Capítulo 04.pdf - PUC Rio
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ressalva importante: a “verdade” e a “verossimilhança” que servissem para o<br />
convencimento, já que aqui a eloqüência baseava-se na argumentação jurídica e se<br />
permitia inventar e exagerar fatos para captar a simpatia para a causa em questão.<br />
Enfim, o papel da invenção na oratória clássica assegurou as perfomances de antigos<br />
jurisconsultos, mas, por ser baseada nos termos da imitação, pareceu pouco propensa a<br />
um sentido de sujeito puramente psicológico. Do orador esperava-se que, ao narrar um<br />
fato, permanecesse o mais possível no imitativo da ação. As preocupações com a<br />
recepção do discurso deviam chegar até os limites da imagem sem internalizá-la, picotála<br />
e organizá-la mediante os recursos da teoria do conhecimento. 88 O escritor do<br />
Retórica a Herênio, assim como Aristóteles, aconselhava a manter a ordem cronológica<br />
dos acontecimentos, evitando o discurso “confuso, obscuro e inusitado; não começar de<br />
muito longe, não seguir muito adiante e não deixar de lado o que diz respeito à<br />
matéria”. 89 Os fantasmas aqui se produziram conformados por um conhecimento<br />
científico diverso daquele acumulado pelos fillósofos e artistas modernos, cada vez mais<br />
atentos à fuga das imagens, ao invés de confiantes no direcionamento dado pela vontade<br />
e argúcia do falante.<br />
Para finalizar esta que se quer uma breve reminiscência da seqüenciação de<br />
imagens ocidentais valeria a pena resgatar uma pequena e influente obra cuja data de<br />
escritura e autoria ainda permanecem desconhecidas. Trata-se Do sublime, manuscrito<br />
do século X, mas que remetia a um autor romano setecentos anos mais jovem, Cássio<br />
Longino. O texto valeu-se de toda uma discussão travada desde a Antigüidade sobre os<br />
princípios formais da ação discursiva, porém imergia com muito mais profundidade<br />
naqueles dispositivos dados como os responsáveis pela fruição estética. Ateve-se de<br />
maneira muito mais pausada na movimentação da cadeia de imagens, responsabilizando<br />
a organização formal pela maior ou menor atenção do público. Segundo o autor:<br />
Para produzir a majestade, a grandeza de expressão e a veemência, meu jovem amigo, é<br />
preciso acrescentar também as aparições, como o mais próprio a fazer. Nesse sentido,<br />
pelo menos, é que alguns as chamam “fabricantes de imagens”. Pois se o nome aparição<br />
é comumente atribuído a toda espécie de pensamento que se apresenta, engendrando a<br />
palavra, agora o sentido que prevalece é esse: quando o que tu dizes sob o efeito do<br />
entusiasmo e da paixão, tu crês vê-lo e o colocas sob os olhos do auditório. 90<br />
88 “A fábula contém ações que não são nem verdadeiras, nem verossímeis, como as relatadas na tragédia.<br />
A história são as ações realmente empreendidas, mas em época distante de nossa lembrança. O argumento<br />
é a ação ficta que, no entanto, poderia ter acontecido, como o argumento das comédias”. CÍCERO, op.<br />
cit., p. 65.<br />
89 Idem, p. 67.<br />
90 LONGINO. Do sublime. São Paulo: Martins Fontes, 1996, p. 67.