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Capítulo 04.pdf - PUC Rio

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202<br />

No sentimento da minha alma eu não descubro algum mecanismo. Este sentimento é<br />

uma modificação, uma maneira de ser da minha alma, que não tem alguma semelhança<br />

com o efeito da matéria. Minha alma parece receber a impressão que se faz na<br />

extremidade anterior do nervo ótico; mas é a maneira de uma substância imaterial: ela<br />

experimenta um sentimento, não recebe um choque. 42<br />

O ecletismo espiritualista nasceu em contraposição ao empirismo radical<br />

disseminado pelos filósofos ilustrados anteriores à Revolução Francesa, cujos estudos<br />

sobre a natureza humana desprezavam as abordagens especulativas sobre a alma e todas<br />

as análises para as quais a apreensão física do mundo não constituía a base para a<br />

interpretação dos fenômenos naturais. Se a fama de “sensualistas” na época fugia aos<br />

rótulos de trabalhos hoje conhecidos como pornográficos, as proximidades excessivas a<br />

uma máquina sensível, para a qual a dor ou o prazer motivava ou retraía os membros<br />

diante de objetos cortantes ou macios, deu o ensejo para a realização de um corpo<br />

passivo ao dado mundano. A fisiologia humana incrustava-se num composto inerte e, ao<br />

mesmo tempo, intumescido por uma seiva silenciosa, dando vida a fetiches de mármore.<br />

Certamente a incidência do mito de Pigmalião sobre a imaginação clássica realizou-se<br />

por este contexto de automatização do organismo:<br />

LA STATUE<br />

Que vois-je? Où suis-je?<br />

Et qu’est-ce que je pense?<br />

D’où me viennent ces mouvements?<br />

PIGMALION<br />

Ô ciel!<br />

LA STATUE<br />

Que dois-je croire?<br />

Et par quelle puissance<br />

Puis-je exprimer mes sentiments? 43<br />

Em 1748, o músico Jean-Philippe Rameau, a partir do libreto de Ballot de<br />

Sauvot, revisitaria o mito que mais adiante serviria às intenções teóricas de Condillac,<br />

em seu Tratado das sensações. 44 Para ilustrar sua visão de corpo de base sensualista, o<br />

filósofo francês solicitou os préstimos de uma estátua na qual foi aos poucos inserindo<br />

os órgãos e as sensações correspondentes. Começou limitando o sentido de seu boneco<br />

ao olfato, à audição, à visão e ao tato, isolando cada uma das funções de aprendizado na<br />

42 ALVERNE, Compêndio de filosofia, p. 92.<br />

43 SAUVOT, Ballot de. “Pigmalion” [libreto]. Paris: Virgin Veritas, 1999, p. 15.<br />

44 CONDILLAC, Étienne de. Tratado das sensações. São Paulo: Editora Unicamp, 1993.

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