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Capítulo 04.pdf - PUC Rio

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307<br />

No Brasil, a década de publicação de Noite na taverna foi uma das mais<br />

expressivas para o entendimento da comunicabilidade do irracional. Alguns momentos,<br />

tais quais os apresentados pelo segundo livro Investigações de psicologia, de Eduardo<br />

Ferreira França, mostraram o quanto a sociedade brasileira havia amadurecido, desde a<br />

chegada de D. João VI, nos meandros da fantasmagoria. O principal nome do ecletismo<br />

brasileiro dissertou com uma intimidade bastante evidente sobre a formatura literáriofilosófica<br />

já pressentida na Europa e exportada aos países sob seu âmbito de influência<br />

cultural. O pensador baiano observou que o ópio, o haschich e “bebidas espirituosas”<br />

traziam com sua ingestão a projeção de cores, imagens e sons, elementos de um cérebro<br />

ressentido pelas “impressões extraordinárias” enviadas do “foco da sensibilidade”, que<br />

respondia com produtos muitas vezes semelhantes aos que se manifestavam por ocasião<br />

da ação dos sentidos externos. E completava:<br />

Estas sensações cerebrais tomam às vezes tal caráter, que parecem realmente o resultado<br />

da ação atual sobre os sentidos, e constituem então as alucinações ou falsas sensações,<br />

e, embora não sejam provocadas pelos objetos exteriores, apresentam-se todavia com<br />

todos os sinais de exterioridade; são neste caso as alucinações, que Baillager chama<br />

psico-sensórias, porque pensa que nestas há na realidade intervenção dos sentidos;<br />

enquanto que em outras não há essa representação exterior, são imagens interiores,<br />

vozes secretas etc. 281<br />

Nem sempre as imagens realizadas por Alvares de Azevedo permitiam<br />

afirmações categóricas a respeito de suas predileções filosóficas. O amaneiramento<br />

estilístico de que se prouve, por vezes, refletia um conhecimento adquirido de segunda<br />

mão, conceitos gravitando na esfera de leituras intensivas de Byron, Alfred de Musset,<br />

Hoffmann, ou seja, tudo muito fechado nos domínios da literatura. Porém o<br />

questionamento levantado pela imersão nos conteúdos da teoria do conhecimento<br />

mobilizava toda a intelectualidade brasileira do período, pulverizando o assunto na<br />

atmosfera sem que se necessitasse uma aspiração muito profunda: respirava-se sem<br />

esforço um ar saturado de imagens depauperadas. Assim, Noite na taverna, a ficção em<br />

prosa mais bem acabada deixada pelo escritor, manteve este título muito pelas<br />

correspondências evidentes com os dilemas de seu tempo, e se pode afirmar que a<br />

atração imortal de suas linhas provém menos das excentricidades expostas pela rebeldia<br />

feérica, autista, do que pelas raízes de um pertencimento consciente a uma<br />

281 FRANÇA, Eduardo Ferreira. Investigações de Psicologia. São Paulo: Editora Grijalbo, 1973, p. 276.

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