Capítulo 04.pdf - PUC Rio
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liberalismo. Joaquim Manuel de Macedo, por exemplo, no seu romance A misteriosa,<br />
colocou na boca de Fileno, o narrador da história, as intenções de realizar uma trama<br />
onde diria tudo, pois “debaixo do ponto de vista da literatura, o caso pode pertencer à<br />
escola clássica, como à romântica e à realista”. E, assim, meio escondido atrás de uma<br />
personagem, externou aquilo que toda uma geração de escritores almejou com suas<br />
obras:<br />
É igualmente necessário, essencial, determinar a hora, ou as horas da ação, para que não<br />
se suponha que tudo correu de princípio ao fim à sombra da noite ou à distância e à luz<br />
equívoca do gás; não! O romanesco e maravilhoso, caso começou com o sol afora,<br />
embora acabasse com o sol adentro. Ainda neste ponto há de tudo nele, luz do dia, gás à<br />
noite, penumbra e sombra... e, por conseqüência, a escola clássica aos raios do sol, a<br />
romântica à luz do gás e a realista no escuro... 203<br />
Interessante observar a posição intermédia obtida pelo romantismo no esquema<br />
visual criado por Macedo, o lugar da luminosidade esbaforida do gás, entre a falta de<br />
recônditos penumbrosos do classicismo e a total escuridão do realismo. Talvez o<br />
romance A misteriosa seja por demais tardio para oferecer um trecho contemplativo dos<br />
ideais românticos de antanho, mas versões de uma literatura conciliatória podem ser<br />
achadas nas preferências literárias de Pereira da Silva pelo gênio de Goethe, se<br />
quisermos voltar um pouco mais no tempo. Em sua peregrinação pela Alemanha, em<br />
1837, esteve em Weimar, onde visitou a casa do autor, morto em 1832, e deixou um<br />
registro dos motivos de sua veneração pelo criador de Fausto:<br />
Assim foi Goethe, gênio fecundo e raro, variado e harmonioso como a natureza, original<br />
e profundo nas suas concepções e sutil e penetrante em seus juízos (...) É poeta clássico<br />
e romântico, antigo e moderno, pagão e cristão, pastoril e elegíaco, dramático e heróico,<br />
tudo ao mesmo tempo. 204<br />
Sua admiração por Hoffmann também se resolveu por um juízo de gosto afeito<br />
ao fantástico, ao maravilhoso, sem abrir demais para o desvario, já que destacou a “mão<br />
firme” com que o escritor alemão desenhou os mais extravagantes personagens, “dando<br />
a seus quadros uma naturalidade e coloridos tão reais” a ponto de superar as artimanhas<br />
históricas de Walter Scott. Se entrarmos em contato com o material crítico referente a<br />
recepção do fantástico na França, as palavras de Pereira da Silva coadunavam-se com a<br />
203 MACEDO, Joaquim Manuel de Macedo. “A misteriosa”. <strong>Rio</strong> de Janeiro: Editora Ocidente, s.d., p.11<br />
http://www.caminhosdoromance.iel.unicamp.br/ Acessado em 23 de março de 2008.<br />
204 SILVA, J.M. Pereira da. Variedades literárias. <strong>Rio</strong> de Janeiro: Livraria de B.L. Garnier, 1862, p. 8.