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Capítulo 04.pdf - PUC Rio

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cujas ânsias decorativas ou as urdiduras frouxas na trama quebravam o encanto das<br />

idéias encadeadas com senso rítmico dos sonhos.<br />

Não é difícil vincular muitos acontecimentos, no domínio do romance, àquelas áreas da<br />

experiência humana que não encontram explicação racional ou que, contra todas as<br />

probabilidades, não exigem a intervenção de agentes sobrenaturais para que possam<br />

ocorrer mesmo com os comuns dos mortais. Afinal, o sonho, o incompreensível, o<br />

visionário também fazem parte do que chamamos realidade. 55<br />

Algo das palavras da estudiosa brasileira lembrava a bela imagem de Northrop<br />

Fry realizada quando, em suas aulas dadas na Universidade de Harvard, defendeu para o<br />

romance um lugar em que os ritos de descenço e de subida, os mundos de sonho e de<br />

vigília, a realidade e a ilusão, impediam a recriação de um ato social plenamente<br />

iluminado, sem as trevosas artes do inconsciente:<br />

O romance desce, às vezes, deliberadamente, a um mundo evidentemente relacionado<br />

com o inconsciente humano, e não nos surpreenderia descobrir que alguns romances,<br />

como por exemplo Phantastes, de George MacDonald, são buscas psicológicas que se<br />

levam a cabo em um espaço interior. Este espaço interior tem exatamente tanta<br />

“realidade”, segundo o uso que dessa palavra faz Wallace Stevens, como a Feira de<br />

Vaidades de Thackeray: a Feira de Vaidades, em si mesma, é, depois de tudo, um<br />

simples produto social das ilusões que produzem os conflitos dentro desta<br />

consciência interior. 56<br />

Neste sentido, o “Efeito do real” residia muito mais na capacidade de uma<br />

organização coerente, com profunda concisão estética, capaz de urdir a trama sob as<br />

pulsações de uma mente atenta, do que entregue a um sentido deleitoso de pura<br />

exterioridade. Assim, aberto a uma fantástica resultante da busca de uma composição<br />

conexa com a realidade primeira do ser humano, o romance absorveu a paisagem sob o<br />

ditame de um ritmo interior e, conseqüentemente, fantasmático. No século XVIII esta<br />

consciência chegou a seu ápice no momento em que os conceitos tratados no processo<br />

de funcionamento da percepção começaram a ser empregados para normatizar os<br />

produtos estéticos, especialmente as artes conhecidas como narrativas. 57 Ao tempo que<br />

55 GUARDINI, “Dez Lições sobre o romance inglês”, op. cit., p.28.<br />

56 FRYE, Northrop. La escritura profana. Caracas: Monte Avila Editores, 1992, p.72.<br />

57 “Os efeitos desta concepção na teoria/crítica da arte foram quase imediatos. Nos artigos publicados no<br />

Spectador, números 411 a 421 (de junho a julho de 1712), denominados ‘Os prazeres da imaginação’,<br />

Addison fornece uma explicação do prazer estético derivada em grande parte da epistemologia empirista.<br />

A antiga teoria segundo a qual a arte aperfeiçoa a natureza mediante a seleção de seus aspectos mais belos<br />

apresenta-se agora, não como aproximação à forma ideal implantada no espírito do artista, ou conforme<br />

as leis universais condensadas no princípio da coincinnitas,ou então como resultado do afflatus<br />

sobrenatural, mas como um produto da combinação dos materiais obtidos da experiência sensível.(...)

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