<br />

(L1T3), os Corregedores <strong>da</strong> Corte dos Feitos Crimes (L1TVII), os<br />

Corregedores <strong>da</strong> Corte dos Feitos Cíveis (L1TVIII), os Juízes dos Feitos<br />

do Rei <strong>da</strong> Coroa (L1TIX), os Juízes dos Feitos do Rei <strong>da</strong> Fazen<strong>da</strong> (T1LX)<br />

e outros. Pois bem, <strong>de</strong>ntre os Desembargadores <strong>da</strong> Casa <strong>da</strong> Suplicação,<br />

um servia como Promotor <strong>da</strong> Justiça (<strong>no</strong>tese: Promotor <strong>da</strong> Justiça e não<br />

Promotor <strong>de</strong> Justiça) – Livro1, Título XV. A este promotor cabia requerer<br />

to<strong>da</strong>s as causas que tocam à Justiça, formar libelos contra os seguros ou<br />

presos, que por parte <strong>da</strong> Justiça hão <strong>de</strong> ser acusados na Casa <strong>da</strong><br />

Suplicação. Mais adiante, <strong>no</strong> item 6 do mesmo Título XV, havia a seguinte<br />

disposição: E man<strong>da</strong>mos que, em nenhuma ci<strong>da</strong><strong>de</strong>, vila ou lugar haja<br />

Promotor <strong>da</strong> Justiça, salvo nas Casas <strong>da</strong> Suplicação e do Porto e assim,<br />

nas Correições, em ca<strong>da</strong> uma haverá um Promotor <strong>da</strong>do por Nós. Porque<br />

nas outras ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, vilas e lugares o Tabelião, ou E<strong>sc</strong>rivão, que for do<br />

feito, fará o libelo e <strong>da</strong>rá as testemunhas... E esta mesma or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> <strong>da</strong>r<br />

as testemunhas terão os ditos Promotores. E do que o Tabelião ou<br />

E<strong>sc</strong>rivão fizer como Promotor, não lhe será contado salário <strong>de</strong> Promotoria,<br />

somente lhe contarão as regras, como outra e<strong>sc</strong>ritura do feito, que como<br />

Tabelião e<strong>sc</strong>reve.


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12.No Império, havia crimes em que a acusação era feita pela Justiça e<br />

outros em que o Promotor a fazia (Código Criminal do Império – 1831, art.<br />

312). A situação pouco mudou na Primeira República, pois a ação penal<br />

iniciaria <strong>de</strong> ofício, ou seja, pelo Juiz, <strong>no</strong>s crimes inafiançáveis e quando<br />

não fosse apresenta<strong>da</strong> a <strong>de</strong>núncia pelo Ministério Público <strong>no</strong>s prazos <strong>da</strong><br />

lei (Código Penal <strong>de</strong> 1890, art. 407, § 3o). A mesma disposição havia <strong>no</strong><br />

art. 407, § 4o, <strong>da</strong> Consoli<strong>da</strong>ção <strong>da</strong>s Leis Penais <strong>de</strong> 1932. O Código <strong>de</strong><br />

Processo Penal em vigor (Decreto-Lei <strong>no</strong> 3.689/1941) manteve a<br />

possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> do Juiz <strong>da</strong>r início à ação penal nas contravenções penais<br />

(artigos 26 e 531).<br />

13.Somente com o advento do artigo 129, I, <strong>da</strong> Constituição <strong>da</strong> República<br />

Fe<strong>de</strong>rativa do Brasil, em 1988, é que o Ministério Público passou a <strong>de</strong>ter o<br />

mo<strong>no</strong>pólio <strong>da</strong> ação penal pública. Assim, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1988, não há como se<br />

falar – sem incorrer em erro – em “Justiça Pública” como autora <strong>de</strong><br />

processos e procedimentos criminais: primeiro, porque não há uma<br />

Justiça priva<strong>da</strong>; segundo, porque a “justiça” <strong>no</strong> caso é o Juiz – que não<br />

po<strong>de</strong> intentar ação penal; terceiro, porque o <strong>no</strong>me do órgão que promove<br />

a ação penal, que é o autor <strong>da</strong> ação penal, é Ministério Público e não<br />

“Justiça”.<br />

EM FACE DO EXPOSTO, o Ministério Público Fe<strong>de</strong>ral requer seja<br />

<strong>de</strong>termina<strong>da</strong> a retificação <strong>da</strong> autuação, para que conste, como “autor” o Ministério Público<br />

Fe<strong>de</strong>ral e não a “Justiça Pública”; requer, ain<strong>da</strong>, seja <strong>de</strong>terminado à Secretaria <strong>de</strong>ste Juízo<br />

que se abstenha <strong>de</strong> colocar na autuação <strong>de</strong> processos e procedimentos criminais a “Justiça<br />

Pública” como autora; requer, finalmente, seja remeti<strong>da</strong> cópia <strong>de</strong>sta petição à Distribuição,<br />

para que, igualmente, se abstenha <strong>de</strong> autuar processos e procedimentos criminais<br />

colocando a “Justiça Pública” como autora.<br />

Nestes Termos<br />

Pe<strong>de</strong> Deferimento.<br />

Blumenau, 1 <strong>de</strong> Dezembro <strong>de</strong> 2004<br />

João Marques Brandão Néto


Revista Eletrônica PRPE, Dezembro <strong>de</strong> 2004<br />

Procurador <strong>da</strong> República

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