Capítulo 04.pdf - PUC Rio
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dos documentos mais privilegiados para adentrar o pensamento filosófico do Padre<br />
Mestre tratou-se, na verdade, de uma apostila planejada para o melhor aproveitamento<br />
de seus alunos. Ele mesmo confessou, em carta ao Conselheiro Antônio Feliciano de<br />
Castilho, em 1855:<br />
Sem dúvida tenho entre meus papéis alguns esboços literários um pouco avançados,<br />
mas que é impossível completar porque me falecem as mãos e os olhos, e não ouço em<br />
volta de mim quem, parodiando o verso 18° do cap. 2° do Gênesis, reproduza o famoso:<br />
faciannus ei adjutorium símile sibi. O trabalho que vos falo é um curso de filosofia<br />
elementar para uso das nossas escolas, e do qual tanto carecem os nossos modernos<br />
gongoristas e os nossos insolentes martinistas. Acreditai-me, não é um tratado de<br />
eloqüência de que necessitam os corruptores da linguagem do púlpito e os plebeus da<br />
nossa atual literatura, eles carecem instruir-se nos primeiros elementos da arte de<br />
pensar; necessitam conhecer a teoria do discurso e os preceitos da composição. 36<br />
O Compêndio de filosofia, único livro do gênero legado por Monte Alverne, não<br />
pôde ser revisado pelo autor, pois este veio a falecer antes que fosse publicado, em<br />
1859. 37 Francisco Luis Pinto, responsável pela edição do manuscrito, justificou os<br />
inúmeros defeitos da obra pela falta da demão necessária ao acabamento da escrita, mas,<br />
realmente, caso se recusasse a levá-lo ao prelo por preciosismos editoriais, ficaríamos<br />
sem um objeto privilegiado para acessar os conhecimentos filosóficos do padre-mestre.<br />
Em conseqüência, vislumbrar parte do conteúdo repassado aos estudantes em suas<br />
concorridas aulas no Seminário São José.<br />
Indo de encontro às intenções iniciais de Monte Alverne, Compêndio de filosofia<br />
realmente importa menos pela originalidade do pensamento do autor que pela<br />
capacidade de síntese de um amplo espectro de leituras, objetivando a realização de uma<br />
cartilha simples e direta para a instrução dos neófitos “na arte de pensar”. 38 Mas algo na<br />
proposta destoava do temperamento impositivo de Alverne, para quem as necessidades<br />
imperiosas do gênio alçavam-se acima da exposição fria e impessoal de qualquer<br />
documento. Se comparado, por exemplo, ao livro Compêndio de medicina prática, de<br />
Bomtempo, o resumo do padre apresentou momentos muito mais nítidos de autoridade,<br />
mesmo porque jamais se furtava de comentar, e refutar, os conceitos dos filósofos mais<br />
complexos. Leibniz, por exemplo, teve parte de seu sistema invalidado pelo franciscano.<br />
Da “Harmonia Pré-Estabelecida” ao “Inatismo”, nada deixou de ser comentado<br />
negativamente pelo padre. “Os livros obram sobre a alma pelos olhos e os ouvidos”,<br />
36 ALVERNE, Trabalhos oratórios e literários, op. cit., p. 30.<br />
37 ALVERNE, Francisco de Monte. Compêndio de filosofia. <strong>Rio</strong> de Janeiro: Tipografia Nacional, 1859.<br />
38 ALVERNE, “Trabalhos oratórios e literários”, p. 30.