Capítulo 04.pdf - PUC Rio
Capítulo 04.pdf - PUC Rio
Capítulo 04.pdf - PUC Rio
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
246<br />
As sombras de Descartes, Kant e Jouffroy a Mr. Cousin descrevia uma cena na<br />
qual Victor Cousin, após conversar com a aparição de Descartes, repassava na mente<br />
“os mais fortes raciocínios que lhe tinham feito contra a sua filosofia” e, ponderando<br />
que nos interstícios do sono os espíritos animais “exaltaram sua imaginação e a fizeram<br />
delirar”, acabou dando com o fantasma de Kant. Do filósofo de Koenigsberg, o chefe<br />
máximo do ecletismo escutou palavras de puro arrependimento, arregimentado durante<br />
o tempo em que filosofava, sem nenhum controle, sobre os mistérios da natureza da<br />
percepção humana.<br />
Ah! Triste verdade! Menor me fora que nem uma letra houvesse sabido formar. Não<br />
louveis minha ciência, nem minhas obras sobre a razão. Tanto critiquei esta razão, não<br />
achando que a concepção provasse, suficientemente, a existência do objeto concebido,<br />
que pretendi, loucamente, que não se podia afirmar a existência de coisa alguma, o que<br />
necessariamente conduz, ou ao mais triste ceticismo, ou no cego fatalismo de<br />
Espinoza. 147<br />
Depois do fantasma de Kant praguejar contra a crítica da razão prática, pura e do<br />
juízo, arrependendo-se por não render submissão à Santa Igreja católica enquanto teve<br />
tempo hábil para fazê-lo, esfumou-se, deixando Cousin em profunda crise de<br />
consciência no seu gabinete de estudos, tal qual um Fausto órfão de Mefistófeles.<br />
Durante o desenvolvimento do diálogo imaginário, D. Romualdo Seixas teve a<br />
oportunidade de, através dos recursos ficcionais, colocar na boca de filósofos vivos e<br />
mortos palavras saídas de suas reflexões particulares com relação às buscas pelo<br />
absoluto através do subjetivo. Para ele, nada se poderia esperar de uma filosofia dobrada<br />
sobre as imagens nascidas no interior da mente humana, nada além de simulacros<br />
decaídos, ainda mais se o termo de comparação residisse nas urdiduras perfeitas da<br />
inteligência divina. Ambição desmedida, inatingível, conciliar as harmonias dadas pelo<br />
dinamismo da natureza a partir do entendimento de algo imperfeito – lição cujo<br />
ceticismo calou fundo na alma da personagem real/imaginária do diálogo filosófico.<br />
Atendo-se exclusivamente sobre as argumentações do opúsculo do padre<br />
Romualdo Seixas até se encontra alguma coerência e firmeza de idéias, mas a maneira<br />
achada para que as infâmias do ecletismo espiritualista viessem à tona, na verdade,<br />
atuou mais no sentido de equiparar o chefe da escola eclética aos grandes pensadores da<br />
teoria do conhecimento moderno, em nada diminuiu sua estatura diante da divindade.<br />
As críticas ao sistema filosófico acabaram envolvidas por uma atmosfera leve de<br />
147 JUNQUEIRA, op. cit., p.89.