Capítulo 04.pdf - PUC Rio
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275<br />
Eduardo Ferreira França Influência dos pântanos sobre o homem. Para ele, os habitantes<br />
das regiões pantanosas obtinham “um caráter triste, melancólico, apático”, tese em<br />
consonância com o profundo crédito nos elementos climáticos, topográficos e<br />
geológicos para a formação do caráter coletivo da humanidade. 210<br />
Mas as implicações estéticas de um processo de catalogação da paisagem, o<br />
estabelecimento dos moldes paisagísticos capazes de caracterizar toda uma coletividade,<br />
consistiram apenas no lado mais exposto desta busca, cujas primícias nasciam de um<br />
curto, mas audível, rugido interior. 211 O choque dado no encontro com o elemento<br />
natural também fizera com que o homem caísse em si e no empuxo convertesse a<br />
emoção numa gestalt, segundo Herder – filósofo alemão bastante citado pela primeira<br />
geração romântica brasileira –, uma forma psicológica estabilizada na diferenciação<br />
entre o ser e o meio circundante. 212 Para uma sociedade em que a natureza tornou-se<br />
finita como calotas de gelo sobre o sol escaldante, as condições epistemológicas de uma<br />
elevação positiva, integral, dada no encontro da interioridade complacente com a<br />
infinidade de formas externas não deixa de ser algo difícil de acreditar. Porém, se abrir<br />
emocionalmente para o exterior significou para os românticos a construção de uma via<br />
dupla após a qual a fixidez de uma paisagem só-natureza, cedo ou tarde, desestabilizarse-ia<br />
diante do olhar alucinado.<br />
Entender de maneira ampla o que significou a paisagem para os românticos<br />
brasileiros significa, pois, ir além do dado físico para perceber os desdobramentos<br />
estéticos do processo de construção de um ambiente autóctone. 213 Pois uma das<br />
210<br />
FRANÇA, Eduardo Ferreira. Investigações de psicologia. São Paulo: Editora da Universidade de São<br />
Paulo, 1973, p.22.<br />
211<br />
“Por toda a pintura de paisagem só é possível exposição subjetiva, pois a paisagem só tem realidade no<br />
olho daquele que a contempla. A pintura de paisagem busca necessariamente a verdade empírica, e o mais<br />
alto de que é capaz é utilizar a esta mesma novamente como um véu através do qual deixa entrever uma<br />
espécie superior de verdade. Mas o que se expõe é tão-somente o véu: o verdadeiro objeo, a Idéia,<br />
permanece sem figura, e sua descoberta naquilo que é vaporoso e informe passa a depender daquele que<br />
contempla. É inigável que as relações da luz universal com um amplo todo de objetos – se ela paira sobre<br />
a natureza de uma maneira mais manifesta ou mais velada, mais forte e distinta ou mais fraca e como que<br />
frutua sobre ela - evocam certos estados da alma, despertam, indiretamente, Idéias ou, antes, apenas<br />
fantasmas de Idéias, e não raro tiram de nossa vista o véu que recobre o mundo invisível. (...) A beleza de<br />
uma paisagem depende de tantas casualidades, que é difícil, é impossível lhe dar na arte aquela<br />
necessidade que, por exemplo, toda figura orgânica contém em si. Não são causas internas, mas externas<br />
e violentas que determinam a forma, o declive das montanhas e as ondulações dos vales”. SCHELLING,<br />
op. cit., pp. 192-193.<br />
212<br />
SANDLER, Paulo César. Goethe e a psicanálise – a apreensão da realidade psíquica. <strong>Rio</strong> de Janeiro:<br />
Imago, 2001, p. 44.<br />
213<br />
“El paisaje canário ejerce, asimismo, outra influencia em estos viajeros que refleja claramente una de<br />
las principales características de la escritura romântica. Nos referimos al lirismo con el que pretenden<br />
traducir, por médio de palabras, los sentimientos que les provoca uma naturaleza que ya no conciben<br />
como algo exterior, sino de la que se sienten parte integrante, por lo que su misión no va a consistir